Novo CPC por Gisele Leite

Legitimidade ad causam na ação coletiva de direitos do consumidor e o CPC/2015

A segunda metade do século XX testemunhou grande mudança nos rumos do direito processual civil que passou de instrumento projetado somente para propiciar o exercício individual do direito de ação, para então servir também para a tutela de interesses[1] sociais como um todo ou em grupos representativos de expressiva dimensão do tecido social.

O movimento da ordem jurídica para o social não se registrou somente no campo processual civil. Pois, ao contrário, todos demais ramos do Direito, sentiram, pois quando se deu a definitiva instauração do Estado Social de Direito no lugar do velhusco Estado Liberal de Direito, onde somente havia o indivíduo como titular da tutela jurisdicional.

A nova visão do Estado e suas funções trouxe destaque aos chamados interesses difusos[2] e coletivos, para os quais o legislador dedicou particular atenção, seja no plano material como processual.

Evidentemente não se abandonou o direito clássico, de proteção ao indivíduo, nem a pessoa, seus bens e direitos individuais. Afinal, continua o homem a ser a figura protagonista do organismo social e que logrou alcançar o mais amplo amparo da ordem jurídica tradicional. Pois ao se ampliar o campo de atuação do direito para neste também se incluir as situações coletivas que até então permaneciam marginalizadas e sem a garantia e sanção do direito positivo protetivo.

No bojo do ordenamento jurídico pátrio contemporâneo passa a existir a convivência de normas de conteúdo objetivo dos mais diversos, governadas por isso mesmo, por princípios jurídicos também diferentes.

Ao aplicar ao direito contemporâneo há igualmente a tarefa de adequadamente compreender o direito à luz de sua teleologia e, principalmente, em função de princípios fundamentais vigentes em cada ramo jurídico que complementa a complexa tessitura normativa, com o fim de encontrar o equilíbrio existente entre os interesses individuais e a tutela de interesses[3] coletivos. É patente que no Estado Social todos os direitos deverão coexistir em harmonia, sem anularem-se uns aos outros.

Os remédios processuais concebidos para a garantia de um tipo de interesse não podem ser transplantados para a solução de lides na área de interesse que ostenta natureza diversa.

A situação é idêntica à que a que se percebe na terapêutica, onde o medicamento prescrito quando utilizado ou aplicado fora do caso para o qual fora recomendado, tornar-se uma agressão ou perigo ao organismo e, pode até promover o agravamento da enfermidade, ao invés de cumprir sua missão curativa.

Essa disfunção natural dos remédios processuais coletivos trouxe a preocupação da doutrina contemporânea que faz um alerta, in litteris:

“O uso generalizado e indiscriminado de ações civis públicas, como outrora do habeas corpus, dos interditos possessórios e do próprio mandado de segurança, pode constituir ameaça à ordem jurídica, e ensejar um clima de litigiosidade, insegurança e contestação generalizada, que é nocivo ao desenvolvimento ao país. O risco apresentado é proporcional à densidade e efetividade do remédio, como está ocorrendo em relação às armas atômicas e antibióticos já antes referidos. O uso desenfreado de remédios pode ameaçar a manutenção da ordem jurídica e impedir o bom funcionamento da administração da justiça e da economia”.

Há de se lembrar de que a prestação jurisdicional não é uma simples tarefa consultiva ou acadêmica para conflitos de interesses, pois pressupõe uma situação concreta litigiosa a dirimir, na qual o operador do direito de ação tenha realmente interesse tutelável.

O processo sendo um método ou um sistema se subordina a requisitos e condições indispensáveis à sua própria existência e eficácia. Logo, não se pode alcançar, obviamente, a tutela jurisdicional mediante a qualquer manifestação de vontade perante o órgão judicante.

Tem-se, primeiramente, de observar com atenção os requisitos de estabelecimento e desenvolvimento válidos da relação processual como a capacidade da parte, a representação por advogado, a competência do juízo e a forma adequada de procedimento.

Inatendidos tais pressupostos, não existe viabilidade para se desenvolver de forma regular o processo que então não funcionará como hábil meio para a composição do litígio ou para o julgamento do mérito da causa. A propósito, cumpre sublinhar que o CPC de 2015 dá especial ênfase a composição amigável dos litígios, inclusive estipulando como primeira audiência[4] das partes, aquela devotada a conciliação ou mediação[5]. Além do que, deverá o juiz, sempre que possível propor a possibilidade de acordos para a consensual composição das lides.

Mas, para que o processo goze de plena eficácia e seja capaz de atingir os fins pretendidos pelos litigantes, não basta, ainda, a simples validade jurídica da relação processual regularmente estabelecida entre os interessados e juiz.

É que, embora abstrata a ação, não se revela tão genérica para obter a tutela de direitos, pois é indispensável que o autor demonstre uma pretensão idônea a ser objeto da atividade jurisdicional do Estado.

Assim, a existência da ação depende de alguns requisitos constitutivos que chamamos de “condições de ação”, cuja ausência, de qualquer uma delas, levará até à carência de ação e, cujo exame deve ser feito, em cada caso concreto, preliminarmente à apreciação do mérito, em caráter prejudicial.

Nessa ordem de ideias, as condições ou requisitos da ação, são categorias lógico-jurídicas existentes em doutrina e, muitas vezes na lei. Aliás, o CPC/2015 reduziu as condições da ação apenas para duas: interesse processual ou interesse de agir e legitimidade ad causam[6] mediante as quais se admite que alguém chegue à obtenção da sentença final.

Lembrando-se que a possibilidade jurídica do pedido (outrora a primeira condição da ação indicada por Enrico Tulio Liebman) atualmente jaz embutida no interesse processual. Desta forma, havendo a falta de uma das condições da ação, o processo será extinto, prematuramente, sem que haja apreciação do mérito. Configura-se a ausência do direito de ação, ou na linguagem corrente dos processualistas, efetivamente dá-se a “carência da ação”.

O art. 485 do CPC/2015 aponta a hipótese de não enfrentamento do mérito. A partir da propositura da ação, com a distribuição da petição inicial, o autor passa a nutri o desejo conviver com os efeitos da sentença de mérito, pondo fim ao conflito de interesses.

É indispensável que o autor preencha todos os requisitos formais mínimos que não se confundem com o mérito ou a questão do fundo que determinou a formação do processo.  Os requisitos formais se referem aos pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular processo e a ausência de qualquer deles, acarreta a extinção do processo sem resolução do mérito.

Quase todas as matérias que acarretam a extinção do processo sem apreciação do mérito, são questões de ordem pública[7], onde está patente o interesse do Estado, a premissa que acarreta as seguintes consequências, a saber: as matérias podem e devem ser conhecidas de ofício pelo magistrado e não precluem, podendo e devendo ser enfrentadas a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, exceto pela primeira vez no recurso especial e no recurso extraordinário, em respeito ao requisito do pré-questionamento, que é específico das espécies extremas, cuja ausência determina o não conhecimento de tais recursos, conforme a Súmula 282 do STF (É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada.) [8].

Diante da sentença terminativa que produz efeitos endoprocessuais, limitados ao processo, formando somente a coisa julgada formal, o autor poderá propor ação fundada nos mesmos elementos (parte, causa de pedir e pedido) ou em elementos distintos, quando for possível eliminar o vício que acarretou a extinção[9].

A sentença terminativa e a condenação do autor ou do réu ao pagamento de custas, despesas processuais e dos honorários advocatícios, em verdade não reconhece a existência de um vencido e de um vencedor, segundo as terminologias empregadas pelo artigo 85, deve condenar o autor e o réu ao pagamento de custas, despesas processuais e dos honorários advocatícios, se (no condicional) o réu houve sido citado, comparecendo em juízo e apresentando a defesa, em respeito ao princípio da causalidade.

O primeiro inciso do artigo 485 refere-se ao indeferimento da petição inicial que confirma o reconhecimento de ausência de qualquer das condições da ação, quais sejam, a legitimidade[10] das partes e interesse processual.

A inação[11] processual está indicada nos incisos II e III. Apesar de o Estado ter assumido a tarefa de pacificar os conflitos de interesses, de forma monopolizada e, de o processo ter curso através de impulso oficial, é evidente que o magistrado não atua sozinho, mas em parceria ou colaboração das partes, que devem apoiar o juízo de informações e condições para que o processo tenha seu curso eficaz e regular. O artigo 6º do CPC/2015 é explícito em apontar o princípio da colaboração.

Se o autor não promover a citação do réu, por exemplo, verificamos a ausência de pressupostos de constituição do processo, de confirmação necessária, para garantir a prolação da esperada sentença de mérito.

A jurisprudência consolidada na época do CPC/1973 entendia que a extinção do processo, nas hipóteses examinadas, dependia do prévio aperfeiçoamento da intimação pessoal do autor, não sendo suficiente a intimação feita na pessoa do advogado, conferindo-lhe prazo para a prática dos atos processuais, advertindo-o de que a inação pode determinar a extinção com base nas normas em exame.

Não pode a extinção de o processo ocorrer por determinação de ofício, dependendo da iniciativa do réu, através do requerimento expresso. Nesse sentido é a Súmula 240 do STJ que aduz que: “A extinção do processo por abandono da causa pelo autor depende de requerimento do réu”.

A expressão “pressupostos processuais” corresponde ao gênero que abriga as espécies como os pressupostos de constituição e os de desenvolvimento válido e regular do processo.

Na primeira espécie, integrada pela citação[12], pela existência de uma petição inicial, pela autoridade jurisdicional competente, desimpedida e insuspeita e pela capacidade postulatória, exclusivamente para o autor, observamos que a presença de pressupostos é necessária para afirmar a própria existência do processo.

Na segunda espécie que é naturalmente decorrente da primeira, integrada pela citação válida e regular, pela petição inicial apta e pela autoridade jurisdicional competente, o processo existe, mas há obstáculo formal instransponível impedindo a continuação da relação processual.

Os pressupostos negativos são aqueles não podem estar presentes, correspondentes a perempção, a litispendência e a coisa julgada material[13]. Nas três situações, a sentença terminativa embora criando apenas a coisa julgada[14] formal, cria óbice processual intransponível para o autor, que não terá como remover o vício que acarretou a extinção processual.

A convenção de arbitragem é forma alternativa de solução de conflitos de interesses, constando do contrato[15] firmado entre as partes (pessoas físicas ou jurídicas), versando sobre direito disponível, que admita transação.

Para a instituição de arbitragem, é necessário que os contratantes incluam a intitulada cláusula compromissória no instrumento (art. 4º da Lei 9.307/96), comprometendo-se a submeter à solução de eventuais conflitos surgidos do descumprimento ou da diferença na interpretação de cláusulas a um árbitro, previamente eleito ou não (estipulação não obrigatória).

Proposta a ação, demonstrando o descumprimento de cláusula compromissória[16], o réu pode denunciá-lo como preliminar da contestação, cujo acolhimento acarreta a extinção do processo sem a resolução do mérito, forçando as partes a solucionarem a questão através do árbitro. A matéria não pode ser conhecida de ofício pelo magistrado, por ser de interesse exclusivo das partes.

A desistência da ação não induz necessariamente, a renúncia ao direito material em disputa, a menos que o autor faça expressa referência ao fato, através de petição dirigida ao juízo.

Após o aperfeiçoamento da citação, o acolhimento do pedido de desistência da ação depende da concordância do réu, ou da verificação de que a discordância manifestada é desarrazoada, não liberando o autor de pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, em respeito ao princípio da causalidade, já que o réu foi onerado com a contratação de advogado, como condição para a apresentação da sua defesa.

Melhorando a redação legislativa, o CPC/2015 prevê que a extinção do processo sem a resolução do seu mérito não decorrente propriamente da desistência da ação, mas da homologação da desistência, através de sentença terminativa.

A desistência[17] dependerá da outorga de poderes especiais ao advogado que subscreve a petição em nome do autor, caso este venha manifestá-la nos autos.

Em regra, o falecimento do litigante[18] acarreta a suspensão do processo, objetivando a habilitando de herdeiros ou sucessores, permitindo a sucessão de partes e restabelecimento da marcha processual.

Contudo, em determinadas situações, o falecimento da parte acarreta a extinção do processo sem resolução do mérito, diante da constatação de que o direito em disputa é intransmissível, como ocorre nas ações de família, com destaque para as ações de separação e de divórcio.

Aplicação do artigo 485, IX do CPC/2015 suscita questão controvertida que se refere à possibilidade ou não de extinção da ação de investigação de paternidade[19], em face do falecimento do autor no seu curso.

Registra o artigo 27 do ECA informa que o reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo indisponível, podendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de justiça.

A doutrina destoa no que se refere à possibilidade de ser a ação conduzida pelos sucessores do falecido, na hipótese de morte ocorrer depois da propositura do processo. Theotônio Negrão transcreveu de julgado alusivo à consideração que “diz-se personalíssimo a investigação de paternidade em relação à legitimação[20] ativa, não quanto à legitimação passiva”. (JTJ 177/239)

Em outro entendimento, Marco Antônio Viana textualiza que se a parte morrer antes de iniciá-la, seus herdeiros e sucessores ficarão inibidos para o ajuizamento. Mas, se a instância já estiver instaurada, eles possuem legitimidade para continuá-la. Não obstante o peso da colocação externada, quanto ao entendimento referente ao artigo 27 do ECA que demonstra que a ação apenas pode  ser proposta e conduzida pelo investigante, não se admitindo a habilitação de sucessores no curso processual, em caso de falecimento do legitimado originário.

Portanto, se pode sustentar que o direito ao reconhecimento da filiação legítima seja personalíssimo, mantendo-se o espírito da norma examinada.

Evidentemente que o artigo 485 do CPC/2015 representa um rol exemplificativo. Assim o processo pode ser encerrado sem resolução de mérito quando o magistrado reconhecer a incapacidade da parte, o defeito da representação ou a falta de autorização, com a necessidade de prévia aplicação do artigo 76, resultando a concessão de prazo para que o autor sane a irregularidade, sob pena de o magistrado extinguir o processo, segundo prevê o inciso I do §1º do art. 76; quando o magistrado constatar que o autor brasileiro ou estrangeiro, que reside fora do Brasil ou deixou de residir no país ao longo do processo não prestou caução suficiente ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios de advogado da parte contrária na ação que propôs (art. 83[21]); quando o autor não efetuar o recolhimento das custas, no prazo de quinze dias úteis, contado da sua intimação (art. 290).

A legitimidade da parte é uma das condições necessárias para que o processo seja conduzido até a sentença de mérito corresponde a titularidade ativa e passiva da ação ou, na linguagem de Buzaid, é a pertinência subjetiva da ação.

Sublinhe-se que a legitimidade poderá ser ordinária como extraordinária. Os legitimados [22]originários são os sujeitos da lide, os titulares de interesses conflitantes. São estes: o autor (demandante), quando se apresenta como possível titular do direito material que quer fazer atuar em juízo e, o réu (demandado), quando se coloca na posição de ser pessoa que resiste a pretensão do autor e debatida em juízo, em sendo procedente a ação, irá suportar os efeitos oriundos da sentença.

A legitimidade extraordinária ocorre quando a lei autoriza, em conjunturas excepcionais, a demanda pela parte, em nome próprio, na defesa de direito alheio. Dá-se esse tipo extraordinário de legitimidade a denominação substituição processual[23].

Não se tolera no direito processual civil, o exercício do direito de ação entre pessoas que não sejam os sujeitos da lide ou da relação jurídica material litigiosa, a não ser nos excepcionais casos de substituição processual, que somente ocorrem nas situações especificamente enumeradas em lei, conforme o artigo 18 do CPC/2015.

O CDC prevê no âmbito do ressarcimento do dano[24] ocorrido nas relações de consumo, tanto a ação individual comum, normalmente utilizada pelo consumidor prejudicado, sendo as condições gerais do CPC, como a ação coletiva, exercitável por determinados organismo públicos ou privados em defesa do grupo de pessoas que tenham sido vítimas do mesmo tipo de lesão consumerista, dentro das características peculiares da legislação consumerista.

A legitimação na lei consumerista para pleitear ressarcimento de danos sofridos oriundos de produtos ou serviços, cabe, normalmente às vítimas[25] que possuem a legitimidade direta e, também, aos órgãos instituídos para defesa coletiva dos consumidores, conforme o artigo 82 do CDC, o Ministério Público, a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, certas entidades e órgãos da administração pública direta ou indireta e, por derradeiro, as associações civis organizadas por consumidores. Onde cabe a estes a chamada legitimação concorrente[26].

Inserem-se na ação coletiva de ressarcimento de dano os consumidores na categoria de ações de grupo, que surgiram primeiramente no direito do trabalho e, posteriormente, no campo de aplicação de ação civil pública, ampliado, finalmente pelo CDC.

Os interesses de grupos protegidos por meio de ações coletivas previstas no CDC são de acordo com seu artigo 81, de três espécies, a saber:

a) interesses ou direitos difusos, que vêm a ser chamados de transindividuais, de natureza indivisível, cuja titularidade toca as pessoas indeterminadas e ligadas apenas por circunstâncias de fato;

b) os interesses ou direitos coletivos, que são transindividuais, de natureza indivisível, cuja titularidade cabe a um grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si, ou com a parte contrária por uma relação jurídica de base[27];

c) interesses ou direitos individuais homogêneos, que são perfeitamente divisíveis entre os respectivos titulares, mas se aproximam pela origem comum.

Enquanto que os interesses difusos[28] ou coletivos não caibam aos indivíduos exercê-los isoladamente, porque pertencem ao grupo e não podem ser fatiados entre os indivíduos que o integram (tais como meio ambiente, bens de valor histórico, paisagístico e cultural e, etc), em relação aos direitos individuais homogêneos[29] a situação é completamente oposto, pois cada indivíduo lesado tem direito próprio a exercitar individualmente contra o fornecedor.

No fundo, tais interesses não são coletivos e nem dependem do grupo para serem exercitados, singularmente, pelos interessados. A sua tutela através da ação coletiva decorre de política legislativa inspirada no princípio da economia processual apenas, que se justifica por apresentarem os casos individuais agrupados por certa uniformidade de origem, capaz de lhe conferir coesão suficiente para destaca-los da massa de indivíduos isoladamente considerados.

Neste particular o IRDR[30], o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas adotado pelo CPC/2015 logrará êxito em uniformizar a jurisprudência a respeito das questões de direito, principalmente, com maior respeito ao princípio da isonomia das partes ou da paridade de armas, extinguindo a famélica loteria na distribuição dos feitos processuais.

Sintetizando, os interesses individuais homogêneos tanto podem ser protegidos individualmente em ações movidas pelo ofendido, como também de forma coletiva, em ações de grupo, como aquelas promovidas pelos sindicatos e associações.

A ação civil pública fora inicialmente concebida para a defesa de interesses coletivos, inicialmente difusos e coletivos e, posteriormente fora ampliada para os direitos individuais homogêneos.

Pois não haveria como o Ministério Público utilizar a modalidade de ação para defender direito, ainda que indisponível, mas de titularidade de uma só pessoa. Mesmo sendo in casu hipossuficiente[31], o interessado deveria socorrer-se da Defensoria Pública[32], e não do Ministério Público, pois àquela, e não a este, competia patrocinar ações singulares de litigante carente.

Ao disciplinar as ações coletivas de interesses de consumidores, o CDC concedeu legitimidade ativa concorrente ao MP[33], aos Estados, Municípios, ao DF e à União, aos órgãos e entidades públicos encarregados da defesa dos interesses e direitos dos consumidores e, ainda, às associações legais constituídas há pelo menos um ano e que incluam ente seus fins institucionais a defesa de interesses e direitos protegidos pelo CDC.

Ampliou-se a legitimação para agir, com o objetivo evidente de fomentar a associação, e, consequentemente, a participação da sociedade nas iniciativas de defesa de interesses coletivos e sociais.

A associação civil tem especial relevo quando se refere à defesa dos consumidores e, elevada importância na melhor organização de relações de consumo, pois constituem instrumento de participação da sociedade civil no aperfeiçoamento da política nacional de relações de consumo e, uma forma eficiente de evitar que continue o paternalismo estatal exagerado na proteção do consumidor.

Seguindo este sentido, veio o CDC estipular a isenção de custas, emolumentos, honorários periciais e demais despesas processuais, estabelecendo, igualmente, que não haverá condenação em honorários advocatícios, custas e despesas processuais, exceto se comprovada a má-fé.

Para impedir a prática de abuso em face da ampliação generosa de acesso à justiça e, também, para conferir a adequada representatividade à associação, o legislador fixou o requisito da pré-constituição. E, ainda atribuiu severas sanções à litigância temerária (art. 87, parágrafo único do CDC).

A evidente relevância da socialização das ações coletivas[34] que evita tanto a multiplicação como a banalização de ações individuais, igualmente deve-se proteger o aparelho estatal e os fornecedores de produtos e serviços da conduta abusiva daqueles que tiveram o mais amplo acesso à Justiça, facilitados pela ausência de custas e despesas processuais e se livraram do ônus sucumbenciais.

O CDC presume, portanto, que a associação regularmente constituída há mais de um ano já esteja apta e suficientemente madura e responsável para bem representar a coletividade de seus associados, como se tivesse adquirido a maioridade civil.

Apresenta-se como medida profilática para conter os abusos de formações premeditadas de associações com o único fim de beneficiar-se da irresponsabilidade garantida pelas ações coletivas de proteção dos consumidores. O principal objetivo é o evitar a constituição de pessoa jurídica para tratar de caso específico ou mesmo com escusas finalidades.

É certo que existem associações sérias de defesa dos interesses dos consumidores, já regularmente constituídas, dotadas de autêntica representatividade de associados ou órgãos institucionais de defesa dos interesses sociais, tais como o MP[35] e demais órgãos estatais, todos aptos e capazes para aviar as ações coletivas fundadas, não há porque se enfraquecerem as ações de grupo, franqueando-as a toda e qualquer associação de pessoas que não tenha sido consagrada pela adesão de filiados e resistido ao interregno anual de corresponde a um estágio probatório para sua representatividade e competência.

Só é possível admitir a dispensa deste requisito pré-constituído nas exatas expressões do art. 82,§1º, ou seja, quando houver manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou relevância do bem jurídico a ser protegido.

É com base em tal ordem de valores eu deverá o juiz avaliar a possibilidade de dispensa do requisito de pré-constituição. E, somente mediante decisão devidamente fundamentada é que se admitirá presente a legitimidade ativa de uma recém-criada associação para intentar ações coletivas para defesa de interesses de seus filiados.

Deve-se investigar caso a caso a representatividade da associação autora e, mensurar, em face das ditas características peculiares àquela associação, em especial a sua composição, credibilidade, seriedade e capacidade, se está apta realmente a proteger o relevante bem jurídico.

Em síntese, nesse juízo, o magistrado irá avaliar por meio de juízos de valor objetivos e subjetivos que revelarão fundamentalmente a representação adequada dos direitos perseguidos pela associação autora.

Ressalte-se que não pode a associação usurpar a competência institucional do MP[36] e se dispor a defender universalmente todos os possíveis e imagináveis consumidores não associados.

As ações coletivas previstas no CDC não servem apenas para tutelar os direitos coletivos propriamente ditos, isto é, aqueles indetermináveis em relação aos titulares, ou transindividuais. Outorgou-se também às associações e órgãos previstos no artigo 82 do CDC a legitimidade para promover a defesa de direitos apenas formalmente coletivos.

E, tais direitos, então, foram chamados de individuais homogêneos, porém, classificados como coletivos, porque, apesar de pertencerem a indivíduos determináveis, formariam um todo uniforme.

O critério[37] que nos ajuda a determinar se o direito ou interesse é individual homogêneo é a natureza da pretensão material e da tutela jurisdicional que se busca na ação judicial.

A um só tempo, um mesmo fenômeno jurídico pode alcançar interesses ou direitos difusos e individuais homogêneos. É assim o objeto da demanda, o pedido de provimento jurisdicional, que determinará enfim a classificação do direito do demandante.

Se a pretensão, pois é de tutela a direito plenamente divisível e, são identificáveis seus titulares, tratar-se-á de tutela coletiva quando possam ser formalmente reunidos por terem origem comum e serem homogêneos.

A origem comum será identificada, pois, no mesmo fato jurídico ou em fatos que sejam considerados juridicamente como iguais. Enquanto que o atributo de homogeneidade se refere à qualidade da pretensão de direito material. Porém, os direitos homogêneos devem ser apurados objetivamente, sem que concorram para seu nascimento as características pessoais e as peculiaridades de cada relação de consumo.

Na delimitação dos direitos individuais homogêneos, devem ser desprezadas e necessariamente desconsideradas as peculiaridades agregadas à situação pessoal e diferenciada de cada consumidor, exatamente porque refogem tais aspectos da homogeneidade. E, por essa razão, se assim não tivesse sido previsto inviabilizariam praticamente um pedido a título coletivo, no bojo de uma ação coletiva, no processo de conhecimento.

Se no nexo causal de danos individuais concorrem fatores diversos, ainda que todos os interessados sejam consumidores do mesmo produto, não há do se cogitar em homogeneidade para efeitos da ação coletiva.  Em verdade, nem mesmo a origem comum[38] é identificável. Quando muito, se configura um quadro que reúne os efeitos assemelhados, mas de causas individualmente múltiplas ou diversas.

Imagine os usuários de um determinado automóvel que tenham sofrido acidente, um por defeito do sistema de carburação, outro por deficiência do sistema de iluminação, outro por defeito do sistema de causa ao acidente por imperícia e inadequação de uso do veículo. Todos terão um prejuízo final assemelhado e todos terão usado o mesmo tipo de veículo. No entanto, é evidente que não haverá homogeneidade alguma causação dos eventos.

Para se configurar uma ação coletiva, é preciso descobrir assentar um evento-regra, o que significa, o uso do produto tem de revelar um defeito constante, um resultado objetivo e uniforme e um nexo causal idêntico ligando sempre o mesmo defeito ao mesmo dato, qualitativamente considerado.

A sentença proferida em ação coletiva que defende direitos individuais homogêneos, embora genérica, não pode ser hipotética. Nem, tampouco, simplesmente declaratória de suposições ou meras probabilidades. Esse tipo de sentença[39] tem de chegar a uma conclusão geral, mas que seja certa e positiva.

Não são homogêneos os direitos que dependam de apuração da causa, ou culpa, individualmente, segundo as características da vítima e peculiaridade de fato concreto.

As associações são legitimadas para as ações coletivas em circunstâncias diversas, a saber: a- podem defender, em ação civil pública, direitos difusos ou coletivos (Lei 7.347/1985, art. 5º, inciso V); b- podem defender direitos individuais homogêneos de seus associados, de forma genérica (CDC, art. 82, inciso IV e 91); c) podem, ainda, em ação comum, propor ação em defesa de seus associados, representando-os na forma do art. 5º, inciso XXI, da CF/1988, sem sujeitar-se ao regime procedimental do CDC.

Observa-se que nos dois primeiros casos, ocorre a ação coletiva, em que os possíveis direitos individuais ofendidos são apenas genericamente beneficiados pela sentença de procedência do pleito patrocinado pela associação, como substituta processual.

Cabe a cada consumidor ou interessado promover a liquidação e a execução do prejuízo individual enquadrável na força da condenação genérica.

A execução poderá, também, ser movida coletivamente pela associação, mas, então, o caso será de representação, devendo cada interessado conferir-lhe os poderes para defesa de sua situação individual. É nesse sentido que o artigo 95 do CDC qualifica como genérica a condenação obtida em ação coletiva de defesa de direitos individuais homogêneos.

A ação de cognição desenvolve-se sob o regime de substituição processual, na fase de execução, submete-se ao de representação.

Na terceira situação, a atividade da associação é, desde o início, enquadrada na figura processual da representação, pois, como literalmente prevê o artigo 5º, XXI da CF/1988, as entidades associativas só representam seus filiados em juízo quando expressamente autorizadas.

Quando, então, a associação já ingressa em juízo como representante de seus filiados e, o faz para reclamar direitos individuais destes, desde logo identificados e líquidos, não há de se exigir nova representação para legitimá-la a promover o subsequente cumprimento da sentença ou a liquidação da condenação acaso obtida de forma ilíquida.

O permissivo constitucional, nesse caso, não é de ação coletiva como aquela regulada pelo CDC, é, na verdade, de uma ação singular, com vários titulares previamente definidos, todos os representados pela associação O efeito prático desejado pela regra constitucional é apenas o de simplificar o procedimento, tornando a entidade associativa o sujeito ativo da demanda, para eliminar os inconvenientes do litisconsórcio[40] tradicional.

Portanto, não se hão de aplicar as normas de liquidação e habilitação individuais cogitadas pelos artigos 94 e 98 do CDC. A sentença, sendo líquida quanto à pretensão de cada associado representado pela entidade demandante, terá o respectivo cumprimento promovido pela mesma entidade, não havendo de se cogitar de credores sujeitos a habilitação, nem de créditos genéricos pendentes de liquidação.

Enfim, a associação, nos moldes do art. 5º, inciso XXI, da CF/1988 e que não do art. 91 do CDC, age por legitimação apenas legal. Representa os associados porque estes lhe delegaram a representação que, em última análise, se desempenha no processo.

Não se trata diversamente do regime das ações coletivas do CDC, de simples imposição legal; mas, de representação consentida pela ordem jurídica e autorizada pelos representados. Tendo a associação representação pleno para o foro, habilitada se acha para obter a condenação, bem como para promover a competente execução sem depender de novo ato de legitimação dos associados.

O presente entendimento exposto vale para ação comum intentada por associação, na defesa de interesses individuais perfeitamente identificados e individualizados desde a propositura da demanda.

Se a pretensão deduzida pela associação é genérica não só quantitativamente, mas também subjetivamente, o grupo de interessados se apresenta aberto e não definido com precisão, de maneira que a ação realmente será coletiva e se sujeitará ao regime processual traçado no CPC, para a tutela dos direitos individuais homogêneos, especial no tocante às artigos 95, 97.

A substituição processual se completa com a obtenção da sentença genérica, e a execução terá de se processar, segundo o interesse individual de cada interessado, segundo o regime de representado, caso não queira o próprio credor promover pessoalmente o cumprimento da sentença na parte que lhe diga respeito.

Há vários acórdãos do STJ tendentes a ampliar a legitimação do órgão sindical para agir tanto na ação coletiva como também na execução coletiva na forma de substituto processual e não de representante de seus filiados.

Os sindicatos possuem legitimidade para atuarem nas ações de conhecimento, assim como para proverem a liquidação e execução do julgado, porquanto agem como substituto processual. Trata-se de hipótese de substituição processual e não de representação, o que dispensa a autorização dos substituídos.

A Constituição Federal brasileira assegura outra legitimação para ações coletivas aos sindicatos, a quem é conferida, ex lege, a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas (art. 8ª, III).

As entidades sindicais, portanto, têm legitimidade ativa para demandar em juízo a tutela de direitos subjetivos individuais homogêneos dos integrantes da categoria, desde que guardem relação de potencialidade com os fins institucionais do sindicato demandante.

O sindicato, quando patrocina a defesa de direitos individuais homogêneos da categoria, atua como típico substituto processual, em busca de uma sentença genérica, conforme os termos do art. 95 do CDC, sem qualquer prejuízo a respeito da situação particular dos substituídos. Por essa razão, é dispensável nas ações coletivas sindicais a autorização individual dos substituídos.

Obtida a condenação genérica por obra do sindicato, cabe a cada um dos substituídos, demandar as vantagens individuais, se não forem satisfeitas espontaneamente. Para esse fim, quer isolada ou conjuntamente, será proposta ação de execução da sentença coletiva.

Se escolhida a via coletiva, a execução não mais se dará sob o regime de substituição e, sim de representação. Haverá o sindicato de comprovar a outorga dos exequentes e de liquidar os valores que individualmente correspondem a cada representado.

Para se acessar a execução, não basta invocar a sentença condenatória genérica. A situação individual de cada exequente, ou seja, o fato constitutivo do direito subjetivo de cada interessado tem de ser demonstrado na fase de cumprimento do julgado coletivo.

Os valores e os sujeitos da execução devem ser quantificados e identificados, ao mesmo tempo em que se procede à certificação de situações fático-jurídicas individuais.

A execução coletiva, por meio da entidade sindical, mandato conferido pelos interessados ao sindicato, para a liquidação e execução, prova da situação individual enquadrável na situação reconhecida pela sentença genérica, mensuração do direito subjetivo de cada exequente realizada no procedimento preparatório de liquidação de sentença.

Frise-se, porém, que a jurisprudência do STJ parece estar evoluindo e chegando a admitir que o sindicato atue também como substituto processual e igualmente na execução coletiva.

O STJ consolidou sua jurisprudência na direção de que tanto na fase de conhecimento como na de liquidação ou de cumprimento de sentença proferida em ações onde se discutam os direitos individuais homogêneos e atuação do sindicato se dá na qualidade de substituto processual, sem a necessidade de prévia autorização os trabalhadores.

Com a posição jurisprudencial assumida pelo STF, o STJ veio também enfrentar as divergências internas, adotando, por sua Corte Especial, uma decisão unânime, a mesma tese esposada pelo STF.

É de se recordar, ao durante muito tempo, as duas correntes se formaram no seio do STF[41], a saber: 1. Uma que se baseava em argumento puramente processual para defender a atuação do órgão sindical como simples representante de seus associados, na fase de cumprimento de sentença; 2. Outra que, à luz do direito constitucional, entendia que o intérprete da lei ordinária não poderia reduzir o alcance de uma regra cuja origem se situava no próprio texto constitucional vigente.

A opção por argumentos prevalentemente processuais, contudo, não prevaleceu no STF, visto que se considerou por expressiva maioria que sua adoção conduziria a uma franca redução não desejada pelo texto constitucional vigente, mitigando o acesso à justiça sob o prisma somente processual, numa subversão de hierarquia normativa.

O objetivo da rega maior, ou seja, da CF/1988 teria sido sem dúvida o de fortalecer a atuação judicial dos órgãos sindicais por meio da substituição processual, não havendo razão para enfraquecê-la com a distinção entre o caráter da atuação do sindicato na fase de cognição e a fase de execução.

Enfim, a corrente vitoriosa, ao assentar que nas ações coletivas a entidade sindical é sempre um substituto processual, pouco importando que a atuação se dê durante o procedimento cognitivo ou na fase de cumprimento da sentença, que, dessa maneira, melhor se atenderia a garantia constitucional de duração razoável do processo e de adoção de medidas tendentes à celeridade de sua conclusão (art. 5º, LXXVIII.).

No âmbito do STJ, decidiu-se por unanimidade da Corte Especial que, tendo em vista a pacificação do tema no âmbito do STF, não havia como se manter, naquela Corte, entendimento que dele divergisse.

Destacou a Ministra Nancy Andrighi (relatora) que, aliás, a própria legislação autoriza as entidades sindicais a atuarem como substitutos processuais da categoria que representa, sem qualquer restrição, conforme o art. 3º da Lei 8.073/90. E, da leitura conjunta do que dispõe os artigos 97 e 98 do CDC, verifica-se que a execução coletiva pode ser promovida pelos legitimados a ajuizar a ação de conhecimento.·.

E, se ao sindicato é autorizado o ajuizamento de ação coletiva, razão não há para se impedir que este também atue no cumprimento de sentença proferida. No que se refere às garantias constitucionais, não é dado ao intérprete restringir o que legislador não restringiu.

Ex positivis, concluiu o arresto da Corte Especial d STJ que diante do conceito legal e constitucional da atualidade, que prima pela celeridade e efetividade processuais, a fim de alcançar prestação jurisdicional rápida e efetiva, não há lugar pra então restringir, nestes termos, a garantia constitucional de atuação de sindicatos na defesa de interesses e direitos individuais e coletivos da categoria. Essa interpretação, contudo, não afasta a necessidade de que a execução coletiva indique individualmente, o credor substituído e o valor devido.

 Conclui-se que a tutela coletiva no CDC abrange interesses e direitos coletivos, difusos e individuais homogêneos. Desta forma, a proteção do CDC não os diferencia quanto ao nível de proteção, nem exclui qualquer um destes dos instrumentos de tutela coletiva que prevê a legislação consumerista. Mas percebe-se que existe procedimentos distintos para o conhecimento dos direitos e interesses e a liquidação e execução da sentença do processo coletigo, todos abrangidos pelo CDC.

Referências

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Direitos do Consumidor: a busca de equilíbrio entre as garantias do CDC e os princípios gerais do direito civil e do direito processual civil. 7ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2011.

MONTENEGRO FILHO, Misael. Novo Código de Processo Civil Comentado. 2ª edição. São Paulo: Atlas, 2016.

DE MELO, Nehemias Domingos (coordenador). Novo CPC Anotado. Comentado. Comparado. 2ª edição atualizada com a Lei 13.256/2016. São Paulo: Editora Rumo Legal, 2016.

MEDEIROS GARCIA, Leonardo. Direito do Consumidor. Código Comentado e Jurisprudência. Niterói – RJ: Impetus, 2010.

FREIRE, Alexandre (coordenador executivo) Comentários no código de processo civil. Organizadores: Lenio Luiz Streck, Leonardo Carneiro de Cunha. São Paulo: Saraiva, 2014.

HARTMANN, Rodolfo Kronemberg. Curso Completo do Novo Processo Civil. 3ª edição. Niterói-RJ: Editora Impetus, 2016.

LEITE, Gisele. Novo CPC. Comentários às principais inovações do novo direito processual civil. Campo Grande: Contemplar, 2016.

CARREIRA ALVIM, J. E. Teoria Geral do Processo. 19ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2016.

MEDINA, José Miguel. Direito Processual Civil Brasileiro. 2ª edição. São Paulo: RT, 2016.

GAJARDONI, Fernando da Fonseca; DELLORE, Luiz; ROQUE, André V.; OLIVEIRA JR., Zulmar D. Teoria Geral do Processo. Comentários ao CPC de 2015. Parte Geral Rio de Janeiro: Forense, 2015. São Paulo: Método, 2015.

MAZZOLA, Marcelo. A cláusula opt out de mediação à luz do Novo CPC. Disponível em:  http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI227753,71043-A+clausula+opt+out+de+mediacao+a+luz+do+novo+CPC Acesso em 05.09.2016.

NUNES, Jorge Amaury Maia; DA NÓBREGA, Guilherme Pupe. Alguns aspectos da coisa julgada no novo Código de Processo

Civil. Disponível em:  http://www.migalhas.com.br/ProcessoeProcedimento/106,MI222648,51045-Alguns+aspectos+da+coisa+julgada+no+novo+Codigo+de+Processo+Civil Acesso em 05.09.2016.

ALVIM, Rafael. Intervenção de terceiros no Novo CPC. Disponível em:  http://www.cpcnovo.com.br/blog/2015/09/17/intervencao-de-terceiros-no-novo-cpc/ Acesso em 05.09.2016.

GRECO, Leonardo. Instituições de Processo Civil. Processo de Conhecimento. Volume II. 3ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2016.

TALAMINI, Eduardo. Incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR): pressupostos. Disponível em:  http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI236580,31047-Incidente+de+resolucao+de+demandas+repetitivas+IRDR+pressupostos  Acesso em 05.09.2016.

MARQUES, Cláudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 4ª edição. São Paulo: RT, 2013.

Quadros explicativos:

Modalidade

Divisibilidade do Bem Jurídico

Determinação dos Titulares

Existência da Relação Jurídica

D. Difusos

 Indivisível

 Indeterminados

Não. Ligados por circunstância de fato

D. Coletivos

Indivisível

Determinados

SIM ligados pela relação jurídica-base

Direitos Individuais Homogêneos

Divisível

Determinados ou determináveis

 Irrelevante o que importa é que sejam decorrentes de origem comum

       

Análise da coisa julgada material secundum eventum litis nos direitos difusos e coletivos

 Sentença

Coisa Julgada

Direitos difusos

Direitos coletivos

Precedente

Faz coisa julgada material

Efeito erga omnes

Efeito ultra partes

Improcedente que outro motivo que não a insuficiência de provas

Faz coisa julgada material

Efeito erga omnes

Obs: impede somente nova propositura de ação coletiva. Não impede, entretanto, que os consumidores intentem ações individuais pelos danos individualmente sofridos art. 183,§1º.

Efeito ultra partes

Obs: Impede somente nova propositura de ação coletiva. Não impede, entretanto, que os consumidores intentem ações individuais pelos danos individualmente sofridos (art. 103,§1º).

Improcedente por insuficiência de provas

 Não faz coisa julgada material

Qualquer legitimado do art. 82 poderá intentar novamente a ação coletiva, bastando possuir nova prova.

Qualquer legitimado do art. 82 poderá intentar novamente a ação coletiva bastando possuir nova prova.

       

Análise da coisa julgada material secundum eventum litis nos direitos individuais homogêneos

Sentença

 Coisa Julgada

Direitos Individuais Homogêneos

 

Procedente

Faz coisa julgada material

Efeito erga omnes bastando o consumidor se habilitar na liquidação e promover a execução provando o dano sofrido.

 

Improcedente

 Se o consumidor integrou o processo em litisconsorte, tornando-se parte (art.94) sofre os efeitos da coisa julgada material.

 Consequência não poderá intentar a ação individual pelos danos sofridos

 

Improcedente

Se o consumidor ficou inerte ao processo, não sofre os efeitos da coisa julgada material.

Consequência: poderá intentar a ação individual pelos danos sofridos

 
       

Importante observar que a sentença nas ações coletivas fará coisa julgada

Direitos Difusos

Erga omnes

Exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas

Direitos Coletivos

Ultra partes (ilimitadamente ao grupo, categoria ou classe).

Exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas

Direitos Individuais Homogêneos

Erga omnes

Apenas no caso de procedência do pedido



[1] A partir do momento em que os interesses passam a ser tutelados juridicamente pelo sistema surge o direito. Assim, na prática embora possa ter uma diferença teórica, inexiste razão para diferenciá-los, já que os interesses também são passíveis de ser tutelados, assim como os direitos.

[2] Doutrinariamente, os direitos difusos, coletivos (stricto sensu) e individuais homogêneos são espécies do gênero direitos coletivos lato sensu. Muitos autores divergem quanto à conceituação e amplitude de tais direitos e, na prática, o que se verifica até certa confusão igualmente presente na jurisprudência.

[3] Fredie Didier e Hermes Zaneti apontam que no direito italiano existe a diferença entre direitos e interesses sendo relevante, uma vez que na Itália existe a dualidade de jurisdição. Dessa forma, os direitos subjetivos são julgados pela justiça civil e os interesses legítimos são julgados pelos órgãos da justiça administrativa, existindo, portanto, razão para diferenciá-los, ao contrário do que ocorre no ordenamento jurídico brasileiro, que adotou a unidade de jurisdição.

[4] É verdade que tanto o autor como o réu podem se opor a realização de tal audiência, mas terão que se manifestar tempestivamente e ainda justificadamente. Mesmo assim, poderá o juiz, marcar a dita audiência e tentar a possível conciliação ou mediação.

[5] A Lei 13.140/2015, em seu artigo 2º, § 3º, tem redação distinta: “Pode ser objeto de mediação o conflito que verse sobre direitos disponíveis ou sobre direitos indisponíveis que admitam transação”. E no artigo 3º, § 2º, complementa esta ideia, ao prescrever “O consenso das partes envolvendo direitos indisponíveis, mas transigíveis, deve ser homologado em juízo, exigida a oitiva do Ministério Público”.

[6] Distingue-se da legitimação para a causa a legitimação processual, esta ligada à capacidade.  O absolutamente incapaz não tem legitimação processual, porque é incapaz, mas pode ter legitimação para a causa, pois, suprida sua incapacidade por representação de seu pai, mãe, tutor ou curador, tanto pode ser autor quanto réu.  Por outro lado, pessoa com capacidade plena, tendo, portanto, legitimação para o processo, de regra não tem legitimação para pleitear em nome próprio direito alheio.

[7] Mesmo diante de questões de ordem pública, o CPC/2015 recomenda que o juiz ouça as partes, antes de proferir a sentença terminativa. Isto porque o Código Fux prestigia a primazia do julgamento do mérito bem como o princípio do contraditório dinâmico ou colaborativo. Isto se confirma, pelos artigos 10 e art. 331 (saneamento compartilhado) do CPC/2015.

[8] Convém recordar que o STF tem vedado a interposição de ações civis públicas em matéria tributária ou previdenciária. A jurisprudência tem admitido a possibilidade de ação civil pública, de declaração incidental de inconstitucionalidade.

[9] É flagrante que o Código Fux adotou a maior sanabilidade que possível em termos processuais, admitindo-se mesmo em caso de falta de recolhimento de custas processuais, a punição severa do recolhimento em dobro, diante a falta de preparo recursal. Neste caso, o recurso sem o devido pagamento das custas, deve ser complementado em seus valores, em um prazo de cinco dias, conforme o §2º do artigo 1007.  Somente depois de intimado, permanecendo em inércia, deve ser declarada a deserção, se ainda não remetido para o tribunal, deve negar seguimento, e, se for, não será conhecido em sua admissibilidade. Entretanto, nenhuma novidade sobre este aspecto. Com base no código de 1973, ora revogado, no artigo 511, §2º, já havia a previsão legal desta complementação para o recorrente sanar o vício, realizando o pagamento da diferença do preparo correto e o pago anteriormente.

Sobre a deserção, correto pelo CPC/1973 pensar que o não pagamento gera a inadmissão do recurso, a ausência integral do preparo não pode ser sanada. Contudo, o CPC de 2015 ampliou o aproveitamento processual, pelo princípio da instrumentalidade das formas, almejando a retirada de outros empecilhos formais sobre o preparo para tentar ao máximo chegar ao julgamento de mérito. Entretanto, essa oportunidade de correção do vício da não apresentação do preparo acarretará à parte desidiosa a imposição do pagamento em dobro, justamente por não ter o feito no prazo legal, diferenciando por completo a complementação (pagamento a menor) da segunda chance para realização do preparo (ausência de pagamento). Nesta segunda hipótese, não haverá a possibilidade de intimação posterior se esse pagamento em dobro for a menor, conforme o §5º do artigo 1007.

[10] No caso para se apontar a ilegitimidade da parte, não há mais a intervenção de terceira chamada de nomeação à autoria, tal acertamento de legitimidade deve ser promovido pelo demandado em preliminar da contestação. A nomeação à autoria desaparece desse título, mas o seu espírito está presente nos artigos 338 e 339 do Novo Código como hipóteses de correção da ilegitimidade passiva. Nas palavras de Cássio Scarpinella BUENO: “(…) a nova regra substitui, com inegáveis vantagens, a disciplina da ‘nomeação à autoria’ do CPC atual que, incompreensivelmente, depende da concordância do nomeado para justificar a correção do polo passivo do processo, exigência injustificável em se tratando de processo estatal.”.

[11] A inação processual aponta francamente pela ausência de verdadeiro interesse processual. E, diante da falta desta condição da ação é cabível a extinção de processo sem resolução do mérito. Cumpre ainda assinalar que há o dever das partes em prover a atualização de seus endereços. E, em caso de necessária intimação ou convocação, havendo mudança de endereço, sem o aviso ao juízo, configurar-se-á presumida a intimação bem como a falta de boa-fé processual.

[12] Entre os itens exigidos para petição inicial não existe a exigência de pedir a citação do réu. O NCPC não mais exige que se requeira expressamente a citação do réu, mas agora exige opção do autor pela realização de audiência de conciliação ou de mediação (art. 319). Em ambos os casos, o réu é citado para comparecer à referida audiência de conciliação ou mediação.

[13] O CPC/2015 não mais associa ao conceito de coisa julgada material uma espécie de eficácia que torne imutável a sentença.  A expressão “eficácia”, que nunca foi do agrado dos doutrinadores (no sentido que lhe atribuiu o art. 467 do CPC/1973, sob menção, porque não poderia ter espaço no mesmo rol das outras eficácias conhecidas e consentidas por robusta parcela da doutrina: declaratória, condenatória, constitutiva, executiva e mandamental), foi suprimida e substituída pela expressão “autoridade”. No que concerne aos limites subjetivos da coisa julgada, ainda que alguns pontuais questionamentos doutrinários ainda remanesçam, prevalece o vetusto entendimento de que a coisa julgada é lei para as partes entre as quais é dada, e não pode prejudicar terceiros. Sem embargo disso, eventuais efeitos declaratórios ou constitutivos de uma decisão poderão atingi-los. Se atingidos, poderão em juízo debater especificamente esse aspecto.

[14] A coisa julgada no âmbito das ações coletivas é regida principalmente pelos artigos 103 e 104, ambos do CDC, bem como se aplica subsidiariamente o CPC quanto à parte processual da ação coletiva, além da Lei da Ação Civil Pública e Lei da Ação Popular. A coisa julgada no âmbito do processo coletivo, em regra, só existe para beneficiar as partes integrantes do grupo, categoria ou da classe, possuindo efeitos erga omnes ou ultra partes, variando-se a depender da ação proposta, seja para defesa dos interesses difusos, seja para defesa dos interesses coletivos ou individuais homogêneos. Ressalta-se que os limites objetivos e subjetivos da coisa julgada no âmbito do processo coletivo, não sãos os mesmos adotados no direito individual, ou seja, nas ações individuais. Os limites subjetivos da coisa julgada coletiva serão ultra partes (alcançando além das partes do processo, bem como terceiros não participantes daquela relação jurídica) e erga omnes (a sentença produz efeitos que atingem todos, ainda que não tenha o indivíduo participado do processo).

[15] Tema polêmico e que vem gerando debates no meio acadêmico gira em torno da validade da cláusula opt out de mediação, pela qual os contratantes acordam desde logo que, na hipótese de eventual ação judicial decorrente de controvérsia ou descumprimento do contrato, não têm interesse na realização de audiência de mediação. Essa cláusula de opt out, também conhecida como cláusula de retirada ou auto-exclusão tem inspiração nas class actions dos Estados Unidos, nas quais os representados têm right to opt out, isto é, o direito de se retirar da demanda coletiva ou de não se beneficiar dela. Ao que parece, essa cláusula revela eventual preocupação dos contratantes em aperfeiçoar o tempo na esfera judicial, evitando atos processuais que, na visão deles, seriam desnecessários. Inicialmente, vale registrar que o novo CPC não aborda expressamente a possibilidade de as partes pactuarem esse opt out.

Da mesma forma, a lei 13.140/15 (lei da mediação) não prevê tal possibilidade. Pelo contrário, alguns de seus dispositivos deixam claro que as partes podem inserir cláusulas contratuais prevendo expressamente a mediação extrajudicial, a qual deve ser respeitada pelo árbitro ou pelo magistrado, caso um dos contratantes ignore a disposição e inicie procedimento arbitral ou judicial sem a mediação prévia. Neste sentido, considerando que as partes podem prever a cláusula de mediação, que inclusive deve ser respeitada pelo juiz e pelo árbitro, não vejo óbice para que ajustem uma cláusula opt out, abrindo mão do método de autocomposição, na hipótese de ação judicial decorrente do contrato. Até porque, um dos princípios sagrados da mediação é a voluntariedade.

[16] A 4ª turma do STJ julgou nesta terça-feira, 1º/3, recurso acerca da validade de cláusula compromissória de arbitragem inserida em contrato de adesão, em relação de consumo de compra e venda de imóvel. O colegiado seguiu, à unanimidade, o voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão. Em 1ª e 2ª instâncias foi considerada válida a cláusula arbitral, eis que livremente pactuada entre as partes quando o consumidor adquiriu imóvel na planta direto com a construtora.  O autor do recurso que aportou no STJ é o consumidor. REsp 1.189050. 

[17] Incorporando esse consolidado posicionamento, estipulou também o novo Código de Processo Civil, em seu artigo 485, §5º, o momento da sentença como limitação ao direito de desistência, ao dispor que “a desistência da ação pode ser apresentada até a sentença”. Assim, antes de proferida a sentença, pode o autor, a qualquer momento, desistir da ação por ele proposta, desistência esta que, como analisado anteriormente, produzirá efeitos apenas a partir de sua homologação judicial.

[18] A morte ou incapacitação da parte ou de seu representante legal leciona Eduardo Talamini geram suspensão do processo automaticamente, desde a sua ocorrência. A decisão judicial é apenas declaratória da suspensão (STJ, REsp-ED 270191).  Mesmo que ainda não declarada a suspensão, são írritos os atos processuais realizados a partir daí,  desde que geradores de prejuízo (STJ, REsp-AgRg 1249150). Cogita-se em nulidade, mas relativamente aos sucessores da parte morta as decisões desfavoráveis são absolutamente ineficazes, na medida em que houver violação do contraditório.  Com a morte da parte, o mandato de seu advogado é extinto (Código Civil, art. 682, II; STJ, REsp-AgRg 248625). Se quem faleceu foi o autor, sendo transmissível o direito em litígio, o juiz determina a intimação, conforme o caso, do inventariante, do sucessor ou dos herdeiros, para que se habilitem no processo, no prazo designado; se quem faleceu foi o réu, o juiz determina a intimação do autor para que promova a citação do respectivo espólio, do sucessor ou dos herdeiros, no prazo que designar, em ambos os casos sob pena de extinção do processo.

[19] Importante frisar que quando se tratar de direito irrenunciável e indisponível da parte, mesmo diante a desídia do autor e da manifesta desistência, o MP tem o dever de continuar no processo, principalmente em ações como as investigatórias de paternidade.

[20] Há três correntes doutrinárias para justificar a legitimação para defesa nas ações coletivas. 1. Legitimação extraordinária por substituição processual; 2. Legitimação ordinária das formações sociais; 3. Legitimação autônoma para a condução do processo.  A legitimação ordinária das formações sociais é defendida pelos juristas Ada Pellegrini Grinover e Kazuo Watanabe. Para os doutrinadores, quando as formações sociais estiverem defendendo o grupo de acordo com seus objetivos institucionais estarão atuando como titulares do próprio direito alegado, tendo-se, portanto, legitimação ordinária. Já para Nery Júnior e grande parte da doutrina, a dicotomia clássica a legitimação ordinária – extraordinária, só tem cabimento para a explicação de fenômenos envolvendo direito individual. As ações coletivas na tutela de direitos difusos e coletivos se tratam de legitimação autônoma para a condução do processo, uma vez que legitimado não estará defendendo direito alheio em nome próprio, porque não se pode identificar o titular do direito.

[21] O cerne da questão é o problema do alcance dos efeitos da coisa julgada na ação coletiva proposta contra o grupo.

[22] Pelo sistema da ope judicis, adotada pela class actions americana, a legitimidade será aferida em cada caso concreto pelo juiz competente para o julgamento da ação coletiva Não há um rol previamente estabelecido pela lei. O magistrado é que deverá aferir se a representatividade de possível legitimado é adequada ou não para defender os interesses coletivos. Para tanto, deverá o juiz analisar o objeto da ação proposta e se o possível legitimado possui algum vínculo com o direito coletivo que está defendendo. Já para o sistema ope legis, os legitimados para as ações coletivas são determinados previamente pela lei. A condição de representante adequado é estabelecida pelo legislador. Foi esse o sistema adotado no Brasil. É mencionado no art. 82 do CDC e no art. 5º da LACP são os legitimados a proporem as ações coletivas.

[23] O conceito de substituição processual, construído pela doutrina, pode hoje se extrair exegeticamente do artigo 18º do CP/2015: Ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico. Parágrafo único. Havendo substituição processual, o substituído poderá intervir como assistente litisconsorcial. Tem-se, no habeas corpus impetrado em favor de outrem, claro exemplo de substituição processual.  O impetrante é substituto processual do paciente. O substituto processual é parte, definindo-se como tal quem pede a tutela jurisdicional, assim como aquele em face do qual é formulado o pedido. Em outras palavras, são partes o autor e o réu. Nesse sentido, o substituído não é parte. Contudo, ele sofre os efeitos da sentença. Não está no processo, mas sofre os seus efeitos.  A sentença faz coisa julgada tanto para o substituto quanto para o substituído. Útil para definir a situação do substituído o conceito de parte em sentido material ou de sujeito da lide.

[24] Importante lembrar que: dano de âmbito local, o juízo competente será a justiça estadual local; Dano de âmbito regional, o juízo competente será a Justiça estadual na capital do Estado; dano de âmbito nacional o juízo competente será justiça estadual na capital do estado ou no DF. Causas em que a União, entidade autárquica, empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, o juízo competente será a Justiça Federal.

[25] Existem três conceitos de consumidores, não destinatários finais, mas, sim, elevados por equiparação à categoria de consumidores, merecendo, assim, a proteção estampada na legislação consumerista, sendo eles: a coletividade de pessoas (parágrafo único do art. 2º do CDC), as vítimas do acidente de consumo (art. 17 do CDC) e as pessoas expostas às práticas comerciais (art. 29 do CDC).

[26] Essa legitimidade é, de acordo, com a doutrina, concorrente e disjuntiva. É concorrente porque todas as pessoas e órgãos contidos na norma possuem legitimidade para toda e qualquer ação coletiva, não estabelecendo a lei exclusividade a qualquer deles para uma determinada ação, quer seja de direito difuso, coletivo ou individual homogêneo. Assim, vários os legitimados para a tutela dos direitos coletivos lato sensu. É disjuntiva porque cada legitimado pode isolada e independentemente da vontade dos demais colegitimado, ajuizar a ação coletiva. Caso desejem ajuizar a ação em conjunto, o litisconsórcio será facultativo.

[27] Convém sublinhar que essa relação jurídica-base pode se dar entre os membros do grupo, categoria ou classe (membros de uma determinada associação ou pertencentes a um sindicato) ou com a parte contrária, como os estudantes em relação à determinada escola. Ademais, sublinhe-se que a referida relação jurídica base precisa ser anterior a lesão ao direito do consumidor (caráter de anterioridade) e não nascida com a própria lesão. A ligação é verificável, por exemplo, no momento em que a publicidade é veiculada, ou seja, no momento da lesão. Pois antes da exposição da publicidade não existia qualquer ligação entre os componentes da coletividade lesada, nem tampouco com o fornecedor que veiculou a publicidade. Os interessados se unem exatamente pela circunstância fática que acarreta a lesão.

[28] Constituem categoria unitária própria do universo conflituoso dos interesses supraindividuais. De origem essencialmente processual são os que têm como titulares grande parcela de pessoas não representadas adequadamente. É característica a dificuldade e organização de seus titulares para carrear os recursos ou influência proporcionais e compatíveis com o número e fragilidade dos sujeitos que, em tese, seriam beneficiados pela atividade organizada e pela regulamentação que, pela superação da dispersão, busca-se alcançar.

[29] São aqueles cujo objeto pode ser dividido (divisibilidade de direito) e cujos titulares são perfeitamente identificáveis (titularidade de direito). Não importa se existe uma relação jurídica anterior ou vínculo que uma os titulares entre si ou com a parte contrária. O que caracteriza um direito individual como homogêneo é a origem comum (origem do direito). A relação que se forma com a parte contrária decorre somente da lesão sofrida. Trata-se de uma versão abrasileirada da conhecida class actions norte-americana. A homogeneidade decorrente da origem comum faz surgir, a princípio a possibilidade de defesa de forma coletiva.

[30] A instauração do IRDR pressupõe a “efetiva repetição de processos” em que se controverta “sobre a mesma questão unicamente de direito” (art. 976, I). Portanto, não basta a mera perspectiva de que venham a existir muitos processos em que se discuta a mesma questão jurídica. A multiplicidade de processos já tem de existir, ser “efetiva”, e não meramente potencial. A questão repetitiva não precisa referir-se ao mérito da causa. Pode ser uma questão de direito processual (art. 928, par. ún.). Mas não basta a efetiva reiteração de processos com a mesma questão jurídica. Há um requisito cumulativo (“simultâneo”, diz a lei).  É preciso ainda que exista o risco de violação da isonomia ou da segurança jurídica (art. 976, II) – o que se terá quando a mesma questão jurídica, nos inúmeros processos, estiver recebendo soluções distintas. Se, apesar da reiteração da questão em muitos processos, não se estiver havendo divergência jurisprudencial, com a questão sendo resolvida de modo uniforme na generalidade dos casos, não se justifica o IRDR.

[31] A brilhante doutrinadora Claudia Lima Marques da qual diz que vulnerabilidade é: “Uma situação permanente ou provisória, individual ou coletiva, que fragiliza, enfraquece o sujeito de direitos, desequilibrando a relação de consumo. Vulnerabilidade é uma característica, um estado do sujeito mais fraco, um sinal de necessidade de proteção”. Temos então que a vulnerabilidade elimina a premissa de igualdade entre as partes envolvidas, logo, se um dos polos é vulnerável as partes são desiguais e, justamente por força da desigualdade, é que o vulnerável é protegido pela legislação, com o fim de garantir os princípios constitucionais da isonomia e igualdade nas relações jurídicas minimizando deste modo a desigualdade.  A hipossuficiência por sua vez, não se confunde com a vulnerabilidade, pois se apresentará exclusivamente no campo processual devendo ser observada caso a caso, já que se trata de presunção relativa, então, sempre precisará ser comprovada no caso concreto diante do juiz.

São duas as principais noções de hipossuficiência, segundo a lei: 1º) Aplicação do art. 4º da Lei n.º 1.060/50 (Lei de Assistência Judiciária) revogada pelo CPC/2015, que concede o benefício da justiça gratuita aos que alegarem pobreza e comprovando-a na forma da lei então, considera-se a parte hipossuficiente. 2º) Relaciona-se à inversão do ônus da prova, prevista no inciso VIII do art. 6º do CDC, mas que não se relaciona necessariamente à condição econômica dos envolvidos.

[32] O STJ tem exigido como requisito pra a Defensoria Pública propor a ação coletiva que os beneficiados se enquadrem na condição jurídica de necessitados. Nesse sentido, o voto do Ministro Teori Zavascki no REsp 912849/RS, DJ 28.04.2008: Sé é certo que a Defensoria Pública está investida desses poderes, também é certo que a Constituição estabelece, sob o aspecto subjetivo, um limitador que não pode ser desconsiderado: a Defensoria cumpre a defesa dos necessitados (art. 134, CF), ou seja, dos que comprovarem insuficiência de recursos (art. 5º, LXXIV). [Essa limitação, que restringe a legitimidade ativa a ações visando à tutela de pessoas comprovadamente necessitadas, deve ser tido por implícita no ordenamento infraconstitucional, como, v.g., no art. 4º da LC 80/94 e no art. 5], II da Li 7.347/85. Sustentamos esse entendimento também em sede doutrinária (Processo Coletivo, 2ª edição, SP-RT, p.77) E foi justamente assim que entendeu o STF quando apreciou a constitucionalidade do art. 176, §2º, V e e f da Constituição Estadual do Rio de Janeiro, que trata da legitimação dessa natureza (Adin-MC558-8, Pleno, Min. Sepúlveda Pertence, DJ 26.03.03).

[33] Há posicionamento do STJ no tocante ao estipular a atuação obrigatória do MP nas ações coletivas sob pena de nulidade de atos praticados e, também, estipulando que quando o MP atuar como parte na demanda, será desnecessária a sua atuação como fiscal da lei ou fiscal da ordem jurídica.

[34] O instituto da coisa julgada secundum eventum litis no direito coletivo, segundo Aldo Ferreira da Silva Junior surgiu no Brasil por meio da Lei da Ação Popular ainda no ano de 1965: “O instituto da coisa julgada secundum eventum litis surgiu no Brasil através da Lei nº. 4.417/65, da Ação Popular, em que era permitida a renovação da demanda por qualquer cidadão, desde que com novas provas, nos casos de improcedência por insuficiência probatória na primeira ação.” A doutrina diverge quanto ao termo adotado na formação da coisa julgada nas ações coletivas.

Parte da doutrina defende que a coisa julgada nas ações coletivas, de fato, opera por meio do instituto secundum eventum litis. Eduardo Braga Bacal explica, neste sentido, que: “Conforme já se analisou em momento anterior, tendo a LACP e o CDC acolhido o modelo da coisa julgada secundum eventum litis, resulta que a sentença, transitada em julgado, proferida em ação civil pública, apenas poderá beneficiar o resultado das ações individuais e, portanto, jamais prejudicá-las em caso de improcedência do pedido formulado na ação coletiva.”.

[35] Citamos os exemplos em que tem sido reconhecida, a legitimidade do MP, sob o enfoque da relevância social pelo STJ: Exame da vaidade de cláusula sobre o seguro inserta em contrato de adesão para arrendamento mercantil ou leasing; Exame da legalidade de cláusulas constantes do contrato de plano de saúde; Direito à aquisição de casa própria, obstado pela administração de cooperativa habitacional em detrimento de cooperados; Discussão acerca de cobrança, na vigência do Plano Real, de resíduo de correção monetária acumulada a cada período de 12 meses, além de reajuste da própria prestação, em contrato de promessa de compra e venda imóvel celebrado pela construtora; Tutela de aplicadores de títulos de capitalização, lesados pela atuação irregular de sociedade de capitalização no mercado financeiro; Legitimidade para ajuizar ação civil pública em que se postula a nulidade de cláusula contratual que autoriza a constituição de hipoteca por dívida de terceiro (ENCOL), mesmo após a conclusão da obra ou integralização do preço pelo promitente comprador; Acerca de serviços públicos, quando a lesão deles visualizada em sua dimensão coletiva, pode comprometer interesses sociais relevantes.

[36] Ação civil pública. Revisão do benefício previdenciário Ilegitimidade do MP Trata-se de ação civil pública objetivando, no âmbito da circunscrição judiciária de Francisco Beltrão/PR, a condenação da autarquia previdenciária ao recálculo da renda mensal inicial de todos os benefícios de prestação continuada da Previdência Social concedidos entre o advento da Lei 6.423/77 e a promulgação da CF, com base na Súmula 2 do TRF da 4ª Região, em razão da correção dos benefícios previdenciários concedidos anteriormente à CF/1988 por índices não oficiais, com a consequente implantação das diferenças nos benefícios previdenciários, corrigidas monetariamente, com reflexo em todas as demais verbas devidas (…) (STJ REsp 506457/PR. Rel. Min. Felix Fischer. J. 18.09.2003).

[37] Antonio Gidi ressalta três critérios básicos definidores de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos: o critério subjetivo da titularidade do direito material; o critério objetivo da divisibilidade do direito material e o critério de origem do direito material. Barbosa Moreira, nos ensina que do mesmo modo há por assim dizer uma comunhão indivisível de que participam todos os possíveis interessados, sem que se possa discernir, sequer idealmente, onde acaba a quota de um e começa a de outro. Por isso mesmo, instaura-se entre os destinos dos interessados tão firma união que a satisfação de um só, implica de modo necessário a satisfação de todos, e, reciprocamente, a lesão de um só constitui ipso facto, lesão, da inteira coletividade.

[38] São muito interessantes as observações da douta Ada Pellegrini Grinover no que se refere à caracterização do requisito origem comum que leva à homogeneidade dos direitos individuais. A origem comum (causa) pode ser próxima ou remota. A origem comum próxima ou imediata aconteceria, por exemplo, no caso da queda de avião, vitimando diversas pessoas. Já a origem comum remota ou mediata, aconteceria, por exemplo, no caso de dano à saúde imputado ao produto potencialmente nocivo, que pode ter tido como causa próxima as condições pessoais ou o uso inadequado. Portanto, quanto mais remota for a causa, menos homogêneos serão os direitos individuais.

[39] Importante salientar que ensina José Miguel Medina que: “No NCPC, sentença e decisão interlocutória receberam conceituação diversa. A sentença, no Projeto de NCPC (tanto na versão do Senado, quanto na da Câmara dos Deputados, é definida pelo momento processual em que é proferida (já que “põe fim” ao processo ou “fase” processual) e também pelo conteúdo. A decisão interlocutória, por sua vez, não mais se vincula à ideia de “questão incidente” resolvida no curso do processo, pois, no novo Código, é considerada interlocutória qualquer decisão que não seja sentença, de acordo com parágrafo 2.º do artigo 203 do CPC/2015. Se, de acordo com o CPC/2015 qualquer decisão que não corresponda à descrição de sentença deverá ser considerada interlocutória, é importante ter bem claro que, como antes se mencionou, o CPC/2015 vale-se dos seguintes critérios, cumulativamente, para identificar a sentença (afastando-a, portanto, da decisão interlocutória): a) é decisão final, que “põe fim” ao processo ou a uma de suas “fases”; e b) é decisão definitiva (que resolve o mérito) ou terminativa (que, por ausência de algum requisito processual, não resolve o mérito)”.

[40] Há a possibilidade de litisconsórcio também quando for viável a atuação do MP Federal, na justiça estadual. Dessa forma, não pode ser invocada a divisão da estrutura administrativa do MP para obstar o desempenho de sua função constitucional, que conforme o art. 127, caput da CF/1988, é a de defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis.

[41] Para o STF, a legitimidade para as ações coletivas é extraordinária (substituição processual). Já para Nelson Nery Júnior e boa parte da doutrina brasileira, nas ações coletivas para a tutela de direitos difusos e coletivos há legitimação autônoma para a condução do processo (legitimação ordinária) e, no caso de tutela de direitos individuais homogêneos haveria substituição processual (legitimação extraordinária). A Defensoria Pública tem legitimidade ativa para propor a ação coletiva que foi inserida pelo art. 5º da Lei 7.347/1985.

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Gisele. Legitimidade ad causam na ação coletiva de direitos do consumidor e o CPC/2015. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2016. Disponível em: https://investidura.com.br/colunas/novo-cpc-por-gisele-leite/legitimidade-ad-causam-na-acao-coletiva-de-direitos-do-consumidor-e-o-cpc2015/ Acesso em: 22 nov. 2024