Direito Constitucional

Os Municípios como direito fundamental do povo brasileiro

Municipalities as a fundamental right of Brazilian people

Isabel Cristina Arriel de Queiroz[1]

RESUMO

O objetivo deste trabalho é propiciar a reflexão acerca da importância da autonomia dos Municípios, refletindo sobre os benefícios trazidos à população nestas circunscrições administrativas, através dos estabelecimentos públicos e privados encontrados nas grandes cidades, tais como: hospitais, igrejas, transportes, áreas de lazer em geral, entre outros. Tal fato ocorreu, devido ao desenvolvimento de algumas regiões no país, em que boa parte da população migrou-se para as grandes cidades, com o intuito de adquirir melhores condições de vida.

Iniciaremos nossa reflexão, com a forma federativa de Estado que foi adotada no Brasil em 1889, a partir da Proclamação da República, a exemplo do sucesso trazido pelo modelo de federação norte-americano. Porém, os Estados Unidos apesar de adotarem a federação como forma de Estado, trata o modelo de forma descentralizada, já que seus Estados são dotados de ampla autonomia. Diferentemente do que ocorre no Brasil, que tem como característica ser um Estado centralizador, em que a maioria das competências e repasses são de responsabilidade da União.

Outro fato relevante, é que pelo atual modelo constitucional nota-se que os Municípios são os que recebem a menor parcela dos tributos, bem como são estes os que detêm a menor competência para legislar, já que a maior parte dos tributos e as legislações em vigor são de responsabilidade da União e, posteriormente dos Estados, conforme  previsto no artigo 30 da Constituição Federal.

 Deste modo, os Municípios apesar de terem concentrada em seus territórios grande parte da população, dependem tanto de repasses de outros órgãos públicos (Estado e União) para conseguirem satisfazer os interesses primordiais dos seus habitantes, como da morosidade que é própria sistema executivo.

Com este sistema, são os Municípios e Estados os maiores devedores da União, já que o sistema prevê empréstimos a juros consideráveis, além de ocorrer de maneira totalmente distorcida do modelo ideal previsto para um sistema federativo, qual seja, o empréstimo da União para os seus próprios entes federativos.

Portanto, o que se propõe é a alteração do atual texto constitucional, por meio de emenda, para que os Estados e Municípios possam se beneficiar da maioria dos tributos arrecadados em sua territorialidade, cabendo à União apenas representar o país especialmente no âmbito internacional, a exemplo do modelo de federação norte-americano.

Este modelo proposto não fere a cláusula pétrea prevista no artigo 60, §4º da Constituição Federal que impede a modificação até mesmo por emenda constitucional, já que esta forma federativa de Estado proposta resguarda o conceito primordial de Federação previsto no texto Constitucional de 1988.

Palavras-chave: Municípios, Emenda Constitucional, forma federativa de Estado, modelo norte-americano de federação.

ABSTRACT

The objective of this work is to promote reflection on the importance of the autonomy of municipalities, reflecting on the benefits to the population in these arrondissements, by public and private institutions in the large cities, such as hospitals, churches, transportation, recreation areas groups, among others. This happened due to the development of some regions in the country, where much of the population migrated to the citiesin order to acquire better living conditions.

We will begin our reflection with the federative form of State which was adopted in Brazil in 1889, from the Proclamation of the Republic, the example of the success brought by the American federation model. However, the United States while adopting the federation as a form of state, is the decentralized model, since the states are endowed with wide autonomy. Unlike what happens in Brazil, which is characterized by being a centralized state, where most of the skills and transfers are of responsibility of the Union.

Another relevant factor is that the current constitutional model to note that the municipalities are the ones who receive the smallest share of taxes, and are the ones who hold the least power to legislate, since most of the taxes and laws in force are responsibility of the Union and later the States, as provided for in Article 30 of the Constitution.

Thus, the municipalities although they concentrated on their large population areas, depend as much on other government agencies transfers (State and EU) to achieve meet the best interests of its inhabitants, as the slow pace that is very executive system.

With this system, they are the Municipalities and States the largest debtors of the Union, since the system provides loans to considerable interest, and completely distorted way to occur the ideal model scheduled for a federal system, namely the Union loan the for their own federative.

So what is proposed to change the current Constitution through amendment to the states and municipalities can benefit from most of the taxes collected in their territoriality, with the Union only represent the country especially in the international context, example of the US federation model.

This proposed model does not hurt the planned entrenchment clause in Article 60, paragraph 4 of the Constitution that prevents the modification even by constitutional amendment, as this federative form of State proposal enshrines fundamental concept of Federation set out in the Constitutional text 1988.

Keywords: municipalities, Constitutional Amendment, federal form of government, the American model of federation.

A elite brasileira sempre lutou por modelos de Federação e República, face o sucesso do modelo norte-americano.

Com a proclamação da República no Brasil, veio à tona pelo Decreto n. 01 de 15/11/1889, o nascimento dos Estados Unidos do Brasil e essa formação ocorreu pela união das antigas Províncias que, no momento da República, foram transformadas em Estados.

A união foi permeada pelos ideais e princípios federalistas, tanto que caberiam a esses Estados, no exercício de sua legítima soberania, decretar oportunamente sua Constituição definitiva.

 Historicamente, verifica-se que a federalização no Brasil, apesar de se valer do modelo norte-americano como exemplo, surgiu de forma diferente do modelo federal dos Estados Unidos. O Brasil não era composto de Estados soberanos e autônomos, ao contrário, era formado por um Estado Unitário, embora descentralizado para alguns.

O fato é que havia um poder central e pouca autonomia para os Estados, que foram impedidos de intervir na condução do destino federal. (fonte artigo escrito por Leonardo Scofano Damasceno Peixoto, intitularizado “A autonomia dos municípios na constituição brasileira de 1988”, publicado no site jusbrasil.com.br).

Mesmo que mencionada a “legítima soberania dos Estados” no artigo 3º do aludido Decreto, verifica-se que isso de fato não se concretizou, uma vez que os Estados brasileiros ficaram sujeitos à constante intervenção do poder central, sendo este um dos resquícios de nosso governo unitário.

Apesar de sua vasta extensão, com mais de oito milhões e quinhentos e onze mil quilômetros quadrados, o Brasil desde a sua descoberta por Portugal, revela até hoje uma inegável concentração de poderes num Estado unitário, mantendo-se em regra um poder único.

No modelo atual, a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituindo-se em Estado Democrático de Direito. Nesse modelo de sistema é que se depreende até os dias atuais, uma enorme concentração de poderes “nas mãos” da União.

Com relação aos direitos fundamentais do ser humano, confere o preâmbulo da nossa Constituição Federal que o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça são valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social.

São direitos e garantias fundamentais dos brasileiros e estrangeiros residentes no País, conforme confere o artigo 5º do mesmo texto, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

Também o artigo 6º da lei maior dispõe que são direitos sociais: a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Todos estes direitos, sem sombra de dúvidas, são inerentes a qualquer ser humano.

Ocorre que com o desenvolvimento de algumas regiões do país e em busca de melhores condições de vida, a população brasileira tem optado por viver em aglomerados urbanos, formando assim, as cidades.

Nesse sentido, um estudo realizado pelo Conselho Federal de Serviço Social, disponível no site  http://www.cfess.org.br/arquivos/direitoacidade.pdf[2]”, que trata sobre o tema, dispõe que “O crescimen­to das cidades brasileiras é determinado pela intensa valorização da terra. As políticas de “higienização” com a revitalização de bair­ros ou áreas da cidade valorizadas pelo capi­tal e a violência com a criminalização dos movimentos sociais empurram famílias e gru­pos sociais para as periferias urbanas… atualmente, 60% da população urbana vivem em 224 municípios com mais de 100 mil habitantes, dos quais 94 pertencem a aglomerados urbanos e regiões metropolitanas com mais de um milhão de ha­bitantes “.

Ainda, de acordo com estudos realizados pelo Conselho Federal de Serviço Social, no Brasil 83% da população estão concentradas nas cidades, consideradas como espaços de produção e acumulação de capital e reprodução da vida social.

Cidade, de acordo com o dicionário Michaelis, é uma Povoação de primeira categoria em um país; no Brasil, toda sede de município, qualquer que seja a sua importância” (grifamos).

 De acordo com o dicionário Aurélio, cidade é a povoação que corresponde a uma categoria administrativa (em Portugal, superior a vila), geralmente caracterizada por um número elevado de habitantes, por elevada densidade populacional e por determinadas infraestruturas, cuja maioria da população trabalha na indústria ou nos serviços.

 Segundo o artigo 30 do texto constitucional, compete aos Municípios, legislar sobre assuntos de interesse local, suplementando a legislação federal e estadual no que couber; instituir e arrecadar tributos de sua competência, devendo prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados por lei; manter e prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação e atendimento à saúde da população.

Conforme previsto no texto constitucional, infelizmente a competência para legislar sobre a maioria dos assuntos foi conferida à União e aos Estados e pouco ficou a critério dos Municípios, apesar de nestes estar concentrada a maior parte da população.

Quanto à divisão de receitas tributárias, a situação não foi diferente já que a maioria delas fica sob a responsabilidade da União e posteriormente, dos Estados, restando aos Municípios apenas a pequena arrecadação conseguida por sua competência e outros repasses realizados pela União e pelos Estados.

O artigo 158 da Constituição Federal dispõe, dentre outros assuntos que pertencem aos Municípios :  I – o produto da arrecadação do imposto da União sobre renda e proventos de qualquer natureza, incidente na fonte, sobre rendimentos pagos, a qualquer título, por eles, suas autarquias e pelas fundações que instituírem e mantiverem;  II – 50% do produto da arrecadação do imposto da União sobre a propriedade territorial rural, relativamente aos imóveis neles situados, cabendo a totalidade na hipótese da opção a que se refere o art. 153, § 4º, III; III – 50% da arrecadação do imposto do Estado sobre a propriedade de veículos automotores licenciados em seus territórios; 25% vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.

Conforme previsto no artigo 159, a União entregará parte do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados. Dos 49% (quarenta e nove por cento) repassados, apenas vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento do Fundo de participação cabem aos Municípios e mais de um por cento do Fundo de Participação dos Municípios é entregue no primeiro decêndio do mês de dezembro de cada ano e 1% (um por cento) no primeiro decêndio do mês de julho de cada ano.

Dos recursos arrecadados pelos Estados, 25% (vinte e cinco por cento) devem ser também repassados aos Municípios.

O artigo 160, veda a retenção ou qualquer restrição à entrega e ao emprego dos recursos atribuídos, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, mas isso não impede a União e os Estados de condicionarem a entrega destes recursos.

A lei 9.846, de 26 de outubro de 1999, estabelece critérios para a concessão de empréstimo pela União aos Estados e ao Distrito Federal, destinado ao ressarcimento parcial de eventuais perdas líquidas imputadas àquelas unidades da federação, decorrentes da aplicação da Lei no 9.424, de 24 de dezembro de 1996.

As dívidas dos Estados e dos Municípios começaram a se cristalizar na década de 70, quando a gestão tributária centralizadora da União no regime militar comprometia a capacidade de gerar receita dos governos subnacionais.

É fato notório em nossos dias, que os Municípios vivem em constantes dívidas com a União e, por consequência, deixam de receber repasses para cobrirem suas despesas cotidianas.

A respeito, veja-se matéria publicada no site do senado[3]:

Em março passado, os 26 estados e o Distrito Federal deviam à União R$ 416.599.605, segundo o Banco Central. Do total, 76,8% estão concentrados em quatro estados, justamente os de maior poderio econômico: São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. A cidade de São Paulo é a terceira maior devedora individual do Tesouro Nacional, acrescentando outros R$ 57 bilhões ao valor. Portanto, trata-se de um contencioso financeiro próximo de meio trilhão de reais, construído, em grande parte, a partir de contratos de renegociação assinados entre os estados e o governo federal, no final do século passado.

Passados 15 anos, estados e municípios reivindicam uma revisão dos critérios usados nos acordos, que estariam sobrecarregando fortemente as finanças dos entes federados, prejudicando ­sobremaneira a capacidade de ­investimento deles.

Além dos repasses e empréstimos oferecidos pela União aos seus próprios entes federados, também constatamos que nas regiões com maior concentração de pessoas, no caso os Municípios, a prestação de serviços de atendimento à saúde da população também depende da cooperação técnica e financeira da União e do Estado. 

A saúde constitui-se como um direito à vida. Logo, tal direito não se limita apenas ao direito de não morrer, mas sim o de viver com dignidade. 

Em dezembro/2013[4], a Auditoria Cidadã da Dívida encaminhou carta ao Senado, alertando para a situação caótica dos Estados e Municípios, cujo trecho coleciona-se in verbis:

“O endividamento é o principal entrave ao atendimento imediato dos direitos reivindicados por milhões de brasileiros(as), objeto das diversas manifestações populares ocorridas durante o mês de junho. Em centenas de cidades de nosso País, o povo foi às ruas reivindicando melhoria dos serviços de saúde, educação, transporte, segurança, dentre outros.

A situação dos Estados e Municípios fica ainda mais agravada diante da contínua transferência de atribuições que antes eram assumidas pela União, ao mesmo tempo em que as receitas tributárias são fortemente concentradas na esfera federal, como mostra o gráfico a seguir.

Além desse panorama desfavorável relacionado aos recursos dos entes federados e desequilíbrio para o atendimento aos direitos sociais da população, o processo de endividamento público de Estados e Municípios tem subtraído grande parte de seus respectivos orçamentos, agravando ainda mais a situação financeira desses entes federados. Essa situação tem levado Estados e Municípios ao absurdo de contrair dívidas externas (junto ao Banco Mundial e junto a bancos privados internacionais) para obter recursos para pagar ao Tesouro Nacional.”

A lei 10.257, de 10 de julho de 2001, que estabelece diretrizes gerais da política urbana, determina em seu artigo 2º, parágrafo I, que “A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais, garantindo o direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações”.

Dentro deste contexto, observamos que constituem-se como objetos fundamentais da República Federativa do Brasil, segundo o artigo 3º do texto constitucional, construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Nesse caso, já se vislumbra perante o texto constitucional aqui exposto que há um total descaso com a valoração dos Municípios, embora ocorra nestes a concentração da maior parte da população, tornando-os responsáveis pela concessão dos direitos sociais básicos, conforme previsto no artigo 6º da Constituição Federal de 1988, sendo estes: a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados.

 Nota-se, no entanto, que apesar de existirem estes direitos sociais previstos aos brasileiros na Constituição Federal de 1988, verificamos que na prática isso não ocorre, pois temos atualmente condições precárias de moradia, de apropriação do espaço urbano, de distribuição de renda, de relações de trabalho, além da violência urbana e devastação ambiental, problemas estes ocasionados pela falta de fiscalização e omissão do Estado Brasileiro.

 É extremamente necessário, garantir à população os serviços básicos de infraestrutura, como: o acesso ao saneamento básico, a iluminação e ao transporte públicos, à proteção aos bens públicos e culturais, à conservação das ruas, praças, hospitais, igrejas, lazer, como garantia ao bem estar de qualquer ser humano.

 A Constituição Federal confere como valores supremos do Estado Brasileiro o bem estar e o desenvolvimento social e se os mesmos não forem proporcionados à sociedade que deles dependa, haverá o descumprimento à lei maior, configurando-se num retrocesso social e na desobediência das normas constitucionais que deveriam reger as relações do Estado com os seus representados, seu povo.

 Sabemos que povo é um conjunto de indivíduos que, num dado momento histórico, constitui uma nação e todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes (art.1, §1º da Constituição Federal) e que aos representantes, cabe gerir o dinheiro e patrimônio público, zelando pelo bem estar da população, sob a pena deste próprio povo destituir seus representantes, porém, é lamentável perceber que o povo brasileiro desconheça o seu próprio poder, apesar das mudanças históricas no mundo demonstrarem que este pode atuar como protagonista. Porém, como não existe a consciência disto, as pessoas são escravizadas pelas suas próprias omissões e por depositarem seus interesses “nas mãos’’ do Estado e das instituições. 

 Nesse sentido, é necessário refletirmos sobre a importância da autonomia dos Municípios para o melhor atendimento à população que neles habita e depende, isso deve ocorrer com a mudança constitucional para que atenda de fato aos anseios atuais da sociedade, conferindo aos Municípios mais poderes para atuar diante da proximidade com o seu povo. 

 A atual distância existente entre o povo e a União (Estado unitário) neste modelo em vigor de federação brasileira, distancia ainda mais a população dos seus direitos constitucionais, levando-a ao descontentamento, à revolta e indignação com o sistema existente.

 Segundo os ensinamentos do Professor Miguel Reale, “os fatos sociais recebem inevitavelmente uma carga de valoração humana e o direito deve acompanhar estes diferentes momentos e valores requeridos pela sociedade’’.

 O filósofo Kant já afirmava que a “produção, em um ser racional, da capacidade de escolher os próprios fins em geral e consequentemente de ser livre, deve-se à cultura”. Deste modo, o direito é filho da cultura humana.

 Diante destas afirmações, verificamos que só o povo é capaz de buscar esse ideal, pleiteando coletivamente pela reforma do texto constitucional para alcançar um verdadeiro modelo federativo que dê aos Municípios maior autonomia e repasses financeiros, face à proximidade com os que nele habitam e dependem para sobreviverem com dignidade, sendo fundamental o direito de pertencer à sociedade ao qual se integra.

Torna-se necessário integrar uma norma à atividade regulada, pois as normas não podem ser interpretadas distanciadas do direito político, econômico e social em que devem ser aplicadas.  Nesse caso, a reforma das competências atribuídas aos Municípios, Estados e União, bem como uma mudança na forma da repartição das receitas estabelecidas no atual texto constitucional.

 Desse modo, conclui-se que Federação é um modelo no qual o Estado é composto por diversas entidades autônomas dotadas de governo próprio. Como regra geral, são os estados federados que se unem para constituir a federação, ou seja, o “Estado federal” e este deve ser considerado soberano, inclusive para fins de direito internacional.

 O que se vê, é que no Brasil a interpretação desse modelo federativo da forma que foi disposta no texto constitucional desvitua por completo a verdadeira essência do modelo federativo a que serviu de modelo, no caso o norte-americano, e assim, desestabiliza todo o sistema, distanciando-se o povo e suas necessidades do próprio Estado, à exemplo do distanciamento realizado nos Municípios.

A reforma do texto constitucional aqui proposta, não fere a qualquer cláusula pétrea estabelecida no artigo 60, §4, I da Constituição Federal,  já que as competências e repasses aos Municípios não estão acobertados por este manto. Assim, o sistema federativo seria mantido em conformidade com o modelo que rege o sistema norte-americano, ao qual inspirou os brasileiros quando optaram por este modelo de Estado.



[1] Mestranda em Direito Constitucional pela PUC/SP, pós-graduada em Direito Constitucional Aplicado, pós-graduada em Direito Civil e Processo Civil, pós-graduada em Direito e Processo Administrativo, advogada.

[2] Raquel Rolnik, Le Monde Diplomati­que Brasil, agosto de 2008.

[3] (fonte  http://www.senado.gov.br/noticias/Jornal/emdiscussao/contas-públicas/contexto/estadose-municipios-aumentam-a-pressao-para-mudar-os-termos-dos-contratos-dos-quase-r-500-bilhoes-em-dividas-que-tem-com-a-uniao.aspx, titularizado “Estados e municípios aumentam a pressão para mudar os termos dos contratos dos quase R$ 500 bilhões em dívidas que têm com a União”, publicado em 2013). 

[4] Publicado em 06/11/2014 – Secretaria da Receita Federal e CONFAZ. Elaboração: Auditoria Cidadã da Dívida  Fonte: http://www.auditoriacidada.org.br/senado-aprova-alteracao-nas-taxas-de-juros-das-dividas-de-estados-e-municipios-com-a-uniao/

Como citar e referenciar este artigo:
QUEIROZ, Isabel Cristina Arriel de. Os Municípios como direito fundamental do povo brasileiro. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2016. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/os-municipios-como-direito-fundamental-do-povo-brasileiro/ Acesso em: 10 mar. 2025