Apelação Cível. Ação Indenizatória. Acidente de trânsito com morte. Responsabilidade civil. Culpa do empregado. Responsabilidade do empregador. Ação de rito sumário. Preliminar de falta de comprovação de poderes. Preliminar de cerceamento de defesa. Absolvição do motorista atropelador no processo criminal. Danos morais. Valor da indenização.
Fernando Machado da Silva Lima*
EGRÉGIA XXXXXXXX CÂMARA CÍVEL ISOLADA
PROCESSO : N° XXXXXXXXXX
APELAÇÃO CÍVEL
APELANTE: XXXXXXXXXXXXX LTDA.
APELADA: XXXXXXXXXXX
RELATORA : EXMA. DESA. XXXXXXXXXX
PROCURADORA DE JUSTIÇA : XXXXXXXXX
Ilustre Desembargadora Relatora :
Trata o presente do recurso de Apelação, nos Autos da Ação Indenizatória, ajuizada por XXXXXXXXXX, contra XXXXXXXXXX Ltda.
Em síntese, os Autos informam que :
Em sua Exordial, de fls.
Depoimentos, às fls. 29 – 32.
A Ré apresentou Contestação, às fls. 33 – 37. Disse que não houve culpa do agente, nem responsabilidade civil pelos danos decorrentes do acidente. Transcreveu doutrina a respeito de caso fortuito e força maior. Alegou que ocorreu uma espécie de quase suicídio, porque a vítima foi jogada para baixo da carreta por haver batido com o pedal no meio-fio. Disse que o valor pleiteado pela Autora é absurdo e ilegítimo. Citou jurisprudência a respeito.
Às fls. 61 – 66, requerimento da Autora, no sentido de que fosse decidida a causa, tendo em vista que, apesar de se tratar de processo regido pelo rito sumaríssimo, já se haviam passado quatro anos. Falou sobre a comprovação do ato ilícito e sobre a responsabilidade da Ré. Falou sobre a desnecessidade da realização de audiência. Falou sobre o valor da indenização. Citou a Súmula 491 do STF.
Três anos depois, o processo foi remetido à conta.
A Mma. Juíza de Direito da Xª Vara Cível da Capital decidiu, às fls. 76 – 79. Relatou o processo. Disse que ficou evidente, para o motorista atropelador, a situação de risco em que se encontrava a vítima, e que este deveria ter reduzido a velocidade, ou até parado o seu veículo, agindo com prudência, evitando a queda e o esmagamento da criança. Disse que o patrão do motorista tem o dever de reparar os danos, com base no art. 1.521, III, do Código Civil, porque está caracterizada a culpa do seu empregado, por imprudência, na forma do art. 159 do Código Civil. Disse que, se a vítima teve o seu futuro interrompido, deve a Autora receber o equivalente ao pagamento de um salário mínimo durante o período de vida útil da criança. Condenou a XXXXXX, ora Apelante, a pagar à Autora o correspondente a um salário mínimo mensal até a data em que a vítima completaria 65 anos de vida, a começar da data do evento danoso.
A Ré apelou (fls. 84 – 99). Alegou cerceamento de defesa, porque entendeu que a Mma. Juíza determinou, de forma açodada e ilegal, o encerramento da instrução processual, dispensando a inquirição das testemunhas, tempestivamente arroladas pelas partes. Citou jurisprudência. No mérito, alegou a ocorrência de caso fortuito e força maior, afastando qualquer hipótese de indenização civil por danos. Disse que o acidente ocorreu por negligência, imprudência e imperícia da própria tia da vítima. Disse que o motorista atropelador foi absolvido, no processo criminal. Discutiu a questão do valor da indenização. Transcreveu jurisprudência.
A Apelada apresentou Contra-Razões (fls. 107 – 120). Alegou, preliminarmente, que a empresa apelante não comprovou a regularidade do mandato conferido ao seu patrono. Transcreveu doutrina e jurisprudência a respeito. Falou, a seguir, sobre a inexistência do alegado cerceamento de defesa. Disse que a principal testemunha da Ré foi ouvida em juízo e que a outra era meramente procrastinatória. Disse que os testemunhos ouvidos na Unidade Policial do Guamá não foram impugnados pela Ré, em sua Contestação. Disse que a Mma. Juíza agiu corretamente, julgando antecipadamente a lide, porque já existiam, nos Autos, provas suficientes para formar o seu convencimento, nos termos dos arts. 131, 334, II e 335 do CPC. Transcreveu jurisprudência. No mérito, disse que o próprio motorista da Ré expressamente reconheceu ter sido ele, em razão de sua imprudência, o causador do acidente que ceifou a vida da menor Valéria e que assim cai por terra a tese da Ré pertinente à ocorrência de caso fortuito e força maior. Transcreveu trecho do depoimento. Citou a legislação de trânsito. Disse que a adolescente Regiane, que dirigia a bicicleta, não teve qualquer culpa no acidente. A respeito da absolvição do motorista no juízo criminal, disse que é irrelevante, no que tange à responsabilidade civil. Citou doutrina a respeito. Sobre a indenização, citou doutrina e jurisprudência, para comprovar a correção da Decisão ora apelada.
Distribuídos os Autos, vieram a esta Procuradoria de Justiça, para exame e parecer, 8 (oito) anos depois do ajuizamento da Inicial da Ação Indenizatória de Danos Pessoais causados em acidente de veículo (procedimento sumário – CPC, art. 275, II, ‘e’).
É o Relatório. Esta Procuradoria passa a opinar.
1. Primeira preliminar.
Quanto à preliminar pertinente à falta de comprovação dos poderes concedidos ao patrono da Ré, levantada nas Contra-Razões da Apelada, esta Procuradoria de Justiça entende que não deve prosperar, porque consta, na Certidão de fls. 26, referente ao cumprimento do Mandado de Citação da Empresa Ré, que a citação foi feita na pessoa de seu representante legal, Sr. Francisco Machado de Andrade (Vice-Presidente). Também às fls. 27, observa-se que o referido senhor compareceu à Audiência, presidida pela Mma. Juíza Dra. XXXXXX, para a oitiva das testemunhas e do motorista atropelador, representando a Ré – XXXXXXXX Ltda., e fazendo-se acompanhar de seu advogado, o Dr. XXXXXXXXX.
Além disso, se aceita a preliminar, a conseqüência seria a decretação da revelia da empresa Ré, oito anos depois do início deste processo, originariamente de rito sumaríssimo. No entanto, a empresa em questão não foi intimada pela Mma. Juíza, para sanar o defeito processual apontado, pertinente à regularização da representação, o que impede agora que a Ré possa ser reputada revel.
Na abalizada opinião de Arruda Alvim (Código de Processo Civil Comentado, II, p. 105),
“se faltar capacidade processual ao réu e não for intimado quem de direito para sanar o defeito, não se operam os efeitos da revelia”.
A jurisprudência transcrita às fls. 110, nas Contra-Razões da Apelada, não se aplica à hipótese vertente. Verifica-se, realmente, que a comprovação deve ser feita com a inicial, porque é acessória da procuração outorgada aos advogados da causa. Mas a mesma decisão estabelece, ainda, que “constatada a irreparabilidade e não sendo sanado o defeito em prazo razoável, decretará o juiz a nulidade do processo e a extinção do feito, sem apreciação do mérito (CPC, art. 13 e 267, IV).” Tratava-se, evidentemente, na apelação então examinada, da falta de comprovação dos poderes do Autor, e não do Réu, e essa comprovação não deve ter sido feita pelo Autor, embora intimado, nos termos do art. 13 do CPC. Como o despacho não foi cumprido dentro do prazo, o juiz decretou a nulidade do processo e a extinção do feito. Conseqüentemente, a apelação não foi conhecida.
2. Segunda preliminar.
Quanto à preliminar levantada pela Ré, pertinente ao cerceamento de defesa, esta Procuradoria entende que também não deve prosperar. Afinal, apenas uma testemunha da Ré não foi ouvida. Não houve, absolutamente, decisão açodada e ilegal da Mma. Juíza, ao determinar o encerramento da instrução processual, conforme alega a Apelante, às fls. 88, porque o próprio motorista da Ré, através do depoimento prestado, confessou, na prática, ter sido o causador do acidente que deu origem à presente lide. Nada mais seria necessário, para que a Mma. Juíza firmasse o seu convencimento, e decidisse a questão.
Na realidade, deve ser aqui ressaltado o fato de que a presente Ação, nos termos do art. 275, II, ‘d’, do CPC, deveria ser instruída através do Rito Sumaríssimo, hoje Sumário, de forma que a Mma. Juíza poderia até mesmo, nos termos do atual art. 281 do CPC, proferir sentença na própria audiência, ou no prazo de dez dias. Além disso, todas as provas constantes dos Autos confirmam o acerto da Decisão ora apelada, e esta Procuradoria entende que tem toda a procedência a alegação do Patrono da Apelada, no sentido de que os testemunhos ouvidos na Unidade Policial do Guamá corroboram a Sentença, especialmente porque não foram impugnados pela Ré, em sua Contestação. Já existiam, portanto, nos Autos, provas suficientes para que a Mma. Juíza sentenciasse, sem que houvesse ainda necessidade de quaisquer outros expedientes, meramente protelatórios, ainda mais prejudiciais à Autora, que já está litigando com a empresa Ré há oito anos, apesar de não dispor das riquezas materiais necessárias para tanto. A jurisprudência que a Apelada transcreveu, às fls. 112 – 113, é perfeitamente elucidativa do entendimento jurisprudencial a respeito do tema.
3. Processo cível e processo criminal.
Também não podem prosperar as alegações da Ré, referentes à absolvição do motorista atropelador no processo criminal, conforme o documento anexado às fls. 100. É verdade que a independência das esferas cíveis e criminais, consagrada em nosso Direito, impõe certa mitigação, porque de acordo com o art. 1.525 do Código Civil Brasileiro, “a responsabilidade civil é independente da criminal; não se poderá, porém, questionar mais sobre a existência do fato, ou de quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no crime.”
Não foi isso, porém, o que ocorreu na hipótese vertente, porque a absolvição na esfera criminal, em primeira instância, decorreu da falta de comprovação da culpa, segundo o entendimento da Ilustre Magistrada, Dra. Inácia Frias. Aliás, esta Procuradoria guarda reservas, data venia, a respeito desse Decisum, porque entende que, ao menos nos presentes Autos Cíveis, ficou sobejamente comprovada a culpa, e até mesmo o dolo, na medida em parece ter sido conscientemente assumido, pelo motorista, a julgar pelas suas próprias declarações, o risco de obter o fatídico resultado. A questão será examinada posteriormente.
De qualquer maneira, mesmo em face da decisão favorável na esfera criminal, isso em nada pode influir na decisão cível, porque é de comum sabença que, da prática do ato ilícito, exsurgem duas pretensões, uma de natureza penal, e outra de natureza indenizatória, que leva à propositura da ação civil. Conseqüentemente, as duas ações são completamente independentes entre si, de modo que o processamento da ação criminal, ajuizada perante a jurisdição penal, não obsta o ajuizamento e o andamento da ação indenizatória proveniente do mesmo fato.
Pode ser, portanto, prolatada sentença absolutória em favor do réu na instância criminal, e ainda assim, essa decisão não afetará o direito da vítima, pois mesmo que o ato não seja considerado ilícito penal, ou haja insuficiência de provas para a determinação da autoria, pode ser que ele constitua um ilícito civil, e os interessados poderão recorrer ou permanecer na esfera cível, e poderão produzir novas provas para alcançarem o ressarcimento do dano sofrido pela ação danosa, independentemente do resultado alcançado na sentença penal.
Aliás, essa interpretação ressalta evidente pela simples existência das duas ações, a cível e a penal, porque se a decisão de uma delas fosse determinante em relação à outra, não haveria qualquer razão para que fossem separadas.
Também não se pode cogitar de sobrestamento da ação civil quando pendente a ação penal, uma vez que sendo independentes, de uma não decorre o resultado da outra. Este é o sistema adotado pela processualística penal, acompanhado por inúmeros julgados, entre os quais destacamos:
“Ação de reparação de dano causado em acidente de veículos não se suspende até que seja decidida a ação criminal em decorrência do mesmo acidente, instaurada contra um dos réus, se no crime não está sendo questionada a existência do fato ou quem seja o seu autor. Nos termos do art. 66 do CPP e 1525 do CC, somente essas circunstâncias decididas no juízo criminal não ensejariam requestionamento no juízo cível. A responsabilidade civil é independente da criminal, e a reparação de danos materiais pode existir mesmo sendo o réu absolvido na ação criminal que visa a punir homicídio ou lesão corporais culposos ou dolosos” (RT 505/233 – Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial – Rui Stoco – p. 90). (os grifos são nossos)
“A existência de processo crime contra o responsável pelo dano não justifica a suspensão da ação civil” (1º TACSP – 6ª C. – Ap., Rel. Villa da Costa – RT 553/154. Op. Cit. – p. 91)
“não se constituindo a sentença absolutória no crime obstáculo para a propositura da ação civil (art. 67, inciso III, do CPP), com muito mais razão não se justifica a suspensão desta em decorrência de estar a ação penal pendente de julgamento, uma vez que a responsabilidade civil é independente da criminal” (1º TA Civil SP – 3ª C. AI – Rel. Juiz Luciano Leite – J. 12.9.84 – RT 590/147 – Op. Cit. – op. 91).
“nada impede que a ação civil de indenização seja intentada antes do desfecho do processo criminal” (RT 462/83) – Op. Cit. – 90)
“não há obrigação do juiz suspender ação civil de indenização por agressão, até o julgamento da ação penal”. (RT 464/104 – Op. Cit. – 90)
4. Culpa do motorista da Empresa- Ré.
Finalmente, deve ser dito que ficou perfeitamente comprovada, nos Autos, a culpa do empregado da Empresa/Ré, no evento danoso. Pelo exame dos Autos, esta Procuradoria não tem qualquer dúvida a respeito da culpa do motorista da Ré, porque se ele dirigisse com a devida cautela, respeitando as normas legais pertinentes, especialmente ao se aproximar de uma ciclista, no caso em exame, a adolescente Regiane, que levava na garupa uma criança de cinco anos, Valéria, o fato não teria ocorrido.
É também completamente absurda a alegação de que teria havido culpa (negligência, imprudência e imperícia, segundo o patrono da Apelante – fls. 95) da tia da vítima, a adolescente Regiane, pelo fato de que o pedal da bicicleta teria batido no meio-fio. Essa alegação serve, na realidade, para fortalecer ainda mais a convicção desta Procuradoria de que o motorista da carreta, de maneira irresponsável, aproximou demasiadamente o seu pesado veículo da frágil bicicleta que trafegava à sua frente. Qual teria sido, então, a culpa da adolescente Regiane, que pedalava a bicicleta, se ela estava no limite da pista, ao ponto de ter batido o pedal no meio-fio? Será que ela pretendia realmente se suicidar, como foi irresponsavelmente alegado nos autos?
A única dúvida que ficou, para esta Procuradoria de Justiça, é a pertinente a uma possível caracterização de dolo, porque se o motorista conscientemente aproximou a sua carreta do pequeno veículo, conforme consta do depoimento de fls. 31- 32, para ‘mexer’ com a jovem de dezesseis anos de idade que pedalava a bicicleta, levando na garupa a criança que foi vitimada, assumiu com certeza o risco de causar o acidente fatal. Ficou evidente que a bicicleta não estava trafegando no meio da pista. Ao contrário, consta dos depoimentos, e está mesmo citado pelo próprio patrono da Ré, em sua Contestação, e também na Apelação, que o pedal da bicicleta bateu no meio-fio, o que comprova que a carreta se aproximou demasiadamente da bicicleta, de maneira imprudente, ou até mesmo dolosa.
Aliás, o próprio motorista atropelador declarou, em seu depoimento, que avistou, ao longe, a bicicleta dirigida por uma moça, com uma criança na garupa, e que comentou, com o rapaz que viajava, ao seu lado, de carona, “que era um perigo uma pessoa andar daquele jeito, numa rua estreita, porque poderia até cair”, o que comprova, inteiramente, a sua irresponsabilidade, e o descumprimento das mais elementares regras do trânsito. Afinal, ele vislumbrou o perigo, mas nada fez para evitá-lo.
Não menos absurdas são as alegações da Ré, na tentativa de configurar a existência de caso fortuito e força maior, para provar sua irresponsabilidade e a ausência de culpa de seu motorista. Segundo Lacerda de Almeida, citado pela própria Ré, às fls. 93, caso fortuito é um sucesso previsto, mas fatal, como a morte, a doença, etc. Evidentemente, essa lição não se aplica ao atropelamento daquela criança, porque se a morte é um acontecimento fatal, a daquela criança, especificamente, não resultou, absolutamente, de um caso fortuito, mas de um acidente cuja concretização contou com a total irresponsabilidade e com a decisiva colaboração do motorista da Ré.
Ainda segundo o mesmo autor, citado pela Ré, a força maior é um acontecimento insólito, de impossível ou dificílima previsão, tal como uma grande seca, uma inundação, etc.
Como afirmar, no entanto, seriamente, que o motorista da Ré não poderia prever o resultado dos seus atos, se ele próprio declarou, em seu depoimento, conforme acabamos de transcrever, que achava um perigo que a ciclista trafegasse naquela pista, na frente do seu veículo? Onde, portanto, o caso fortuito? Onde a força maior?
Não resta dúvida, portanto, de que deve ser aplicada, à hipótese vertente, a regra do art. 159 do Código Civil, verbis:
“art. 159- Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.”
5. Responsabilidade da Apelante.
Sobejamente caracterizada, assim, a culpabilidade do motorista da Ré, deve ser dito, finalmente, que é orientação pacífica, na jurisprudência, o reconhecimento da responsabilidade do proprietário do veículo pelos danos que este causar a terceiros, senão vejamos:
“provada a responsabilidade do condutor, e a circunstância de o veículo estar em circulação por vontade ou consentimento do seu proprietário, fica este necessária e solidariamente responsável, pelos danos causados, como criador do risco para seus semelhantes”. (RTJ 58/905)
“o proprietário é responsável pelo pagamento dos danos causados em acidente de trânsito por seu automóvel dirigido por preposto ou por pessoa de sua confiança que tem acesso ao veículo” (JTARS 16/448)
In casu, além da responsabilidade direta do causador do dano, houve também a responsabilidade indireta onde o empregador, incluindo aqui a empresa, responde pelo fato de outrem, no caso presente o preposto da Apelante. O art. 1521 do Código Civil se incumbe de indicar tais responsáveis. Portanto, a Apelante é perfeitamente legitimada para estar no pólo passivo desta demanda, e deve arcar com os ônus pertinentes ao cumprimento da Decisão ora apelada.
Dadas as circunstâncias, e todo o conjunto probatório constante dos Autos, não pode mais ser admitida, portanto, qualquer discussão a respeito de uma alegada culpa concorrente, ou exclusiva, da vítima, ou de sua tia, que pedalava a bicicleta, porque conforme já afirmamos, ficou perfeitamente comprovada a exclusiva culpabilidade do motorista da Empresa-Ré.
6. O valor da indenização.
Assim, reconhecida a existência do direito da Autora à indenização pela morte da menor, nenhum reparo pode ser feito à r. Sentença ora Apelada. Ademais, não podem ser olvidados os danos morais sofridos pela mãe, em face da morte súbita e violenta de uma filha em tenra idade (5 anos). É evidente que nenhum valor material compensaria tamanha dor. Todavia, nestes casos, a jurisprudência entende que o quantum indenizatório abrangerá o dano causado pela privação da vida do filho. Nesta qualidade, os parentes próximos, no caso a mãe, têm direito a uma reparação pecuniária em razão do que o direito denomina de dano moral, como forma de atenuar, pelo menos em parte, as conseqüências da irreparável perda sofrida.
Quanto ao tema da indenização devida pela morte da criança, a MMa. Julgadora trouxe à baila a súmula 491 do STF, que garante aos pais o direito à indenização pela morte de filho menor.
Diz a súmula nº 491 do STF, in verbis :
É indenizável o acidente que cause a morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado.”
Apesar de todas as discussões e divergências doutrinárias acerca do limite temporal para o pensionamento, em casos de morte de filho menor, este Órgão Ministerial entende ser perfeitamente possível a indenização por prejuízo material em decorrência da morte de filho menor que ainda não exerça qualquer atividade remuneratória, porque mesmo em se tratando de família humilde, há sempre uma expectativa dos pais em poderem contar com a contribuição de seus filhos para o aumento da renda familiar, e a pensão nesses casos deve ser fixada até o limite de sobrevida da vítima, que no nosso sistema costuma ser estabelecido nos 65 anos de idade. Não há nenhum exagero, no valor determinado para a indenização, pela Sentença ora recorrida, que tomou como base para o cálculo o valor do salário mínimo. Afinal, aquela criança, embora de família humilde, poderia perfeitamente estudar e chegar a ser, até mesmo, uma Desembargadora.
O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial 1999 – SP, em que foi relator o Ministro Athos Carneiro, firmou o seguinte entendimento, amparando-se na jurisprudência do STF:
“a obrigação do filho , em ajudar os pais que de ajuda possam necessitar não encontra limite temporal. Tempo provável de vida da vítima 65 anos”
Em outro julgado, a Colenda Corte de Justiça confirma o mesmo entendimento:
“Ementa: Direito Civil. Responsabilidade Civil. Menor de dezesseis (16) anos, vítima fatal de atropelamento. Danos material e moral.
I – (…)
II – (…)
III – Após inicial divergência, veio a consolidar na turma o entendimento no sentido de considerar a presumida sobrevida da vítima como termo final do pagamento da pensão, tomando-se por base a idade provável de sessenta e cinco (65) anos, haja vista não se poder presumir que a vítima, aos vinte e cinco (25) anos, deixaria de ajudar seus familiares, prestando-lhes alimentos (STJ – RE – Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira – JUIS – 16)
O STF, através do Relator, Min. Néri da Silveira, 1ª turma (RTJ 123/1065), ao apreciar demanda em que era beneficiário o pai de vítima menor de 18 anos, manifestou-se da seguinte forma:
“Responsabilidade civil. Ato ilícito. Morte da vítima. Pensão àqueles a quem a vítima devia alimentos. Filho menor. Duração provável da vida da vítima. Idade de 65 anos. Não é possível presumir que, aos 25 anos de idade a vítima não mais auxiliaria seu pai, prestando-lhe alimentos. CPC, art. 602 e seus §§, c/c art. 1.537. Conhecimento e provimento de recurso extraordinário, para restabelecer a sentença, condenando a empresa-ré a pagar pensão ao autor, até a data em que a vítima completaria 65 anos de idade.”
Assim, nos termos da legislação processual e da jurisprudência predominante, impõe-se a manutenção da r. Sentença, também no pertinente ao quantum indenizatório, e ao limite temporal do pensionamento, desde a data do óbito, até aquela em que a vítima completaria 65 anos de vida.
Por conseguinte, meritoriamente estão corretas as conclusões do r. Decisum monocrático, que merecem subsistir integralmente.
Ex positis, considerando o exame de todos os elementos do Presente, esta Procuradoria de Justiça se manifesta pelo conhecimento, e no mérito, pela improcedência do pedido da Apelante, para que seja integralmente mantido o r. Decisum, por seus próprios e jurídicos fundamentos.
É O PARECER.
Belém, fevereiro de 2.001.
* Professor de Direito Constitucional da Unama
Home page: www.profpito.com
Compare preços de Dicionários Jurídicos, Manuais de Direito e Livros de Direito.