Processo Civil

Tipologia do conflito: do nascimento à classificação do conceito

RESUMO Este trabalho faz uma abordagem sobre as diversas nuances que envolvem o conflito, sua evolução histórica, tipos e questões, e como pode servir – numa abordagem mais moderna, como mola propulsora para o surgimento de grandes idéias, a partir da discussão de visões diferentes sobre um determinado tema, além de ser utilizado também como motivação para criação e ampliação de meios alternativos de dirimir crises que ocorrem no seio da sociedade em função da divergência de opiniões.

Palavras-Chave: Conflito – Motivação – Divergência.

1. INTRODUÇÃO A origem da palavra conflito vem do latim conflictus, particípio passado de confligere, que significa bater junto, estar em desavença. A análise etimológica do conceito nos traz à tona situações em que opiniões entram em choque, podendo ser exteriores ao indivíduo quando se trata de si mesmo e da sociedade, ou intrapsíquicas quando se refere a forças conflitantes no interior do indivíduo.

Desde os primórdios da evolução do homem o conflito é característica presente independente do nível intelectual de seus membros, pois faz parte da sociedade a contraposição de idéias e visões acerca de determinado fato, corroborando com Oliveira, 2007, p. 9: A sociedade é constituída por organizações sociais, grupos e indivíduos que possuem percepções e perspectivas próprias da realidade que os circunda. Dado isto, o conflito encontra-se presente na sociedade, uma vez que cada grupo e/ou indivíduo apresenta as suas convicções, podendo estas colidir. O conflito possui diferentes naturezas podendo ser de interesses, necessidades, de opinião e pode ser inclusive amigável, passando a ter uma conotação de necessidade de negociação e não exatamente de embate entre pessoas. Na maioria dos casos as divergências de opiniões se dão pela dificuldade que as pessoas têm de estabelecer um diálogo e se comunicarem, fazendo com que haja dificuldade para sanar os problemas em função da própria incapacidade de identificar a raiz do conflito ou os aspectos intrínsecos que redundam nele. A falta de habilidade que geralmente se vê nas pessoas para solucionar situações conflituosas pode fazer com que venha a tona a ideia de evitá-lo como forma de fuga, face a noção paradigmática de que exista somente pontos negativos no conflito, como é natural de acontecer, sendo importante salientar que no momento da divergência procuremos também alternativas de tratá-lo de modo construtivo, conforme explica Martinelli e Almeida (2009, p. 46): Existem então duas maneiras de encarar o conflito: uma negativista, que encara o conflito como apenas prejudicial, devendo ser evitado a todo custo e, não se podendo evitá-lo, pelo menos dever-se-ia buscar minimizar seus efeitos. A segunda alternativa é a de encarar o conflito de maneira positiva, procurando verificar aquilo que pode trazer de benéfico, em termos de diferenças de opiniões e visões, bem como de possibilidades de aprendizagem e enriquecimento em termos pessoais e culturais. Nesse caso, já que existem também aspectos negativos, deve-se buscar minimizar seus efeitos, reforçando-se, por outro lado, todos os aspectos positivos que possam advir do conflito.

A caracterização que é dada na tipologia de conflitos é uma forma de se conhecer melhor a origem da desavença e a melhor estratégia de tratá-lo de acordo com sua especificidade, ressaltando que neste processo de globalização em que há uma maior interação entre as pessoas, é cada vez mais tendencioso que situações de divergências se ampliem, sendo fato que enquanto houver relações sociais entre as pessoas sempre teremos opiniões contrariadas ou ameaçadas em busca de uma verdade que seja absoluta na visão parcial dos indivíduos. 2. A EVOLUÇÃO HISTORICA DO CONCEITO DE CONFLITO. Com o desenvolvimento e o crescimento da população e as grandes diversidades de culturas e costumes presentes nas sociedades modernas, torna-se inevitável a existência do conflito social. Infelizmente, somos vulneráveis aos atritos rotineiros da vida humana, e mesmo nos tempos primitivos, de onde surgiram as primeiras descobertas, já buscávamos soluções para os conflitos, como a elaboração de regras de conduta social, ou através de um terceiro a decidir sobre uma contenda, aplicando as normas vigentes, com o objetivo de alcançar a pacificação da vida comunitária. Nesse sentido, afirma Vasconcelos (2008, p.19) que “(…) conflito ou dissenso é fenômeno inerente às relações humanas. É fruto de percepções e posições divergentes quanto a fatos e condutas que envolvem expectativas, valores ou interesses comuns.” É importante salientar que ao se tratar sobre o conceito de conflito é necessário observar sua evolução desde os primórdios até os dias contemporâneos, pois significativas mudanças socioeconômicas, culturais e ideológicas, trouxeram novas nuances para o conceito de conflito, como destaca Vasconcelos (2008, p.21): A evolução do conflito e suas manifestações degeneradas pela violência variam consoante a circunstancia intersubjetiva histórica, social, cultural e econômica. Mais de noventa e nove por cento da história da humanidade foi vivenciada por nossos ancestrais nômades. Eles viviam da caça da pesca e da coleta de mantimentos. O espaço era teoricamente ilimitado, os recursos eram maleáveis. Inexistiam castas, classes sociais, estados ou hierarquia.

Destarte, após o surgimento das primeiras civilizações e as primeiras relações sociais entre os homens antigos, ocorreram complexas transformações sociais, à medida que o homem passou de nômade a um ser sedentário, com o domínio das técnicas de agricultura e dos animais selvagens, passando a existir uma relação de controle e domínio entre os mais fortes e poderosos e os mais fracos e com menos poder. Com efeito, a dinâmica social e a descoberta de novas terras para exploração e colonização, fez com que as nações se desenvolvessem passando de simples cidades-estado, para grandes estados nacionais, com o auge das monarquias absolutistas, e após as sangrentas revoluções sociais, chegamos a ideia de estado moderno, regidos sob a égide de uma constituição, norteadora dos fundamentos desse estado. Após todo esse processo de desenvolvimento histórico, é de fácil percepção que os conflitos sempre estiveram presentes em qualquer meio social tendo em vista a grande diversidade de interesses, mudando-se apenas suas formas de resolução de acordo com as normas de cada sociedade. No entanto, é fundamental ressaltar que com a globalização e a interdependência comercial entre as nações, oriunda do capitalismo financeiro, os conflitos deixaram de ser locais e tornaram-se globais. Há agora uma profunda e complexa relação de interesses entre as nações, e um conflito, inicialmente local, inevitavelmente repercutirá em todo o globo, tendo como expressão máxima as duas grandes guerras que ocorreram no século passado, que podemos afirmar ser o auge das consequencias das discórdias e divergências humanas, com prejuízos incalculáveis, e a morte de incontáveis inocentes. Destarte, no início das décadas de 1950 e 1960, o desenvolvimento de armas nucleares e as tensões entre as superpotências, Estados Unidos e União Soviética, mais uma vez pareceu estar ameaçada a sobrevivência humana. No entanto, durante a evolução dos conflitos eminentes nesse período, esta nova configuração modificou a ordem mundial, dando a origem a novas idéias e novos conceitos de conflito, com uma melhor compreensão dos conflitos internacionais, que ocorreram de maneira indireta, sem necessariamente um confronto direto entre as superpotências, limitando-se a corrida armamentista, espacial, e domínio sobre as demais nações através de seus sistemas econômicos. Por outro lado, tomando como base as primeiras raízes do campo de investigação da paz e movimentos de não violência, identificam-se indivíduos que contribuíram de forma estratégica para o desenvolvimento da teoria e da prática de resolução de conflitos. Destacam-se como exemplo de indivíduos que contribuíram nesta evolução Mahatma Gandhi, Nelson Mandela, Martin Luther King, dentre muitos outros precursores.

Destarte, pode-se constatar que o problema do conflito está comumente relacionado ao fato de insistirmos em obter a satisfação dos nossos interesses somente de um único modo, sempre do nosso jeito. Queremos o que queremos e quando queremos e não nos importamos com as consequências futuras. É justamente daí que surgem as guerras e contendas. Idealizamos desejos, e não os alcançamos; vivemos lutando e fazendo guerras constantemente. No entanto, nota-se que um ponto determinante para a resolução desses conflitos inicialmente era a mediação, que de acordo com Barbosa (2006, p.7) “se enquadra como espaço de criatividade pessoal e social, sendo um mecanismo de acesso à cidadania”. Na visão de Moore (1998): A mediação de conflitos é geralmente definida como a interferência consentida de uma terceira parte em uma negociação ou em um conflito instalado, com poder de decisão limitado, cujo objetivo é conduzir o processo em direção a um acordo satisfatório, construído voluntariamente pelas partes, e, portanto mutuamente aceitável com relação às questões em disputa. Desta forma, em uma mediação de conflito entre dois indivíduos, será estritamente importante a presença de um mediador, pois assim as partes poderão ter seu dialogo interposto por um terceiro hábil para esse tipo de situação, havendo uma grande possibilidade, a depender do nível de civilidade das pessoas envolvidas, de se chegar a um acordo recíproco às partes, resolvendo de forma amigável o conflito e atingindo a pacificação social. Esta atividade foi introduzida no Brasil na década de 80, porém, somente nos anos 90 é que surgiu interesse na área familiar, tendo como referência a Argentina, Estados Unidos, França e Espanha, onde os profissionais buscaram conhecimentos para poder aplicá-la no Brasil. O instituto da mediação promove o direito fundamental de acesso à justiça, representando um importante instrumento de efetivação da cidadania e da pacificação social. Ao contextualizarmos o tema no que diz respeito ao Brasil é bastante válido destacar o que Carneiro (2010) apud Sales e Carvalho (2006, p.74) apresenta em seu artigo sobre o tema da mediação: Desde 1998, tramita no Congresso Nacional brasileiro um Projeto de Lei da ex-Deputada Federal Zulaiê Cobra Ribeiro, sob o nº 4.827/98, alterado pela versão consensuada em 2003 e pouco depois alterado pelo voto do Relator atual do Projeto, senador Pedro Simon, que institucionaliza e disciplina a mediação como forma de se prevenir e solucionar litígios de forma amigável e positiva para as partes. O referido projeto propõe duas formas de mediação: a mediação prévia (pré-processual) e incidental (depois de iniciado o processo), ambas de cunho facultativo, podendo ser realizadas por mediadores judiciais (advogados com três anos de experiência jurídica) ou extrajudiciais (profissionais de outras áreas que atuam com mediação). Esse procedimento está crescendo gradativamente no Brasil, principalmente com a implantação de núcleos de mediação, conciliação, negociação e demais meios não adversariais de resolução de conflitos, mesmo ainda não havendo regulamentação no país por força de lei. 3. TIPOLOGIA DE CONFLITOS Muito se ouve falar de conflito, mais poucos sabem que são classificáveis e que cada um se caracteriza pela sua definição. De acordo com Daniel (2011, p.17), “(…) os conflitos podem ser analisados em dois sentidos, quando visto do estado de ânimo objetivo, e quando visto do estado de ânimo das partes conflitantes”. O objetivo deste capítulo é explanar as diferentes tipologias de conflitos, tomando como base a teoria elaborada por Boulding, por meio de uma tabela onde são discriminados conforme relacionamento, diferenças de personalidades, de informação, percepção, valores, crenças, dentre outros. Destarte, tomando como referência a tabela de Boulding, Deutsch elaborou uma classificação de conflito mais completa por analisar não somente a controvérsia de opinião das partes, mas analisando também o contexto social. Desta forma, estudaremos a tipologia de conflito pela teoria de Deutsch que os separam em seis tipos elencados abaixo. Conflito Verídico: é o conflito “real” e ocorre porque não há compatibilidade de objetivo, ou seja, ambas as partes desejam o mesmo objetivo, porém são impossibilitadas de terem por não haver como solucionar sem que uma ceda para outra, para Deutsch (1973), essa situação se resolveria com o uso de arbitragem vinculante. Deutsch (1973), afirma ainda que são difíceis de serem solucionados amigavelmente, pois uma das partes terá que abrir mão do seu direito para que a outra seja privilegiada. Destarte, o conflito pode ser solucionado de forma amigável, desde que haja cooperação de ambas as partes no sentido de estabelecer o que é prioridade ou que possam concordar sobre um mecanismo institucional imparcial ao qual estejam de acordo para solucionarem juntas o motivo que gerou o conflito.

Conflito Contingente: Ocorre quando é necessária determinada circunstância rearranjável para a existência do conflito, ou seja, que haja uma segunda alternativa, mesmo que não seja ainda reconhecida pelas partes como solução. O que difere o conflito verídico deste é exatamente a existência de um meio alternativo de solução. No conflito contingente apenas são difíceis de resolução os conflitos em que as partes não estão abertas a flexibilidade. Este apresenta claramente uma segunda opção aos conflitantes, impedindo assim que venham sair em total desvantagem na negociação. Nesse sentido, um conflito obviamente tem consequências destrutivas se seus participantes estão insatisfeitos com as conclusões e sentem, como resultado do conflito, que perderam. Similarmente, um conflito tem consequências produtivas se todos os participantes estão satisfeitos com os efeitos e sentem que, resolvido o conflito, ganharam. Também, na maioria das vezes, conforme Deutsch (1973), um conflito cujos efeitos são satisfatórios para todos os participantes será mais construtivo do que um que seja satisfatório para uns e insatisfatório para outros. Nota-se que o conflito pode surgir de qualquer assunto, matéria ou situação, ou até mesmo sobre coisa errada, como é o caso do conflito deslocado; onde é representado pelo conflito manifesto quando tratado diretamente, e pelo subjacente quando não está sendo diretamente expressado. Deutsch (1973, p.10), afirma que: (…) o conflito manifesto pode simplesmente refletir a irritabilidade e a tensão geral nas relações entre as partes conflitantes que resulta de um conflito não-resolvido e subjacente – a tensão não-resolvida leva cada lado a ser excessivamente sensível e desprezível, inclinando a controvérsias e ter outras posturas desse tipo. Já o conflito mal-atribuído diferente do deslocado; forma-se com erro sobre as partes, o que dá origem a situações equívocas. Como afirma Deutsch (1973, p.12): “Tal mal-atribuição pode ser inconsciente.” No entanto, isto não impossibilita que em alguns casos ocorra com total consciência, destaca-se, por exemplo, a estratégia do “Dividir e Conquistar”, que ataca um grupo para enfraquecê-lo e após tal acontecimento busca-se dominá-los isoladamente.

Desta forma, encontramos o conflito mal-atribuído, pelo qual o individuo entra em desacordo com seus parceiros por indução da situação, onde na verdade o polo opositor deste impasse deveria ser outro, portanto, neste conflito, o erro ocorre sobre as partes e não sobre a coisa errada, como no conflito deslocado. Observa-se que tais conflitos geram inúmeras preocupações sociais, assim como destaca Deutsch (1973, p.12): Uma das preocupações inevitáveis de grupos interessados em produzir mudança social é reduzir a má-atribuição e os conflitos falsos ou contenciosos, fazendo a cooperação efetiva ganhar espaço entre grupos de pequeno poder. A cooperação efetiva irá levar seus poderes mútuos para alcançar a mudança. É importante ressaltar que, esses tipos de conflito causam assim, como os outros, incertezas e litígios, onde uma simples cooperação entre as partes resultaria na extinção deste impasse, gerando assim a mudança social desejada sem qualquer tipo de atrito. Haja vista a explanação de todos os conflitos anteriores é necessário abordar estes dois últimos tipos: o latente e o falso, que são de total importância para compreensão da tipologia de conflito. Conflito latente. É o conflito que implicitamente existe, mas que não se exterioriza pelas circunstâncias em que está envolvido o individuo. Nas palavras de Deutsch, 1973, p. 12: “Alguém pode não estar experienciando conscientemente um conflito de maneira como deveria porque ele foi reprimido, deslocado, ou mal atribuído ou porque ele nem se quer existe psicologicamente”. Nesse sentido o conflito só se exteriorizará quando o individuo se sentir atingido em relação a uma situação que esteja contrariando os seus ideais, crenças ou valores, momento em que este conflito, até então implícito ou oculto, passará a ser um conflito evidente e expresso. Um exemplo trazido por Deutsch (1973) em que ocorre este tipo de conflito é quando uma mulher nada contrapõe quanto ao homem ser superior economicamente e em direitos, a não ser quando se sentir atingida de alguma forma. Conflito falso. É aquele conflito em que o motivo que lhe deu causa não o justifica, pois foi resultado de uma comunicação errônea entre os indivíduos. Para Martinelli e Almeida (2009, p.60) conflito falso “São falhas que não existem a não ser na aparência, já que não existe um verdadeiro desacordo latente”.

É importante salientar que não se trata aqui de um motivo insignificante que resultou em um conflito, mais sim de um motivo que sobreveio de uma falsa percepção do individuo, que teve como consequência uma situação conflituosa. Apesar desse conflito advir de uma má interpretação dos fatos – caracterizando um falso conflito, pode ainda criar uma nova situação, evidenciando novos motivos que o torne verdadeiro. Os tipos de conflitos acima explanados poderão ocorrer simultaneamente, pois a existência de um não exclui a ocorrência do outro. Nesse sentido, em qualquer situação como esta, um ou outro conflito poderá incidir nos mais variados tipos de questões responsáveis por sua ocorrência. 4. OS TIPOS DE QUESTÕES ACERCA DO CONFLITO Um conflito, em qualquer de suas modalidades, necessariamente é precedido por algumas questões ou fatores das mais variadas naturezas, que geram discórdia, dissenso ou desentendimento entre as partes envolvidas, pois há uma complexa contraposição de interesses profundamente subjetivos entre os participantes da disputa, de acordo com Vasconcelos (2008, p.20): Em realidade, o conflito interpessoal compreende o aspecto relacional (valores, sentimentos, crenças, e expectativas intercomunicados), o aspecto objetivo (interesse objetivo ou material envolvido) e a trama decorrente da dinâmica decorrente desses dois aspectos anteriores. Dentre esses tipos de questões acerca dos conflitos é possível destacar cinco tipos básicos principais. O primeiro deles diz respeito ao controle sobre recursos, quando duas ou mais pessoas buscam o domínio ou o monopólio sobre determinados recursos básicos e essenciais – vistos como impassíveis de partilha por serem limitados, há uma grande probabilidade de ocorrência de fortes embates, e consequentemente, o surgimento de um complexo conflito, de difícil resolução. Deutsch (1973, p.13), adverte: Recursos como espaço, dinheiro, propriedade, poder, prestígio, alimentos e outros podem ser vistos como impartilháveis, e se duas ou mais partes buscam a posse ou o uso exclusivo de um recurso ou de uma parte disponível dele, está apto a nascer um conflito entre elas. Conflitos desse tipo são difíceis de serem resolvidos construtivamente quando há rígida fixação no recurso específico em questão e pouca possibilidade de encontrar um substituto satisfatório para ele. Os dois próximos tipos básicos de conflito estão relacionados às preferências e incômodos, facilmente percebidos nas relações sociais cotidianas, pois os interesses de cada pessoa, ou de um determinado grupo, podem facilmente se contrapor aos ideais de outra pessoa ou de outro grupo, dadas as peculiares singularidades de cada pessoa, como bem elucida Morton Deutsch (1973, p.13), “Muitos conflitos surgem porque as atividades ou os gostos de um indivíduo ou de um grupo chocam-se com as preferências, a sensatez ou a sensibilidade de um outro”. Destarte, é importante notar que todos possuem o direito de ter suas próprias escolhas e preferências, e que apenas isso não enseja motivos suficientes para a ocorrência de um conflito. O problema surge quando o direito alheio é desrespeitado através da falaciosa convicção de que o exercício de um direito é absoluto e ilimitado, em detrimento do direito dos demais partícipes da sociedade de não terem seus direitos lesados pelo exercício exacerbado de um direito singular de um indivíduo, o que resultará em um incômodo – mola propulsora de um conflito. O excesso no exercício de um direito, ao ponto de comprometer o de outrem, é um fenômeno razoavelmente suficiente para a ocorrência de uma disputa. O equilíbrio, a moderação e a sensatez na fruição de um direito, são conceitos necessários para a resolução dessa questão, podendo ser relembrado o pensamento de que o campo de atuação de um direito se finda quando se inicia o de outrem. Nas palavras de Deutsch (1973, p.13-14), “A questão não é o direito abstrato de alguém às suas preferências ou atividades, mas sim se ele pode exercer esse direito na medida em que, fazendo isso, cria um incômodo ou um distúrbio para outro”. Em quarto lugar, há a questão dos valores, outra fonte bastante suscetível à ocorrência de conflitos. Nesse sentido, Mendes (2008) afirma que “Valores são normas ou padrões sociais geralmente aceitos ou mantidos por determinado indivíduo, classe ou sociedade, portanto, em geral, dependem basicamente da cultura relacionada com o ambiente onde estamos inseridos”. Com efeito, é cediço que a diversidade de valores presentes em uma sociedade é incontável, e o choque entre esses mais variados valores são praticamente inevitáveis e potencialmente capazes de gerarem discórdias.

No entanto, como bem explana Deutsch (1973, p.14), “Não é a diferença de valores em si que conduz ao conflito, mas, antes, a alegação de que um valor deveria dominar ou ser aplicado universalmente, mesmo por aqueles que detêm diferentes valores”. Destarte, em uma sociedade em que os valores pessoais de determinados grupos não sejam colocados em grau de superioridade e domínio em relação aos demais, haverá menor probabilidade de ocorrência de conflitos de valores. Em quinto e último lugar, surge a questão das crenças, onde os conflitos apresentam-se como resultado da divergência acerca da realidade, fatos ou informações. Nesse contexto, Deutsch (1973) cita o exemplo de duas pessoas que observam o mesmo fato e apresentam depoimentos divergentes sobre este. Destarte, leciona Andrade apud Marco e Varisa: Há, é claro, o aspecto objetivo resultante de múltiplas variáveis reais e específicas que configuram a singularidade de cada contexto em particular. Além disso, no entanto, é preciso levar em conta os aspectos subjetivos, ou seja, o fato de que a capacidade de julgar a realidade exterior depende diretamente de como é o juízo crítico de cada pessoa em relação ao seu mundo exterior. Nesse contexto, urge-se importante ressaltar que quando há uma divergência fundada em crenças diferentes há sempre fatores emocionais relevantes a serem observados, pois as crenças estão diretamente ligadas à visão de mundo das pessoas, e o processo de disputa pode trazer conseqüências crônicas e devastadoras para as partes, como expõe Deutsch (1973, p.15), “Se não se pode ter confiança em que se acredita ou percebe, sua habilidade de agir racionalmente é minada”. Por outro lado, o fator principal da disputa na maioria dos casos nem sempre é a própria diferença de crenças, mas a intolerância em relação à crença do outro; o fato de não aceitar que o outro pode pensar diferente. 5. CONFLITOS DESTRUTIVOS X CONFLITOS CONSTRUTIVOS Sabemos que um conflito se configura quando duas ou mais pessoas divergem em opiniões, ideias e valores. Porém não podemos negá-lo em nossa vida, porque ele faz parte da natureza humana, e muitas vezes, ele se apresenta de forma positiva e negativa, construtiva e destrutiva.

As pessoas que são envolvidas nos conflitos sentem dor, incompatibilidade e hostilidade. São sentimentos negativos que levam a conclusões precipitadas e inconvenientes sobre os motivos, atitudes e intenções do outro. Muitas vezes entram em choque. É aquele conflito que não foi canalizado, porque nesse contexto as partes sentem-se, insatisfeitas e desmotivadas; desviam-se de tarefas importantes para assuntos que não são relevantes e transformam-se em adversários, ao invés de cooperadores para o bom desempenho do grupo. As maiores consequências do conflito destrutivo são as distorções da comunicação que geram maus entendimentos. Sabe-se, que o conflito só será solucionado se houver clareza e eficácia na comunicação. De acordo com Martinelli e Almeida (2009, p.48): “o conflito também faz com que o fluxo de comunicação e de informações seja distorcido”. Porém, é bom lembrar que o conflito não é um problema em si, porque diferenças e discordâncias não são sinônimos de incompatibilidade. O conflito também pode gerar resultados construtivos que se dá com a abertura de uma discussão produtiva, onde levará os envolvidos a ações motivadoras. Nesse contexto, afirma Martinelli e Almeida (2009, p.50): (…) os conflitos podem ser construtivos, quando ajudam a abrir a discussão de uma questão ou resultam em um problema que está sendo solucionada, contribuindo para aumentar o nível individual de interesses e envolvimento em uma questão, bem como para as pessoas possam descobrir habilidades que possuem, mas que ainda não haviam se manifestado (…). Desta forma, nota-se que a resolução de um conflito está ligada diretamente ao modo de sua condução, podendo ser destrutivo – quando há uma falta de comunicação entre as partes, e construtivo – quando a comunicação e o interesse de solucioná-lo forem predominantes, extinguindo, enfim, o conflito. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Após os estudos realizados foi constatado o quanto o conflito é presença marcante na vida do ser humano, sendo visto em todas as áreas que abrangem o relacionamento do indivíduo, tanto pessoal quanto profissional. Fica claro que os conflitos são advindos de problemas de relação e também por falta de comunicação, revelando que é necessário aprender a reagir de forma mais calma e coerente às situações de dificuldade que vão surgindo no decorrer da vida, procurando sempre o diálogo e o respeito ao ponto de vista do outro. Na verdade, tal tendência do comportamento humano dificilmente se ausentará do seu cotidiano, mas é necessário que se forme uma mentalidade diferenciada na sociedade sobre como se deve tratar os conflitos, sendo implementada uma cultura de pacificação e diminuição gradativa das contendas. Um grande passo que precisa ser dado é a maior conscientização do homem no que tange ao respeito aos direitos e opiniões dos seus pares. Pois não há evolução de ideias e pensamentos sem a participação da coletividade, e isso é fator preponderante para evolução da sociedade e a melhoria das relações existentes.

7.REFERÊNCIAS

BARBOSA, Águida A. Relação de Respeito. Boletim IBDFAM, n. 38, ano 6, p. 7, maio-jun. 2006. CARNEIRO, Daniel. A mediação de conflitos como instrumento de acesso à justiça e incentivo à cidadania. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2673, 26 de outubro de 2010. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/17698>. Acesso em: 24 de outubro de 2012.

DANIEL, Fernanda Paola. Possibilidade e limites das práticas de mediação extrajudicial enquanto forma alternativa de resolução de conflitos sociojurídicos. Três Passos – RS, 2011. p 17. DEUTSCH, Morton. The resolution of conflict: constructive and destructive processes. New Haven and London: Yale University Press, 1973. Pp. 1-32; 349-400. Traduzido por Arthur Coimbra de Oliveira e revisado por Francisco Schertel Mendes, ambos são membros do Grupo de Pesquisa e Trabalho em Mediação, Negociação e Arbitragem.

MARCO, Cristhian Magnus De; VARISA, Gabriela Miotto. Breve introdução sobre a subjetividade do magistrado no ato de julgar no contexto do neoconstitucionalismo. Anais do Seminário Nacional de Dimensões Materiais e Eficaciais dos Direitos Fundamentais: v. 1, n. 1 (2011). Disponível em: <http://editora.unoesc.edu.br/index.php/seminarionacionaldedimensoes/article/view/961/537>. Acesso em: 19 de outubro de 2012. MARTINELLI, Dante P.; ALMEIDA, Ana Paula de. Negociação e solução de conflitos: Do impasse ao ganha-ganha através do melhor estilo. São Paulo: Atlas, 2006. P. 49-60.

MENDES, Jerônimo. Princípios, valores e virtudes. Disponível em: <http://www.gestaodecarreira.com.br/coaching/reflexao/principios-valores-e-virtudes.html>. Data da publicação: 17 de agosto de 2008. Acesso em: 19 de outubro de 2012. MOORE, Christopher W. O processo de mediação. Porto Alegre: Artmed, 1998.

OLIVEIRA, Raquel Alexandra Duarte. Resolução de Conflito – Perspectiva dos Alunos do 4° Ano do Conselho de Arruda dos Vinhos. Disponível em: <http://pt.scribd.com/doc/88325472/6/Tipologia-dos-conflitos>. Acesso em: 18 de outubro de 2012. VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de Conflitos e Práticas Restaurativas. 1.ed. São Paulo: Método, 2008.

Autores:

Aline Ferreira Silva1

Andreilma Viana Sampaio2

Bharbara Paolla de K. Abbud3

Ivanildo Farias4

Matheus Matos Nogueira5

Raquel Silva Barbosa6

Syllas Teixeira de Oliveira7

Vera Regina Freitas Miranda8

Discentes FACDO

 

Me. Maicon Rodrigo Tauchert

Docente pesquisador FACDO

Como citar e referenciar este artigo:
OUTROS, Maicon Rodrigo Tauchert e. Tipologia do conflito: do nascimento à classificação do conceito. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2013. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-civil/tipologia-do-conflito-do-nascimento-a-classificacao-do-conceito/ Acesso em: 09 mar. 2025