EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DA ………………….
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE …………………, por meio do Promotor de Justiça do Meio Ambiente, vem mui respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL em face de
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e outros invasores a serem identificados na área, todos podendo ser encontrados na área descrita abaixo e objeto da presente ação, a qual é proposta com fundamento na Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1.985 e nas leis Estaduais nºs. 898, de 18 de dezembro de 1.985 e 1.172, de 17 de novembro de 1.976, dentre outras, e em razão dos fatos e fundamentos jurídicos abaixo relatados:
I. DOS FATOS E DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS
Consoante apurado no incluso protocolado nº ………….., cujas peças passam a fazer parte integrante da presente ação, os requeridos promoveram invasão de uma área de terras situada à Estrada ………………., Jardim ………… (Sítio …………….), nesta comarca, encerrando uma área total de aproximadamente ………….. metros quadrados, pertencente a ……………………………., conforme certidão de propriedade juntada às fls. ……. e identificação do croquis de fls.
……
De acordo ainda com que se apurou, a área foi objeto de inúmeros desmatamentos por pessoas diversas, conforme relatam os boletins de ocorrência juntado a fls. …… e ……. e autos de infração a fls. ………
Informou o Departamento de Regularização de Parcelamento do Solo – RESOLO, órgão da Secretaria Municipal de Habitação, que a área foi objeto de três operações anti-invasão, com a retirada de piquetes, arames e fitas demarcatórias de lotes.
Após idas e vindas, ameaças de invasão e operações fiscalizatórias do poder público, informou ainda o órgão municipal que “no dia ………… constatamos que a área estava ocupada por aproximadamente ………. barracos de madeirite, na área pertencente a …………….. (vide fls. ……….).
Procurando a Promotoria de Justiça a identificação dos invasores ocupantes dos barracos precariamente instalados, obteve informação do Grupo de Fiscalização SOS Mananciais, juntada às fls. ………., de que se trata dos requeridos.
Portanto, não obstante as intervenções do Poder Publico no sentido de impedir a consolidação da ocupação irregular, os invasores têm insistido em adentrar ilegalmente a área para construção de casas precárias, com a finalidade de instalar-se definitivamente.
Segundo, ainda, o laudo técnico a fls. ……. e informação juntada a fls. ……., a área invadida é classificada como de proteção aos mananciais.
A área objeto da invasão, classificada como de 1ª categoria, está qualificada como área non aedificandi pelos arts. 2º e 4º, da Lei Estadual nº 1.172, de 17 de novembro de 1.976, a qual “Delimita as áreas de proteção relativas aos mananciais, cursos e reservatórios de água a que se refere o artigo 2º da Lei nº 898, de 18.12.75, estabelece normas de restrição do uso do solo em tais áreas e dá providências correlatas”, in verbis:
“Art. 2º. Nas delimitações de que trata o artigo anterior constituem áreas ou faixas de 1ª categoria ou de maior restrição:
…
II – a faixa de 50 metros de largura, medida em projeção horizontal, a partir da linha de contorno correspondente ao nível de água máximo dos reservatórios públicos, existentes e projetados.”
De acordo com os arts. 9º, da citada Lei nº 1.172/76, nas áreas classificadas como sendo de 1ª categoria, somente são permitidos usos e atividades referentes à “pesca, excursionismo, excetuado o campismo, natação, esportes náuticos e outros esportes ao ar livre, que não importem em instalações permanentes e quaisquer edificações”, excetuadas aquelas destinadas à proteção de mananciais.
O art. 10, por sua vez, estabelece que “nas áreas ou faixas de 1ª categoria ou de maior restrição, somente são permitidos serviços, obras e edificações destinados à proteção dos mananciais, à regularização de vazões com fins múltiplos, ao controle de cheias e à utilização de águas prevista no artigo 8º” (abastecimento de água).
O art. 2º, da Lei Estadual nº 898/75, ao elencar as áreas de proteção de mananciais, elenca no inciso V, o “reservatório Billings”.
Mesmo em se tratando de área classificada como de 2ª categoria o parágrafo único do art. 3º, da Lei nº 898/75, estabelece que “nas áreas de proteção, os projetos e a execução de arruamentos, loteamentos, edificações e obras, bem assim a prática de atividade agropecuárias, comerciais, industriais e recreativas dependerão de aprovação prévia da Secretaria dos Negócios Metropolitanos e manifestação favorável da Secretaria de Obras e Meio-Ambiente, mediante parecer da Companhia de Tecnologia de Saneamento Básico e Defesa do Meio Ambiente – CETESB, quanto aos aspectos de proteção ambiental, sem prejuízo das demais competências estabelecidas na legislação em vigor para outros fins”.
Portanto, ao invadirem e edificarem na área, os requeridos infringiram conscientemente a legislação ambiental, sujeitando-se ao desfazimento da obra e a recuperação ambiental.
O inciso IV, do art. 13, da Lei nº 898/75, estabelece que os infratores às suas disposições, ficam sujeitos ao “embargo ou demolição da obra ou construção executada sem autorização ou aprovação”.
No caso ora tratado, os invasores, obviamente, não procuraram o órgão ambiental, ou qualquer outro, para obterem autorização para edificar na área.
Ressalte-se, ainda, que a Lei Federal nº 4.771/65 (Código Florestal), em seu artigo 2º, considera de preservação permanente as áreas situadas “ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água” (alínea “a”); “ao redor de reservatórios de água naturais ou artificiais” (b); “nas nascentes, ainda que intermitentes (…) num raio mínimo de 50 (cinquenta) metros de largura” (c).
Já seu art. 3º considera, também, de preservação permanente, as formas de vegetação natural destinadas “a assegurar condições de bem estar público”, neste conceito subsumindo-se as áreas de proteção aos mananciais, cuja criação, como se verá adiante, visou a melhoria da qualidade da água servida à população da grande …………………, bem como ao controle das enchentes.
A Constituição do Estado de …………………, ao tratar dos recursos hídricos, estatui, em seu artigo 197, inciso II, que são consideradas como áreas de preservação permanente as nascentes, os mananciais e matas ciliares.
A respeito dos fatos foi, inclusive, instaurado inquérito policial por infração ao art. 26, alínea “g”, da Lei nº 4.771/65 (Código Florestal), conforme informado pela Delegacia de Polícia Especializada em infrações penais contra o meio Ambiente (fls. 87).
II. DA IMPORTÂNCIA DA REGIÃO DE MANANCIAIS E SUA PROTEÇÃO
É oportuno acrescentar que a definição de uma área entorno de reservatórios aquáticos destinados a abastecimento público visa exatamente perenizar tais reservatórios, de molde a garantir a qualidade de suas águas. A proteção dos mananciais atende, então, não somente a aspectos ambientais de preservação de recursos naturais, mas a própria garantia imediata de continuidade de um serviço público de abastecimento da população.
A contaminação e o assoreamento dos reservatórios implica em sua condenação quase irremediável como fonte de captação de água, demandando enormes e vultuosos recursos para sua recuperação ou para captação de água em mananciais mais longínquos. E quem pagará por isso são os próprios contribuintes, como acontece hoje na recuperação da bacia do Guarapiranga.
“A contaminação é provocada pela introdução no ambiente lacustre de materiais tóxicos ou de organismos patogênicos, provenientes principalmente do lançamento de águas residuárias domésticas e industriais. O assoreamento é causado pelo recebimento de material sólido originário da bacia de drenagem. A existência de áreas facilmente erodíveis, sobretudo em função de desmatamentos, favorece o carreamento de material particulado até os cursos d’água afluentes aos lagos ou à represa”.
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Enquanto o assoreamento está associado ao problema de diminuição da quantidade de água, a contaminação e eutrofização têm como principal consequência uma degradação de sua qualidade. Todos esses fenômenos acarretam por conseguinte graves danos ao corpo d’água, prejudicando o uso para o qual ele foi destinado. Frente a esta situação cabe ao homem tentar, da forma mais eficiente possível, compatibilizar o aproveitamento do recurso hídrico com o grau de qualidade desejado.” (Eduardo Von Sperling, in, “Sugestões para Programas de Monitoramento de Lagos e Reservatórios”, Anais do 17º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. ABES – Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental – vol. 2, tomo II – grifamos).
Como se observa pela lição técnica citada, a partir da definição de uso de um determinado reservatório (no caso, uso público para abastecimento populacional), é fundamental a proteção de seu entorno, prolongando sua utilização.
Utilizar de recursos naturais de forma adequada e racional é, também, defender o meio ambiente, posto que sua exploração se dará de forma integral não havendo necessidade de se lançar mão de novos recursos naturais antes do tempo previsto.
A ocupação irregular da chamada Região de Proteção de Mananciais, por meio de sucessivas edificações em seu entorno, em nada contribuirá para resolver problemas sociais, como se pode imaginar.
Ao contrário. Além de ensejar edificações, que no mais das vezes encontram-se em precárias condições, inclusive de segurança, a ocupação sem critério dessas áreas, em muito breve espaço de tempo trará novo e crucial problema que já começa a ser vivido pela população da Região Metropolitana de …………………: a falta de água para consumo humano e desenvolvimento de atividades vitais.
O Reservatório Billings, local da invasão e parcelamento irregular ora tratado, passa por momento decisivo como definição de uso hídrico de suas águas como fonte de abastecimento. Ou se impede a ocupação de seu entorno, de forma decidida, ou se pagará por isso brevemente, a começar pelo preço da água consumida, que será buscada em mananciais afastados a um custo caríssimo.
“Ao passo que na Guarapiranga haverá uma fiscalização destinada a impedir a ocupação em desacordo com a finalidade da represa, a vizinha bacia do reservatório Billings, até agora abandonada à própria sorte das atividades humanas é um fortíssimo fator de pressão sobre a Guarapiranga. Embora também submetida à Lei de Proteção de Mananciais, na realidade a Billings ainda não é tratada como tal, sofrendo rápido processo de proliferação de assentamentos irregulares que deverão dificultar a manutenção da linha divisória com as intocáveis áreas da bacia da Guarapiranga” (Amauri Pollachi, in “Guarapiranga: Realidade e Futuro” Anais do 17º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. ABES – Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental – vol. 2, tomo IV – grifamos).
Como se vê claramente, é urgente assumir a responsabilidade pela opção social expressa na Lei de Proteção de Mananciais, agindo drasticamente para proteção de seu entorno.
III. DO PEDIDO LIMINAR
A situação relatada no procedimento anexo não pode permanecer como está, posto que implicará na implantação de parcelamento irregular da área, em prejuízo dos próprios invasores, que terão gastos com as edificações precárias e inseguras, correndo riscos de, principalmente no período das chuvas, verem suas casas desabando juntamente com o deslizamento de encostas.
Desrespeitando voluntária e reiteradamente a autoridade administrativa, os requeridos não deixam outra alternativa senão o socorro ao provimento jurisdicional para fazer cessar sua atitude degradadora.
Nesse sentido, presente o fumus boni iuris representado pela legislação de proteção de mananciais acima citada, concretizado pelo conteúdo do laudo técnico de fls. 08/10 e presente o periculum in mora representado pelo risco de contaminação, assoreamento e degradação do Reservatório Billlings, manancial de abastecimento da população da Região Metropolitana de …………………, requer a Vossa Excelência o deferimento de medida liminar inaudita altera pars com a finalidade de determinar à Prefeitura Municipal de …………………, por meio da Administração Regional da Capela do Socorro e ao Grupo Integrado de Fiscalização SOS Mananciais, que desocupem imediatamente a área, promovendo o alojamento provisório das famílias e a remoção de seus pertences para local seguro, bem como procedam a necessária demolição das edificações irregulares implantadas no local.
Requer, ainda em sede de liminar, que os requeridos e demais invasores sejam intimados a não mais proceder invasão da área objeto desta ação, ou qualquer outra situada na região de proteção de mananciais, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$.100,00 (cem reais) por dia de permanência em área invadida.
Requer seja deferido, desde já, o auxílio de força policial a ser prestada pela Polícia Militar Florestal e de Mananciais, para o cumprimento da medida liminar.
A título de exemplo, junta o autor a fls. ……., algumas decisões proferidas em caráter liminar e sentenças de mérito, bem como a legislação estadual de proteção aos mananciais hídricos (fls. ……).
IV. DO PEDIDO PRINCIPAL
Deferida a medida liminar retro requerida, requer a Vossa Excelência a citação dos requeridos na própria área objeto da ação para, querendo, responderem aos termos da presente ação civil pública, sob pena de revelia e presunção de veracidade dos fatos ora alegados, devendo a final ser julgada procedente para o fim de condená-los à completa demolição das edificações por eles erigidas, bem como à recuperação ambiental da área, de acordo com a prova pericial a ser produzida durante a instrução.
Caso a recuperação ambiental da área se mostre total ou parcialmente impossível, requer sua condenação ao pagamento de indenização quanto aos danos irrecuperáveis, a serem quantificados economicamente na prova pericial.
V. DA CITAÇÃO DOS RÉUS NÃO DETERMINADOS
Tratando a presente ação de invasão de área de manancial hídrico, impossível se torna a identificação todos os invasores da área, principalmente pelo fluxo contínuo de pessoas que se instala e deixa a área.
Ademais, é comum nesses casos os invasores recusarem-se a se identificar para a autoridade civil, sem que se possa obrigá-los a tal.
Consoante jurisprudência uniforme, é possível o processamento inicial da ação contra réus não identificados, em caso de invasão, determinando-se simplesmente a área invadida, considerando-se que os mesmos se tornarão certos, no curso da ação, por força da citação (v., p. ex., 1º TACIVIL/SP – 6ª. C. – Ap. cív. 385.451 e RT 600/116).
Nelson Nery Jr., perfilhando idêntico entendimento, ensina que “quando houver invasão de imóvel por várias pessoas, p.ex., muitas vezes não é possível àquele que pretende a proteção possessória, individualizar os ofensores da posse. Deverá, entretanto, dirigir o seu pedido contra esses ofensores, utilizando-se de quaisquer dados que possam determiná-lo. O que é importante salientar é que os réus devem ser determináveis e não expressamente determinados” (in, “Interditos Possessórios”, Revista de Processo 52/170).
No caso dos autos, ao referir aos demais invasores, tratam-se de pessoas perfeitamente identificáveis e o serão por ocasião da citação pessoal.
VI. DOS DEMAIS REQUERIMENTOS
Requer, ainda, a produção de todos os meios de prova permitidos pelo Direito, em especial a prova documental, testemunhal, pericial, vistorias e inspeções, inclusive judiciais, sem prejuízo de outras que se façam necessárias no decorrer da instrução para demonstração da veracidade dos fatos ora alegados.
Para os fins do § 2º, do art. 236, do Código de Processo Civil, esclarece o representante do Ministério Público que deverá ser intimado dos atos processuais na própria Promotoria de Justiça do Meio Ambiente da …………………, situada no Fórum João Mendes Júnior, 16º andar, sala 1.617.
Requer, finalmente, os benefícios do § 2º, do art. 172, do Código de Processo Civil, por ocasião da citação dos requeridos.
Dá-se à presente o valor de R$.10.000,00 (dez mil reais) exclusivamente para fins de alçada.
Termos em que
Pede Deferimento.
[Local], [dia] de [mês] de [ano].
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Promotor de Justiça