Hora de fazer um balanço preliminar das eleições municipais recém realizadas e ainda não concluídas em cidades relevantes como Rio de Janeiro. Esses resultados devem ser vistos em conjunto com o fato não menos importante do impeachment de Dilma Rousseff, movimento que compõe os dois lados da mesma moeda que rifou o PT do poder. Este partido perdeu cerca de 60% dos prefeitos que tinha, e, na mesma proporção, o montante de vereadores. Perdeu a joia da coroa, a prefeitura de São Paulo. Tudo isso junto com a substantiva perda da Presidência da República. Há uma importante mensagem a ser compreendida, pois o tônus político brasileiro mudou fortemente.
Vejo aqui uma guinada sensacional da opinião pública brasileira não propriamente para um polo conservador, mas para uma posição de enfrentar a realidade e garantir a sobrevivência coletiva, que está em risco (ainda não foi superado o risco). Os delírios esquerdistas do PT e seus aliados, que instrumentalizaram o esquema de corrupção mastodôntico desde o centro de poder, perpassando governos estaduais e municipais e as estatais, levaram o país à beira do precipício. O problema é menos a corrupção e mais a cegueira ideológica que impede o PT de ver o real. Hoje jornais deram que o Estado do Rio de Janeiro pede intervenção federal para pagar as contas, quebrado que está com a perda dos royalties do petróleo e com a fuga de investimentos, especialmente do setor petrolífero. Na mesma edição tivemos a notícia do pronunciamento do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, em favor do teto do crescimento do gasto público e também anuncio de página inteira de entidades patronais em apoio ao limite do gasto público, pronunciamentos incompatíveis com a pretensão do Rio de Janeiro. Não podemos esquecer que as classes patronais sempre foram entusiastas apoiadoras do PT ao menos desde a emissão da famigerada Carta ao Povo Brasileiro. Sempre diziam que o PT era “capitalista”. Quase destruíram o país com sua cegueira política de apoiar um partido criminoso e revolucionário (uma evidente redundância).
Percebe-se que esse sentimento de que precisa ser restabelecida a disciplina fiscal é o ponto central da discussão. É o real prevalecendo sobre o devaneio revolucionário. A esquerda radical abusou do recurso ao populismo econômico a fim de garantir a perpetuação no poder, abusando inclusive do recurso à gestão criminosa observada no mensalão e no petrolão. O sentimento de risco existencial, como não poderia deixar de ser, tomou conta de toda a sociedade brasileira, fato que se expressou pelas elites políticas com representação no Congresso Nacional e no Supremo Tribunal Federal, que cassaram Dilma Rousseff, e também pelo povo miúdo em geral, que massacrou o PT nas urnas. Particularmente em São Paulo o divórcio entre o desejo da maioria e a decisão do governante petista ficou evidente no abuso da redução da velocidade dos veículos nas vias públicas, uma insensatez sinistra, e o programa de ciclovias pintadas feitas no intuito de atrelar a minoria militante de ciclistas ao petismo. Ganhou a minoria e perdeu a maioria. Não se pode governar contra o povo em geral, porque há eleições, felizmente.
É importante notar que a dura e crua realidade se sobrepôs às falsas análises da luta de classes e à discussão ideológica insossa. O discurso do “nós contra eles” morreu, pois a salvação nacional, da Pátria ela mesma, não pode cair no maniqueísmo destrutivo. O povo todo percebeu que um instrumento de salvação era essencial e se uniu contra aquilo que se comportava como um câncer agressivo e perigoso. O exemplo do prefeito eleito de São Paulo, João Dória, que destruiu o que restava do petismo na cidade, é definitivo: empresário, rico, mas portador de um discurso que encantou a todos que estavam exaustos dos vagabundos do PT que estavam no governo supostamente em nome da classe trabalhadora. Vitória incontestável daquele que prometeu responsabilidade fiscal e social, que anunciou programa de privatização de unidades deficitárias e desnecessária de ficar sob o poder público e, ao mesmo tempo, determinou a estabilidade do preço dos transportes públicos, em benefício especialmente dos mais pobres. Estamos diante de um novo quadro político, que se liga a um partido de esquerda (PSDB), mas aprendeu com a própria experiência desse partido governando que a lei da escassez precisa ser respeitada e, no momento histórico em que vivemos, haverá que haver sacrifício dos beneficiários dos gastos do setor público em favor da maioria que paga a conta.
Talvez tenhamos chegado ao momento em que um partido de direita programático possa ser viável eleitoralmente, mas este não é o PSDB. O que estamos vendo, em movimento fascinante, é que a “direita da esquerda” teve que se curvar ao realismo e, ao fazê-lo, conquistou o triunfo eleitoral esmagador. O partido continua com sua agenda revolucionária especialmente nos costumes, mas na economia acordou para o real. Veremos o desdobramento desse movimento sociológico surpreende na eleição de 2018, momento em que o PT e seus satélites poderão ser reduzidos à condição de partidos nanicos. Os analistas conservadores que desconfiam e temem a “direita da esquerda” estão errados quando equiparam o PSDB ao PT e dizem que é tudo a mesma coisa. Não é. Nesse momento histórico é o PSDB peça essencial para a superação das ameaças que pairam sobre o Brasil.
Da mesma forma o PMDB, que concentra o famoso “Centrão”, mudou fortemente. Partido fisiológico que é, que sempre flertou com o progressismo, emprestou seu poderio legislativo para afastar o PT do poder e, para dar sustentabilidade ao presidente Michel Temer, fez o que ninguém esperava: aliou-se ao PSDB. O pouquíssimo tempo do governo Temer mostra que há agora no comando da Nação pessoas imbuídas de sensatez e boa vontade honesta para resolver os problemas. Mudanças na diplomacia, com um ministro do PSDB, foram sensacionais, realinhando o Brasil no plano internacional com o que há de melhor e afastando as fantasias petistas de fazer alianças com o atraso. Na economia as mudanças não foram menores, com melhorias nas expectativas, nos índices de preços, na taxa de câmbio, fatos que necessariamente precedem o retorno da prosperidade econômica.
Em termos teóricos estamos vendo o triunfo das ideias econômicas de Hayek contra as de Keynes. Se Keynes estivesse certo sobre a demanda agregada (ou a sua insuficiência), que poderia ser gerida pelo Estado, o Brasil estaria no auge da prosperidade. O que é o déficit da Previdência Social, o programa bolsa-família, a proliferação do funcionalismo público, a gastança desatinada que construiu para este ano o gigantesco déficit público federal, estimado em 170 bilhões de reais? É puro delírio keynesiano de suprir uma suposta insuficiência de demanda, que só logrou jogar o País na mais grave crise econômica de sua história. A sombra protetora das ideias de Hayek está no legítimo medo causado pela inflação e pela desordem causada pela ilegítima intervenção do Estado na vida econômica. Tudo que a esquerda tem a oferecer é déficit público e desequilíbrios sem fim, nada mais, exceto o modus operandi do banditismo institucionalizado pelo PT, que agrega à crise econômica a aguda crise moral.
As eleições recém realizadas indicam tudo isso. Mesmo sem saber os brasileiros estão realizando um duelo de titãs para realinhar os fundamentos da Nação. Os resultados eleitorais foram auspiciosos tanto que, se não permitem uma euforia desarrazoada, apontam para soluções duradouras no enfrentamento da crise. Consiste nisso a beleza da democracia, que é capaz de corrigir seus próprios erros e eliminar os agentes políticos patológicos que corroem a Nação sem ter que apelar para o uso da força. As instituições, apesar de tudo, saíram fortalecidas.
Um problema grave que persiste e que não tem solução à vista é a crença generalizada nos programas esquerdistas que domina a mídia e as universidades, perpetuando a fábrica de militantes-militontos. Talvez esteja na internet o seu antídoto, pois esta, na sua anarquia, permite que as vozes da razão cheguem ao grande público, denunciando as mentiras por elas repetidas. Essas eleições, com seu resultado tão espetacular, mostram que o poder da internet não é pequeno. No longo prazo será a internet talvez o grande instrumento de mudança de mentalidade, na medida em que escritores e formadores de opinião marginalizados cheguem ao grande público. Será o fim da hegemonia das ideias esquerdistas.
www.nivaldocordeiro.net – 07/10/2016