Gostava (e gosto) muito de ler sobre Steve Jobs. Li sua biografia, escutei seu discurso em Stanford, acompanhei seus passos criadores, inovadores e
principalmente simples em relação aos produtos da Apple.
Já escrevi sobre ele algumas vezes (leia aqui) e sempre o assunto era sobre a sua genialidade, singularidade e como a empresa Apple seria sem a sua
presença. Agora, iremos realmente descobrir isto.
Minha homenagem a esta grande pessoa que em sua passagem pela terra fez diferente e fez a diferença não será emotiva ou quiçá marcante. Se você quer
algo assim, leia esta aqui.
Os produtos por ele criados eram de um princípio de ser algo extremamente difícil de fazer: Ser simples. Ou como se brinca por aí, estilo KISS – Keep
it simple, Stupid!
Até o email que a Apple criou para que as pessoas possam homenageá-lo foi simples, como ele: rememberingsteve@apple.com (se você quiser, deixe sua
homenagem para ele através deste email).
Criar algo funcional e simples não é fácil. Em fato, é muito mais complexo. Ser simples significa conseguir unir funcionalidades, desejos dos
consumidores em algo que não pode ser complicado, deve ser muito intuitivo e mais, deve surpreender.
Fazer isto em produtos não é fácil, em serviços então, mais difícil ainda.
Mas, a história de Jobs nos mostra que é possível inovar com ideias simples e diretas. Como ele mesmo disse, ter foco é dizer não.
Quem trabalhou com ele dizia que era uma pessoa dura, perfeccionista, mas que amava o que fazia e encantava a todos com este amor ao trabalho.
Conheci advogados com mais de 70 anos com vitalidade que muitos jovens não tem. Eles não tinham força física, as vezes até o raciocínio já estava mais
lento, mas o amor a sua profissão e o brilho nos olhos de quando conversamos sobre justiça me marcaram a alma e faz-me acreditar que o mundo ainda pode
ter jeito.
Divido com vocês o discurso que Steve Jobs fez em Stanford. É extenso, mas vale cada palavra. Tire suas conclusões.
Eu já tirei: Continuo bobo e com fome…
[Discurso na Universidade de Stanford]
Você tem que encontrar o que você ama
Estou honrado de estar aqui, na formatura de uma das melhores universidades do mundo. Eu nunca me formei na universidade. Que a verdade seja dita,
isso é o mais perto que eu já cheguei de uma cerimônia de formatura. Hoje, eu gostaria de contar a vocês três histórias da minha vida. E é isso. Nada
demais. Apenas três histórias.
A primeira história é sobre ligar os pontos.
Eu abandonei o Reed College depois de seis meses, mas fiquei enrolando por mais 18 meses antes de realmente abandonar a escola. E por que eu a
abandonei? Tudo começou antes de eu nascer. Minha mãe biológica era uma jovem universitária solteira que decidiu me dar para a adoção. Ela queria muito
que eu fosse adotado por pessoas com curso superior. Tudo estava armado para que eu fosse adotado no nascimento por um advogado e sua esposa. Mas,
quando eu apareci, eles decidiram que queriam mesmo uma menina.
Então meus pais, que estavam em uma lista de espera, receberam uma ligação no meio da noite com uma pergunta: “Apareceu um garoto. Vocês o querem?”
Eles disseram: “É claro.”
Minha mãe biológica descobriu mais tarde que a minha mãe nunca tinha se formado na faculdade e que o meu pai nunca tinha completado o ensino médio.
Ela se recusou a assinar os papéis da adoção. Ela só aceitou meses mais tarde quando os meus pais prometeram que algum dia eu iria para a faculdade. E,
17 anos mais tarde, eu fui para a faculdade. Mas, inocentemente escolhi uma faculdade que era quase tão cara quanto Stanford. E todas as economias dos
meus pais, que eram da classe trabalhadora, estavam sendo usados para pagar as mensalidades. Depois de seis meses, eu não podia ver valor naquilo.
Eu não tinha idéia do que queria fazer na minha vida e menos idéia ainda de como a universidade poderia me ajudar naquela escolha. E lá estava eu,
gastando todo o dinheiro que meus pais tinham juntado durante toda a vida. E então decidi largar e acreditar que tudo ficaria ok.
Foi muito assustador naquela época, mas olhando para trás foi uma das melhores decisões que já fiz. No minuto em que larguei, eu pude parar de
assistir às matérias obrigatórias que não me interessavam e comecei a frequentar aquelas que pareciam interessantes. Não foi tudo assim romântico. Eu
não tinha um quarto no dormitório e por isso eu dormia no chão do quarto de amigos. Eu recolhia garrafas de Coca-Cola para ganhar 5 centavos, com os
quais eu comprava comida. Eu andava 11 quilômetros pela cidade todo domingo à noite para ter uma boa refeição no templo hare-krishna. Eu amava aquilo.
Muito do que descobri naquela época, guiado pela minha curiosidade e intuição, mostrou-se mais tarde ser de uma importância sem preço. Vou dar um
exemplo: o Reed College oferecia naquela época a melhor formação de caligrafia do país. Em todo o campus, cada poster e cada etiqueta de gaveta eram
escritas com uma bela letra de mão. Como eu tinha largado o curso e não precisava frequentar as aulas normais, decidi assistir as aulas de caligrafia.
Aprendi sobre fontes com serifa e sem serifa, sobre variar a quantidade de espaço entre diferentes combinações de letras, sobre o que torna uma
tipografia boa. Aquilo era bonito, histórico e artisticamente sutil de uma maneira que a ciência não pode entender. E eu achei aquilo tudo fascinante.
Nada daquilo tinha qualquer aplicação prática para a minha vida. Mas 10 anos mais tarde, quando estávamos criando o primeiro computador Macintosh,
tudo voltou. E nós colocamos tudo aquilo no Mac. Foi o primeiro computador com tipografia bonita. Se eu nunca tivesse deixado aquele curso na
faculdade, o Mac nunca teria tido as fontes múltiplas ou proporcionalmente espaçadas. E considerando que o Windows simplesmente copiou o Mac, é bem
provável que nenhum computador as tivesse.
Se eu nunca tivesse largado o curso, nunca teria frequentado essas aulas de caligrafia e os computadores poderiam não ter a maravilhosa caligrafia
que eles têm. É claro que era impossível conectar esses fatos olhando para frente quando eu estava na faculdade. Mas aquilo ficou muito, muito claro
olhando para trás 10 anos depois.
De novo, você não consegue conectar os fatos olhando para frente. Você só os conecta quando olha para trás. Então tem que acreditar que, de alguma
forma, eles vão se conectar no futuro. Você tem que acreditar em alguma coisa – sua garra, destino, vida, karma ou o que quer que seja. Essa maneira de
encarar a vida nunca me decepcionou e tem feito toda a diferença para mim.
Minha segunda história é sobre amor e perda.
Eu tive sorte porque descobri bem cedo o que queria fazer na minha vida. Woz e eu começamos a Apple na garagem dos meus pais quando eu tinha 20
anos. Trabalhamos duro e, em 10 anos, a Apple se transformou em uma empresa de 2 bilhões de dólares e mais de 4 mil empregados. Um ano antes, tínhamos
acabado de lançar nossa maior criação — o Macintosh — e eu tinha 30 anos.
E aí fui demitido. Como é possível ser demitido da empresa que você criou? Bem, quando a Apple cresceu, contratamos alguém para dirigir a
companhia. No primeiro ano, tudo deu certo, mas com o tempo nossas visões de futuro começaram a divergir. Quando isso aconteceu, o conselho de
diretores ficou do lado dele. O que tinha sido o foco de toda a minha vida adulta tinha ido embora e isso foi devastador. Fiquei sem saber o que fazer
por alguns meses.
Senti que tinha decepcionado a geração anterior de empreendedores. Que tinha deixado cair o bastão no momento em que ele estava sendo passado para
mim. Eu encontrei David Peckard e Bob Noyce e tentei me desculpar por ter estragado tudo daquela maneira. Foi um fracasso público e eu até mesmo pensei
em deixar o Vale do Silício.
Mas, lentamente, eu comecei a me dar conta de que eu ainda amava o que fazia. Foi quando decidi começar de novo. Não enxerguei isso na época, mas
ser demitido da Apple foi a melhor coisa que podia ter acontecido para mim. O peso de ser bem sucedido foi substituído pela leveza de ser de novo um
iniciante, com menos certezas sobre tudo. Isso me deu liberdade para começar um dos períodos mais criativos da minha vida. Durante os cinco anos
seguintes, criei uma companhia chamada NeXT, outra companhia chamada Pixar e me apaixonei por uma mulher maravilhosa que se tornou minha esposa.
A Pixar fez o primeiro filme animado por computador, Toy Story, e é o estúdio de animação mais bem sucedido do mundo. Em uma inacreditável guinada
de eventos, a Apple comprou a NeXT, eu voltei para a empresa e a tecnologia que desenvolvemos nela está no coração do atual renascimento da Apple.
E Lorene e eu temos uma família maravilhosa. Tenho certeza de que nada disso teria acontecido se eu não tivesse sido demitido da Apple.
Foi um remédio horrível, mas eu entendo que o paciente precisava. Às vezes, a vida bate com um tijolo na sua cabeça. Não perca a fé. Estou
convencido de que a única coisa que me permitiu seguir adiante foi o meu amor pelo que fazia. Você tem que descobrir o que você ama. Isso é verdadeiro
tanto para o seu trabalho quanto para com as pessoas que você ama.
Seu trabalho vai preencher uma parte grande da sua vida, e a única maneira de ficar realmente satisfeito é fazer o que você acredita ser um ótimo
trabalho. E a única maneira de fazer um excelente trabalho é amar o que você faz.
Se você ainda não encontrou o que é, continue procurando. Não sossegue. Assim como todos os assuntos do coração, você saberá quando encontrar. E,
como em qualquer grande relacionamento, só fica melhor e melhor à medida que os anos passam. Então continue procurando até você achar. Não sossegue.
Minha terceira história é sobre morte.
Quando eu tinha 17 anos, li uma frase que era algo assim: “Se você viver cada dia como se fosse o último, um dia ele realmente será o último.”
Aquilo me impressionou, e desde então, nos últimos 33 anos, eu olho para mim mesmo no espelho toda manhã e pergunto: “Se hoje fosse o meu último dia,
eu gostaria de fazer o que farei hoje?” E se a resposta é “não” por muitos dias seguidos, sei que preciso mudar alguma coisa.
Lembrar que estarei morto em breve é a ferramenta mais importante que já encontrei para me ajudar a tomar grandes decisões. Porque quase tudo —
expectativas externas, orgulho, medo de passar vergonha ou falhar — caem diante da morte, deixando apenas o que é apenas importante. Não há razão para
não seguir o seu coração.
Lembrar que você vai morrer é a melhor maneira que eu conheço para evitar a armadilha de pensar que você tem algo a perder. Você já está nu. Não há
razão para não seguir seu coração.
Há um ano, eu fui diagnosticado com câncer. Era 7h30 da manhã e eu tinha uma imagem que mostrava claramente um tumor no pâncreas. Eu nem sabia o
que era um pâncreas.
Os médicos me disseram que aquilo era certamente um tipo de câncer incurável, e que eu não deveria esperar viver mais de três a seis semanas. Meu
médico me aconselhou a ir para casa e arrumar minhas coisas — que é o código dos médicos para “preparar para morrer”. Significa tentar dizer às suas
crianças em alguns meses tudo aquilo que você pensou ter os próximos 10 anos para dizer. Significa dizer seu adeus.
Eu vivi com aquele diagnóstico o dia inteiro. Depois, à tarde, eu fiz uma biópsia, em que eles enfiaram um endoscópio pela minha garganta abaixo,
através do meu estômago e pelos intestinos. Colocaram uma agulha no meu pâncreas e tiraram algumas células do tumor. Eu estava sedado, mas minha
mulher, que estava lá, contou que quando os médicos viram as células em um microscópio, começaram a chorar. Era uma forma muito rara de câncer
pancreático que podia ser curada com cirurgia. Eu operei e estou bem.
Isso foi o mais perto que eu estive de encarar a morte e eu espero que seja o mais perto que vou ficar pelas próximas décadas. Tendo passado por
isso, posso agora dizer a vocês, com um pouco mais de certeza do que quando a morte era um conceito apenas abstrato: ninguém quer morrer. Até mesmo as
pessoas que querem ir para o céu não querem morrer para chegar lá.
Ainda assim, a morte é o destino que todos nós compartilhamos. Ninguém nunca conseguiu escapar. E assim é como deve ser, porque a morte é muito
provavelmente a principal invenção da vida. É o agente de mudança da vida. Ela limpa o velho para abrir caminho para o novo. Nesse momento, o novo é
você. Mas algum dia, não muito distante, você gradualmente se tornará um velho e será varrido. Desculpa ser tão dramático, mas isso é a verdade.
O seu tempo é limitado, então não o gaste vivendo a vida de um outro alguém.
Não fique preso pelos dogmas, que é viver com os resultados da vida de outras pessoas.
Não deixe que o barulho da opinião dos outros cale a sua própria voz interior.
E o mais importante: tenha coragem de seguir o seu próprio coração e a sua intuição. Eles de alguma maneira já sabem o que você realmente quer se
tornar. Todo o resto é secundário.
Quando eu era pequeno, uma das bíblias da minha geração era o Whole Earth Catalog. Foi criado por um sujeito chamado Stewart Brand em Menlo Park,
não muito longe daqui. Ele o trouxe à vida com seu toque poético. Isso foi no final dos anos 60, antes dos computadores e dos programas de paginação.
Então tudo era feito com máquinas de escrever, tesouras e câmeras Polaroid.
Era como o Google em forma de livro, 35 anos antes de o Google aparecer. Era idealista e cheio de boas ferramentas e noções. Stewart e sua equipe
publicaram várias edições de Whole Earth Catalog e, quando ele já tinha cumprido sua missão, eles lançaram uma edição final. Isso foi em meados de 70 e
eu tinha a idade de vocês.
Na contracapa havia uma fotografia de uma estrada de interior ensolarada, daquele tipo onde você poderia se achar pedindo carona se fosse
aventureiro. Abaixo, estavam as palavras:
“Continue com fome, continue bobo.”
Foi a mensagem de despedida deles. Continue com fome. Continue bobo. E eu sempre desejei isso para mim mesmo. E agora, quando vocês se formam e
começam de novo, eu desejo isso para vocês. Continuem com fome. Continuem bobos.
* Gustavo Rocha – Diretor da Consultoria GestaoAdvBr
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