A temática sobre as convenções processuais veio a ser disciplinada dentro do espectro da justiça dialógica e sob o influxo do princípio da cooperação e, ainda, da duração razoável do processo. Nitidamente o julgamento do mérito perde sua primazia para possibilidade de acordo processual buscando um mezzo termo entre fatos e valores. A contenda cede lugar a cultura da pacificação social.
O artigo 190 do CPC de 2015 [1] está de acordo com a noção de juiz dialógico, que com as partes poderá adequar o procedimento mediante as regras abertas contidas no novo codex e a fim de que o processo civil seja capaz de promover a célere e efetiva tutela de direitos, além, de naturalmente, ser tempestiva (em atendimento da duração razoável do processo). Igualmente é possível as partes no exercício da liberdade constitucional, estipularem mudanças no procedimento, alterando prazos processuais, manejando ônus, faculdades, deveres e direitos processuais.
Tais acordos processuais que representam a contemporânea gestão procedimental podem ser produzidos, conforme prevê o direito francês, em processos que admitam autocomposição.
Podem de fato existirem acordos pré-processuais ou processuais. Evidentemente o juiz deverá verificar se todos os requisitos [2] estejam presentes para sua validade e eficácia.
Os acordos processuais podem ser pactuados durante o tramitar e perante o juízo ou, em outro lugar, como, por exemplo, o escritório de advocacia de uma das partes.
O acordo processual, no entanto, praticado fora da sede do juízo deve ser comunicado ao juiz imediatamente por meio de petição, inclusive para haver a verificação de requisitos de validade e eficácia e também realizar o controle de validade, conforme prevê o parágrafo único do art. 190 do CPC.
O objeto do artigo 190 do CPC de 2015 são os ônus, poderes, faculdades e deveres processuais. Evidentemente está sujeito à cláusula do direito ao processo justo [3] , vide artigo 5º, LIV da CF/1988.
É importante observar que os referidos acordos processuais não poderão incidir sobre os poderes do juiz, notadamente os que são voltados à verificação de veracidade das alegações de fato, sob pena de operar indevida restrição da possibilidade de obtenção de uma decisão justa para causa…
Portanto, os acordos processuais não podem ter por objeto os poderes do juiz…. Já no que se refere aos poderes e faculdades das partes, incluindo também os direitos das parts, é preciso examinar dentro da perspectiva da possível renúncia aos direitos fundamentais… posto que sejam notadamente irrenunciáveis.
Os acordos que importem em violação do essencial núcleo dos direitos fundamentais processuais são nulos. Há também de se verificar que acordos irrevogáveis são igualmente nulos. Bem como aqueles acordos que envolvem a integralidade do direito. Da mesma forma, os acordos que importem em renúncias sem benefício correlato proporcional, correspondem a negócios nulos.
Os acordos processuais sob coação são, de fato, anuláveis. Apesar de que tecnicamente sejam atos inexistentes. A coação absoluta ou física, em verdade, aponta não propriamente para um defeito do negócio jurídico, pois há a total ausência da manifestação de vontade jurígena.
De sorte que fulmina o plano de existência do negócio jurídico, e não apenas o plano de validade, conforme ocorre com a chamada coação relativa e os demais defeitos do negócio jurídico.
O negócio jurídico realizado por coação absoluta é, em verdade, inexistente, e não exatamente inválido. A coação que torna inválido o negócio jurídico é a coação relativa, na qual há a manifestação de vontade, apesar de esteja viciada. Comportando assim a anulação.
Atente-se que segundo o art. 151 do CC para que a ameaça seja considerada como coação, necessário se faz que seja a causa do ato, e também que seja grave, injusta, capaz de produzir dano atual ou iminente e que acarreta justo receio de dano, e que seja ameaça de dano à própria pessoa, sua família ou ainda a seus bens
Deve-se também distinguir a coação da ameaça do exercício normal de um direito, prevista no artigo 153 do CC. Trata-se de ameaça injusta que pode ser representada pela famosa expressão: então, vou procurar os meus direitos, não constitui qualquer coação, assim como a ameaça de negativação do real devedor junto aos órgãos de proteção ao crédito e aos cadastros de inadimplentes.
Igualmente se distingue a coação do temor reverencial, constante na segunda parte do art. 153 do CC que é o respeito à autoridade constituída, seja esta, profissional, eclesiástica, familiar ou de qualquer outra ordem (como por exemplo, laboral).
Cumpre destacar que o negócio jurídico firmado apenas sob sujeição psicológica ou profissional não acarreta a anulação, para tanto, deverá ser acompanhada de ameaça grave (atual ou iminente).
É evidente que o juiz tem o dever de controlar a validade dos acordos processuais, seja quando indevidamente incidentes sobre os seus poderes ou, quando incidir de forma indevida e injusta sobre os poderes das partes, pois não poderá violar a boa-fé objetiva e nem quebrar a simetria das partes [4] . Em sendo, o caso deverá decretar a nulidade do acordo processual.
Afora isto, deverá ainda estar atento sobre a eventual inserção desta cláusula em contrato de adesão pois trata-se de crassa cláusula abusiva e, sendo, nula de pleno de direito, principalmente nos contratos de consumo, em razão à tutela do direito consumerista e ostensiva defesa da vulnerabilidade dos consumidores.
Ao verificar os excessos impróprios, deverá o juiz decretar a respectiva nulidade. Sendo discutível se seria possível promover ajustes a fim de adequar e cumprir todos os requisitos de validade para a convenção processual pactuada.
A validade dos acordos processuais está condicionada à inexistência de violação às normas estruturantes do direito processual principalmente no que se refere a justa simetria das partes.
Cogita o parágrafo único do artigo 190 do CPC/2015 em termos de “nulidade”, e ainda, na inserção abusiva em contrato de adesão ou ainda manifesta situação de vulnerabilidade o que aponta para outras situações como contrato laboral, e tanto outros, onde o aderente é a parte vulnerável na relação contratual.
Vislumbra-se nítida preocupação [5] com a mantença e respeito da boa-fé objetiva bem como o reto respeito a isonomia de tratamento das partes no processo civil, ex vi o art. 7 do CPC/2015.
O art.191 do Código Fux acena com a chamada calendarização [6] do processo pelas partes, que é uma técnica processual dirigida em propiciar uma eficiente e racional gestão do tempo no processo, deve ser feita em diálogo e, podem assim, as partes e o juiz acertarem datas e prazos para a realização dos atos processuais.
Mas, é imprescindível que exista o acordo entre o juiz e as partes para que o calendário seja realmente fixado, ou seja, deverá ser feito em comum acordo, a vantagem está na racional condução do processo com o atendimento da economia processual.
Percebe-se que com evento da calendarização, há a positiva vantagem de se dispensar a necessidade de intimação das partes para a dita e programada prática de atos processuais, agendados previamente… podem ser calendarizados todos os atos do procedimento, até também a data para a prolação de sentença, na douta opinião de Marinoni, Arenhart e Mitidiero.
A eventual violação do calendário processual fixado acarreta a perda do direito processual envolvido, assim, poderá acarretar a perda de vantagem que poderia ser obtida pelo desempenho tempestivo e correto do ônus calendarizado.
Evidentemente não se dispensa em razão do calendário consensual fixado pelas partes, o cumprimento de deveres previamente demarcados, além de que a violação do calendário acena claramente com litigância de má-fé, notadamente quando houver a frustração da confiança dos demais participantes do processo.
Ressalte-se, porém, que a eventual violação do calendário processual fixado pelo juiz não lhe acarreta consequências, mas poderá ser considerada para efeitos administrativos, influenciando por exemplo em promoções na carreira por merecimento.
A título apenas de ilustração o TJ/RS no dia 16 de maio de 2016 decidiu impor punição ao juiz em face de processo administrativo disciplinar que fora instaurado devido o magistrado negar ao advogado cadeirante, a realização de audiências no andar térreo do Fórum de São Francisco de Paula, no Rio Grande do Sul, e sugerir, ainda que o seu cliente trocasse de defensor.
Mas, mesmo após o TJ/RS ter anulado a primeira audiência, garantindo o direito à acessibilidade, o referido juiz ainda, negou a atender o pedido de Nunes. O referido TJ finalmente puniu o magistrado com a perda do direito de promoção pelo prazo de um ano, além da advertência expressa a ser anotada em sua ficha funcional, tendo reflexos negativos sobre direito a promoção por merecimento após dois anos.
É relevante sublinhar que a modificação do calendário acordado entre as partes pode ocorrer somente em situações excepcionais, o que deve ser feito devidamente de forma justificada por quem almeje a sua alteração. É possível, por analogia, invocar o conceito de justa causa [7] para a caracterização da excepcionalidade (art. 223, primeiro parágrafo do CPC/2015).
O negócio processual é o fato jurídico voluntário em cujo suporte fático confere-se ao sujeito, o poder de escolher a categoria jurídica ou estabelecer, dentro dos limites fixados no ordenamento jurídico, certas situações jurídicas processuais que pretenda assumir.
Assim o Código Fux praticamente encerra a discussão sobre a existência ou não de negócio processuais, a despeito de que alguns doutrinadores que defendiam a inexistência do negócio jurídico processual.
O artigo 200 do CPC/2015 evidencia ser possível o negócio jurídico processual unilateral e bilateral (estes costumam estar subdivididos em contratos, quando as vontades se referem aos interesses contrapostos), já os acordos e convenções se notabilizam quando as vontades se unem por um interesse comum. Há doutrinadores que defendem a terminologia convenções processuais em detrimento de negócios processuais.
Existem igualmente os negócios jurídicos plurilaterais que se dá com a participação do juiz ou, com a participação de outros sujeitos, quando na hipótese de sucessão processual voluntária (art. 109 CPC/2015).
Podem existir ainda, os negócios típicos ou atípicos. Entre os típicos se insere o calendário procedimental, previsto no artigo 191, a organização de sustentação oral, o acordo para ampliação de tempo para sustentação oral, o julgamento antecipado do mérito convencional, a convenção relativa a distribuição do ônus probatório bem como a redução convencional de prazos processuais.
E, nesse sentido, existe o pronunciamento do Enunciado 21 do Fórum Permanente de Processualistas Civis, in litteris: “São admissíveis os seguintes negócios, dentre outros: acordo para realização de sustentação oral, para ampliação da sustentação oral, julgamento antecipado de mérito convencional, convenção sobre prova e redução de prazos processuais”.
Destaque-se que existem negócios processuais sobre o objeto litigioso [8] do processo como o reconhecimento da procedência do pedido e há negócios processuais que possuem como objeto o próprio processo em sua estrutura, como por exemplo, o acordo para suspensão convencional do procedimento (que tem o limite máximo temporal de seis meses).
O negócio processual que tem por objeto o próprio processo pode propor uma redefinição de situações jurídicas processuais, tais como ônus, faculdades, direitos e deveres processuais, ou ainda, servir para reestruturação do procedimento.
Igualmente existe negócio processual referente ao foro de eleição e, negócios tácitos, como o consentimento tácito de cônjuge para propositura de ação real imobiliária, ou ainda, para sucessão processual voluntária, art. 109, primeiro parágrafo do CPC/2015, a recusa tácita de autocomposição formulada pela outra parte, a renúncia tácita à convenção de arbitragem (art. 337, sexto parágrafo do CPC/2015) e, ainda a aceitação tácita da decisão, art. 1.000, parágrafo único do CPC/2015.
Convém esclarecer que os negócios tácitos podem ser entendidos por comportamentos comissivos, ou seja, com a efetiva prática de atos incompatíveis com a vontade de recorrer, bem como atos omissivos, ou seja, com a não alegação de convenção de arbitragem.
Frise-se que existem, portanto, omissões processuais negociais que possuem efetivos efeitos no processo. Porém, nem toda omissão processual é ato-fato processual. O silêncio da parte, poderá em certas circunstâncias, normalmente previstas, ser apenas uma manifestação de vontade, conforme prevê o artigo 111 do CC, aplicável no direito processual civil.
Importante verificar sempre a eficácia negocial do silêncio, conforme já tive oportunidade de escrever, vide:http://professoragiseleleite.jusbrasil.com.br/artigos/232326168/o-efeito-juridico-do-silencio-na-formacao-contratual
In litteris : (…) Apesar de que a formação do contrato não resulte (da inferência que não é direta) da forma ou modo da declaração negocial que visa à formação, é preciso analisar as possibilidades existentes nesse âmbito, inclusive considerando-se oportunamente, o silêncio, para que se conclua se o contrato fora ou não formado. (…).
É curial a lembrança de que existem negócios processuais que precisam ser homologados judicialmente, é o caso da desistência do processo, conforme aduz o artigo 200, parágrafo único do CPC/2015 e, também existem outros que não necessitam de tamanha chancela, como é o caso do negócio tácito sobre a modificação de competência relativa ou a desistência de recurso.
A necessidade de homologação judicial não descaracteriza o ato como negócio. As convenções das partes sobre matéria processual, não deixa de ser negócio jurídico, é típico exemplo, o acordo em divórcio, mas havendo incapazes submete-se à homologação judicial.
É cediço que a autonomia privada pode ser regulada e ajustada pela lei, que ora confere maior ou menor liberdade para a produção de eficácia jurídica.
Em regra, se dispensa a formalidade da homologação judicial do negócio processual. A exigência da homologação deve ser restrita e vir expressamente prevista, conforme o Enunciado 113 do Fórum Permanente dos Processualistas Civis.
Repiso que o art. 190 do CPC/2015 consagra os chamados negócios processuais o que permite que as partes promovam a autocomposição, podendo alterar o rito procedimental, a fim de ajustar o processo às peculiaridades da causa, podendo ainda convencionar sobre ônus, poderes, faculdades, direitos e deveres processuais antes e mesmo durante o processo que relativiza a importância do julgamento e enaltece a solução amigável como meio de composição da lide.
O parágrafo único do art. 190 do CPC/2015 ainda estabelece que o magistrado controlará a validade dessas convenções, recusando-as em casos de nulidade ou de inserção abusiva como cláusula em contrato de adesão, principalmente quando uma das parts se encontrar em situação de vulnerabilidade [9] .
Cabe, todavia, por ser oportuno, diferenciar a vulnerabilidade de hipossuficiência. Pois apesar de todo consumidor ser vulnerável, nem sempre é hipossuficiente. Porque esse último conceito vai além do sentido literal de ser “pobre ou sem recursos” e, são aplicáveis para a concessão de benefícios [10] de justiça gratuita [11] , o campo do direito processual.
A hipossuficiência consumerista é conceito mais amplo e deve ser apreciado pelo aplicador do direito caso a caso, no sentido de reconhecer a disparidade técnica ou informacional diante de uma situação de desconhecimento.
É um conceito fático e não propriamente jurídico, baseado na disparidade ou discrepância notada no caso concreto. Enquanto a hipossuficiência é avaliada casuisticamente, a vulnerabilidade pode ser presumida como no caso de pessoa física, consumidor, e também pode ser percebida no caso concreto, mesmo no caso de pessoa jurídica.
A temática é polêmica pois divide a doutrina apesar que entende Hartmann que o legislador agiu acertadamente pois, antes havia parca regulação que se revelava tímida, apesar da previsão de possível suspensão do processo no prazo máximo de até seis meses a fim de viabilizar uma solução consensual.
O legislador brasileiro se inspirou nos modelos francês e alemão e, infelizmente acabou por criar uma norma exageradamente abstrata e genérica. Há, quem defenda que na doutrina pátria que a referida norma autorizaria que as partes não pudessem apenas alterar os prazos e ritos, podendo negociar até mesmo a formação ou não da coisa julgada no caso concreto, o que transcende em muito, as possibilidades previstas no modelo primitivo além, não favorecer o cumprimento das normas fundamentais do CPC.
Ademais, diante da vivente realidade social brasileira poderá produzir auspiciosos negócios processuais, o que pode promover maiores injustiças e não galgar a tão desejada pacificação social.
Hartmann aponta lucidamente que tal modelo brasileiro imposto pela comentada norma, de qualquer maneira, revela-se inconstitucional e pelos mais variados motivos.
O primeiro motivo refere-se a matéria enfocada que é Direito Processual Civil pois é ramo de direito público e, somente o Congresso Nacional pode regulá-lo, por meio da criação das leis (vide art. 22, inciso I da CF/1988). Ademais, a jurisdição [12] é a atividade pública, não podendo receber tratamento assemelhado ao da arbitragem que permite essa possibilidade no que se refere à formatação do compromisso arbitral (art.11 da Lei 9.307/96) principalmente por esta última, decorrer da autonomia da vontade com forte cariz privatista.
Assim, os ajustes pactuados no procedimento minam a atividade pública, descaracterizando-a e afetando negativamente a garantia do devido processo legal (art. 4º, LIV CF/1988).
Há ainda o perigo das alterações procedimentais gerarem o caos cartorário, caso todos os demandantes quiserem realizar o negócio processual, pois cada feito terá então, o seu rito particular, o que irá exigir maior cuidado para o seu controle e desenvolvimento, não permitindo que haja o respeito a duração razoável.
O dispositivo acena infelizmente com o enfraquecimento da autoridade jurisdicional. Há ainda que se atentar os seguintes enunciados do Fórum Permanente dos Processualistas Civis (Enunciados 6, 16, 17, 18,19, 20, 21, 115, 131, 132, 133, 134, 135, 252, 253, 254, 255, 256, 257, 258, 259, 260, 261 e 262).
O art. 191 do CPC/2015 é flagrantemente inconstitucional posto que permita a calendarização procedimental feita pelas partes juntamente com o juiz, o que aproxima ainda mais a jurisdição de arbitragem que é um equivalente jurisdicional com forte caráter privatístico.
Há de se sublinhar que o CPC seja o de 1973 como o de 2015, já autorizavam a dilação temporal de prazos peremptórios [13] em situações justificáveis, como nos casos de calamidade pública [14] (art. 222§2º).
Há ainda o Enunciado 229 do FPPC. O juiz pode designar a audiência também (ou só) com o objetivo de ajustar com as partes e a fixação de calendário para a fase de instrução e decisão.
Já o art. 192 do CPC/2015 propõe mero ajuste redacional, substituindo a necessidade do uso de vernáculo pela língua portuguesa. Mas é admitida a juntada de documento versado em língua estrangeira, mas que deverá vir acompanhado de tradução (juramentada).
Já o art. 200 do CPC/2015 prevê com perceptível ajuste redacional e manteve a permissão para que as partes exijam recibo de petições, arrazoados, papéis e mesmo documentos que forem entregues em cartório.
Os atos jurídicos processuais lato sensu compreendem os atos jurídicos stricto sensu e negócios jurídicos. A vontade é o elemento principal no suporte fático dos atos jurídicos stricto sensu e dos negócios jurídicos.
Há no âmbito do direito processual civil, com evidente restrição quanto à liberdade das partes, quanto aos efeitos do negócio jurídico processual. Distinguem-se com clareza os planos de existência e de validade do ato jurídico. O ato existente pode ser defeituoso, podendo ser invalidado.
Os atos [15] das partes podem ser unilaterais e bilaterais e, ainda pode haver também declarações plurilaterais (como por exemplo: o plano de recuperação judicial da empresa).
Podem ser bilaterais ou não, podem os atos serem classificados, conforme o caso, em atos jurídicos sentido estrito ou negócios jurídicos, conforme o grau de liberdade dos declarantes e quanto aos efeitos do ato.
No curso processual surgem diversas situações que colocam os sujeitos em condição de exercer suas posições jurídicas. A princípio, o não exercício de uma faculdade não impõe ao sujeito qualquer sanção. Mas pode haver consequência pela inação de uma faculdade, pois pode figurar como condição para obter alguma vantagem. Como por exemplo, a decadência quanto ao exercício de direito potestativo, ou a preclusão que consiste na perda da faculdade de praticar, um ato processual.
Afirmou Carnelutti que existe ônus quando o exercício de uma faculdade aparece como condição para obter uma determinada vantagem; por isso, o ônus é uma faculdade cujo exercício é necessário para obtenção de um interesse.
Obrigação e ônus têm em comum o elemento formal, consistente no vínculo da vontade, mas diferem no elemento substancial, porque quando há obrigação, o vínculo se impõe para tutela de um interesse alheio, e, para a tutela de um interesse próprio, quando se tratar de ônus.
É exemplo de faculdade processual, a apresentação das contrarrazões de recurso. Já a apresentação de contestação revela-se como ônus, pois sem esta, o réu será considerado revel. Do descumprimento de ônus processual, decorre preclusão.
Aliás, doutrinariamente se afirma que o ato de demandar também corresponde a um ônus processual (Eduardo Cambi, Eduardo Hoffmann).
A lei se refere a uma grande variedade de negócios jurídicos processuais possíveis (negócios típicos). No rol de negócios jurídicos se inserem: a convenção das partes sobre a suspensão do processo (art. 313, II do CPC/2015) ou sobre o ônus da prova (art. 373, §3º) e as hipóteses em que prepondera o aspecto processual no objeto do negócio.
Boa parte da doutrina enxerga na transação [16] art. 487, III, b do CPC/2015, em que haverá destaque as regras de direito substantivo quanto aos limites da manifestação de vontade das partes. Embora que os problemas atinentes aos vícios da vontade das partes, por exemplo, podem ocorrer em qualquer das hipóteses de negócio processual.
Na transação homologada, aliás, é nítida a presença de dois atos que, juntos, compõem um novo, o ato de direito material e o ato de direito processual que o reveste, conforme expressou Pontes de Miranda ao se referir a homologação judicial, de modo que a invalidade da sentença homologatória não conduz à transação necessariamente.
De forma que poderá ocorrer ato diverso quando desfeita a execução, mantenha-se o ato executivo realizado, que galga autonomia conforme ocorre com a arrematação [17] .
Ainda cita Medina outros negócios processuais, já reconhecidos em doutrina, tais como a convenção de arbitragem, cláusula de eleição de foro, a desistência da ação o reconhecimento jurídico do pedido ou, o acordo para abreviar ou ampliar os prazos dilatórios ou para não indicar os assistentes técnicos.
À luz das reformas do CPC/1973 surgiram novas formas de negócios processuais, como o plano de recuperação judicial de empresas, alienação por iniciativa privada, na execução (art. 880 do CPC/2015) acordo sobre cronograma de cumprimento voluntário da sentença, negociado para a implantação de política pública que pode envolver vários negócios processuais.
Cita-se também a cláusula de mediação, em que as partes se comprometem a não iniciar procedimento arbitral ou processo judicial durante certo prazo ou até o implemento de determinada condição (art. 23 da Lei 13.140/2015 [18] ). As partes podem ainda pactuar a cláusula de conciliação [19] com base na regra geral do art. 190 do CPC/2015.
Ainda há negócios atípicos que realça a força normativa da vontade dos celebrantes. Os negócios típicos ou nominados aqueles que se encontram, além dos referidos expressamente disciplinados na legislação.
Já na vigência do CPC/1973, quando as partes de comum acordo elegem o foro competente (art. 63 CPC/2015) alteram os prazos (art. 222 CPC/2015), dispõem sobre o ônus probatório (art. 373, terceiro parágrafo), acertam não indicar os assistentes técnicos, renunciam ao direito de recorrer (art. 999, CPC/2015) ou desistem do recurso interposto (art. 998 do CPC/2015).
Pode haver também convenção das partes e o juiz, como na fixação do calendário processual (é um negócio processual típico). O art. 190 do CPC/2015, por sua vez, refere-se apenas aos negócios realizados entre as partes, cuja validade deverá ser controlada pelo juiz, nos termos do parágrafo único do mesmo artigo, e, sendo válida a convenção restará ao juiz dar-lhe cumprimento.
Há ainda hipóteses em que a participação do juiz é relevante para que o ato produza os efeitos, embora o juiz não o tenha integrado na formação, como é o caso da desistência que depende da homologação judicial para surtir seus efeitos.
Mas existem casos em que o juiz apenas aplica o que tiverem convencionado as partes; situações em que a lei exige a participação do juiz homologando o negócio jurídico processual; hipóteses em que o juiz participação da convenção.
Os negócios processuais atípicos podem ser celebrados antes do processo, ou seja, pode ser pré-processual a serem observados na avaliação do bem, em caso de leilão judicial ou convencionarem a audiência [20] de conciliação, caso já tenham dispensado a realização a tratativa no sentido de acordo extrajudicial.
De qualquer maneira, o negócio processual é sempre sujeito ao controle judicial. O parágrafo único do art. 190 do CPC/2015 dispõe que o juiz não aplicará o que tiver sido convencionado as partes somente nos casos de nulidade.
O advérbio “somente” dá noção de que a atuação do juiz no controle judicial do negócio processual deve ser contido. Não podem as partes na convenção processual criar deveres para o órgão judicial e nem eliminar a jurisdição estatal. Do contrário será considerado ineficaz.
Em razão o dever de cooperação que se impõe a todos os sujeitos do processo, para que solucionarem a lide em tempo razoável; não se admite o acordo sobre o procedimento que viole o princípio da isonomia. Há de se respeitar as garantias mínimas do processo.
Devem ser consideradas as restrições que estão expressas no sistema processual. Não podem as partes dispor a respeito dos requisitos processuais indispensáveis.
É o caso previsto do art. 62 do CPC/2015 que dispõe sobre a competência absoluta e inderrogável. Não podem as partes convencionarem em desconsiderar a coisa julgada, a fim de que seja reproposta a demanda e se galgar nosso julgamento.
A lei processual ainda se refere a outros pressupostos. São raras as situações que não admitam autocomposição. As partes devem ser plenamente capazes. Note-se que a capacidade é limitação para que a prática de atos jurídicos estabelecida para que se proteja o próprio incapaz. Igualmente relevante é decifrar a expressão “direitos que admitam [21] autocomposição”.
No que se refere à expressão “direitos indisponíveis”, cumpre fazer a distinção de que estes direitos não correspondem aos direitos que não admitem transação [22] conforme expressa a redação do artigo 331, do CPC/1973, a partir da alteração promovida pela Lei 10.444/2002.
Isso porque, há direitos indisponíveis que admitem transação, sendo exemplo disso as questões de alimentos, guarda de filhos e outras causas de família, as causas coletivas, demandas que envolvem entes públicos [23] , consoante bem anota Fredie Didier Jr.
Também se deve ainda fazer a ressalva de que não são somente os direitos patrimoniais privados que admitem a transação, conforme relembra o doutrinador baiano, que também aponta para a necessária distinção entre conciliação e transação.
Para Fredie Didier Jr., a transação é espécie do gênero conciliação, sendo uma prova disso a possibilidade de se obter a conciliação sem transação, conforme ocorre nos casos de reconhecimento do pedido ou de renúncia ao direito em que se funda a ação. Portanto, a leitura mais adequada do artigo 331 do CPC/1973 deve ser “direitos que admitam conciliação”, e não apenas transação.
Com relação à possibilidade de haver conciliação nas causas em que são partes entes públicos [24] , refere Fredie Didier Jr que existe “um mau vezo de se relacionarem tais causas com suposto interesse público, a não permitir a realização de qualquer espécie de autocomposição. ”
São inúmeras as hipóteses de autocomposição envolvendo interesse de ente público, não sendo temerário afirmar, por exemplo, que a maior parte dos conflitos fiscais se resolve por acordo de parcelamento firmado perante a repartição pública, longe das mesas de audiência do Poder Judiciário.
A lei, inclusive, prevê expressamente a possibilidade de conciliação em demandas que dizem respeito aos entes federais [25] . Em regra, são situações em que a cobrança integral do valor é muito dispendiosa, se comparada com o seu possível resultado. A renúncia ou a transação acaba sendo de interesse público.
A lei processual ainda se refere aos outros pressupostos. E, são raras as situações que não admitem autocomposição. As partes devem ser plenamente capazes. Frise-se que a falta de capacidade resulta em limitação para a prática de atos jurídicas estabelecida em lei para que se proteja o próprio incapaz.
O negócio jurídico processual pode se referir ao procedimento, aos ônus, poderes, faculdades, direitos e deveres processuais das partes. Bem como prevê a fixação de calendário processual.
Interessante seria analisar ainda uma convenção pré-execução onde as partes convencionam que a penhora recairá sobre determinado bem imóvel ainda que não se convencione a hipoteca e o que o bem será alienado, em determinado prazo, por um, dois ou três corretores imobiliários indicados no contrato por no mínimo 50% da avaliação que esses dois corretores realizem. É solução que em geral tende agilização a execução.
Constatados que estão presentes todos os elementos essenciais para o negócio processual passa-se então, reconhecer-se que este existe juridicamente. Restando verificar também a validade, se a vontade das partes é jurígena e idônea, se o objeto do negócio é lícito, possível e ao menos determinável e, se não há vício de consentimento, e se é eficaz (quando não depende de homologação judicial).
O calendário processual é figura conhecida, no direito comparado. Trata-se simplesmente, de fixação prévia de cronograma para a realização de alguns atos processuais que permitam a organização mais planejada e a gestão do tempo no processo.
O calendário é definido no contexto onde se prevê que o juiz ficará o tempo à instrução do caso, convém observar que o referido planejamento inexiste dentro da prática judiciária brasileira.
Já no direito francês, o Code Procedure Civile prevê, que nos casos de instrução realizada presente o juge de mise em état [26] (uma espécie de juiz designado para a realização de atos instrutórios em alguns casos), o juiz deverá fixar o tempo necessário à investigação, em atenção à natureza, a urgência e complexidade do caso concreto.
Os prazos estipulados pela calendarização convencional do processo podem ser prorrogados, se presentes os motivos graves definidos e devidamente justificados (art. 764 do Code de Procedure Civile).
Enfim, com a calendarização consensual do processo torna-se mais previsível para as partes o trâmite processual, podendo assim reduzir a sua duração, e se evitando os atrasos desnecessários.
No direito italiano, a fixação do calendário do processo à luz da reforma feita pela Lei 148/2011, quando se discutiu sobre a obrigatoriedade ou discricionariedade da fixação do calendário processual. Tendo a jurisprudência apontado o segundo sentido.
Através da redação da Lei 148/2011 passou a existir a possibilidade de imposição de sanção disciplinar, no caso de desrespeito ao calendário fixado. O que fez acreditar que o calendário processual consensual passou a ser obrigatório.
Contudo, observou-se grandes inconvenientes, pois os juízes temendo serem punidos, passaram fixar calendários demasiadamente elásticos, dotados de prazos longos. Ademais o gerenciamento dos referidos calendários implicaria em aumento de carga de trabalho para os juízes já tão assoberbados.
Opina, com razão, que o uso do calendário consensual nos parece difícil pois em razão da grande quantidade de processos e o número de magistrados, há evidente dificuldade para haver a prévia definição de datas para que os atos processuais possam enfim serem realizados.
A arbitragem e seu procedimento estão regulados pela Lei 9.307/96. Em verdade, a lógica da jurisdição, as formalidades, os pressupostos processuais e as condições da ação de um modo geral são disciplinadas no processo arbitral, posto que se assemelhe em muito com o processo jurisdicional, apesar de ser privado.
As partes na arbitragem são todos os envolvidos na disputa, definidos por força de contrato ou do compromisso arbitral, sendo seus julgadores chamados de árbitros.
Em relação aos árbitros, cabe igualmente destacar a triangularização que se esquadrinha entre polo ativo, polo passivo e árbitro que poderá ser mais de um, em número ímpar, sendo eleitos pelos disputantes de comum acordo, sendo escolhidos entre os especialistas na matéria correspondente ao objeto da disputa.
O que difere da jurisdição onde o magistrado não é escolhido pelos litigantes sendo vedado o uso de conhecimentos temáticos para supressão de prova técnica, o que impõe a nomeação de peritos, experts que são auxiliares da justiça (art. 420 e seguintes do CPC).
A conciliação é considerada genericamente uma forma de resolução pacífica de disputas e de lides administrativas por um terceiro investido de autoridade decisória na questão posta ou delegada por quem a tenha, judicial ou extrajudicialmente, a quem compete aproximar as partes, gerenciando e controlando as negociações, sugerindo e formulando propostas.
Quando as partes não cheguem a esse acordo, frustrando-se a conciliação, a autoridade judicial proferirá a sua decisão.
A gestão de disputas intermediada por um terceiro [27] sem autoridade decisória, equivale-se à negociação facilitada. Na hipótese de conciliação pré-processual, apesar de não ser realizada por aquele que decidirá a disputa ou alguém em seu nome, consideramos a conciliação justamente por seu desenvolvimento em espaço decisório. Caso frustrada, esta poderá levar à propositura de processo para que finalmente se decida a questão.
A conciliação não visa melhorar a qualidade da relação entre as partes, sendo em geral breve e tem suas próprias formalidades quando na esfera judicial.
O conciliador tem a prerrogativa técnica de intervir e sugerir um possível acordo após uma criteriosa avaliação das vantagens e desvantagens que sua proposição traria às partes, o que distingue diametralmente da atuação do mediador que, tecnicamente, não deve sugerir saídas para o acordo. O eventual acordo flui das partes, construídas pelos litigantes, dentro de seus reais anseios e possibilidades.
A conciliação no curso processual tem previsão expressa nos arts. 331, 447 e seguintes do CPC, arts. 21 e seguintes da Lei 9.099/95 e o art. 846 da CLT e as parts são as mesmas constantes no processo judicial, por força de contrato, lei ou de interesse jurídico comprovado.
Na conciliação no processo seja judicial ou administrativo existe a participação das partes, da autoridade e do conciliador por sua ordem, dos advogados e dos membros do Ministério Público, quando previsto em lei. Excepcionalmente, também participam da conciliação os auxiliares da justiça tais como psicólogos, assistentes sociais e outros profissionais que possam facilitar a solução da lide.
Nas conciliações extrajudiciais [28] e privadas é possível que o conciliador seja uma autoridade familiar ou religiosa. Havendo a conhecida situação chamada de slice and choice (corte e escolhe) e a exemplificamos com a hipótese de um pai (a autoridade), diante de duas crianças que disputam a última fatia de um bolo de chocolate. Ele, com autoridade, propõe que as crianças decidam amigavelmente do seguinte modo: uma criança corta o bolo em duas partes e a outra criança escolhe a primeira fatia.
Há possibilidade de consenso mesmo numa esfera limitada de possibilidades, não se aprofundando o conciliador no âmbito dos interesses em choque, tampouco à funcionalidade das inter-relações. Soluciona-se a disputa sobre a última fatia de bolo, mas não se cria espaço para trabalhar o inter-relacionamento, nem há o caráter pedagógico amplo representado pela cultura da paz.
A negociação pode ou não ser um processo autônomo de resolução de disputas e demandas. Na mediação, conciliação e na facilitação assistida podem-se se delinear momentos de negociação. São pilares das ADRs [29] as teorias da negociação, da comunicação e do conflito, dos sistemas, entre outras.
A negociação enquanto processo pode ser realizada pelo próprio sujeito envolvido na disputa, um representante sem ou um terceiro que auxiliará os envolvidos a solucionarem a disputa ou demanda. Portanto, são partes da negociação as pessoas com interesses, direta ou indiretamente, no resultado ou na solução da disputa posta, mediante um acordo.
O modelo de negociação de Harvard [30] , por exemplo, defende as vantagens dos ganhos mútuos na negociação e inova ao sistematizar a presença do terceiro como auxiliar da negociação, bem como ao reconhecer como aspecto a serem superadas as emoções das partes.
Apesar de não se destinar à transformação de relacionamentos, mas a redimensionar a expressão de sentimentos para atingir a objetividade e a funcionalidade comunicativa no processo negocial, pelo uso de uma comunicação linear.
Harvard procura focar-se no trabalho contensor (mudança de primeira ordem) de forma a superar os efeitos das emoções surgidas durante o processo negocial e que as partes possam expressar seus interesses. Tal objetivo é feito pela redução de distâncias entre os interesses para se chegar a uma negociação. O pacto, nesse caso, é o foco da negociação, e não a qualidade da relação.
Na negociação as partes devem falar para serem entendidas, não se trata de um debate, mas sim, uma conversa para se conseguir um acordo. O negociador deve proporcionar às partes espaço de respeito para se expressarem, indicando seus interesses e pretensões, afastando-se das lamúrias ou lamentações. Os aspectos emocionais e culturais devem ser observados na instrumentalização da negociação.
A negociação em razão das partes pode ser classificada como: negociação simples, negociação multipolos e coletiva.
Negociação simples caracteriza-se por desta participarem apenas os dois polos, sejam coletivos, difusos ou individuais. Exemplificando: a negociação direta entre um grupo comprador e um vendedor de um estabelecimento comercial; a negociação de um consumidor e um fornecedor de serviços.
Negociação multipolos onde há mais dois polos da negociação, podendo ser simples ou multipolos. Exemplificando, uma negociação sobre compra e venda de imóvel, em que estão presentes, o comprador, vendedor, o corretor, o cartório e o banco financiador.
Negociação coletiva é caracterizada pela presença um ou mais grupos de sujeitos participantes de um dos polos da negociação, podendo ser coletiva simples ou multipolos. Exemplificando as negociações de um sindicato com determinada indústria pela redução da jornada laboral; ou do Poder Público com um grupo social para a desocupação de uma área invadida.
Enfim, a possibilidade de convenções processuais acena com um conceito de processo justo que contribui decisivamente para sua consolidação, e se revela por seu conteúdo de forma bastante objetiva.
O processo justo abrange as seguintes garantias: a) amplo acesso à justiça, porque todos possuem direito de acesso a uma decisão justa, que merecem o patrocínio técnico, o suprimento de incapacidades inclusive financeiras, devendo ser excepcionais os impedimentos ao acesso à justiça, especialmente os motivos relativos às questões de forma.
Continuamos a ter um juiz que deve ser imparcial, equidistante das partes, sujeitando-se o julgamento somente aos ditames do Direito e da Justiça; a imparcialidade subjetiva deve ser conjugada com independência objetiva advinda de garantias de investidura do cargo e exercício da função, sem exclusão do diálogo humano.
Mas é preciso que a ampla defesa deva favorecer não apenas a argumentação quanto às teses (defesa técnica) mas, também favorecer o acesso à prova de alegações.
O julgamento deve ser apresentado ao juiz natural, preexistente e acessível. E, a jurisdição deverá atuar somente mediante a provocação, salvo os casos de proteção da dignidade humana.
As decisões devem ser tomadas mediante contraditório prévio ou diferido em casos excepcionais, o contraditório dinâmico e democrático e participativo que pressupõe a audiência bilateral, o direito de alegar, ser ouvido, produzir provas, influir no julgamento da causa, com congruidade e a suficiência de prazos, com a devida e específica fundamentação das decisões, a recorribilidade de decisões, a proibição de surpresa processual, a proibição de tarifação das provas, a proibição de ilicitude das provas e o direito de intervenção de terceiros que manifestem interesse jurídico.
E, o processo deve na medida do possível atender a oralidade e imediatidade, concedendo a garantia de coisa julgada em sentido acentuado, admitida a modificação ou modulação de julgado em casos graves e excepcionais, sem prazo exíguo, deve ser assegurada a publicidade, com raras exceções, a fim de assegurar um controle democrático popular do Judiciário e para a formação da consciência acerca da Justiça e o aumento da confiança pública.
As medidas de coerção devem obedecer ao princípio da legalidade estrita, a prestação jurisdicional deve ser outorgada em prazo razoável, observando-se também a inexistência de impedimentos ilegítimos de acessos e a equidade processual.
Enfim, a possibilidade do processo justo é decorrente de uma concepção de Estado, mas não se refere propriamente a certa ideologia, mas a comportamento ético, sério, relevante e humano.
Nesse ponto, insta destacar que se enxerga a grande preocupação quanto ao debate e fixação de teses jurídicas no âmbito processual. Mas, deve o processo justo ser aquele também capaz de gerir o influxo de componentes indispensáveis para a solução justa da causa, portanto, transita entre fatos e valores.
Confesso que diante das possibilidades de negócios processuais, sinto-me ainda receosa, pois há de ser ter muita ponderação e coerência, não só na verificação de validade por parte do juiz sobre essas convenções, mas, sobretudo, na possibilidade de equilibrar de forma coerente os fatos e valores na produção de um resultado justo e equânime.
Referências:
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________________ Curso Completo do Novo Processo Civil. 3ª Edição. Niterói-RJ: Editora Impetus, 2016.
GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. Coordenador: Pedro Lenza. 7ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2016.
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MEDINA, José Miguel Garcia Direito Processual Civil Moderno. 2ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.
MELO, Nehemias Domingos. (Coord.); Leite, Gisele; HEUSELER, Denise; VIVEIROS, Estefânia; SEGRE, German; SIMÕES, Márcio Cardoso. Novo CPC Anotado, Comentado, Comparado. 2ª edição. São Paulo: Editora RUMO LEGAL, 2016.
STRECK, Lenio Luiz; NUNES, Dierle; CUNHA, Leonardo. Coordenador Executivo: Alexandre Freire. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2016.
TARTUCE, Fernanda. Poderes do Juiz, vulnerabilidade geográfica e justa causa no Novo CPC. Disponível em: http://genjuridico.com.br/2016/02/26/poderes-do-juiz-vulnerabilidade-geografica-e-justa-causa-no-novo-cpc/ Acesso em 15.06. 2016.
WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil. Teoria Geral do Processo Volume 1. 16ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais.
[1] Em sentido contrário do legislador do CPC de 1973, o CPC de 2015 veio norteado com firme propósito de promover maior simplificação do processo, por essa razão promoveu a redução do número de procedimentos especiais, guardando coerência com os princípios já invocados por toda nova lei.
É uma grande inovação do Código Fux ao prever uma especialíssima modalidade que deriva os negócios jurídicos processuais e que podem até ser pactuados de forma mais complexa ou plurilateral.
E tal progresso chega até ao calendário do procedimento que poderá ser fixado e respeitado pelas partes e pelo juiz, que vincula as partes e também ao juiz, o que promoverá uma sensível redução no custo público de manejo do processo.
[2] O exercício da liberdade negocial está subordinado a certos requisitos. No aspecto subjetivo é imprescindível que o sujeito tenha personalidade jurídica e capacidade para o exercício de direitos (arts. 1,3,4,166, I e 171, I). Para os negócios processuais, o sujeito precisa ter capacidade de ser parte e de estar em juízo, conforme o art. 70 do CPC/2015.
Em geral, existe correspondência com a capacidade para o exercício de direitos no plano material. Mas, para os negócios processuais, o que importa é a capacidade de estar em juízo. E, normalmente essa reflete naquela. Contudo, existe casos específicos em que entes orgânicos (internos ou entes coletivos), aos quais não se confere autonomia no plano jurídico-material) apesar de serem admitidos como parte no processo judicial.
Exemplifica Talamini que é o acontece no polo ativo do mandado de segurança. Admite-se que entidade ou órgão público não revestido de personalidade jurídica própria impetre essa ação constitucional, para atacar ato de poder exercido por outro órgão ou ente público, ao qual esteja submetido. O MS funciona, portanto, como instrumento de proteção de competência de órgão público, lesada ou ameaçada pelos excessos praticados por outro órgão.
Nesse caso, muitas vezes, o MS é usado para atacar ato praticado por outro órgão que integra até a mesma pessoa jurídica que o órgão impetrante, é o caso de impetração do writ por assembleia legislativa para atacar ato de governador de Estado…. Portanto, conclui-se que tais órgãos públicos despersonalizados detêm capacidade de ser parte, ao menos especialmente em razão do MS.
[3] O direito ao processo justo encontra-se amparado amplamente em diversos instrumentos jurídicos internacionais e, também jaz incorporado ao ordenamento constitucional e infraconstitucional da grande maioria dos países contemporâneos. A construção do conceito de processo justo decorre da matriz histórica da evolução da noção de justiça do processo, nitidamente marcada pelas influências ideológicas predominantes em momentos históricos sucessivos, associadas às respectivas concepções de Estado.
Portanto do liberalismo processual passamos para a socialização processual e, enfim, chegamos ao chamado neoliberalismo processual que se apresenta nos derradeiros anos em nosso país, buscando identificar os desafios, limites e possibilidades de efetivação de um processo justo.
Luigi Paolo Comoglio procurou demonstrar a necessidade de investigação mais apurada acerca do fundamento que fundamenta a noção de processo justo, não restrita às matrizes de cunho histórico e analítico.
O conceito de processo justo fundado em filosofia que dá tratamento ao processo sob a inspiração do valor da dignidade da pessoa humana. Tal dignidade emana do homem enquanto integrante do fenômeno processual, quer na sua condição de parte, de juiz e, ainda, mesmo de terceiro interessado.
[4] A doutrina, a jurisprudência e até mesmo a legislação vigente utiliza da analogia para se referir ao princípio da igualdade no processo, por vezes difundindo pela expressão “paridade de armas” que é necessária para haver o bom e justo combate ou litigância processual. Porém tal jargão jurídico se mostram inadequado com o princípio da consensualidade que preenche o escopo do processo, sobretudo civil.
De sorte que cogitar de “armas, duelo ou combate” não teriam mais predominância no campo processual e deveriam concorrer ou dar lugar a novas figuras de linguagem mais afinadas com a noção de sujeitos cooperantes e protagonistas do contraditório dinâmico.
A nova concepção do processo busca desconfigurar o cenário de luta jurídica e são mais direcionadas para tentativas de paz. Também coaduna mais com a sentença menos impositiva e, pautada mais na conciliação e mediação, menos na exaltação dos ânimos e, mas assentada no consenso e harmonia, menos de litigantes e mais apontadas para agentes cooperantes que buscam a boa e serena solução, dispensando a rivalidade, há uma relevância do diálogo franco e aberto.
[5] O admirável e produtivo doutrinador Adroaldo Furtado Fabrício veio a enumerar as causas que possivelmente influenciaram o legislador infraconstitucional para definir as matérias de direito material que contemplaria com os procedimentos especiais. O doutrinador, afirma que o peso da tradição histórica com as complicações e incongruências decorrentes de múltiplas fontes de influência, nem sempre coesas e entre si, coerentes, ainda a eventual interpenetração, em um mesmo processo, de elementos de diversas modalidades de tutela jurisdicional, de cognição, de execução e de cautela; razões de conveniência momentânea e local, com caráter meramente emergencial: até mesmo a simples impaciência do legislador em face da morosidade do aparelho judiciário em contraste com a pressão da demanda social, tudo influi no sentido de retirar da vala comum do rito ordinário um número crescente de ações. (In: Disponível em ADROALDO FURTADO FABRÍCIO, Justificação teórica dos procedimentos especiais. Disponível em: http://www.abdpc.org.br/abdpc/artigos/Adroaldo%20Furtado%20Fabr%C3%ADcio(3)formatado.pdf, acesso em 15 de outubro de 2015.)
[6] Porém, com o original teor do art. 12 do CPC/2015 há quem defenda que a dita calendarização procedimental pactuada vem a colidir com a regra do julgamento por ordem cronológica, atrapalhando a gestão dos processos. Mas, como a Lei 13.256/2016 veio tornar o que era dever em mera faculdade. A possível calendarização procedimental acordada não irá influenciar na gestão dos processos por parte dos magistrados.
[7] Dependendo do tipo de vulnerabilidade que acomete o litigante, contudo, a advertência por si não basta: se, por exemplo, o litigante vulnerável organizacional for intimado a obter e juntar documentos no prazo regular do aditamento à petição inicial (10 dias), pode não lograr êxito em cumprir tal desiderato por árduas dificuldades, devendo-se ser-lhe dilatado o prazo se demonstrada a justa causa que o impediu de atuar.
A Lei n. 13.105/2015[18] repete previsão do CPC/73 ao prever a justa causa como justificativa para a devolução de prazos processuais. Comparando os dispositivos das duas legislações, pouca alteração é constatada. O Novo CPC perdeu a oportunidade de melhor disciplinar a justa causa e explicitar que ela também pode decorrer das características pessoais do litigante que involuntariamente comprometem a sua atuação em juízo, ou seja, da constatação da vulnerabilidade. Aferida a disparidade entre as partes em razão da vulnerabilidade de um dos litigantes, é possível, com base na justa causa, informá-la ao juízo e buscar superá-la.
No Novo CPC, a “justa causa” segue sendo uma cláusula aberta sujeita ao completo preenchimento de seu conteúdo pelo intérprete – sem, contudo, contar com a desejável facilitação advinda de explicitações da Lei.
A doutrina brasileira costuma definir justa causa como o impedimento eficaz, alheio à vontade da parte, que por si só não permite que o ato processual seja realizado, aliando-se normalmente à noção de um fato imprevisível[21]. A vulnerabilidade processual, conforme exposto, insere-se de forma adequada nesta definição.
[8] Não se deve, contudo, confundir os negócios processuais relativos ao objeto litigioso do processo, como por exemplo, o reconhecimento da procedência do pedido, com os negócios jurídicos processuais, que tem por objeto o próprio processo em sua estrutura dinâmica. Tal derradeira modalidade se referem os artigos 190,191 e 200 do CPC/2015. E, não dizem respeito à transação, mas do próprio processo bem como de suas condições de desenvolvimento ao longo do procedimento.
[9] Conforme o art. 4º, inciso I do CDC, o consumidor é vulnerável, pois representa a parte fraca da relação jurídica de consumo. E, ainda por não ter acesso ao sistema produtivo e como também não tem as condições de conhecer seu funcionamento, não tendo as informações técnicas, nem ter informações sobre o resultado, que são os produtos e serviços oferecidos.
A vulnerabilidade representa uma situação permanecente ou provisória que pode ser individual ou coletiva que é fragilizando e enfraquece o sujeito de direitos, desequilibrando a relação jurídica. Daí a necessidade de proteção. A proteção do vulnerável afinal vem concretizar o princípio constitucional da igualdade ou isonomia pelo qual serão tratados igualmente os iguais, e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades.
A vulnerabilidade, porém, se reveste de variadas facetas, não é conceito de único sentido. Cláudia Lima Marques elenca quatro espécies.
A primeira vulnerabilidade é informacional, “básica do consumidor, intrínseca e característica deste papel na sociedade”. Isso porque “o que caracteriza o consumidor é justamente seu déficit informacional”. O que fragiliza o consumidor não é a falta de informação, mas o fato de que ela é “abundante, manipulada, controlada e, quando fornecida, nos mais das vezes, desnecessária”. Esta é a modalidade que mais justifica a proteção do consumidor, pois a informação inadequada sobre produtos e serviços é potencial geradora de incontáveis danos.
Já “na vulnerabilidade técnica, o comprador não possui conhecimentos específicos sobre o objeto que está adquirindo e, portanto, é mais facilmente enganado quanto às características do bem ou quanto à sua utilidade, o mesmo ocorrendo em matéria de serviços”. Será presumida para o consumidor não profissional, podendo “atingir excepcionalmente o profissional destinatário final fático do bem”. A disparidade entre os conhecimentos técnicos do consumidor em relação ao fornecedor também é patente, pois o fornecedor é o expert da área em que atua, sendo o consumidor, em tese, leigo.
A terceira é a vulnerabilidade jurídica, ou científica, que consiste em “falta de conhecimentos jurídicos específicos, conhecimentos de contabilidade ou de economia”. Ela deve ser “presumida para o consumidor não profissional e para o consumidor pessoa física”, enquanto que, “quanto aos profissionais e às pessoas jurídicas, vale a presunção em contrário”.
Por fim, a vulnerabilidade fática ou socioeconômica é aquela na qual se vislumbra grande poderio econômico do fornecedor, em virtude do qual (o poderio) ele (o fornecedor) pode exercer superioridade, prejudicando os consumidores. São, portanto, quatro tipos de vulnerabilidade, podendo o consumidor se encaixar em uma das modalidades. A importância de se conhecer todas elas, reside na compreensão do finalismo aprofundado, que, por sua vez, possibilita a aplicação das normas de proteção do consumidor.
[10] Em síntese, estão abrangidas pela gratuidade, não sendo o caso de pagamento por quem é beneficiário da justiça gratuita: I –custas judiciais; II – despesas com correio; III – despesas com publicação na imprensa oficial (dispensada a publicação em outros meios de comunicação); IV – indenização devida à testemunha (dia de trabalho da testemunha, que se ausenta para ir à audiência); V – custo do exame de DNA (já previsto na lei) e de “outros exames considerados essenciais” (novidade – que poderá ser realizado por hospital público, nos termos do art. 95, § 3º); VI – honorários de advogado, perito, intérprete ou tradutor; VII – custo com a elaboração de memória de cálculo, quando necessário para a fase satisfativa; VIII – depósitos devidos “para interposição de recurso, propositura de ação e para a prática de outros atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório” (dispositivo que acaba sendo residual, para afastar a necessidade de pagamento de e não incluída nos incisos anteriores); IX –emolumentos devidos a cartórios extrajudiciais (notários ou registradores) para atos cartoriais necessários à efetivação de decisão judicial.
[11] Portanto, dentre os pontos fortes do CPC/2015 a respeito da justiça gratuita, destaco o seguinte:
A disciplina da justiça gratuita dentro do próprio Código. A gratuidade de justiça não era tratada no CPC/73, mas na L. 1.060/50. Conveniente que um tema dessa relevância não fique apartado do corpo do CPC, especialmente para fins de melhor sistematização da matéria (harmonização com o todo do sistema processual).
Porém, vale destacar que a L. 1.060/1950 não foi totalmente revogada. Conforme art. 1.072, III do NCPC, ficam revogados “os arts. 2º, 3º, 4º, caput e §§ 1º a 3º, 6º, 7º, 11, 12 e 17 da Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950”). Além disso, se tudo regulado no próprio Código, é certo que facilita a assimilação das regras por todos os atores do processo.
Nese sentido, por exemplo, a condenação do beneficiário da gratuidade, quando vencido na demanda, no ônus da sucumbência. Apesar de expressamente prevista no art. 12 da L. 1.060/1950, muitos juízes não aplicavam a regra. Quiçá por desconhecimento, já que não constava do CPC. Com a presença da regra no art. 98, § 4º, espera-se que deixem de existir tais decisões.
No cotidiano forense é comum a utilização inadequada dos termos relacionados à gratuidade. A L. 1.060/50, em alguns momentos, trata da gratuidade e da assistência judiciária como sinônimos. O CPC/2015, ao tratar do tema adequadamente, apenas pelo nome “gratuidade de justiça”, afasta a atecnia legislativa.
Augusto Tavares Rosa Marcacini foi dos primeiros a bem diferenciar os conceitos de assistência jurídica [3] (orientação ao hipossuficiente, em juízo ou fora dele – CF, art. 5º, LXXIV, assistência judiciária (serviço de postulação em juízo, principalmente, mas não só, exercido pela Defensoria Pública) e justiça gratuita (isenção do recolhimento de custas e despesas processuais).
O CPC/2015 regula apenas a justiça gratuita. Mas, com o nome tecnicamente correto, pode permitir que, aos poucos, deixe se ser utilizado o termo assistência judiciária de forma inadequada.
Explicitando e facilitando como pode ser feito o requerimento de gratuidade, o art. 99 do NCPC permite requerer a justiça gratuita: (i) na petição inicial, (ii) na contestação; (iii) na petição de ingresso de terceiro, (iv) no recurso e (v) por simples petição. Está justificada a hipótese (v) porque a parte pode, inicialmente, não necessitar da gratuidade, mas, durante o processo, em primeiro grau e antes do recurso, ter necessidade do benefício. Portanto, continua ampla liberdade no momento de se requerer (como já se reconheceu).
[12] Mesmo encarando o redimensionamento da jurisdição dentro do chamado Estado Constitucional, há de se respeitar as garantias processuais, notadamente as de origem constitucional, que repousam sobre valores e princípios que não são transacionáveis.
[13] Os prazos peremptórios são aqueles que normalmente a convenção das partes, e ordinariamente, nem mesmo o juiz podem alterar. A dilação de prazos instrutórios é medida que tende a ter significativa repercussão, já que discute a importância da fase instrutória para o processo, sendo a nosso ver opção política o resguardo à produção de provas em detrimento da aplicação rígida da técnica preclusiva – como já vem discutido e exigido no direito estrangeiro.
O CPC/2015 acaba assim, mesmo que indiretamente, facilitando a difícil diferenciação do que seja prazo dilatório e peremptório na fase de conhecimento, a partir do momento que passa a admitir que todo o prazo da instrução deva ser compreendido como não peremptório – já que pode ser dilatado pelo magistrado, diretor do processo. Como reforço argumentativo, podemos ainda pontuar que pela versão derradeira, não houve menção expressa, como no sistema anterior, a polêmica distinção conceitual entre prazos dilatórios e peremptórios, ao ser regulada a sistemática dos prazos a partir do art. 218 do CPC/2015.
Pelo sistema do CPC/2015, essa resolução da problemática fica evidentemente facilitada, já que maiores esforços exegéticos – de interpretação do CPC à luz da CF – deixam de se fazer indispensáveis, a partir do momento em que o próprio Codex já admite que ao menos os prazos na instrução podem ser dilatados pelo magistrado.
[14] O estado de calamidade pública é similar à situação de emergência no sentido de ser também um reconhecimento legal, pelo município atingido, de uma situação anormal provocada por desastres. O estado de calamidade se diferencia da Situação de Emergência, porém, por ser decretado quando o desastre causa sérios danos à comunidade afetada, inclusive representado perigo e elevado risco à vida de seus habitantes.
[15] Dentre os fatos processuais, destacam-se os negócios jurídicos processuais. Onde o elemento volitivo é crucial para a configuração do ato jurídico lato sensu, mas enquanto no ato jurídico stricto sensu, os efeitos do ato realizados pela parte encontram-se previamente definidos em lei, no negócio jurídico aqueles que o celebram podem dispor também sobre tais efeitos. Há negócios processuais realizados fora do processo, mas que neste vêm a produzir efeitos posteriormente.
[16] A transação é um negócio jurídico de direito material e a sua celebração resolve o mérito da causa. É lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas, através de declaração ou de reconhecimento de direitos, desde que estejam em jogo apenas direitos patrimoniais de caráter privado.
Contudo, conforme ressalta Marinoni, Arenhart e Mitidiero é possível transação nas causes de interesse da União (Leis 9.469/1997, 10.259/2001) e pode ser judicial ou extrajudicial. Se for judicial será feita por escritura pública ou por termos nos autos, devidamente assinados pelos transigentes. A transação pode ou não incluir matéria diversa daquela posta em juízo. E, dependendo de cumprimento, a sentença que homologa a transação constitui título executivo judicial. O juiz identificando que estão presentes os requisitos que autorizam a transação, está vinculado ao negócio entabulado pelas partes, não podendo recursar-se a homologação da transação.
A transação só se anula por dolo, coação, ou erro essencial quanto à pessoa a coisa controversa. A transação não se anula por erro de direito sobre as questões que foram objeto de controvérsia entre as partes. A transação poderá ser anulada mediante a ação anulatória de ato processual, conforme o artigo 966, §4º do CPC.
[17] A arrematação ou alienação judicial na execução também ostenta, segundo Medina, a evidente natureza de negócio processual, ex vi o art. 903 do CPC de 2015. As implicações do art. 190 do CPC/2015 trazem uma previsão inédita que visa fazer valer a vontade das partes. O que mais preocupa os doutrinadores é a possível renúncia aos direitos. Por exemplo, caso as partes pactuem que não irão impetrar mandado de segurança contra qualquer decisão proferida no conflito. Será que uma norma infraconstitucional poderá prever o direito de renúncia a uma garantia constitucional? Não se acredita ser possível. Acredita boa parte da doutrina que o referido dispositivo pode ser questionado no STF. Não por ação direta de inconstitucionalidade, pois acredita-se que isso não seria viável, pois o projeto ficou em discussão por cinco anos, os ministros dos tribunais superiores foram ouvidos e o presidente da comissão (de juristas, que elaborou o anteprojeto do novo CPC) é um ministro do STF, Luiz Fux que tem forte visão constitucional. Mas, eventualmente, um dispositivo ou outro pode chegar ao STF por meio de controle incidental de constitucionalidade, via recurso extraordinário.
[18] A Lei 13.140/2015, em seu artigo 2º, § 3º, tem redação distinta: “Pode ser objeto de mediação o conflito que verse sobre direitos disponíveis ou sobre direitos indisponíveis que admitam transação”. E no artigo 3º, § 2º, complementa esta ideia, ao prescrever “O consenso das partes envolvendo direitos indisponíveis, mas transigíveis, deve ser homologado em juízo, exigida a oitiva do Ministério Público”.
[19] Convém trazer à colação um breve excerto do entendimento de Luiz Guilherme Marinoni e de Sérgio Cruz Arenhart, in litteris: “Cabe lembrar que a conciliação permite que as causas mais agudas do conflito sejam consideradas e temperadas, viabilizando a eliminação do litígio não apenas na forma jurídica, mas também no plano sociológico, o que é muito importante para a efetiva pacificação social. Como alertou Mauro Cappelletti, a conciliação – ao contrário da decisão que declara uma parte “vencedora” e a outra “vencida” – oferece a possibilidade de que as causas mais profundas do litígio sejam examinadas, recuperando-se o relacionamento cordial entre os litigantes.”
[20] A audiência, em princípio, somente poderá ser evitada com a manifestação expressa de ambas as partes (CPC, art. 4º, I). Não há margem para se afastar, no curso do processo, a referida audiência pela manifestação expressa de apenas uma das partes, mesmo se sabendo que “se um não quer, dois não se conciliam”. Então, fora as hipóteses do inciso II do art. 4º do CPC, a audiência somente será evitada se ambas as partes manifestarem expressamente sua vontade em não conciliarem, sempre por escrito? Sim, de fato. No entanto, esta previsão legal específica – quanto a este negócio jurídico dentro do processo – não afeta o poder geral de negociação das partes, sobre normas processuais, fora do processo.
[21] Inclusive, a doutrina chega a propor a seguinte classificação: “a) indisponibilidade absoluta (irrenunciável, insuscetível de transação e de persecução processual obrigatória); b) indisponibilidade relativa (irrenunciável, suscetível de transação, mas de persecução processual obrigatória); c) disponibilidade limitada (irrenunciável, suscetível de transação e de persecução processual facultativa) ”. Enfim, o que parece ser o grande desafio não é a verificação da aptidão ou não dos entes públicos de fazer acordos, mas sim quais seriam as suas condições.
É inegável que a margem de liberdade para a realização de acordos pelo poder público é menor do que a existente para o setor privado. Acontece que, quando a situação envolve o poder público, tem-se a prévia exigência de autorização normativa para que membro da advocacia pública possa transigir em juízo. Algumas leis possuem autorizações genéricas, tais como o parágrafo único do artigo 10 da Lei 10.259/2001 e o artigo 8º da Lei 12.153/2009.
[22] Alerta está de acordo com a ideia de cooperação e boa-fé (CPC, arts. 5º e 6º e CC, art. 422), a transação processual antes do processo tem base expressa na lei (CPC, art. 190), a qual admite negócios tácitos (CC, art. 111) e, por fim, a regra processual que exige vontade expressa não se aplica aos negócios realizados antes do processo, mas somente àquele específico do inciso II do § 4º do art. 334 do CPC. Norma que restringe à vontade deve ser interpretada restritivamente. A audiência de conciliação e mediação, criada com boas intenções, é no mundo real um entrave à efetividade do processo. Temos de identificar os mecanismos adequados para evitá-la, pensando para além do Código de Processo Civil.
[23] Tratando-se da Lei 13.140/2015, Mariana Saragoça comenta que “Com relação aos conflitos envolvendo a administração pública federal direta, suas autarquias e fundações, a referida lei prevê a possibilidade de tais controvérsias serem objeto de transação por adesão, mediante autorização do Advogado?Geral da União ou de parecer do Advogado? Geral da União, aprovado pelo Presidente da República. Nesses casos, a resolução administrativa terá efeitos gerais e será aplicada aos casos idênticos que tiverem sido habilitados mediante pedido de adesão, tendo como efeito a renúncia do interessado ao direito sobre o qual se fundamenta a ação ou o recurso, eventualmente pendentes, de natureza administrativa ou judicial”. http://jota.uol.com.br/a-nova-lei-sobre-a-autocomposicao-de-conflitos-na-administracao-publica.
[24] Para além da autorização normativa, há quem mencione os seguintes elementos: a) agente competente; b) finalidade legítima; c) motivos razoáveis; e d) formas transparentes e controláveis — accountability[. De fato, esses parecem ser motivos aptos a auxiliar no controle a posteriori das transações feitas por entes públicos, para além da simples autorização legal. É preciso mais que a mera edição de ato normativo público e com critérios para a autocomposição, torna-se também imprescindível que se obedeça aos princípios da publicidade e, especialmente, o da impessoalidade. E que existam os elementos de controle para a análise dos acordos feitos pelos entes públicos.
[25] Realmente, de acordo com o que está expresso no trecho supracitado, a própria Lei Complementar nº 73/1993, que institui a Advocacia Geral da União, dispõe, em artigo 4º, inciso VI, que é atribuição do Advogado Geral da União “desistir, transigir e firmar compromisso nas ações de interesse da União, nos termos da legislação vigente”. Também a lei 9.469/1997 prevê a possibilidade de conciliação pelos membros da Advocacia Geral da União. Por sua vez, a Lei que instituiu os Juizados Especiais Federais (Lei 10.259/2002), em seu artigo 10, parágrafo único, disciplina que: Os representantes judiciais da União, autarquias, fundações e empresas públicas federais, bem como os indicados na forma do caput, ficam autorizados a conciliar, transigir ou desistir, nos processos da competência dos Juizados Especiais Federais. ” Especificamente, no âmbito do direito previdenciário, a própria Lei de Benefícios (Lei 8.213/1991) possui dispositivo que admite a prática de transação pelos procuradores que a representarem em juízo, consoante se extrai da redação do artigo 132 do referido diploma legal:
[26] O juiz do pré-julgamento é, no direito francês, um juiz da Alta Corte e responsável por garantir o bom desenvolvimento do julgamento segundo um calendário. O juiz do pré-julgamento é nomeado para supervisionar a instrução de um julgamento civil complexa. Poderá tomar todas as medidas de instruções úteis e dar tempo às partes para fornecer as peças necessárias. Ele também pode ordenar o pagamento de uma disposição por uma das partes (isto é, um montante provisoriamente fixado em um certo nível, mas que mais tarde pode ser removidas, reduzida ou aumentada pelo juiz).
[27] Na mediação, visa-se recuperar o diálogo entre as partes. Por isso mesmo, são elas que decidem. As técnicas de abordagem do mediador tentam primeiramente restaurar o diálogo para que posteriormente o conflito em si possa ser tratado. Só depois pode se chegar à solução.
Na mediação não é necessária interferência, ambas partes chegam a um acordo sozinhas, se mantém autoras de suas próprias soluções. Conflitos familiares e de vizinhança, por exemplo, muitas vezes são resolvidos apenas com o estabelecimento da comunicação respeitosa entre os envolvidos.
A conciliação pode ser mais indicada quando há uma identificação evidente do problema, quando este problema é verdadeiramente a razão do conflito – não é a falta de comunicação que impede o resultado positivo. Diferentemente do mediador, o conciliador tem a prerrogativa de sugerir uma solução.
[28] A Resolução nº 125 do Conselho Nacional de Justiça sedimentou uma nova política de Justiça, pautada no tratamento dos conflitos por meios consensuais e, não apenas pela prolação de sentença, permitindo a abertura de novas arenas para solução de conflitos. A conciliação e a mediação nas serventias extrajudiciais mostram-se extremamente relevantes para favorecer uma mudança cultural: ampliar os espaços para que os meios consensuais sejam cada vez mais vistos como uma saída efetiva para a solução de qualquer impasse, sobretudo àqueles de cunho patrimonial disponível.
[29] ADR significa Alternative Dispute Resolution, ou seja, meios alternativos de resolução de conflitos. A complexidade, o tecnicismo, além dos custos elevados, do tradicional processo judicial norte-americano, inspirou diversas tentativas orientadas a encontrar um modo mais econômico e rápido de solução dos litígios. Muitos são os defensores de tal direcionamento. Partindo da premissa de que nem todas as causas necessariamente precisam ser veiculadas e discutidas no âmbito de um procedimento formal e completo, ele percebe no juiz uma espécie de manager (administrador, gerente, dirigente) processual, o qual teria, afora suas tradicionais atribuições, a função de encaminhar as demandas ao tipo de procedimento (alternativo) mais adaptado às suas peculiaridades.
[30] O método Harvard de negociação e baseado no conteúdo do livro “Getting a Yes”. (Conseguindo um Sim). O método baseia-se em quatro pontos fundamentais: pessoas, interesses, opções e critérios.
E, tem como premissa de que a negociação deve ser baseada em princípios, onde cada negociador deve focar no núcleo da questão e nos critérios objetivos e procurar soluções que atendam às necessidades todas as partes envolvidas. O pensamento comum de que a negociação é um jogo de somatória zero, isto é, que sempre terá alguém perdendo e alguém ganhando, não é considerado válido. Ambas ou as várias partes envolvidas devem sair satisfeitas com o acordo final. Logo, podem e devem ser desenvolvidas negociações onde todas as partes envolvidas têm seus objetivos atendidos e com os resultados baseados em princípios ou méritos, e sem a utilização das barganhas de posicionamento.