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AgRg no AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 806.698 – SP (2006/0185933-9)
R
RELATOR : MINISTRO LUIZ FUX
AGRAVANTE : FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR : MIRIAM A PERES SILVA E OUTRO(S)
AGRAVADO : COMERCIAL DE VEÍCULOS DE NIGRIS
LTDA
ADVOGADO : LUÍS ANTÔNIO MIGLIORI E OUTRO
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO
REGIMENTAL EM DE INSTRUMENTO. RECURSO
ESPECIAL. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO
POR HOMOLOGAÇÃO. REPETIÇÃO DE
INDÉBITO/COMPENSAÇÃO. ARTIGO 3º, DA LEI
COMPLEMENTAR 118/2005. PRESCRIÇÃO. TERMO
INICIAL. PAGAMENTO INDEVIDO. ARTIGO 4º, DA
LC 118/2005. DETERMINAÇÃO DE APLICAÇÃO
RETROATIVA. DECLARAÇÃO DE
INCONSTITUCIONALIDADE. CONTROLE DIFUSO.
CORTE ESPECIAL. RESERVA DE PLENÁRIO. SELIC.
LEI N.º 9.250/95.
1. É cediço, hodiernamente, no STJ que, “com o advento da LC
118/05, a prescrição, do ponto de vista prático, deve ser
contada da seguinte forma: relativamente aos pagamentos
efetuados a partir da sua vigência (que ocorreu em 09.06.05),
o prazo para a repetição do indébito é de cinco a contar da
data do pagamento; e relativamente aos pagamentos
anteriores, a prescrição obedece ao regime previsto no sistema
anterior, limitada, porém, ao prazo máximo de cinco anos a
contar da vigência da lei nova”.
2. Isto porque a Corte Especial declarou a
inconstitucionalidade da expressão “observado, quanto ao art.
3º, o disposto no art. 106, I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro
de 1966 – Código Tributário Nacional”, constante do artigo 4º,
segunda parte, da Lei Complementar 118/2005 (AI nos
ERESP 644736/PE, Relator Ministro Teori Albino
Zavascki, julgado em 06.06.2007).
3. Deveras, a norma inserta no artigo 3º, da lei complementar
em tela, indubitavelmente, cria direito novo, não configurando
lei meramente interpretativa, cuja retroação é permitida,
consoante apregoa doutrina abalizada:
“Denominam-se leis interpretativas as que têm por
objeto determinar, em caso de dúvida, o sentido das leis
existentes, sem introduzir disposições novas. {nota: A questão
da caracterização da lei interpretativa tem sido objeto de não
pequenas divergências, na doutrina. Há a corrente que exige
uma declaração expressa do próprio legislador (ou do órgão
de que emana a norma interpretativa), afirmando ter a lei (ou
a norma jurídica, que não se apresente como lei) caráter
interpretativo. Tal é o entendimento da AFFOLTER (Das
intertemporale Recht, vol. 22, System des deutschen
bürgerlichen Uebergangsrechts, 1903, pág. 185), julgando
necessária uma Auslegungsklausel, ao qual GABBA, que cita,
nesse sentido, decisão de tribunal de Parma, (…) Compreensão
também de VESCOVI (Intorno alla misura dello stipendio
dovuto alle maestre insegnanti nelle scuole elementari
maschili, in Giurisprudenza italiana, 1904, I,I, cols. 1191,
1204) e a que adere DUGUIT, para quem nunca se deve
presumir ter a lei caráter interpretativo – “os tribunais não
podem reconhecer esse caráter a uma disposição legal, senão
nos casos em que o legislador lho atribua expressamente”
(Traité de droit constitutionnel, 3a ed., vol. 2o, 1928, pág. 280).
Com o mesmo ponto de vista, o jurista pátrio PAULO DE
Superior Tribunal de Justiça
DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO
Edição nº 109 Brasília, segunda-feira, 31 de março de 2008
LACERDA concede, entretanto, que seria egero exigir que a
declaração seja inseri da no corpo da própria lei não vendo
motivo para desprezá-la se lançada no preâmbulo, ou feita
noutra lei.
Encarada a questão, do ponto de vista da lei
interpretativa por determinação legal, outra indagação, que se
apresenta, é saber se, manifestada a explícita declaração do
legislador, dando caráter interpretativo, à lei, esta se deve
reputar, por isso, interpretativa, sem possibilidade de análise,
por ver se reúne requisitos intrínsecos, autorizando uma tal
consideração.
(…)
… SAVIGNY coloca a questão nos seus precisos
termos, ensinando: “trata-se unicamente de saber se o
legislador fez, ou quis fazer uma lei interpretativa, e, não, se
na opinião do juiz essa interpretação está conforme com a
verdade” (System des heutigen romischen Rechts, vol. 8o, 1849,
pág. 513). Mas, não é possível dar coerência a coisas, que são
de si incoerentes, não se consegue conciliar o que é
inconciliável. E, desde que a chamada interpretação autêntica
é realmente incompatível com o conceito, com os requisitos da
verdadeira interpretação (v., supra, a nota 55 ao n° 67), não
admira que se procurem torcer as conseqüências inevitáveis,
fatais de tese forçada, evitando-se-lhes os perigos.
Compreende-se, pois, que muitos autores não aceitem o rigor
dos efeitos da imprópria interpretação. Há quem, como
GABBA (Teoria delta retroattività delle leggi, 3a ed., vol. 1o,
1891, pág. 29), que invoca MAILHER DE CHASSAT (Traité
de la rétroactivité des lois, vol. 1o, 1845, págs. 131 e 154),
sendo seguido por LANDUCCI (Trattato storico-teoricopratico
di diritto civile francese ed italiano, versione ampliata
del Corso di diritto civile francese, secondo il metodo dello
Zachariæ, di Aubry e Rau, vol. 1o e único, 1900, pág. 675) e
DEGNI (Linterpretazione della legge, 2a ed., 1909, pág. 101),
entenda que é de distinguir quando uma lei é declarada
interpretativa, mas encerra, ao lado de artigos que apenas
esclarecem, outros introduzido novidade, ou modificando
dispositivos da lei interpretada. PAULO DE LACERDA (loc.
cit.) reconhece ao juiz competência para verificar se a lei é, na
verdade, interpretativa, mas somente quando ela própria
afirme que o é. LANDUCCI (nota 7 à pág. 674 do vol. cit.) é
de prudência manifesta: “Se o legislador declarou
interpretativa uma lei, deve-se, certo, negar tal caráter
somente em casos extremos, quando seja absurdo ligá-la com a
lei interpretada, quando nem mesmo se possa considerar a
mais errada interpretação imaginável. A lei interpretativa,
pois, permanece tal, ainda que errônea, mas, se de modo
insuperável, que suplante a mais aguda conciliação, contrastar
com a lei interpretada, desmente a própria declaração
legislativa.” Ademais, a doutrina do tema é pacífica no sentido
de que: “Pouco importa que o legislador, para cobrir o
atentado ao direito, que comete, dê à sua lei o caráter
interpretativo. É um ato de hipocrisia, que não pode cobrir
uma violação flagrante do direito” (Traité de droit
constitutionnel, 3ª ed., vol. 2º, 1928, págs. 274-275).” (Eduardo
Espínola e Eduardo Espínola Filho, in A Lei de Introdução ao
Código Civil Brasileiro, Vol. I, 3a ed., págs. 294 a 296).
4. Consectariamente, em se tratando de pagamentos indevidos
efetuados antes da entrada em vigor da LC 118/05
(09.06.2005), o prazo prescricional para o contribuinte pleitear
a restituição do indébito, nos casos dos tributos sujeitos a
lançamento por homologação, continua observando a
cognominada tese dos cinco mais cinco, desde que, na data da
vigência da novel lei complementar, sobejem, no máximo,
cinco anos da contagem do lapso temporal (regra que se
coaduna com o disposto no artigo 2.028, do Código Civil de
2002, segundo o qual: “Serão os da lei anterior os prazos,
quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua
entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do
tempo estabelecido na lei revogada.”).
5. Por outro lado, ocorrido o pagamento antecipado do tributo
após a vigência da aludida norma jurídica, o dies a quo do
prazo prescricional para a repetição/compensação é a data do
recolhimento indevido.
6. In casu, a recorrida ajuizou a presente ordinária em
10.11.2005 (muito antes da entrada em vigor da novel lei
complementar), pretendendo o reconhecimento de seu direito à
compensação de valores indevidamente recolhidos a título de
FINSOCIAL, o que, nos termos dos artigos 168, I, e 150, § 4º,
do CTN, revela inequívoca a inocorrência da prescrição dos
valores recolhidos indevidamente a partir de 10.11.1985,
porquanto tributo sujeito a lançamento por homologação, cuja
prescrição opera-se 5 (cinco) anos após expirado o prazo para
aquela atividade.
7. Na compensação ou restituição de indébito tributário,
consoante jurisprudência do E. STJ, os expurgos inflacionários
devem ser aplicados, utilizando-se: a) no período de março de
1990 a fevereiro de 1991, o IPC; b) a partir de março de 1991,
vigora o INPC, a ser adotado até dezembro de 1991; e c) a
partir de janeiro de 1992, a UFIR, na forma preconizada pela
Lei nº 8.383/91, até 31.12.1995, com o advento da Lei nº
9.250/95, época em que o índice foi substituído pela ta
SELIC, que compreende ta de juros reais e ta de
inflação a ser considerada a partir de 1º de janeiro de 1996,
inacumulável com qualquer outro índice de correção
monetária ou com juros de mora. (Precedentes: ERESP
478.359/SP, Corte Especial, DJ de 13.9.2004; EREsp
548.711/PE, DJ de 25/04/2007; EREsp 640.159/PE, DJ de
13.11.2006; REsp 879.747/SP, DJ de 1º.3.2007; REsp
608.556/PE, DJ de 06/02/2007 ).
8. Agravo Regimental a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA
TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e
das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo
regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Teori
Albino Zavascki, José Delgado (Presidente) e Francisco Falcão votaram com o
Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Denise Arruda.
Brasília (DF), 19 de fevereiro de 2008(Data do Julgamento)
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