Política

Problemas à Vista

Problemas à Vista

 

 

Ives Gandra da Silva Martins*

 

 

O Embaixador Rubens Barbosa, em artigo publicado no “O Estado de São Paulo”, no dia 27 de Março, alertou para as restrições que a União Européia pretende impor aos produtos agropecuários brasileiros, principalmente ao café, em apoio, neste caso, às empresas que o beneficiam na Europa. Lembra a perda do mercado brasileiro e a conquista pela Alemanha do mercado de solúvel (exporta 11% do café solúvel mundial), sem nem ser produtora.

 

A tese do continente, que mais subsidia a agricultura de forma inescrupulosa para os padrões de globalização –são os europeus os principais responsáveis pelo fracasso das sucessivas rodadas, desde Seattle (2000), do comércio mundial–, é a de que o Brasil é uma superpotência agrícola e precisa ser controlado, inclusive com sobretaxas.

 

Alerta, o Embaixador, para a necessidade de não cedermos mais do que já fizemos e, conforme as medidas que os europeus pretenderem impor, recorrermos à OMC, como fizemos em relação à exportação do algodão.

 

As considerações do Embaixador Rubens Barbosa levam-me a algumas outras.

 

A primeira delas é que -à esta altura em que não avançamos na quebra das barreiras criadas pelos países desenvolvidos, quanto a produtos em relação aos quais onde não são competitivos, obrigando-nos, não poucas vezes, a bater às portas da OMC, com resultados positivos- não tem o menor sentido diminuirmos nossas fronteiras alfandegárias, com redução do imposto de importação. Deveríamos é criar um sólido sistema de salvaguardas, semelhante ao dos Estados Unidos ou da Europa, e aplicá-lo sempre que não houver reciprocidade, transferindo eventual discussão posterior à OMC, em face do aspecto temporal recente, de eventual criação de sistema protetor da empresa nacional.

 

Este regime jurídico de salvaguardas deveria ser implementado de imediato, com relação à produção chinesa, que será devastadora, nos próximos anos, no mercado brasileiro. Com câmbio manipulado, sem encargos trabalhistas, sem tributos e com mão-de-obra de custos reduzidíssimos, em comparação ao mercado mundial, além da produção em escala e sem entraves burocráticos, não haverá competidor no mundo ao produto chinês. As desvantagens que o Brasil tem em matéria cambial, tributária, trabalhista e burocrática, só poderiam ser reduzidas por salvaguardas compensatórias, que colocariam o produto chinês em patamares semelhantes ao produto nacional. Já começou a ocorrer transferências de empresas e de produção do Brasil para a China, por força desta descompetitividade gerada por excesso de juros, de tributos, de câmbio, de burocracia esclerosada e de encargos trabalhistas.

 

Sem mecanismos compensatórios, mesmo que se tenha que discuti-los em nível internacional, em cinco anos teremos parte de nosso parque empresarial sucateado. Outra forma de enfrentar o perigo amarelo seria a redução de juros, tributos e encargos trabalhistas, além do enxugamento da máquina administrativa, tese utópica, considerando o perfil dos políticos e burocratas do Brasil.

 

Em relação ao Mercosul, parece-me também que o Brasil fez excessivas concessões. A Argentina, à época do início do Plano Real, tinha “superávits” em relação ao Brasil e se dedicava a enaltecer o Mercosul.

 

No momento, em que viveu a crise do “calote financeiro”, passou a atacar o Brasil e o Mercosul e, agora, que já se recuperou devido ao crescimento muito superior ao que experimentamos, na era Lula, continua obrigando nosso país a fazer concessões muito além do razoável.

 

Tenho muito receio de que as excessivas benesses que o Brasil costuma oferecer, no cenário sulamericano e mundial, termine por desguarnecer o nosso empresariado, que será presa fácil, no muitas vezes selvagem comércio internacional, pois todos os demais países defendem seus empresários melhor do que o nosso.

 

A tudo isto se acresce o aumento das despesas públicas, em 2006, a maior parte delas improdutivas, o que poderá provocar a volta da inflação, o crescimento do “risco Brasil”, o desemprego e o descompasso da economia.

 

Espero que o novo Ministro da Fazenda esteja consciente dos riscos e aja de acordo com os interesses nacionais.

 

São Paulo, Março/2006.

 

 

* Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Site: www.gandramartins.adv.br

 

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Como citar e referenciar este artigo:
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Problemas à Vista. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/politica/problemas-a-vista/ Acesso em: 17 out. 2024