Política

Sucessão nas Ruas

14 de agosto de 2009

 

Eu vi inicialmente o vídeo do pastor Silas Malafaia, da Assembléia de Deus, contra a Igreja Universal do Reino de Deus, informado pelo site do UOL. Depois vi os vídeos dos noticiários de ontem a noite sobre o assunto, onde a Globo e a Record fizeram-se reciprocamente acusações pesadas. O que esse fato revela? Não é uma questão religiosa, nem mercadológica, mas sim, política.

 

A fala inicial do pastor Malafaia está recheada de queixas contra a ação imoral da programação da Rede Record, que ignorou os preceitos bíblicos abertamente ao partir para a conquista de mercado, em prejuízo dos concorrentes, com programas incompatíveis com a fé cristã. Não bastando, a Igreja Universal, que deixou de transmitir programas religiosos na sua própria rede, passou a comprar espaços nas redes concorrentes pertencentes a outras igrejas pentecostais, praticamente expulsando as demais igrejas na pregação por meios eletrônicos. O pastor Silas testemunhou que manteve sua programação onde está por relação de amizade e lealdade dos donos da emissora, que recusaram ofertas vantajosas da Universal.

 

A Globo deu um furo de reportagem sobre os problemas judiciais enfrentados pela Record e pela Igreja Universal. Os processos corriam em segredo de Justiça. Foram quase dez minutos de vitupérios contra os seguidores de Edir Macedo, cuja emissora revidou com tempo semelhante de acusações contra a Rede Globo, desenterrando todos os defuntos.

 

Quer me parecer que estamos diante de um round da sucessão presidencial. Cada uma dessas igrejas são detentoras de verdadeiros currais eleitorais, vez que seus fiéis quase sempre seguem a orientação dos pastores em matéria de votos. Certo é que a Universal estava atacando silenciosamente, minando a força de seus adversários pentecostais. O pastor Silas Malafaia, com suas severas admoestações, foi ao contra-ataque especificamente contra isso. A Folha e a Globo entraram no vácuo da fala do pastor. Suas queiras me pareceram sinceras e procedentes.

 

O bispo Macedo é aliado do PT e está trabalhando a seu favor e de seu projeto político. Enfraquecer as igrejas concorrentes é uma forma de crescer seu próprio negócio e fortalecer não apenas seu cacife político, mas também o de seus aliados petistas. Não contavam com a reação tão dura e tão forte. As práticas do bispo Macedo sempre foram suspeitas e ele jamais ganhou o respeito da classe média.

 

Entre as igrejas ditas pentecostais a Assembléia de Deus é das mais respeitáveis e não sei ao certo se seus líderes apoiariam o candidato do PT. Pela reação que vimos é provável que essa adesão fosse incerta, não automática. Daí porque o bispo Macedo teria tido apoio para colocar em prática seu projeto de obtenção do monopólio sobre o rebanho pentecostal.

 

O papel da Rede Globo é menos claro. A Globo é sempre governista, mas nesse momento fez o jogo da oposição. É bem verdade que está defendendo também seus interesses estratégico-comerciais, mas dificilmente um movimento dessa envergadura é feito sem que o cálculo político exato tenha sido posto na mesa. A matéria do Jornal Nacional referiu-se especificamente aos problemas jurídicos que correm em segredo de Justiça, ou seja, a Globo tinha a opção de ficar de fora da briga. Preferiu o confronto aberto, algo que não se via desde os tempos de Assis Chateaubriand.

 

É a guerra da sucessão em plena combustão, algo bem parecido com o que houve com o Sarney no Senado recentemente. Múltiplos jogos jogados ao mesmo tempo, com interesses díspares e mesmo contraditórios. Mais sombras que luz sobre os cenários e os atores, tornando difícil a análise do observador. Ao fim e ao cabo, o grande xadrez está em curso. Não sei se teremos cenas emocionantes dessa novela, mas certamente teremos cenas repugnantes, espero que não sangrentas. O PT não entregará o poder com facilidade e galhardia. Fará qualquer coisa para mantê-lo, até mesmo dividir o rebanho pentecostal.

 

 

* José Nivaldo Cordeiro, Executivo, nascido no Ceará. Reside atualmente em São Paulo. Declaradamente liberal, é um respeitado crítico das idéias coletivistas. É um dos mais relevantes articulistas nacionais do momento, escrevendo artigos diários para diversos jornais e sites nacionais. É Diretor da ANL – Associação Nacional de Livrarias.

Como citar e referenciar este artigo:
CORDEIRO, José Nivaldo. Sucessão nas Ruas. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/politica/sucessao-nas-ruas/ Acesso em: 07 dez. 2025