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O Enquadramento Societário das Corretoras de Seguros

O Enquadramento Societário das Corretoras de Seguros

 

 

Luiz Cezar Quintans*

 

 

A CONSULTA

 

Pergunta: A Consulente questiona se as corretoras de seguro são consideradas sociedades empresárias ou, por se tratar de “atividade técnica”, deve ser considerada sociedade simples.

 

O legislador brasileiro, com a edição do Novo Código Civil (Lei n. 10.406/2002), dividiu as sociedades em duas categorias distintas. As não personificadas e as personificadas. As não personificadas não possuem registro. Podemos citar como exemplo as sociedades em conta de participação e as sociedades de fato. O registro da sociedade faz com que ela adquira sua personalidade jurídica. Por isso, considera-se uma sociedade personificada justamente quando ela registra os seus atos constitutivos no competente registro. O legislador definiu que as sociedades personificadas seriam de duas espécies. As sociedades simples, que são registradas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas – RCPJ; e as sociedades empresárias, que são registradas nas Juntas Comerciais.

 

O tema central de nossa consulta está na análise do artigo 966, do novo ordenamento que menciona:

 

“Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.

 

Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.”

 

A avaliação das sociedades dar-se-á através da análise das próprias sociedades, onde os sócios irão perguntar a eles próprios:

 

Primeiro: Se exercem profissionalmente atividade econômica para a produção ou a circulação de bens ou de serviço?

 

Segundo: Se a sociedade está organizada para esse fim?

 

Terceiro: Se praticam profissionalmente atividade intelectual, de natureza científica, literária ou artística?

 

O novo código em nenhum momento definiu o que seja uma atividade econômica organizada. Apenas adotou esse critério como uma forma de diferenciar a sociedade simples da sociedade empresária.

 

A sociedade simples não tem definição precisa na legislação. Para conhecermos conceitualmente o que seja uma sociedade simples temos também que conhecer o conceito de sociedade empresária. Assim, como vimos no artigo 966 acima citado, o legislador estabeleceu que “considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”.

 

Então, podemos concluir que a sociedade simples é aquela que não está organizada profissionalmente para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. Dentro da conceituação do empresário é que se supõe que a sociedade simples é simples, ela não é muito organizada, sua organização é pessoal, quase artesanal.

 

Por outro lado, enquadram-se (legalmente) como sociedade simples as sociedades de pessoas que exercem profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda que com o concurso de auxiliares ou colaboradores. Essa exclusão ao conceito de empresário está no parágrafo único do artigo 966.

 

Assim, quem trabalha quase que artesanalmente, com a ajuda de uma ou de algumas pessoas pode ser enquadrado no conceito de sociedade simples. Citando como exemplos sociedades de médicos, de advogados, de produtores culturais, de autores de novelas, de cientistas, etc. A exceção a essa regra está na hipótese de pessoas que se organizam e, no exercício da profissão, constituem elemento de empresa (atividade profissional organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços).

 

Exemplo que pode ser citado é o de hospitais, que grupos de médicos resolvem estabelecer. Hospitais são totalmente diferentes de pequenas clínicas e de trabalhos pessoais, quase artesanais, dos próprios médicos e seus assistentes e auxiliares. Um hospital requer uma organização muito grande e certamente produz muitos serviços à comunidade, constituindo elemento de empresa.

 

Existem autores e palestrantes que estão se posicionando de forma a aceitarem, inclusive, pequenos comércios como sociedades simples. Os cartórios de registro civil da pessoa jurídica, local onde se registram as sociedades simples, também estão aceitando, sem a menor cerimônia, o registro de pequenos comerciantes e prestadores de serviços naquele órgão. O grande argumento para a aceitação é “a autonomia da vontade das partes” e complementarmente, entendem que em sendo profissional a sociedade, mas, pouco organizada, é possível a manutenção do registro no RCPJ, ainda que ocorra produção e circulação de bens ou de serviços.

 

Por prevenção, não se deve entrar muito nessa discussão, principalmente, porque o assunto é muito novo. Mas, acredito que se uma sociedade praticar a produção e/ou a circulação de bens e/ou serviços, ficará muito difícil não lhe caracterizar como empresária, a menos que ela esteja na hipótese de exclusão.

 

Ressalte-se que, o ponto mais importante, o cerne, dessa questão é a responsabilidade dos sócios nessas espécies de sociedade. Enquanto nas sociedades simples a responsabilidade do administrador é solidária e ilimitada; e a de seus sócios pode ser solidária, se ele for administrador, nas sociedades empresárias, em geral sociedades limitadas, os sócios possuirão responsabilidade restrita ao valor das suas quotas.

 

É bom que se diga, ainda, que se a sociedade simples é quase artesanal por ser gerida e trabalhada pelo próprio sócio, dono da entidade, normalmente o sócio é o administrador. Aliás, se essa sociedade tiver administradores ela já poderá ser caracterizada como organizada e sendo organizada e produzindo bens e/ou serviços, poderá ser considerada como empresária.

 

Depois dessa visão geral entre sociedades simples e sociedades empresárias temos, ainda, que dissecar o parágrafo único do artigo 966, que para fins de hermenêutica tem uma regra explicativa e ao mesmo tempo uma regra de exceção. O referido parágrafo explica, complementarmente ao seu caput que, quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda que com o concurso de auxiliares ou colaboradores, não será considerado empresário. Por seu turno, o final do citado parágrafo estabelece uma exceção. Se o exercício da profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística constituir elemento de empresa, ou seja, atividade econômica profissional organizada para a produção ou circulação de bens e serviços, então, essa sociedade estará se caracterizando como uma sociedade empresária, como é o caso do exemplo do hospital, acima citado.

 

Temos que ter em mente que “atividade técnica” não está descrita na explicação do parágrafo único do artigo 966. No mesmo sentido, por mais que as corretoras de seguros tenham atividades intelectuais, técnicas e científicas, o simples fato do exercício dessas atividades, reunido com atividades de circulação de bens e de serviços, notadamente, a prestação de serviços aos segurados, não implica na caracterização de “atividade técnica” ou “atividade intelectual” ou “atividade científica”. A função precípua das corretoras de seguros é a prestação de serviços de corretagem.

 

Assim, atendendo ao consultado, somos de parecer que as corretoras de seguros, por praticarem atividade econômica profissional organizada para a produção e/ou a circulação de serviços e/ou de bens, se enquadram como sociedades empresárias e, portanto, devem escolher um dos tipos societários disponíveis nos artigos 1039 a 1088 do NCC. Não existe opção para ser uma sociedade simples. É obrigatória a “manutenção” ou adequação à espécie “sociedade empresária”, por pura interpretação do referido artigo 966 e seu parágrafo único. Em regra, as atuais sociedades corretoras são sociedades civis, limitadas. Assim considerando, somos de parecer que devem alterar seus contratos sociais, atualizando-os pelo novo ordenamento, levando o registro da “sociedade civil” para a Junta Comercial, mantendo-se como uma sociedade empresária, preferencialmente, limitada. No mesmo diapasão, se algumas dessas sociedades corretoras já eram caracterizadas como sociedades comerciais, assim devem permanecer.

 

A principal pena para quem não observar esta regra legal é, em sendo sociedade simples, ver o seu patrimônio pessoal ser confundido com o patrimônio da corretora. Afinal, nas sociedades simples, a responsabilidade do administrador (em geral o sócio) é ilimitada e a responsabilidade do sócio é solidária.

 

A questão é de adequação à legislação. Mas mesmo que haja uma pequena abertura para o contrato de sociedade, as partes devem avaliar o risco da responsabilidade solidária e ilimitada, que alcança o patrimônio do sócio, no caso das sociedades simples; e avaliar, por outro lado o excesso de obrigações sociais, como fazer assembléias, escriturar livros de atas e etc., como é o caso das sociedades empresárias limitadas.

 

Esse é o nosso parecer S.M.J.

 

 

* Advogado

 

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Como citar e referenciar este artigo:
QUINTANS, Luiz Cezar. O Enquadramento Societário das Corretoras de Seguros. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/estudodecaso/empresarial-estudodecaso/o-enquadramento-societario-das-corretoras-de-seguros/ Acesso em: 22 nov. 2024