“Já passou da hora de colocar na grade curricular do ensino fundamental a disciplina trânsito”. O alerta, do capitão da Polícia Militar de Minas Gerais Edson Nogueira Benjamim, resume proposta que foi consenso entre autoridades na manhã desta quinta-feira (13/6/12), em Poços de Caldas (Sul de Minas), durante a abertura do Ciclo de Debates Siga Vivo: pelo fim da violência no trânsito da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O excesso de velocidade, o aumento da frota e falhas estruturais em trechos da malha rodoviária foram apontados como as maiores causas da violência no trânsito na região.
Abordando o trânsito no meio urbano, o capitão Edison Nogueira, que chefia a Seção de Planejamento Operacional do 29º Batalhão de Trânsito da PMMG, disse que em Poços de Caldas foram registradas, em 2000, 27 mortes por acidentes de trânsito, com uma média diária de 5,22 acidentes. Em 2011, a média de acidentes cresceu para quase seis por dia e o número de vítimas caiu para 22. Ainda assim, ele alertou que a violência no trânsito é um problema crônico. “Temos um desafio enorme”, advertiu ao defender ações de educação inseridas na escola, desde a infância.
Segundo o chefe da Delegacia da Polícia Rodoviária Federal em Pouso Alegre, inspetor Emerson João Soares, prova de que a imprudência é causa importante da violência no trânsito é o fato de duas rodovias em excelentes condições de tráfego, duplicadas e com pedágios, ainda protagonizarem alta incidência de acidentes, entre outros, por excesso de velocidade. É o caso das BRs 381 e 459, respectivamente, nos 200 e 150 quilômetros sob a fiscalização de sua delegacia. Apesar das condições favoráveis, só perdem em acidentes com vítimas fatais para a delegacia que responde pela Região Metropolitana de Belo Horizonte. Segundo ele, a média anual é de 80 mortos por ano nos dois trechos.
Ele informou que foram instalados oito radares na BR-459, equipamentos que serão instalados também na BR-381. Mas ele advertiu que, sem conscientização, essas medidas não terão efeito e defendeu que a segurança no trânsito seja matéria escolar obrigatória. O policial citou, entre ações desenvolvidas pela PF na região, palestras em colégios e centros de formação de condutores, operações como Lei Seca, Duas Rodas e Racha e a realização de comandos médicos e educativos voltados para públicos como motoristas de feriados e caminhoneiros.
Também nos 1.500 km de rodovias federais e estaduais sob a área de atuação da 18ª Companhia Independente de Meio Ambiente e Trânsito da Polícia Militar de Minas Gerais, a imprudência tem contribuído para grande parte dos acidentes. Conforme apontou o comandante da unidade, major PM Sandro Wesley, grande parte dos acidentes com vítimas fatais deve-se a colisões frontais, tipo de acidente geralmente provocado por imprudências, como ultrapassagens forçadas ou feitas em local proibido ou direção na contramão.
Há também causas como falhas estruturais ou de engenharia, apontou o comandante, ao frisar que a 18ª Companhia tem atuado na identificação de pontos críticos, buscando junto a outros órgãos competentes a correção necessária, a exemplo de terceira faixa aberta em trecho da BR-050. Entre pontos ainda críticos, ele citou o trecho conhecido na região como curva da Conceição, no município de Campos Gerais, em que a estrada, não duplicada, é margeada por um brejo e uma lagoa, sendo cenário de sucessivos acidentes com vítimas fatais. “Essa curva tem que ser retirada e se não for, que sejam colocados radares no trecho”, defendeu.
Poços tem quase dois veículos por habitante e vai implantar agentes de trânsito
Somente o município de Poços de Caldas tem hoje emplacados 86 mil veículos, entre os diversos tipos, cerca de 1,8 por habitante. A informação é do secretário municipal de Defesa Social, Demilton Vacarelli, ressaltando que essa relação refere-se apenas à frota fixa da cidade, sem contar o fluxo de turistas numa cidade que está entre as mais procuradas do Estado.
Segundo Vacarelli, a questão do trânsito ocupa boa parte da agenda da secretaria por estar presente no dia a dia da população e envolver toda a sociedade. Apesar do grande fluxo de veículos, ele afirmou que tem havido redução em algumas das estatísticas relacionadas a acidentes de trânsito, o que ele credita a ações em parceria com outros órgãos. “Certamente essa iniciativa da Assembleia vai contribuir com outras campanhas importantes”, avaliou.
Agentes de trânsito – Entre ações positivas na cidade de Poços de Caldas, o secretário citou campanhas junto aos pais, para que optem pelo transporte escolar dos filhos apenas entre os serviços autorizados, invertendo a lógica de que apenas o poder público deve se responsabilizar pela fiscalização. Ele também anunciou que, até o final de julho, entrarão em ação na cidade os agentes municipais de trânsito, com o intuito não de multar, mas de orientar e educar a população.
Por outro lado, o secretário municipal reconheceu a necessidade de o município rever seus corredores de tráfego em busca da melhoria da mobilidade urbana, conforme defendido na fase de debates com a participação da plateia. Ele disse que há ações em desenvolvimento nessa direção, em locais como a avenida João Pinheiro.
Frisando que têm sido realizadas audiências públicas sobre o assunto, o presidente da Câmara Municipal de Poços de Caldas, vereador Waldemar Antônio Lemes Filho, se referiu à violência no trânsito no País como uma guerra civil que somente poderá ser vencida por meio da educação. Ele disse esperar que o Ciclo de Debates Siga Vivo gere propostas de ação que sejam factíveis e realizadas.
Distâncias ainda dificultam ação do Corpo de Bombeiros na região
Representando o Corpo de Bombeiros Militar, o tenente coronel BM Ernande Brandão David, comandante do 9º Batalhão, em Varginha, admitiu que o resgate ainda é prejudicado na região. O batalhão tem unidades instaladas em Poços de Caldas e outros sete municípios (Alfenas, Pouso Alegre, Itajubá, Varginha, Três Corações, São Lourenço e Lavras), havendo percursos que demandam, conforme o chamado, até duas horas para o deslocamento de um resgate. Essas unidades, segundo ele, são responsáveis pela cobertura dos 139 municípios localizados no Sul de Minas.
Somente a unidade de Poços de Caldas, segundo o tenente coronel, registrou, em 2011, 53 ocorrências de chamados relacionados a acidentes de trânsito com carros e outros 49 envolvendo motos, com o registro de14 vítimas fatais, quase cinco vezes mais do que as três mortes registradas no ano anterior. As ocorrências, contudo, são em maior número, conforme explicou o bombeiro, porque excluem os atendimentos e resgates feitos por equipe própria da concessionária que explora a BR-381 na região de Poços. Entre outros dados, o representante do Corpo de Bombeiros frisou que as ocorrências envolvendo motos têm sido responsáveis por grande parte dos chamados.
O custo do sofrimento – Médico responsável pelo Pronto-Socorro e pela Terapia Intensiva da Santa Casa de Poços de Caldas, José Tasca disse que o outro lado das estatísticas expostas pelas autoridades de trânsito está no sofrimento vivenciado pelas vítimas que passam pelo hospital. Ele apresentou um estudo de caso de um paciente de 17 anos que sofreu politraumatismo em decorrência de um acidente de bicicleta e apontou, por outro lado, os impactos financeiros de um tratamento desse tipo.
Segundo o médico, somente em medicamentos e equipamentos, são gastos mil reais por dia. O mínimo de internação nesses casos, frisou, varia de 15 a 30 dias, podendo chegar a três meses ou mais.
Deputado defende novo comportamento da sociedade
O presidente da Comissão de Saúde, deputado Carlos Mosconi (PSDB), advertiu que o Brasil precisa perder o título de campeão mundial de acidentes de trânsito. “Temos que perder este campeonato”, afirmou o parlamentar, lembrando que a cada 13 minutos morre uma pessoa no trânsito no Brasil. Minas Gerais perdeu, em 2010, 1.055 vidas nas rodovias, número que no ano passado subiu para 1.270, aumento superior a 27% de um ano para o outro, disse Mosconi.
Ele lembrou que as leis vão se atualizando, que a fiscalização aumenta e que mais radares têm sido instalados. “Mas a sociedade brasileira está precisando mudar também de comportamento”, alertou o deputado, para quem, mais do que estatísticas que chocam, trata-se de uma questão que traz dor às famílias das vítimas.
Endossando a fala de Mosconi, o deputado Pompílio Canavez (PT) acrescentou que o combate à violência no trânsito é assunto que deve estar presente nas campanhas municipais deste ano, com destaque a ações necessárias para reformas urbanas que contemplem sobretudo melhorias na mobilidade urbana.
Perdas – Os deputados também frisaram que o trânsito deixa famílias destroçadas, a exemplo de Leandro Luiz dos Reis, que perdeu a noiva, Cíntia, em um acidente em 8 de setembro do ano passado, e fez um relato emocionado do caso. Segundo ele, o casal, como de hábito, fazia uma caminhada por volta das 20 horas daquele dia na avenida Venceslau Brás, em Poços de Caldas, quando um carro em alta velocidade atingiu Cíntia. “Era um racha, numa avenida movimentada, que matou Cíntia por imprudência. Um fato triste na minha vida e de sua família. Represento aqui toda a população da cidade que se comoveu com o acidente”, afirmou.
Objetivos – O Ciclo de Debates Siga Vivo tem como objetivos principais: difundir a realidade da violência no trânsito; apresentar o impacto dos acidentes de trânsito nas vidas das famílias e nos sistemas públicos de saúde e previdência; debater as causas e possíveis soluções para o problema; articular agentes públicos para a adoção de medidas visando à redução das mortes e do número de vítimas; e sensibilizar a sociedade, por meio da educação e da mobilização, para um comportamento mais seguro no trânsito.
Este é o terceiro de uma série de nove encontros que a ALMG realiza em parceria com mais de 50 entidades envolvidas com a questão do trânsito. Os debates prosseguem à tarde, no Teart Maison, no Centro da cidade, com mesa redonda “Por uma maior segurança no Trânsito”.
Cinco comissões permanentes da ALMG se engajaram na realização do ciclo: Comissão de Segurança Pública; de Saúde; de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência; de Educação, Ciência e Tecnologia, e de Transporte, Comunicação e Obras Públicas.
Fonte: AL/MG