EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA Xª VARA CÍVEL DA COMARCA DE XXXXXXXXXX – PODER JUDICIÁRIO ESTADO
Ação n° XXXXXXXXXXXXX
ESTADO X , já qualificado nos autos da ação em epígrafe, proposta por XXXXXXX, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento nos artigos 335 e seguintes do Código de Processo Civil, oferecer CONTESTAÇÃO, pelos fatos e fundamentos que passa a expor.
I. FATOS
1. O Autor alega ter sofrido, no dia 11 de janeiro de 2017, um acidente automobilístico em rodovia estadual, devendo ser indenizado material e moralmente pelos danos sofridos, em razão de supostas condutas praticadas pelos réus.
2. Em síntese, aduz que estava “dirigindo em velocidade normal, abaixo do limite permitido” e que “foi surpreendido por um ônibus de transporte coletivo da empresa XXXXX”. Em razão disso, teria colidido “lateralmente com o veículo de XXXXXX” e atingido um buraco sem sinalização, capotando o carro e provocando perda total (fl. X da contestação).
3. Nesse sentido, o Autor argumenta que o Estado X, por se tratar de uma via estadual, agiu com negligência, pois não teria consertado o buraco na rodovia e falhou em sinalizar a sua existência (fl. X da contestação).
4. Contudo, a pretensão do Autor não possui guarida no ordenamento jurídico brasileiro, devendo ser julgada improcedente. Veja-se.
II. FUNDAMENTOS JURÍDICOS
II.1. PRELIMINARES DE MÉRITO
II.1.1. INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO
5. Conforme já exposto, o Autor ofereceu a presente ação de reparação contra os réus XXXXXX e o Estado X. Contudo, tem-se que o foro escolhido é incompetente para julgar a presente demanda.
6. Ora, como se depreende da inicial, o Autor entende que o Estado X agiu com negligência ao permitir a existência de um suposto buraco na Rodovia X, bem como que esse fato teria dado causa ao acidente automobilístico ora citado. Por esse motivo, chamou o Estado X para integrar a relação processual, a fim de que seja condenado a indenizar o Autor a título de danos materiais e morais.
7. Em razão disso, tem-se que o juízo competente para julgar e processar as demandas propostas contra o Estado X é o Juizado Especial da Fazenda Pública, e não o juízo cível apontado pelo Autor. Veja-se:
AÇÃO CONDENATÓRIA AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. VALOR DA CAUSA INFERIOR AO LIMITE DE 60 (SESSENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS. COMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. DECISUM PROFERIDO POR JUÍZO DE COMPETÊNCIA DÚPLICE. REMESSA DOS AUTOS À TURMA DE RECURSOS. ENTENDIMENTO DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO PÚBLICO.[1] [Grifou-se]
8. Dessa forma, pugna-se pelo reconhecimento da incompetência absoluta do Juízo Cível para processar e julgar a presente demanda, remetendo os autos para o juízo competente.
II.1.2. ILEGITIMIDADE PASSIVA
9. Conforme já exposto, o Autor ofereceu a presente ação de reparação de danos contra os réus XXXXXXXXXX e o Estado X. Contudo, essa relação processual não merece prosperar.
10. O Autor alega que o acidente automobilístico ocorreu na Rodovia X, em razão, dentre outros fatores, da existência de um buraco não sinalizado na pista. Acontece que a responsabilidade de manutenção e restauração das rodovias estaduais não pertence ao Estado X.
11. Após o advento da Lei Complementar Estadual n° XXXX, a responsabilidade das obrigações de manutenção e restauração das rodovias estaduais passou a ser do Departamento Estadual de Infraestrutura – DEINFRA, razão pela qual a ilegitimidade passiva ad causam do Estado X deve ser reconhecida.
12. A jurisprudência pátria é uníssona nesse sentido, veja-se:
[…] RESPONSABILIDADE CIVIL. ESTADO DE SANTA CATARINA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. MÁ CONSERVAÇÃO DA RODOVIA E AUSÊNCIA DE SINALIZAÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. Configura-se a ilegitimidade passiva ad causam do Estado de Santa Catarina em ações que visem o ressarcimento de prejuízos decorrentes de acidente de trânsito, ocasionados pela má conservação de rodovias e ausência de sinalização, cuja responsabilidade foi conferida ao Departamento Estadual de Infra-Estrutura – DEINFRA , pela Lei Complementar Estadual n. 244/2003.[2] [Grifou-se]
13. Diante do exposto, além da incompetência da presente Vara Cível para processar e julgar a presente ação de reparação, deve ser reconhecida a ilegitimidade passiva ad causam do Estado X, nos termos do artigo 339[3] do Código de Processo Civil.
II.1.3. INCORREÇÃO DO VALOR DA CAUSA
14. O valor da causa apresentado pelo Autor também merece correção. Isso porque, em seus pedidos, o Autor requereu R$ 14.000,00 (quatorze mil reais), como danos materiais, e R$ 10.000,00 (dez mil reais), a título de danos morais. Contudo, o Autor apresentou como valor da causa o montante de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
15. Por esse motivo, impugna-se o valor da causa apresentado, devendo a parte Autora ser intimada para corrigi-lo e complementar as custas iniciais, se for o caso.
II.2. ESTADO NÃO AGIU COM NEGLIGÊNCIA
16. Ainda que não seja reconhecida a ilegitimidade passiva ad causam do Estado X para integrar a presente relação processual, o que se admite apenas a título de argumentativo e por respeito ao princípio da eventualidade, tem-se que o Estado X não agiu com negligência.
17. Primeiramente, cumpre ressaltar o que o próprio Autor mencionou na inicial o fato de “não ter havido perícia no local do acidente” (fl. X da contestação), o que é suficiente para afastar eventual responsabilidade do Estado X, tendo em vista que a existência do suposto buraco não foi comprovada.
18. Isso porque a responsabilidade do Estado X, nos casos de acidentes automobilísticos, é de natureza subjetiva, isto é, depende da comprovação de culpa.
19. Ora, não há que se falar em responsabilidade objetiva, pois o Estado X não pode funcionar como um protetor e observador universal. A responsabilidade surgiria, sem óbice, se, no caso de o Estado X, ciente da existência de um buraco na rodovia, negligenciasse a notícia e não o restaurasse imediatamente, o que não foi o caso presente.
20. Da mesma forma, o Autor juntou à inicial gravações de câmeras de segurança de postos de gasolina ao longo da Rodovia X. Acontece que tal documentação não possui valor probatório, em razão de que foi elaborada unilateralmente pela parte Autora, pois o contraditório não foi oportunizado, violando-se a ampla defesa.
21. Ainda que se reconheça como prova as gravações obtidas pelas câmeras de segurança, tem-se que elas não comprovam a existência do suposto buraco, que teria dado causa ao acidente. Assim, conforme já exposto, inexiste a responsabilidade do Estado X, pois a culpa não foi demonstrada.
22. Veja-se decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) que, em situação análoga, reconheceu que a responsabilidade do DEINFRA é subjetiva nos casos de acidente de trânsito:
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. AÇÃO REGRESSIVA EM FACE DO DEINFRA/SC. COLISÃO DE VEÍCULO COM ANIMAL, ACARRETANDO A PERDA DO AUTOMOTIVO. AVENTADA APLICAÇÃO DO CDC À HIPÓTESE. RODOVIA ESTADUAL NÃO PEDAGIADA. AUSÊNCIA DE CONCESSÃO À ENTIDADE PRIVADA. INEXISTÊNCIA DE REMUNERAÇÃO DIRETA AO ENTE PÚBLICO PELA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TRÂNSITO (LCE 244/2003). RELAÇÃO JURÍDICO-ADMINISTRATIVA E NÃO DE CONSUMO. MÉRITO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS A CARACTERIZAR OMISSÃO ESPECÍFICA DO ENTE ESTATAL, NOTADAMENTE NO TRECHO EM QUE OCORRIDO O INFORTÚNIO. QUADRO QUE NÃO DENOTA, SEQUER MINIMAMENTE, A FALTA DE ATUAÇÃO DA RÉ NA LOCALIDADE. ÔNUS DA SEGURADORA (ART. 333, I, CPC/1973). RESPONSABILIDADE POR OMISSÃO, NO CASO, APURADA SOB A VERTENTE SUBJETIVA. FALTA DE NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A AVENTADA NEGLIGÊNCIA DA AUTARQUIA E O DANO. REQUISITO IMPRESCINDÍVEL À REPARAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.[4] [Grifou-se]
23. Diante do exposto, se for o caso de não acolhimento da preliminar de ilegitimidade, pugna-se pelo reconhecimento da natureza subjetiva da responsabilidade do Estado X e, consequentemente, do seu afastamento, em razão de ausência de substrato probatório capaz de demonstrar a sua culpa.
II.3. INOCORRÊNCIA DE DANO MORAL
24. Por sua vez, a alegação de ocorrência de dano moral do Autor não merece prosperar, pois não foi demonstrado o efetivo dano sofrido. Trata-se, ao contrário, de mero aborrecimento, não havendo que se falar em dano in re ipsa.
25. Veja-se decisão recentíssima do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), que declara que acidentes de trânsito faz parte dos riscos do dia-a-dia:
[…] “‘Não se nega que o envolvimento em acidente de trânsito provoca um certo abalo momentâneo pelo “susto” da colisão, porém os transtornos e aborrecimentos normais à situação não configuram dano moral. A ocorrência de sinistros de trânsito faz parte dos riscos a que estamos sujeitos no dia-a-dia e, inexistentes maiores consequências, como lesões de natureza grave, não há falar em indenização por danos morais. (Apelação Cível n. 2007.050494-9, rel. Des. César Abreu, j. 11-11-2010).” (TJSC, Apelação Cível n. 2013.057638-9, de Caçador, rel. Des. Stanley da Silva Braga, j. 24-06-2014)”. […].[5] [Grifou-se]
26. Por esse motivo, o argumento de dano moral não merece acolhimento.
II.4. DANO MATERIAL NÃO COMPROVADO
27. O Autor alega que tenha sofrido danos materiais na ordem de R$ 14.000,00 (quatorze mil reais), em razão de ter sofrido perda total do veículo e ter arcado com o aluguel de um novo automóvel, pelo período de dois meses.
28. Ocorre que tais alegações não foram comprovadas. Os documentos acostados à inicial foram elaborados unilateralmente e não possuem firma reconhecida, motivo pelo qual não possuem força probatória e não devem ser utilizados como elementos ensejadores de indenização.
29. Impugna-se, portanto, o valor declarado a título de danos materiais, para que o Autor comprove, efetivamente, qual o verdadeiro valor do dano sofrido.
II.5. AUTOR QUE NÃO DEMONSTROU NECESSIDADE DO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA
30. Da mesma forma que os danos materiais, o Autor não comprovou a necessidade de obter o benefício da justiça gratuita, motivo pelo qual deve apresentar documentos que demonstrem, efetivamente, o seu direito de ficar isento dos pagamentos das custas processuais e honorários advocatícios.
III. PEDIDOS
31. Diante do exposto, requer-se:
a. Seja reconhecida a incompetência do Juízo Cível, para processar e julgar a presente demanda, com a consequente remessa dos autos ao foro competente (Juizado Especial da Fazenda Pública);
b. Seja reconhecida a ilegitimidade passiva ad causam do Estado X, indicando, nos termos do artigo 339 do Código de Processo Civil, o DEINFRA, para integrar a relação processual;
c. Caso não seja reconhecida a ilegitimidade do Estado X:
a) seja realizada a audiência de conciliação;
b) sejam produzidas todas as provas permitidas por direito, em especial a oitiva de testemunhas e perícia no local, ainda que tardia;
c) seja reconhecida a natureza subjetiva da responsabilidade do Estado X;
d) seja afastado o pedido de dano moral;
e) seja o Autor intimado para corrigir o valor do dano material e para que comprove a necessidade da justiça gratuita;
d. Ao final e no mérito, sejam julgados improcedentes os pedidos formulados pelo Autor, condenando-o a arcar com os ônus sucumbenciais e honorários advocatícios.
Nesses termos, pede deferimento.
Cidade (Estado), 2 de maio de 2017.
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ADVOGADO
OAB/UF n° XXXX
[1] TJSC, Apelação Cível n. 0009065-89.2013.8.24.0011, de Brusque, rel. Des. Jorge Luiz de Borba, j. 21-03-2017.
[2] TJSC, Apelação Cível n. 2010.045547-1, de Porto União, rel. Des. Sônia Maria Schmitz, j. 07-05-2013.
[3] Art. 339. Quando alegar sua ilegitimidade, incumbe ao réu indicar o sujeito passivo da relação jurídica discutida sempre que tiver conhecimento, sob pena de arcar com as despesas processuais e de indenizar o autor pelos prejuízos decorrentes da falta de indicação.
[4] TJSC, Apelação n. 0046844-76.2012.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Ronei Danielli, j. 30-08-2016.
[5] TJSC, Apelação Cível n. 0000256-40.2013.8.24.0002, de Anchieta, rel. Des. Carlos Roberto da Silva, j. 24-04-2017.