Política

O terrível polilema de Lula

Em termos filosóficos, quando nos encontramos diante de uma decisão
tendo que ser necessariamente tomada e esta mesma comporta duas, e somente duas
alternativas, ela é chamada dilema, como é o caso da famosa Escolha de Sofia no
filme do mesmo nome.

Se for o caso de uma decisão comportando três alternativas, seu nome é
trilema. E se for mais do que três: polilema.

Mas não importando serem duas ou n alternativas, supondo que todas sejam
igualmente ruins e desastrosas, dizemos que se trata de um dilema, polilema ou
trilema destrutivos.

No dia 31 de dezembro de 2010, Lula teve que tomar uma decisão, que
havia postergado o mais que pôde: ou então deixá-la para sua sucessora, Dilma
Rousseff, em que não decidir nada consistiria numa tomada de decisão.
Tratava-se de fato de um trilema destrutivo apresentando três alternativas:

(1) Conceder a extradição
para a Itália do criminoso Cesare Battisti.

(2) Não conceder

(3) Deixar a batata quente
para Dilma.

Eram essas, nem mais nem menos, as alternativas em jogo e qualquer delas
que fosse tomada acarretaria desastrosas consequências, sem que soubéssemos
dizer qual a mais danosa em termos jurídicos e políticos.

Supondo que ele tivesse tomado a decisão (3), criaria um embaraçoso
problema para a sua sucessora logo no início de seu governo. Dilma se
encontraria na mesma situação de Tarso Genro enquanto ministro da Justiça no
governo Lula. Lembremos que ele foi o primeiro a concordar com a idéia de dar
asilo ao meliante italiano…

Tanto Dilma como Tarso, tendo sido guerrilheiros, como iriam negar
proteção a um “guerrilheiro” no seu distorcido modo de compreender o caso? Na
realidade, Battisti era um criminoso como outro qualquer, autor de vários
assaltos à mão armada e latrocínios. Ele chegou ao Brasil fugindo da polícia
italiana, após ter sido condenado pela Justiça e estar cumprindo pena atrás das
grades.

Desse modo, a decisão (3) foi posta de lado por Lula por não querer ser
visto como ele sempre se mostrou: alguém que, para salvar sua pele, não hesita
nem um momento sequer em fritar seus “companheiros”. Vide o Caso do Mensalão em
que Zé Dirceu e outros foram fritados enquanto ele, Lula, disse que “nada
sabia, nada tinha visto”. E a maioria do povo acreditou nesta lorota. M’engana
qu’eu gosto!

Caso ele tivesse tomado a decisão (2), não concedendo asilo político a
um “herói das esquerdas”, teria sido considerado um traidor da “causa
socialista” e desagradado muito tanto aos membros de seu partido
“revolucionário” como aos de seus tentáculos internacionais, a saber: Hugorila
Chávez, as FARC e, principalmente, El Coma Andante de Cubanacan, misterioso
país del amor.

Restava apenas a decisão (1) e
esta foi realmente a que Lula tomou concedendo asilo político a um reles
criminoso, autor de, entre outros crimes, um latrocínio em que executou um açougueiro na frente do filho pequeno
deste mesmo!

O argumento de Tarso Genro – quando era ministro da Justiça e tomou a
decisão de manter provisoriamente Battisti no Brasil – foi o de que se tratava
“crimes políticos” e que se Battisti fosse extraditado para a Itália, sofreria
perseguição do governo de direita de Berlusconi. E Lula parece ter acolhido
prazerosamente esse pífio argumento.

Na realidade, um sofisma de terceira categoria, pois quem comete
assaltos e latrocínios não pode ser considerado “criminoso político”, mas sim
um criminoso comum como Escadinha e Fernandinho Beira-Mar, ainda que venha com
a esfarrapada desculpa de que a finalidade última desses crimes era a de arrecadar
dinheiro para a revolução. Me poupe dessa asneira!

Se um indivíduo assalta e mata, tendo o “nobre” objetivo de doar a grana
indevidamente apropriada para criancinhas pobres, um asilo de velhinhos ou
arrecadar dinheiro para a guerrilha, suas finalidades últimas são todas
juridicamente irrelevantes. O que é relevante é que ele assaltou e matou.
Quaisquer que sejam os meios e os fins, estes jamais justificam aqueles.

E se Battisti sofresse alguma perseguição, esta seria a da polícia
italiana em sua legítima tarefa de capturar um criminoso procurado não só por
ela como também pela Interpol.

Supondo que o Brasil não tivesse um tratado de extradição com a Itália,
como realmente não tem com alguns países, Lula não teria aviltado nenhuma regra
do direito internacional, embora continuasse sendo um ato moralmente
deplorável; mas o fato é que o Brasil tem de fato o referido tratado com a
Itália e uma importante regra foi aviltada. Quem concede credibilidade a um
país descumpridor de acordos internacionais?

O mínimo que podemos esperar dessa torpe violação de um acordo no âmbito
do direito internacional são os veementes e justificados protestos do governo
italiano e de todos os países em que vigem a democracia e o estado de direito,
o que não é certamente o caso de Cuba, Venezuela, Bolívia, Irã et caterva.

Que fará o governo italiano, desrespeitado em sua soberania? Chamará de
volta seu embaixador em Brasília? Cortará relações com um país que não cumpre
seus acordos internacionais? Quer tome essas ou medidas semelhantes, estará
plenamente justificado em todo o mundo civilizado.

Um país que dá abrigo a criminosos – condenados pela Justiça de outro e
perseguidos por sua polícia – é um país de governantes coniventes com a
criminalidade. É inacreditável o ponto em que o Brasil chegou, alvo de
reprovações e deboches dos países civilizados.

Lima Barreto tinha toda a razão: esse país é mesmo a Bruzundanga!

* Doutor em Filosofia
pela UFRJ. Professor Adjunto IV do Depto. de Filosofia da UFRJ. Ex-Pesquisador
do CNPq. Ex-Membro do ILTC [Instituto de Lógica, Filosofia e Teoria da
Ciência], da SBEC [Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos]. Membro Fundador
da Sociedade Brasileira de Análise Filosófica. Autor de Problemas de Filosofia
da Linguagem (EDUFF, Niterói, 1985); O Dizível e O Indizível (Papirus,
Campinas, 1989); Ética Mínima Para Homens Práticos (Instituto Liberal, Rio de
Janeiro, 1995). O Problema da Ficção na Filosofia Analítica (Editora UEL,
Londrina, 1999). Ceticismo ou Senso Comum? (EDIPUCRS, Porto Alegre, 1999). Deus
Existe? Uma Investigação Filosófica. (Editora UEL, Londrina, 2000) . Liberdade
ou Igualdade? ( EDIPUCRS, Porto Alegre, 2002). Co-autor de Significado, Verdade
e Ação (EDUF, Niterói, 1985); Paradigmas Filosóficos da Atualidade (Papirus,
Campinas, 1989); O Século XX: O Nascimento da Ciência Contemporânea (Ed.
CLE-UNICAMP, 1994); Saber, Verdade e Impasse (Nau, Rio de Janeiro, 1995; A
Filosofia Analítica no Brasil (Papirus, 1995); Pré-Socráticos: A Invenção da
Filosofia (Papirus, 2000) Já apresentou 71 comunicações em encontros acadêmicos
e publicou 46 artigos. Atualmente tem escrito regularmente artigos para
www.parlata.com.br,www.rplib.com.br , www.avozdocidadao.com.br e para
www.cieep.org.br , do qual é membro do conselho editorial.

Como citar e referenciar este artigo:
GUERREIRO, Mário. O terrível polilema de Lula. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2011. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/politica/o-terrivel-polilema-de-lula/ Acesso em: 28 jul. 2025