Tema: Direito Administrativo
Subtema: Concurso Público
Tese: Em caso de desistência de candidatos mais bem classificados e dentro do número de vagas em concurso público, os próximos candidatos da lista classificatória têm direito subjetivo à nomeação.
Aplicação: Requerimento administrativo, petição inicial, réplica ou recursos judiciais para obter a nomeação de candidato aprovado fora do número de vagas, em caso de desistência de candidato mais bem classificado e dentro do número de vagas. A tese jurídica é de que a mera expectativa de direito do candidato aprovado fora do número de vagas se convola em direito subjetivo quando um candidato mais bem classificado, aprovado dentro do número de vagas, desiste do cargo. Esta tese pode ser utilizada tanto no âmbito administrativo como no judicial.
Conteúdo da tese jurídica:
I. CANDIDATO INICIALMENTE APROVADO FORA DO NÚMERO DE VAGAS. DESISTÊNCIA DE CANDIDATO MAIS BEM CLASSIFICADO E APROVADO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS. MERA EXPECTATIVA DE DIREITO QUE SE CONVOLA EM DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA PACÍFICAS.
Como é cediço, salvo em hipóteses específicas, o ingresso em cargo ou emprego público depende de aprovação em concurso público, ocasião em que o candidato será avaliado por critérios objetivos e previstos em lei e no edital do certame, sendo que os candidatos serão nomeados na ordem de classificação.
Nesse sentido, na hipótese em que o concurso público promovido pela Administração Pública prevê, em seu edital, o provimento de cargos efetivos, o candidato classificado em posição compreendida dentro do número de vagas previstas possui direito subjetivo à nomeação. Trata-se, portanto, de ato administrativo vinculado: caso o candidato esteja classificado dentro do número de vagas, ele deverá ser nomeado no prazo de vigência do certame, nos termos da jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal Federal (STJ).
Isso ocorre porque, uma vez que o edital do concurso público é lançado, com a previsão e um número determinado de vagas, cria-se uma expectativa legítima para com os candidatos e uma presunção de que o certame será realizado e todos os gastos decorrentes estão justificados, de modo que os cargos de provimento efetivo, previstos no edital do concurso, serão preenchidos durante o prazo de vigência do certame. Neste sentido, o âmbito de discricionariedade da Administração Pública se restringe ao momento anterior à divulgação, por meio de edital, do número de vagas a serem preenchidas para provimento imediato.
Além dos candidatos aprovados dentro do número de vagas, existem os candidatos aprovados fora desse número, os quais não possuem, pelo menos num primeiro momento, direito subjetivo à nomeação, mas mera expectativa de direito. Contudo, existem situações em que este candidato, aprovado em cadastro de reserva, passa a ter direito subjetivo à nomeação.
Conforme os ensinamentos de GUSTAVO SCHIEFLER e EDUARDO SCHIEFLER, “embora o candidato classificado fora do número de vagas previstas no edital ou aprovado para a formação de cadastro de reserva possua mera expectativa de nomeação, existem situações em que tal expectativa é transformada em direito subjetivo”. Uma dessas hipóteses, segundo os autores, “refere-se justamente à desistência de um candidato mais bem classificado após a sua respectiva nomeação, considerada a presunção de que tal ato configura uma manifestação administrativa de que o preenchimento daquela vaga é uma necessidade concreta da administração pública”.[1]
Ou seja, em outras palavras, se um candidato mais bem classificado, aprovado dentro do número de vagas previsto no edital, desiste do cargo, isso tem como consequência que a mera expectativa de direito do candidato subsequente a ele se convole em direito subjetivo à nomeação.
Esse é o entendimento consolidado do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), como se verifica do recente julgamento, ocorrido em fevereiro de 2019:
No caso dos autos, essa é a hipótese. Os documentos dos autos demonstram que a parte autora concorreu ao cargo de técnico de suporte administrativo para a região de Ribeirão Preto – SP, para o qual foi disponibilizada uma vaga, conforme edital (fl. 40 da inicial). Nesse certame, o autor foi aprovado em quinto lugar, tendo os quatro candidatos anteriores renunciado ao cargo. Nesse sentido, malgrado a renúncia do quarto colocado ter sido feita poucos dias antes da expiração do concurso, a requerida não justifica o fato de ter demorado tanto para iniciar os procedimentos de convocação e posse. Essa circunstância, pois, enquadra-se na mesma situação dos precedentes acima mencionados, pois “devidamente comprovado que os recorrentes foram aprovados dentro do número de vagas existentes no edital do concurso e que, expirado o prazo de validade do certame, não foram nomeados, nem houve, por parte da Administração, a declinação de motivos supervenientes de excepcional circunstância para não fazê-lo, impõe-se o acolhimento da pretensão recursal” (RMS 26.013/MS).
(TRF-3 – RI: 00031961320154036311 SP, Relator: JUIZ(A) FEDERAL ANGELA CRISTINA MONTEIRO, Data de Julgamento: 07/02/2019, 4ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial DATA: 14/02/2019)
A jurisprudência do TRF-3 não é voz isolada. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) também compartilha deste entendimento, no sentido de que “o candidato inicialmente aprovado em colocação além do número de vagas previstas no edital tem direito subjetivo à nomeação com a desistência de candidato classificado dentro do número de vagas previsto, que permita a inclusão do candidato excedente seguinte nesse rol”. Veja-se:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONCURSO PÚBLICO. DESISTÊNCIA DE CANDIDATO CONVOCADO PARA PREENCHIMENTO DE VAGA PREVISTA NO EDITAL. EXISTÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO DO CANDIDATO CLASSIFICADO IMEDIATAMENTE APÓS. […] 2. O acórdão recorrido encontra-se em consonância com o entendimento dessa Corte de que o candidato inicialmente aprovado em colocação além do número de vagas previstas no edital tem direito subjetivo à nomeação com a desistência de candidato classificado dentro do número de vagas previsto, que permita a inclusão do candidato excedente seguinte nesse rol. Precedentes: AgRg no RMS 48.266/TO, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 27.8.2015; AgRg no Ag 1.331.856/DF, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 13.8.2014. 3. Agravo Regimental do ESTADO DA PARAÍBA desprovido.
(STJ, AgRg no AREsp 733.538/PB, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/04/2016)
[…] CONCURSO PÚBLICO. DESISTÊNCIA DE CANDIDATO NOMEADO. DIREITO À NOMEAÇÃO DA CANDIDATA POSTERIORMENTE CLASSIFICADA. DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA. INEXISTENTE. EMBARGOS RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL E DESPROVIDO.
– O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consagrado no sentido de que, em concurso público, a desistência de candidatos nomeados para a vaga existente gera ao candidato em classificação posterior o direito à nomeação, ainda que classificado fora do número de vagas. […]
(STJ, EDcl no AgRg no RMS 22.854/MG, Rel. Ministro ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em 23/02/2016)
O Supremo Tribunal Federal (STF) também possui jurisprudência pacífica nesse mesmo sentido:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. DESISTÊNCIA DE CANDIDATO CONVOCADO PARA PREENCHIMENTO DE VAGA PREVISTA NO EDITAL. DIREITO SUBJETIVO DO CANDIDATO CLASSIFICADO IMEDIATAMENTE APÓS. EXISTÊNCIA. DEMONSTRAÇÃO DA NECESSIDADE E DO INTERESSE DA ADMINISTRAÇÃO.
1. A desistência de candidatos aprovados dentro do número de vagas previsto no edital do certame resulta em direito do próximo classificado à convocação para a posse ou para a próxima fase do concurso, conforme o caso.
2. É que a necessidade e o interesse da administração no preenchimento dos cargos ofertados está estabelecida no edital de abertura do concurso e a convocação do candidato que, logo após desiste, comprova a necessidade de convocação do próximo candidato na ordem de classificação. A repeito: RE 643674 AgR, Relator Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe-168; ARE 675202 AgR, Relator Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe-164. 3. Agravo regimental não provido. (STJ, AgRg no RMS 48.266/TO, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/08/2015)
Diante do exposto, é de se reconhecer, com base na doutrina e jurisprudência pátria, o direito subjetivo à nomeação do candidato inicialmente aprovado fora do número de vagas, mas que teve a sua expectativa de direito convolada em direito subjetivo por conta da desistência de candidato mais bem classificado, sob pena de violação dos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
*É proibida a cópia ou reprodução, total ou parcial, deste conteúdo, em qualquer meio. Fica autorizada a utilização deste conteúdo exclusivamente em petições dirigidas ao Poder Judiciário ou à Administração Pública.
[1] SCHIEFLER, Eduardo André Carvalho; SCHIEFLER, Gustavo Henrique Carvalho. Concurso público: direito subjetivo à nomeação do candidato subsequente em caso de desistência ou inadmissão de candidato mais bem classificado. Portal Jurídico Investidura, Florianópolis/SC, 13 Abr. 2017. Disponível em: investidura.com.br/biblioteca-juridica/artigos/direito-administrativo/335633-concurso-publico-direito-subjetivo-a-nomeacao-do-candidato-subsequente-em-caso-de-desistencia-ou-inadmissao-de-candidato-mais-bem-classificado. Acesso em: 23 Fev. 2019.