Sociedade

Homoafetividade: um novo substantivo

Homoafetividade: um novo substantivo

 

 

Maria Berenice Dias*

 

 

Não adianta procurar no dicionário, não está lá, ainda… Mas é uma expressão que já se incorporou ao idioma, não só ao nosso, mas também ao espanhol e ao inglês, passando-se a falar em “uniones homoafectivas” e “homoaffective unions”.

 

Há palavras que carregam o estigma do preconceito. Assim, o afeto a pessoa do mesmo sexo chamava-se “homossexualismo”. Reconhecida a inconveniência do sufixo “ismo”,  que está ligado a doença, passou-se a falar em “homossexualidade”, que sinaliza um determinado jeito de ser. Tal mudança, no entanto, não foi suficiente para pôr fim ao repúdio social ao amor entre iguais.

 

            A marca da discriminação resta evidente na omissão da lei em reconhecer direitos aos homossexuais. A negativa do legislador revela nítida postura punitiva, pois condena à invisibilidade os vínculos afetivos envolvendo pessoas da mesma identidade sexual.

 

            Ao denunciar esta evidente afronta à dignidade humana e aos princípios constitucionais da liberdade e igualdade, acabei por cunhar o neologismo “homoafetividade”, na obra intitulada “União Homossexual, o Preconceito e a Justiça”, cuja primeira edição é do ano de 2000. Na primeira decisão judicial que reconheceu direitos sucessórios ao parceiro sobrevivente, que data de 14 de março de 2001 (AC 7000138982, Rel. Des. José Carlos Teixeira Georgis), a expressão já foi utilizada, tendo sido referida no último julgamento do STJ, de 7 de março de 2006, em que foram assegurados direitos previdenciários às uniões homoafetivas (REsp 238.715, Relator Min. Humberto Gomes de Barros).

 

Não há como deixar de reconhecer que a expressão “homoafetividade” acabou por ser incorporada ao vocabulário jurídico. Passou-se, agora, a falar em filiação homoafetiva, e até a ser preconizado o surgimento de um novo ramo do Direito: Direito Homoafetivo, estando a surgir muitos escritórios especializados nesta área.

 

Claro que uma palavra não vai acabar com o preconceito ou eliminar a discriminação, mas o importante é o reconhecimento de que as uniões dos homossexuais são vínculos afetivos e, por isso, merecem ser inseridas no Direito das Famílias, cujo âmbito de abrangência é a identificação de um elo de afetividade.

 

Já é um bom começo na busca de uma Justiça mais igual!

 

 

* Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM

 

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Como citar e referenciar este artigo:
DIAS, Maria Berenice. Homoafetividade: um novo substantivo. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2004. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/sociedade/homoafetividade-um-novo-substantivo/ Acesso em: 21 nov. 2024