Processo Civil

O princípio do contraditório no direito processual contemporâneo

 

Resumo:

O princípio do contraditório assim como direito processual como um todo igualmente evoluiu, passou de termos e bases formais para uma concretude mais palpável e material. Enfim, o processo contemporâneo o transformou em dever de diálogo judicial.

Palavras-Chave:

Direito Processual. Princípio do Contraditório. Garantia Constitucional. Constituição Federal de 1988. Processo Contemporâneo.

Abstract:

The adversarial principle as well as procedural law as a whole has also evolved, and we spent a formal basis for a more tangible and concrete material. Finally, the contemporary process turned him into duty of judicial dialogue.

Keywords:

Procedural Law. Adversarial principle. Constitutional guarantee. Federal Constitution of 1988. Contemporary process.

Já é tradicional no direito constitucional brasileiro a adoção expressa da garantia do contraditório no texto constitucional. Se bem que o princípio do contraditório [1] já era previsto na Carta Imperial de 1824, na Constituição federal republicana de 1891, na Constituição de 1934, na de 1937 e, depois na Constituição de 1969 [2] no art. 153 §15º(Emenda Constitucional nº1, 17/10/1969).

Enfim atualmente está no texto constitucional vigente precisamente no art. 5º, inciso LV. Comparativamente o texto anterior houve profunda inovação posto que o referido princípio passou expressamente alcançar o processo civil e administrativo, pois na velhusca Carta constitucional só havia o contraditório para o processo penal.

Apesar da escorreita manifestação da doutrina de que o preferido princípio igualmente se aplicasse ao processo civil e ao administrativo.

Sendo, portanto, congruente com o texto atual a Lei 9.784/99 que confirmou expressamente ser o processo administrativo informado, entre outros, pelo princípio do contraditório.

Constitui fundamentalmente como um princípio do Estado de direito e tem forte ligação cm a igualdade das partes litigantes e o direito de ação.

Apesar de a previsão constitucional atual aludir ao contraditório e a ampla defesa aos litigantes, com os meios e recursos a estes inerentes. Trata o referido dispositivo constitucional de dois institutos distintos entre si. Pois a ampla defesa se destina exclusivamente ao demandado, eis que tenha que se defender a respeito dos fatos afirmados pelo demandante em sua petição inicial, a fim de que o juiz possa julgar improcedente ou procedente a pretensão deduzida.

É importante frisar que para outorgar certos meios protetivos [3] ao demandado não se poderá afrontar o princípio da isonomia. Assim, nos processos decorrentes do CDC, por exemplo, a demanda deverá ser aforada no domicílio do consumidor, seja este demandante ou demandado, eis que por lei trata-se o consumidor como presumivelmente vulnerável (art. 4º, inciso I do CDC) em consonância com art. 101, inciso I do mesmo diploma legal.

Na lição de Marinoni o direito ao processo justo tem como elementos inafastáveis o direito a igualdade e o direito ao contraditório. Daí o porquê a paridade de armas [4] seja pressuposto para que o contraditório encontre ambiente adequado ao seu pleno desenvolvimento.

A garantia do contraditório é inerente aos litigantes, seja autor, réu, suplicante, suplicado, litisdenunciado, opoente ou chamado ao processo bem como ao assistente litisconsorcial e simples incluindo também o Ministério Público mesmo quando atue na condição de fiscal da lei.

Assim, todos aqueles que tiverem alguma pretensão de direito material a ser deduzido em juízo, através do processo, têm o direito de invocar o contraditório a seu favor.

Convém sublinhar que as testemunhas, peritos por não terem pretensão a ser discutida no processo, e por funcionarem apenas como auxiliares da justiça, por isso, não lhe assistem o direito ao contraditório.

Cabem efetivamente aos litigantes a igualdade de tratamento por parte do julgador e, ipso facto, o contraditório. O juiz como sujeito do processo (porém não sujeito da lide) compete a participação ativa para o cumprimento do contraditório substancial, pelo que se pode concluir que os litigantes têm essa garantia, ao passo que o juiz tem o dever de lhes assegurá-la.

Não se restringe ao cidadão enquanto pessoa física ou natural, na verdade a referida garantia pode ser também invocada pela pessoa jurídica, na defesa não apenas da igualdade processual, mas igualmente dos direitos fundamentais de cidadania, de liberdade crença e tantas outras garantias peculiares ao Estado Democrático de Direito [5] .

Então, o contraditório significa a necessidade de dar conhecimento da existência da ação e de todos os atos do processo às partes, e de outro lado, a possibilidade de as partes reagirem aos atos que lhes sejam desfavoráveis.

Garantir o contraditório [6] significa o cumprimento da obrigação de noticiar e informar que o órgão julgador tem, a fim de que o litigante possa exteriorizar suas manifestações.

A melhor e atualizada doutrina explica o conceito do contraditório que em resumo trata do dever de entre o juiz e as partes, incluídos, neste contexto, o direito da parte ser informado quanto aos pedidos que tenham sido formulados pela parte contrária, assim como de todos os subsequentes atos de procedimento, de modo que possa reagir quando for necessário ou adequado. Estão igualmente protegidos por essa garantia todos aqueles que de algum modo participem do processo mesmo na condição de terceiros ou meros assistentes.

No projeto de novo CPC conta em seu art. 9º in litteris: “Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que seja esta previamente ouvida. É a garantia da audiência prévia, diante de qualquer movimento capaz de resultar em decisão que contrarie os interesses da parte”.

Evidentemente a exceção está prevista no parágrafo único e que se referem às hipóteses de tutela antecipada seja de urgência ou de evidência.

Outra inovação é que a disposição que prevê que nenhum órgão jurisdicional poderá decidir com base em fundamento que não tenha sido submetido às partes (o que consagra o direito à informação) e oportunidade de manifestação, mesmo que de matéria de ordem pública se trate.

Mesmo nas matérias em que o juiz pode e deve conhecer de ofício, a decisão somente poderá ocorrer posteriormente à informação para os litigantes e, após a abertura de prazo para eventual manifestação. Apressaram-se os críticos em apontar que tal inovação não respeita a razoável duração do processo.

Mas com melhor observância do contraditório, pelo menos em tese, há sincera possibilidade de haver redução de recursos interpostos em face da decisão, onde se alega, fundamentalmente a violação do contraditório.

O aspecto dinâmico [7] do processo e a celeridade processual não podem ser elaborados e desenvolvidos em detrimento da qualidade da atividade jurisdicional em produzir um processo justo, digno representante do Estado Democrático de direito.

É importante frisar que no art. 7º do projeto do CPC se consagrou que o juiz passa a figurar também como um sujeito do contraditório. Assim no manejo do ônus da prova pode-se ter uma dinâmica, com base no caso concreto, a fim de melhor atender à paridade das armas entre os litigantes e às especificidades do direito material posto no debate em juízo.

Uma questão que merece destaque é que não tratou o referido Projeto do novo CPC das consequências da violação do dever de diálogo judicial. O que reafirma que a decisão-surpresa existe e, é formalmente válida. Embora seja ineficaz.

Há de se acautelar para que o dever do contraditório não seja sempre postergado, pois isso significaria anular essa garantia constitucional e processual.

O parágrafo único do art. 10 do mesmo referido Projeto trata que a decisão-surpresa [8] é ineficaz e obriga o juízo à prolação de nova decisão, observado o contraditório.

Em razão da imperiosa garantia constitucional do contraditório, é proibido ao julgador encurtar ou diminuir o direito de o litigante exteriorizar a sua manifestação no processo. Não se pode economizar ou minimizar a participação do litigante no processo, porque isso contraria o comando emergente da norma constitucional.

O órgão julgador deve dar a mais ampla possibilidade de o litigante manifestar-se, tendo o poder de acompanhar e participar da colheita da prova, de modo a poder, in continenti, a fazer contraprova, como por exemplo, reperguntando para a testemunha.

O direito à prova no cumprimento do contraditório significa que os litigantes têm o direito de realizar a prova de suas alegações, bem como fazer a contraprova do que tiver sido alegado pela parte contrária.

Afirma Nelson Nery Junior que o destinatário da prova é o processo e não propriamente o juiz, de modo que não se pode indeferir a realização de determinada prova sob o fundamento de que o julgador se encontre já convencido da existência do fato probando ou da própria questão incidental ou de mérito posta em causa.

Mas, ressalve-se que não ofende ao contraditório o indeferimento de diligência probatória desnecessária. O contraditório deve ser customizado, atendendo as peculiaridades do processo onde deve ser aplicado, alcançando assim diferente incidência na seara penal, cível e nas tutelas diferenciadas.

A concepção contemporânea do contraditório tem como intenção de sanar a abordagem reducionista das novas litigiosidades, além de evidenciar o maior destaque do uso da jurisprudência como fundamento de decisões judiciais e que vale como relevante argumentação persuasiva.

O contraditório alcança diferente incidência no penal e no civil. O princípio, para o processo penal, significando um contraditório efetivo, real ou substancial. Tanto que se exige defesa técnica substancial do réu, ainda que revel [9] (art. 261 do CPP) para que se tenha por obedecido o mandamento constitucional. Para isso a norma é complementada pelo art. 497, V do CPP [10] , que manda seja oferecido defensor ao réu, quando o juiz o considerar indefeso.

Assim, se houver defesa desidiosa, incorreta, insuficiente tecnicamente, por parte do advogado do réu no processo penal, o feito deve ser anulado e nomeado outro defensor, tudo em nome do princípio do contraditório conjugado ao da ampla defesa, ambos garantidos pela Constituição.

Não pode o juiz, no processo penal, decidir pelo desaforamento do feito, isto é, remetê-lo a outra comarca para que lá seja feito o julgamento pelo júri, sem que sejam ouvidas ambas as partes: a) o autor da ação penal, o Ministério Público, na ação penal pública; querelante na ação penal privada; b) o réu da ação penal.

Nesse sentido há a súmula 712 do STF que in litteris: “É nula a decisão que determina o desaforamento de processo da competência do júri sem audiência da defesa”. E, portanto, pode-se concluir que é nula a decisão que determina o desaforamento de processo da competência do júri sem audiência das partes.

No processo civil [11] o contraditório não tem a mesma amplitude. É suficiente que seja dada a oportunidade aos litigantes para se fazerem ouvir no processo, por intermédio do contraditório recíproco, da paridade de tratamento e da liberdade de discussão da causa.

Tratando-se de direitos disponíveis, o réu, por exemplo, pode deixar de apresentar a contestação, revelia, sem que isso configure ofensa ao princípio do contraditório.

Deve-se enfim dar oportunidade de ser ouvido e de apresentar sua contrariedade ao pedido do autor. Tal oportunidade tem que ser real e efetiva, pois a garantia constitucional não se contenta ser meramente formal.

Torna-se apropriado cogitar em bilateralidade da audiência [12] , sendo um princípio no processo civil. O réu deve ser, portanto, citado, conforme prevê o art. 213 do CPC.

O julgamento antecipado da lide, previsto no art. 330 do CPC também não constitui derrogação do princípio, pois somente poderá ser realizado se os efeitos da revelia tiverem ocorrido. Assim quando o processo estiver em condições de receber o julgamento antecipado, ao réu já terá sido dada a oportunidade de fazer-se ouvir, quando citado.

O processo civil contém outros mecanismos para fazer-se efetivo quando, por exemplo, apesar de citado o réu não contestar a ação que envolva um direito indisponível. Nesse caso, apesar de caracterizar a revelia, seus efeitos não se verificam conforme determinação expressa.

As reformas do CPC que foram efetivadas com o escopo de atribuir maior efetividade ao processo cumprindo a promessa constitucional contida na EC 45/2004, de prestar o Estado a jurisdição em tempo razoável.

Inicialmente temos a hipótese de decisão de improcedência da demanda de ofício nos termos da Lei 11.277 e a Lei 11.280. Com o acréscimo do art. 285-A do CPC se verifica que houve incremento na efetividade processual, e na redação foram utilizados termos imprecisos que devem acarretar muitas perplexidades e transtornos na aplicação.

Com efeito, logo no caput, a expressão “matéria controvertida unicamente de direito”, há de se atentar para a impossibilidade de se separar totalmente a matéria fática da matéria jurídica, segundo a doutrina mais aceita, a ausência de controvérsia sobre os fatos desenvolvidos na petição inicial é que poderia gerar a questão unicamente de direito, o que, por certo, exigiria que fosse cumprido o contraditório, com a citação validade do réu, e apresentada sua peça de contestação, no prazo legal, para que então o julgador viesse a firmar alguma convicção em relação a ser ou não a matéria de direito.

A própria redação do dispositivo processual revela a impropriedade do julgador, de, sem o estabelecimento do contraditório, concluir que a questão jurídica levada ao seu conhecimento não apresenta matéria fática controvertidas, extinguindo, já no despacho liminar o feito, com julgamento de mérito, conforme os termos do art. 269, I do CPC.

Já analisando o segundo parágrafo, tem-se que a citação irá ocorrer no prazo, do que tínhamos como contrarrazões do recurso de apelação, que também era de quinze dias. O problema é que nessa hipótese, é a de que a parte demandada possa vir a discutir não só matéria de direito, mas também matéria de fato, em frontal oposição a visão do juiz a quo que, preliminarmente decidiu sobre a matéria controvertida acreditando ser exclusivamente de direito.

Portanto, a partir dessa premissa resta prejudicado o órgão de segundo grau venha julgar o mérito do feito, sem maculação de toda a estrutura montada no CPC, afeita a defesa do princípio do duplo grau de jurisdição. Aliás, o Tribunal não pode julgar desde logo a lide, envolvendo matéria de fato importante na estrutura meritória da demanda, se não houve anterior apreciação dessas questões pelo julgador originário.

A solução então, nessa hipótese, seria a desconstituição pelo Tribunal da sentença de mérito, com a remessa dos autos ao primeiro grau para desenvolvimento da instrução e prolação de nova decisão final – o que só traria maior dispêndio de tempo e trabalho para o Poder Judiciário, em nada positivo para a efetividade processual.

É importante observar que pelo texto da lei processual, o juiz de primeira instância não está obrigado a valer-se da extinção imediata do feito com julgamento do mérito, sendo imperioso que se tenha a devida sensibilidade e a cautela ao utilizarem o art. 285-A somente em situações excepcionais, determinando, na dúvida, a citação do demandado.

Até porque, há a possibilidade de extinção do feito com base no art. 269 (sentença definitiva), logo em seguida, após o encerramento da fase postulatória, como previsto no art. 330 do CPC.

No que se refere à Lei 11.280 que aponta sobre a declaração de ofício da prescrição pelo julgador, a qualquer tempo, portanto, mesmo sem a citação do demandado. O julgador em matérias de direito patrimonial, e, portanto disponível.

Acontece que ante a decretação da prescrição o demandado poderia desejar ter o mérito apreciado da causa, o que até justificaria não abordar a matéria prescricional entre as preliminares da contestação. Haveria, então com a análise do mérito de obter uma sentença improcedência conforme o art. 269, I do CPC.

Ademais competentes vozes da doutrina já alertam que a prescrição sempre fora considerada matéria típica de defesa (exceção) que pode interessar exclusivamente a parte demandada invocá-la ou não.

Com a decretação de ofício pelo julgador da prescrição sem antes atender ao contraditório, tal atitude seria temerária à efetiva solução da lide, pois calaria a possível discussão sobre as causas suspensivas ou extintivas da prescrição.

O objetivo como sói claro é reduzir significativamente o número de demandas judiciais, o que parece ser mais importante que o ditame constitucional que garante o contraditório, tudo em prol em ser mais célere em apreciar judicialmente qualquer lesão ou ameaça de direito.

O princípio do contraditório não admite a existência, para os litigantes e seus advogados, de procedimento ou processo secreto, seja no âmbito administrativo, seja no cível ou criminal.

Durante a redemocratização do nosso país e com CF/1988, a existência espúria de investigação secreta, por meio de inquéritos policiais sigilosos, aos quais se nega o acesso aos indiciados e muito menos à imprensa, cujo pretexto seria a proteção do interesse público e o sucesso futuro das investigações.

Eis então características típicas do Estado policial, de estado de exceção, só existente em ditaduras, e em regimes totalitários, o que não é o nosso caso conforme afirma o art. 1º CF/1988. Consideramos que o sigilo das investigações pode ser oposto a todos, exceto ao indiciado ou acusado e também ao seu advogado.

Nesse sentido o STF editou verbete como súmula vinculante, minimizando os efeitos dessas investigações secretas, a saber, STF-V 14: “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”.

Apesar do verbete esse se revelou tímido porque não veio garantir o pleno acesso do acusado nos autos do inquérito policial ou civil. Apenas permite o acesso como manifestação do direito de exercício profissional do advogado, quando já existirem elementos probatórios documentados nos autos de inquérito.

A Lei do Processo Eletrônico (Lei 11.419, de 19.12.2006) permite utilização de meio eletrônico na tramitação de processos judiciais, na comunicação de atos e, ainda, na transmissão de peças processuais em qualquer processo judicial, seja civil, pena ou trabalhista, assim também nos processos que tramitam nos juizados especiais, em qualquer grau de jurisdição.

A lei faculta que a transmissão venha autenticada por meio de assinatura eletrônica a fim de que se possa identificar o signatário do documento. O Estado de São Paulo, utilizando-se da faculdade dada pelo art. 24, XI da CF/1988 que prevê competência concorrente com a União, para legislar sobre procedimentos em matéria processual, editou a Lei 11 819/2005 que permitiu a realização de interrogatório do réu, no processo penal, pelo sistema de videoconferência.

Porém, o STF reconheceu a inconstitucionalidade da lei paulista e concedeu habeas corpus ao paciente que tinha sido condenado em processo penal no qual tinha sido utilizada a lei paulista com a realização do ato processual eletrônico.

Entendeu o Ministro Cézar Peluso que atuou como relator do HC 88914-SP que o direito de presença real do acusado durante o interrogatório e em outros atos de instrução processual tem que ser preservado pelo Poder Judiciário.

Mas, o referido entendimento não resta pacificado na Suprema Corte brasileira, pois existem decisões em sentido contrário, admitindo francamente como válido o interrogatório realizado por videoconferência.

Como resultado da inconstitucionalidade da aludida lei paulista sobreveio a Lei 11900/09 que inclui a possibilidade de realizar-se o interrogatório do réu e a oitiva de testemunhas por meio de videoconferência, dando assim nova redação aos primeiro e segundo parágrafos do art. 185 do CPP.

Todavia, pode haver o caso em que se configure lesão à ampla defesa, quando o acusado comprovar que sofreu efetivo prejuízo em seu direito por não ter tido a oportunidade de conferenciar com seu advogado na ocasião do interrogatório realizado fora do juízo, ou ainda, porque o depoimento da testemunha ouvida por videoconferência fora decisivo para a sua condenação, o que propiciaria reperguntas serem feitas em sua defesa. Enfim, a alegação de cerceamento de defesa dever ser aferida diante do caso concreto e não em abstrato.

É fato que o direito processual está vivenciando a quarta fase, correspondente ao neoprocessualismo calcado num formalismo ético onde os princípios processuais se nutrem de intenso instrumentalismo.

Nas vertentes do neoconstitucionalismo há o pungente reconhecimento da força normativa da Constituição, a expansão significativa da jurisdição constitucional e o desenvolvimento de uma nova dogmática interpretativa da Constituição.

Assim o princípio do contraditório concretiza o direito fundamental de acesso à justiça que significa o direito à ordem jurídica justa. Há de se harmonizar a tutela jurisdicional com direito fundamental capaz de ser cada vez mais efetivo, célere e adequado. Havendo firme vinculação do legislador, do administrador e do juiz, propiciando que os direitos fundamentais possuam uma dimensão objetiva, constituindo um conjunto de valores básicos e diretivos da ação positiva do Estado.

Vindo a instrumentalidade a combater o formalismo, e afastando a visão do processo como armadilha perigosa e preparada pela parte litigante mais astuta em detrimento da mais incauta e pobre, capaz somente de produzir a insegurança jurídica.

O afã de dar maior celeridade processual se esbarra no garantismo. No momento de maior aceleração, muito se perde em segurança. Há de se construir técnicas processuais adequadas e efetivas para compatibilizar o processo com os direitos e garantias [13] fundamentais do demandado.

Referências:

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[1] As origens do princípio do contraditório de acordo com historiadores e doutrinadores situam-se no ano de 1215, através da Magna Carta Inglesa ( Magna Charta Libertatum), na qual havia o conceito de devido processo legal que acabou por trazer tacitamente a ideia de contraditório. Em seu art. 39 havia a garantia conhecida mais tarde como o devido processo legal ou a um processo justo. In litteris: “nenhum homem livre será detido ou aprisionado ou privado de seus bens ou dos seus direitos legais ou exilado ou de qualquer modo prejudicado (…) a não ser pelo julgamento regular dos seus pares ou de acordo com as leis do país”.

[2] Em 1969 ocorreu o auge do regime militar brasileiro, a Constituição de 1967 recebeu nova redação através da Emenda Constitucional nº 1. Tal emenda fora decretada pela Junta Militar que mudou radicalmente a maioria dos dispositivos da Constituição de 1967 a fim de adequá-la às medidas de exceção que o governo precisava. Paira séria dúvida sobre a natureza da medida promulgada em 1969 se seria uma emenda constitucional ou na verdade uma nova constituição, por reformar substancialmente a constituição anterior. A maioria dos especialistas afirma que não se trata de nova constituição, mas apenas uma reinterpretação daquela que estava em vigor. Então, substancialmente a atual Constituição Brasileira de 1988 revogou em verdade a Carta Magna de 1967 com sua interpretação dada em 1969. Porém José Afonso da Silva, que entende que, por se tratar de texto completamente reformado alterando até mesmo a denominação formal da carta (a Constituição de 1967 recebeu o nome de “Constituição da República Federativa do Brasil”), trata-se realmente de nova constituição, embora que o instrumento tenha sido uma emenda constitucional que fora impróprio para tarefa.

[3] Com razão Marinoni esclarece que não é só em caso de insuficiência técnica que o juiz deva assegurar a paridade de tratamento para velar pelo efetivo contraditório. Determinada particularidade do direito material e do caso litigioso pode impor a necessidade equalização da posição das partes em juízo. Sendo possível a dinamização do ônus da prova.

[4] Como decorrência do princípio da paridade das partes, o contraditório significa dar as mesmas oportunidades para as partes e os mesmos instrumentos processuais para que possam fazer valer seus direitos e pretensões, ajuizando ação, deduzindo resposta e requerendo e realizando provas como também recorrendo das decisões judiciais irresignadas. Trata-se de cláusula geral processual, na medida em que o juiz, na situação específica que lhe é submetida, deve dar concretude ao preceito, decidindo o que significa igualdade de armas na hipótese.

[5] Ensina o doutrinador Humberto Dalla que juntamente com o princípio da isonomia, o contraditório constitui importante premissa democrática que com ele se relaciona de modo a garantir um efetivo equilíbrio entre as partes. Embora a garantia do contraditório esteja relacionada a algumas premissas individualistas, tais como a legitimidade ad causam, a eficácia da sentença (restritas às partes que figuraram no processo) e os limites subjetivos da coisa julgada, modernamente, tais restrições vão sendo depuradas do significado individualista.

[6] O eminente doutrinador Luiz Rodrigues Wambier apontou que o projeto de novo CPC vem dar vida à garantia constitucional do contraditório. E apontou que a norma tem como destinatários tanto o legislador ordinário como ao juiz, assim, como, no caso de processo administrativo, o gestor público ou privado. Quem, enfim, tenha poder decisório, tanto no plano jurisdicional quanto também no administrativo, deve igualmente respeitar o contraditório em toda sua amplitude. (In: O contraditório e o Projeto do Novo CPC. Disponível em: http://atualidadesdodireito.com.br/luizrodrigueswambier/2013/07/29/o-contraditorio-e-o-projeto-do-novo-cpc/ Acesso em 06.07.2014).

[7] Dierle Nunes já defendia que o contraditório constitui uma verdadeira garantia de não surpresa que impõe ao juiz o dever de provocar o debate sobre todas as questões, inclusive as de conhecimento oficioso, impedindo a solitária onipotência. (…) In: Novo CPC consagra concepção dinâmica do contraditório. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2013-out-08/dierle-nunes-cpc-consagra-concepcao-dinamica-contraditorio Acesso mm 07.07.2014).

[8] Na Alemanha a proibição da decisão-surpresa foi instituída formalmente no direito positivo de 1976, pela redação do ZPO 278, III, reforçada pela redação da reforma de 2001. Há pois a obrigatoriedade de tribunal fazer a advertência às partes, comunicando-se sobre a possibilidade de haver questões que podem ter passado sem a percepção dos litigantes ou que, de ofício, podem ser decididas pelo juiz.

[9] É função institucional da Defensoria Pública, atuar no cargo de curador especial conforme art. 9º, II do CPC. A nomeação do curador especial é imperativa, porque a citação ficta recai a presunção de que não chegou ao conhecimento do réu a existência da demanda em face deste ajuizada.

[10] O referido dispositivo regula o procedimento dos processos de júri, mas a doutrina tem entendido aplicar-se a todos os procedimentos penais, indistintamente. STF Súmula nº 712 – 24/09/2003 – DJ de 9/10/2003, p. 6; DJ de 10/10/2003, p. 6; DJ de 13/10/2003, p. 6.

[11] O contraditório no processo civil se manifesta em todos os três tipos clássicos de processo adotados pelo ordenamento positivo, a saber: o processo de conhecimento, o processo de execução e o cautelar. Sendo indiferente se o processo seja da jurisdição contenciosa ou voluntária. Apesar da posição restritiva de parte da doutrina que reconhece não se aplicar totalmente o contraditório no processo de execução em face do notório desequilíbrio havido entre credor e devedor, em suas posições, de autor e réu (exequente e executado).

[12] Certamente existe limitação imanente à bilateralidade da audiência no processo civil quando necessária à concessão de medida liminar inaudita altera pars, como é o caso da antecipação da tutela de mérito, do provimento cautelar ou nas liminares da ação possessória, mandado de segurança, ação popular e ação civil pública. A referida limitação se dá no interesse superior da justiça e em face do periculum in mora.

[13] Ensinou Luigi Ferrajoli que o garantismo se apoia em três pilares: o Estado de Direito, a teoria do direito e a crítica do direito e, por último, a filosofia e a crítica da política. E, neste sentido, o neoconstitucionalismo e o neoprocessualismo servem de suporte crítico para a construção não somente de novas teorias e práticas, mas sobre, para a construção de técnicas que tornem mais efetivas, rápidas e adequadas à prestação jurisdicional. 

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Gisele. O princípio do contraditório no direito processual contemporâneo. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2014. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-civil/o-principio-do-contraditorio-no-direito-processual-contemporaneo/ Acesso em: 21 dez. 2024