Tema: Direito Constitucional
Subtema: Serviço Militar Obrigatório
Tese: É possível o adiamento da prestação do serviço militar obrigatório enquanto o médico estiver cursando a residência ou pós-graduação.
Aplicação: Recurso administrativo, petição inicial, réplica ou recurso para obter o reconhecimento do direito ao adiamento da prestação do serviço militar obrigatório do médico até o término de sua especialização. A tese jurídica é de que deve se suspender o ato administrativo de reconvocação para a prestação do Serviço Militar. Esta tese também pode ser utilizada por farmacêuticos, médicos veterinários e dentistas.
Conteúdo da tese jurídica:
I. CONVOCAÇÃO PARA SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO. DIREITO À SUSPENSÃO DO ATO ADMINISTRATIVO DE RECONVOCAÇÃO. ADIAMENTO DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO ATÉ O TÉRMINO DA PÓS-GRADUAÇÃO/RESIDÊNCIA. ARTIGO 29 DA LEI FEDERAL Nº 4.375/1964. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA.
Como é de notório conhecimento, o serviço militar obrigatório possui amparo constitucional (artigo 143) e legal (Lei Federal nº 4.375/1964) no Brasil. Especificamente no caso dos médicos, farmacêuticos, dentistas e veterinários, existe uma obrigação especial, decorrente da Lei Federal nº 5.292/1967 (artigo 4ª), que obriga à prestação, após a conclusão de sua graduação, aqueles que não tenham prestado o serviço militar inicial obrigatório no momento da convocação de sua classe.
O Requerente, justamente, é concluinte do curso de medicina e, portanto, se submete à referida obrigação. Contudo, como o Requerente atualmente está cursando a residência médica, não há necessidade de que a prestação dos serviços militares ocorra imediatamente. Em síntese, Requerente possui direito ao adiamento de sua convocação para prestação do serviço militar obrigatório.
O direito ao adiamento encontra-se previsto na própria Lei do Serviço Militar (Lei Federal nº 4.375/1964), que em seu artigo 29 elenca as hipóteses de adiamento de incorporação no serviço militar obrigatório. Leia-se:
Art 29. Poderão ter a incorporação adiada:
e) os que estiverem matriculados ou que se candidatarem à matrícula em institutos de ensino (IEs) destinados à formação, residência médica ou pós-graduação de médicos, farmacêuticos, dentistas e veterinários até o término ou a interrupção do curso. (Redação dada pela Lei nº 12.336, de 2010)
Ainda sobre normativas que regem o tema dos autos, a Lei Federal nº 5.292/1967, também atualizada pela Lei Federal nº 12.336/2010, passou a prever a hipótese de manutenção do adiamento da incorporação, originalmente deferida, até o final do curso de residência médica ou pós-graduação, conforme disposto no caput de seu artigo 4º:
Art. 4º. Os concluintes dos cursos nos IEs destinados à formação de médicos, farmacêuticos, dentistas e veterinários que não tenham prestado o serviço militar inicial obrigatório no momento da convocação de sua classe, por adiamento ou dispensa de incorporação, deverão prestar o serviço militar no ano seguinte ao da conclusão do respectivo curso ou após a realização de programa de residência médica ou pós-graduação, na forma estabelecida pelo caput e pela alínea ‘a’ do parágrafo único do art. 3º, obedecidas as demais condições fixadas nesta Lei e em sua regulamentação. (Redação dada pela Lei nº 12.336, de 2010)
Como se vê, o direito do Requerente ao adiamento encontra-se previsto expressamente na legislação vigente. A redação dos dispositivos legais garante que o profissional não está obrigado a prestar o serviço militar necessariamente ao final do curso de graduação, mas sim somente após o término da residência médica ou pós-graduação. É exatamente o que ocorre no presente caso.
Portanto, a legislação que versa sobre o serviço militar obrigatório passou a incluir, dentre aquelas hipóteses de adiamento a incorporação, a matrícula (ou até mesmo a candidatura a matrícula) em programa de residência ou pós-graduação. Isto é, o serviço militar deve ser prestado somente após a realização da pós-graduação/programa de residência. Nestes autos, o Requerente comprovou estar regularmente matriculado em curso de especialização e, portanto, preencheu o suporte fático da norma citada.
Ainda, a prestação do serviço militar posteriormente à realização da especialização não traz, à primeira vista, prejuízos às Forças Armadas. Pelo contrário, ao obter qualificação, o Requerente poderá agregar ainda mais ao serviço militar obrigatório, com a prestação de serviço ainda mais especializado.
A propósito, a jurisprudência brasileira é sólida em favor do Requerente. Recentemente, em fevereiro de 2019, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região reafirmou o entendimento pacífico dos tribunais pátrios, no sentido de determinar a suspensão do ato de convocação e o adiamento da incorporação no Serviço Militar Obrigatório até que se finalize ou se interrompa a residência médica. Leia-se:
ADMINISTRATIVO. SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO. RESIDÊNCIA MÉDICA. ADIAMENTO DA CONVOCAÇÃO.
É firme na jurisprudência o entendimento no sentido de que as alterações promovidas pela Lei n.º 12.336/2010 na legislação de regência aplicam-se aos concluintes de cursos de graduação, destinados à formação de médicos, farmacêuticos, dentistas e veterinários, sob sua égide, ainda que tenham sido dispensados da incorporação antes de sua edição, desde que convocados após sua vigência. No entanto, estando o impetrante cursando pós-graduação/residência médica, a Lei nº 12.336/2010 permite o adiamento de incorporação até a finalização do curso. (TRF-4 – AC: 50122166620184047100 RS 5012216-66.2018.4.04.7100, Relator: VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Data de Julgamento: 27/02/2019, QUARTA TURMA).
Registre-se que este acórdão não é isolado na jurisprudência brasileira, como se verifica do teor das seguintes decisões:
DECISÃO DA VICE-PRESIDÊNCIA APOIADA NO ART. 543-C, PARÁGRAFO 7º, INC. I, DO CPC. AGRAVO REGIMENTAL. ADMINISTRATIVO. SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO. PROFISSIONAIS GRADUADOS EM MEDICINA, ODONTOLOGIA, FARMÁCIA E VETERINÁRIA. PRÉVIA DISPENSA POR EXCESSO DE CONTINGENTE. CONVOCAÇÃO APÓS A CONCLUSÃO DO CURSO SUPERIOR. LEIS 4.375/64, 5.292/67 E 12.336/2010.
1. O Órgão julgador desta Corte decidiu a hipótese apresentada nos autos em consonância com o entendimento do E. STJ, de forma que a pretensão recursal não merece trânsito.
2. Portanto, revela-se inviável o prosseguimento do recurso especial, tendo em conta a nova sistemática prevista na legislação processual (art. 543-C, § 7º, inciso I, do CPC).
3. Agravo regimental desprovido. (TRF-4 – REEX: 50003503720134047100 RS 5000350-37.2013.404.7100, Relator: CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Data de Julgamento: 06/08/2015, VICE-PRESIDÊNCIA)
ADMINISTRATIVO. SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO. PROFISSIONAL DA ÁREA DE SAÚDE. MFDV. ADIAMENTO DE INCORPORAÇÃO. CONVOCAÇÃO. ADIAMENTO. CONCLUSÃO DO CURSO DE RESIDÊNCIA MÉDICA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
Se o requerente obteve dispensa ou adiamento do serviço militar obrigatório, na forma dos artigos 4º e 9º da Lei 5.292/67, mostra-se não somente possível como até mesmo recomendável que o ato administrativo convocatório seja postergado para momento seguinte à conclusão do curso de residência médica e/ou estudos de pós-graduação. Esta a jurisprudência pacífica dos Tribunais pátrios.
(TRF-4 – REEX: 50029517920144047100 RS 5002951-79.2014.404.7100, Relator: FERNANDO QUADROS DA SILVA, Data de Julgamento: 13/05/2015, TERCEIRA TURMA)
Existem numerosos precedentes que acompanham o entendimento demonstrado. Veja-se em: TRF4 – 5003290-38.2014.4.04.7100, TRF4 – 5043805-81.2015.404.7100, TRF4 – 5014736-85.2012.404.7107, AI 5014399-38.2016.4.04.0000.
Por fim, cabe ressaltar que o inciso V do artigo 208 da Constituição Federal atribui ao Estado o dever com a educação, o que inclui o acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um. Este direito constitucional abrange a qualificação para o trabalho, conforme artigo 205 do diploma supra[1]. E, certamente, a residência médica/pós-graduação constitui etapa significativa na formação profissional, não sendo razoável a sua interrupção pela prestação do serviço militar obrigatório.
Diante do exposto, com amparo nos dispositivos da Constituição Federal citados, nas normas que regem o Serviço Militar Obrigatório e no entendimento pacífico dos tribunais pátrios, é seguro concluir que o Requerente possui direito ao adiamento da prestação do serviço militar.
*É proibida a cópia ou reprodução, total ou parcial, deste conteúdo, em qualquer meio. Fica autorizada a utilização deste conteúdo exclusivamente em petições dirigidas ao Poder Judiciário ou à Administração Pública.
[1] Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.