Bruno de Oliveira Carreirão*
A OAB tem entre os seus objetivos a defesa da ordem jurídica do Estado Democrático de Direito. Não são poucos os dirigentes da Ordem que batem no peito para bradar com orgulho a missão institucional da entidade e exaltar a importância histórica da OAB na defesa da democracia brasileira, citando episódios como a resistência ao Estado Novo e ao Regime Militar e a participação na campanha das Diretas Já.
A mesma atenção, porém, não é dada à democracia interna da entidade. E não, desta vez não estou falando sobre a eleição indireta para a diretoria do Conselho Federal – tema que poderia render (aliás, renderá!) texto próprio. Estou me referindo ao sistema eleitoral que, no último mês, elegeu de forma antidemocrática as diretorias e conselhos das seccionais da OAB.
Ora, a democracia, por definição, é o governo da maioria. Então como podemos admitir como democrático um sistema eleitoral que permite que uma chapa seja eleita com menos de 50% dos votos? Foi o que aconteceu em 2021 em nada menos do que 12 seccionais: Bahia, Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins.
Isso se deve, por evidente, à falta de previsão de segundo turno no regramento eleitoral, o que permite que uma chapa com forte rejeição seja eleita, a despeito da vontade da maioria dos advogados. E esse, por incrível que pareça, nem é o pior problema.
Nas eleições da OAB, vige o sistema apelidado de “chapão”: a chapa vencedora ocupa 100% das cadeiras do conselho seccional. Não há, portanto, nenhuma proporcionalidade entre os votos dos advogados e a composição do conselho que deve, em tese, fiscalizar as ações da diretoria da seccional.
O caso da OAB/SP, maior seccional do país, talvez seja o mais representativo do problema. A chapa liderada pela advogada Patrícia Vanzolini foi eleita com apenas 36,05% dos votos. Isso significa que a vontade manifestada por 63,95% da advocacia paulista será desconsiderada, pois não terá nenhuma representação no conselho. Como pode isso ser democrático?!
Assim, não é de se surpreender que o conselho das seccionais da OAB atue como mera plateia de auditório. Como não há mínima pluralidade política em sua composição, os conselheiros têm o papel de apenas ratificar as decisões e ações da diretoria, pois o sistema eleitoral incentiva a montagem de chapas sem vozes dissonantes para evitar qualquer forma de resistência durante a gestão.
Desde que sou advogado – e isso já faz quase 10 anos -, ouço chapas com proposta eleitoral de acabar com o “chapão”. É provável, inclusive, que essa tenha sido uma das propostas de todas as chapas eleitas no mês passado. Também é provável, porém, que a proposta mais uma vez não saia do papel. O grande entrave é o mesmo que sempre impede reformas eleitorais e políticas mais profundas: quem tem o poder para mudar é justamente quem se elegeu e se beneficiou pelo sistema vigente.
E assim, sendo gerida em desconformidade com a vontade da maioria dos advogados, a OAB segue fingindo ser grande defensora da democracia, com suas enfadonhas notas de repúdio e questionáveis posicionamentos públicos. Na OAB, a democracia é apenas da porta para fora.
* Bruno de Oliveira Carreirão é advogado, mestre em Direito e integrante dos 52,49% do eleitorado sem representação no conselho da OAB/SC.