Tema: Direito Administrativo
Subtema: Concurso Público
Tese: O candidato não deve ser eliminado em avaliação de saúde em virtude da apresentação incompleta de exame por falha do laboratório.
Aplicação: Requerimento administrativo, petição inicial, réplica ou recursos judiciais para reverter decisão de eliminação na fase de avaliação médica por falta de apresentação de exames previstos no edital quando falha decorrer de problema do próprio laboratório. Esta tese pode ser utilizada tanto no âmbito administrativo como no judicial.
Conteúdo da tese jurídica:
I. O CANDIDATO NÃO PODE SER ELIMINADO PELA ENTREGA INCOMPLETA DE EXAMES OCASIONADA POR FALHA DO LABORATÓRIO. POSSIBILIDADE DE APRESENTAÇÃO POSTERIOR DOS EXAMES DEMONSTRANDO APTIDÃO AO CARGO. FINALIDADE ATINGIDA. PROVA DA APTIDÃO MÉDICA.
Em razão de regra constitucional, o ingresso em cargo ou emprego público depende de aprovação em concurso público, ocasião em que o candidato será avaliado por critérios objetivos, previstos em lei e no edital do certame.
Além de comprovar a capacidade técnica para o exercício do cargo, é necessário que os postulantes ao cargo público comprovem a higidez de sua saúde, nos termos do parágrafo único do artigo 14 da Lei Federal nº 8.112/1990, que estatui regra adotada de maneira geral por toda a Administração Pública brasileira, inclusive replicada em normas estaduais e municipais:
Art. 14. A posse em cargo público dependerá de prévia inspeção médica oficial.
Parágrafo único. Só poderá ser empossado aquele que for julgado apto física e mentalmente para o exercício do cargo.
Nesse sentido, é comum que, nos próprios editais de concurso público, seja prevista a etapa de comprovação da aptidão física. É comum e indicado, inclusive, que sejam pormenorizados os exames necessários para comprovação da aptidão médica, como exames de sangue etc.
Diante desta circunstância, a parte autora, ao ser devidamente convocada para comprovação de sua aptidão médica, dirigiu-se ao laboratório de sua confiança e solicitou todos os exames necessários, conforme os termos do edital, para comprovar sua saúde. Os exames foram realizados regularmente.
Após o período indicado pelo laboratório, foi buscar os exames para entregar ao órgão, conforme as exigências realizadas. No entanto, para a sua surpresa, apenas uma parcela das análises laboratoriais havia sido concluída. Alguns itens não foram entregues no prazo previsto, o que obstou a parte autora de entregá-los no órgão.
De todo modo, os exames que haviam sido devidamente analisados pelo laboratório foram todos entregues dentro do prazo e, de modo diligente, a parte informou o órgão da situação, avisando que entregaria o restante dos exames assim que recebesse.
Porém, mais uma vez surpreendida, a parte autora foi informada que havia sido considerada inapta, do ponto de vista médico, por falta de entrega de exames médicos. Desta decisão, dentro do prazo recursal, a parte autora formulou recurso administrativo, incluindo, em anexo, os exames faltantes. Restou, assim, comprovada sua aptidão.
No entanto, o órgão indeferiu o recurso e manteve a decisão administrativa de inaptidão, fundamentando que a entrega havia ocorrido fora do prazo e, portanto, isso desrespeitaria os termos do edital.
Essa decisão, no entanto, fere a razoabilidade. A parte autora atuou de modo diligente, realizou os exames dentro do prazo e acreditou firmemente na seriedade do laboratório, que falhou na prestação do serviço. Apesar disso, na sequência, ela logrou comprovar sua aptidão médica, finalidade maior desta etapa do concurso, de modo que é absurdo que seja eliminada do concurso público por uma falha de terceiro.
Inclusive recentemente, em precedente de junho de 2019, o Tribunal Regional Federal da 1a Região (TRF-1) reconheceu o direito do candidato aprovado em concurso público em caso idêntico:
ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL. EXAME MÉDICO. APRESENTAÇÃO INCOMPLETA DO EXAME DE HEPATITE B. ERRO DO LABORATÓRIO. CORREÇÃO DA IRREGULARIDADE POR OCASIÃO DA INTERPOSIÇÃO DE RECURSO. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. NOMEAÇÃO E POSSE. CANDIDATO SUB JUDICE. TRÂNSITO EM JULGADO. DESNECESSIDADE. SENTENÇA CONFIRMADA.
I – A orientação jurisprudencial já consolidada no âmbito de nossos tribunais é no sentido de que não cabe ao Poder Judiciário substituir-se aos membros de Banca Examinadora na formulação e na avaliação de mérito das questões de concurso público, podendo, contudo, pronunciar-se acerca da legalidade do certame, como no caso, em que se discute a legitimidade da eliminação de candidato, sob o fundamento de que este não teria apresentado todos os exames médicos solicitados pela impetrada.
II – Na hipótese dos autos, não se afigura razoável a eliminação de candidato em etapa específica de concurso público para avaliação de saúde, em virtude da apresentação incompleta do exame de Hepatite B, quando restou comprovado que decorreu de falha do laboratório, sendo que, ao interpor recurso administrativo, o impetrante juntou o exame laboratorial faltante, o qual demonstra, inclusive, sua higidez física. Ademais, consta do edital regente do certame a possibilidade de a junta médica solicitar exames complementares, o que não ocorreu, na espécie dos autos. Precedentes.
III – Não há que se falar em posse precária ou na necessidade de se aguardar o trânsito em julgado da presente decisão para que se efetivem a nomeação e posse do autor, eis que a questão posta nos autos encontra-se em sintonia com a jurisprudência deste egrégio Tribunal, assegurando-se, assim, a garantia dos princípios da eficiência, da moralidade e da razoável duração do processo, conforme preceitua a Lei nº 9.784/99 e os dispositivos insertos nos artigos 5º, inciso LXXVIII e 37, caput, da Constituição Federal, que a todos assegura o direito à celeridade na tramitação dos processos judiciais.
IV – Apelação desprovida. Sentença confirmada.[1]
Aliás, cabe frisar que não se trata de um entendimento isolado, mas consolidado no âmbito do TRF-1. São inúmeros precedentes que demonstram que esta tese é pacífico e deve ser adotada no presente caso:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. CONCURSO PÚBLICO. EXAMES MÉDICOS. EXCLUSÃO DE CANDIDATO POR ALEGADA FALTA DE APRESENTAÇÃO DE DETERMINADO EXAME. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE.
1. O agravante inscreveu-se em concurso público para provimento de vagas para o cargo de Policial Rodoviário Federal, regido pelo Edital nº 01, de 11 de junho de 2013, tendo sido desclassificado na Avaliação de Saúde, sob o fundamento de ausência de entrega do exame médico “IMPEDANCIOMETRIA”.
2. A exclusão do candidato do certame no presente caso, pela negativa de recebimento de um exame médico com nomenclatura variada, pois relatórios médicos juntados aos autos declaram que os termos “IMPEDANCIOMETRIA” e “IMITANCIOMETRIA” referem-se ao mesmo exame, e a omissão da autoridade impetrada em conferir, no momento do recebimento, o rol dos exames entregues, não se coadunam com o princípio da razoabilidade.
3. Agravo de instrumento parcialmente provido para assegurar ao Agravante o direito de participar nas demais etapas do certame de Policial Rodoviário Federal.[2]
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL. EXAME MÉDICO FALTANTE. EXAMES COMPLEMENTARES. POSSIBILIDADE. RAZOABILIDADE.
I – A orientação jurisprudencial já consolidada no âmbito de nossos tribunais é no sentido de que não cabe ao Poder Judiciário substituir-se aos membros de Banca Examinadora na formulação e na avaliação de mérito das questões de concurso público, podendo, contudo, pronunciar-se acerca da legalidade do certame, como no caso, em que se discute a legitimidade da eliminação de candidato, sob o fundamento de que este não teria apresentado todos os exames médicos solicitados pelos impetrados. Dessa forma, rejeita-se a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido alegada na espécie.
II – Na hipótese dos autos, não se afigura razoável a eliminação de candidato em etapa específica de concurso público para apresentação de exames médicos, quando faltante apenas um dentre os inúmeros solicitados, mormente quando o próprio edital regulador do certame indica etapa específica para a entrega de possíveis exames complementares, pelo que não merece qualquer reparo o julgado monocrático que concedeu a segurança postulada na espécie. Ademais, constata-se que não há qualquer pendência editalícia por parte do impetrante, já tendo este participado com aproveitamento do regular curso de formação, sendo determinada, nos presentes autos, inclusive, a sua nomeação e posse desde 27/05/2014.
III – Apelação e remessa oficial, tida por interposta, desprovidas.[3]
Diante do exposto, é de se reconhecer, com base na jurisprudência pátria, o direito da parte autora a ter reconhecida a ilegalidade da sua eliminação e, por consequência, que seja determinada sua aprovação no concurso público e, oportunamente, seja nomeada e empossada no cargo ao qual faz jus.
*É proibida a cópia ou reprodução, total ou parcial, deste conteúdo, em qualquer meio. Fica autorizada a utilização deste conteúdo exclusivamente em petições dirigidas ao Poder Judiciário ou à Administração Pública.
[1] TRF-1, Apelação nº 0009308-21.2016.4.01.3400, DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, Quinta Turma, julgado em 26/06/2019.
[2] TRF-1, AG 0050256-88.2014.4.01.0000 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL KASSIO NUNES MARQUES, SEXTA TURMA, e-DJF1 p.115 de 10/11/2014
[3] TRF-1, AMS 0073548-24.2013.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, QUINTA TURMA, e-DJF1 p.4631 de 24/04/2015