Administrativo

Reexame de Sentença. Mandado de Segurança. Duodécimo. Falta de repasse dos valores devidos. Separação dos Poderes. Autonomia financeira.

Reexame de Sentença. Mandado de Segurança. Duodécimo. Falta de repasse dos valores devidos. Separação dos Poderes. Autonomia financeira.

 

 

Fernando Machado da Silva Lima*

 

 

 

EGRÉGIA XXXXXX  CÂMARA CÍVEL ISOLADA

 

                   PROCESSO :                   XXXXXXXX

 

RECURSO:                   REEXAME DE SENTENÇA           

 

SENTENCIANTE: JUÍZO DE DIREITO DA COMARCA DE CAPITÃO POÇO

 

SENTENCIADO: CÂMARA MUNICIPAL DE CAPITÃO POÇO     

 

SENTENCIADO: PREFEITURA MUNICIPAL DE CAPITÃO POÇO

 

                   RELATORA:                   EXMA.  DESA.  XXXXXXXXXX

 

PROCURADORA DE JUSTIÇA: XXXXXXXXXXX

 

 

Ilustre Desembargadora  Relatora:

 

 

 

Trata o presente de Reexame de Sentença, nos Autos do Mandado de Segurança impetrado pela Câmara Municipal de Capitão Poço, contra ato do Exmo. Sr. XXXXXXXXX, Prefeito do mesmo Município.

 

 

Em síntese, os autos informam que:

 

 1.        Em sua Exordial, de fls. 2 a 12, a Câmara Municipal de Capitão Poço aponta o Exmo. Sr. Prefeito Municipal como autoridade coatora, pelo fato de se recusar a cumprir a Lei Orçamentária Municipal, e fazer o repasse da dotação orçamentária que lhe é devida. Alega que a Câmara Municipal, em decorrência disso, vem encontrando dificuldades até mesmo para manter seus serviços elementares. Alega que encaminhou vários Ofícios à autoridade apontada como coatora, solicitando o repasse do duodécimo, dentro dos valores fixados pela Lei Orçamentária, e que nenhum deles foi respondido. Alega que tal atitude constitui retaliação contra a Câmara, porque o Prefeito não conseguiu impor sua vontade na escolha dos membros da Mesa Diretora da Câmara Municipal. Junta doutrina. Junta jurisprudência. Pede a concessão de liminar. Junta documentos (fls. 13 a 42)

 

2.        Às fls. 43 e 44, a Impetrante apresenta um aditamento ao pedido inicial, para pedir o bloqueio da importância de R$20.800,00 (vinte mil e oitocentos reais), correspondente ao repasse a menor feito pelo Executivo.

 

3.        Às fls. 46, o MM. Juiz deferiu em parte o pedido de liminar, porque determinou a indisponibilidade do valor bloqueado, até a decisão final. A autoridade coatora, notificada, não prestou informações.

 

4.        Às fls. 50 e 51, a Impetrante solicita a liberação dos recursos bloqueados do FPM e que estão à disposição do Juízo. Junta documentos (fls. 52 a 54).

 

5.        Às fls. 55-57, comunicação de suspensão da Liminar pelo Exmo. Sr. Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Pará. Em anexo, cópia da inicial (fls. 58-63).

 

6.        O Órgão Ministerial manifestou-se, às fls. 65-73. Relatou o Processo. Disse que a Câmara Municipal tem legitimidade para impetrar o remédio constitucional do Mandado de Segurança. Citou doutrina a respeito do Writ. Disse que o direito líquido e certo da Impetrante não incide sobre a receita estimada, mas sobre aquela efetivamente arrecadada, da qual o Impetrado deve repassar 1/12 (um doze avos). Disse que, com referência aos valores não repassados anteriormente à impetração, a Impetrante deverá recorrer às vias ordinárias.

 

7.        O MM. Juiz XXXXXXXXX decidiu (fls. 75-77). Relatou o processo. Disse que a Câmara Municipal tem razão em querer resguardar seu funcionamento. Disse que nada existe a discutir quanto ao mérito, tendo em vista que a administração municipal não prestou as informações requisitadas, o que pode importar em confissão ficta dos fatos argüidos na Inicial. Julgou procedente o pedido, determinando que o Prefeito Municipal deposite na conta da Câmara a quantia de R$20.800,00 (vinte mil e oitocentos reais), sob pena de bloqueio dessa quantia.

 

8.        Às fls. 80-84, a Impetrante, tendo em vista que a autoridade coatora não cumpriu a decisão judicial, requer que seja determinado o seqüestro da quantia em questão, e sua imediata transferência para a conta corrente da Câmara Municipal de Capitão Poço.

 

9.        O MM. Juiz deferiu o pedido (fls. 85).

 

10.    A Prefeitura apresentou a apelação intempestivamente, pelo que foi determinado seu desentranhamento dos Autos.

 

11.   Distribuído o Processo, vieram os Autos a esta Procuradoria, para exame e parecer.

 

 

 

É o relatório. Esta Procuradoria passa a opinar:

 

 

         Não resta dúvida de que a hipótese vertente envolve o resguardo de um dos princípios fundamentais em nosso ordenamento constitucional, o da separação dos Poderes, consubstanciado na independência e harmonia dos Poderes Constituídos, Executivo, Legislativo e Judiciário (Constituição Federal, art. 2o). Sendo o Brasil uma Federação, caracterizada pela coexistência de três esferas jurisdicionais, União, Estados e Municípios, esse princípio encontra guarida, necessáriamente, nas Leis Fundamentais do Estados e, também, dos Municípios.

 

         Para que possa ser cumprido o princípio constitucional, porém, é preciso que seja respeitado o orçamento aprovado por lei, e que as dotações orçamentárias sejam entregues aos órgãos legislativos, como no caso sob exame, nas épocas próprias, porque sem a necessária autonomia financeira, ficaria inviabilizado o cumprimento daquele princípio constitucional.

 

Exatamente por essa razão, dispõe o art. 168 da Constituição Federal que:

 

 “Os recursos correspondentes às dotações orçamentárias, compreendidos os créditos suplementares e especiais, destinados aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Ministério Público, ser-lhes-ão entregues até o dia 20 de cada mês, na forma da lei complementar a que se refere o art. 165, § 9o.”

 

Da mesma forma, a Carta Estadual dispõe que:

 

 “Até o dia vinte de cada mês, as Câmaras receberão o duodécimo a que têm direito pela lei orçamentária do Município”.

 

         Não resta dúvida, também, de que é perfeitamente cabível, na hipótese, o recurso ao remédio extraordinário do mandado de segurança, pelo reconhecimento do direito líquido e certo que o Poder Legislativo Municipal tem, de receber mensalmente as parcelas do duodécimo.

 

         A autoridade apontada como coatora não prestou as informações, assim como também não apelou tempestivamente. Tem razão a Ilustre Representante do Parquet, quando afirma, às fls. 70, que a falta de informações conduz ao reconhecimento da confissão ficta dos fatos aduzidos pela Impetrante na Inicial, corroborados pelas provas acostadas aos Autos. De qualquer maneira, o direito líquido e certo da Impetrante não guarda relação com a receita estimada, e sim com a receita efetivamente arrecadada. O Impetrado tem a obrigação de repassar, até o dia vinte de cada mês, de acordo com a normativa constitucional, o percentual correspondente à dotação orçamentária do Órgão Legislativo (duodécimo).

 

Também tem razão, a nosso ver, a Ilustre Representante do Parquet, a respeito do prazo decadencial para o ajuizamento do mandamus. Em relação aos repasses pertinentes ao período pretérito, é claro que restará à Impetrante o recurso às vias ordinárias, porque a Ação do Mandado de Segurança não se pode confundir com a Ação de Cobrança, nos termos da Súmula 271 do STF.

 

         In casu, está sendo questionado apenas o repasse referente ao mês de maio de 1.999. O MM. Juiz, Dr. XXXXXXXXXXXX, em nosso entendimento, acertadamente decidiu que assiste razão à Câmara Municipal do Município de Capitão Poço, quando busca resguardar seu funcionamento, tendo em vista que o fim colimado pela sua existência é o exercício constitucional do Poder Legislativo Municipal.

 

Também em relação à completa desídia da administração municipal, que não prestou as informações requisitadas pelo MM. Juízo, tem razão o Julgador quando afirma que ficou impossibilitado de avaliar o pedido inicial, e cotejá-lo com a realidade municipal. Por essa razão, entendeu que houve confissão ficta por parte do Executivo e condenou o Executivo a efetuar o depósito, na conta da Câmara Municipal, da quantia de R$20.800,00 (vinte mil e oitocentos reais), referente à diferença ocorrida no repasse do duodécimo.

 

         Ex positis, este Órgão Ministerial se manifesta pela manutenção integral da bem elaborada sentença de primeiro grau, por seus próprios fundamentos.

 

É O PARECER.

 

Belém,      março de 1999

 

 

* Professor de Direito Constitucional da Unama

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Como citar e referenciar este artigo:
LIMA, Fernando Machado da Silva. Reexame de Sentença. Mandado de Segurança. Duodécimo. Falta de repasse dos valores devidos. Separação dos Poderes. Autonomia financeira.. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/estudodecaso/administrativo/reexame-de-sentenca-mandado-de-seguranca-duodecimo-falta-de-repasse-dos-valores-devidos-separacao-dos-poderes-autonomia-financeira/ Acesso em: 21 nov. 2024