Gigante pela própria natureza e anão pela própria incompetência, o Brasil tem uma das maiores costas do mundo, uma extensa faixa de águas territoriais marítimas indo da foz do Oiapoque à altura do Arroio Chuí.
Assim sendo, era de se esperar que pescasse peixes e frutos do mar em abundância e esta resultasse num preço do pescado bastante acessível para o consumidor.
No entanto, de todas as carnes de animais consumidas pelos “especistas” – que não levam a sério o filósofo australiano Peter Singer e não conseguem resistir às tentações da carne, como resistem heroicamente os mais radicais vegetarianos – o preço do pescado é o mais caro de todas as carnes comíveis, inacessível ao consumidor de baixa renda, a não ser que ele esteja disposto a engulir cocoroca, mulato velho e acará. Cherne e badejo nem pensar! São “peixes de rico”
Tendo uma costa mais de dez vezes menor do que a do Brasil, o Japão pesca mais de dez vezes mais. Como se explica isto? Do mesmo modo que tendo uma população rural mais de seis vezes menor do que a da China, a agricultura americana produz mais de seis vezes mais do que a chinesa.
A explicação é de uma acachapante simplicidade: no caso do Japão, a pesca é altamente industrializada, no dos Estados Unidos há muito que a agroindústria substituiu a agricultura braçal e sem beneficiamento dos produtos agrícolas.
Em síntese: a tecnologia voltada para a produção agrícola e pesqueira aumentou a produção, produzindo mais com menos mão-de-obra e diminuindo os custos dos produtos de ambas.
Possuidor de grandes navios pesqueiros, que pescam, congelam e embalam peixes e frutos do mar, eliminando perdas por deterioração e intermediários se interpondo entre os pescadores e os consumidores, os japoneses, há alguns, anos propuseram ao governo brasileiro pescar em águas territoriais brasileiras e vender o produto da pesca ao Brasil.
Resposta do governo brasileiro: assim como o petróleo é nosso, o peixe é nosso! E se é nosso, só nós mesmos podemos pescar. Protejamos, pois, nossos pescadores em suas românticas canoas e jangadas pré-históricas. Ah! como é doce morrer no mar, nas ondas verdes do mar…
Além do beneficiamento feito dentro dos próprios navios pesqueiros, os peixes e frutos do mar não são uma riqueza inesgotável, principalmente quando se pratica a pesca predatória. Daí a necessidade de se construir viveiros de peixes e frutos do mar, coisa que é feita em larga escala em países civilizados e pouco feita no Brasil, país semicivilizado ou, caso se prefira, semibárbaro, o que dá no mesmo.
No Brasil, a pesca ainda é artesanal e muitos intermediários se interpõem entre o pescador pobre que vende seus peixes por uma ninharia e o pobre consumidor que os compra por um preço elevadíssimo. E não tem nenhum cabimento pôr a culpa no explorador estrangeiro nem nas multinacionais. Assim como o petróleo e o pescado, a pesca primitiva é nossa.
Antigamente se dizia que “pobre quando come frango, um dos dois está doente”. Hoje, com o notável progresso da avicultura em larga escala, ocupando o lugar dos galinheiros de fundo de quintal, o pobre passou não só passou a comer frango como também tornamo-nos grandes exportadores avícolas. Mas pobre quando come camarão, é porque ganhou na loteria esportiva ou recebeu um tapa-boca de um infrator da lei. Obviamente, a segunda alternativa é muito mais freqüente…
Como lembra uma minoria ínfima de brasileiros não-desmemoriados – minoria esta que não dá pra eleger nem vereador de cidade pequena – nos áureos tempos da República do Pão-de-Queijo, o solerte Itamar Franco, diante dos altos preços dos remédios, cogitou em criar um Ministério dos Remédios. Ao que um conhecido economista, observou que se ele tivesse feito isso, seu governo não teria mais remédio!
Mas, em compensação, o Dom Quixote das Alterosas ganhou um invejável epíteto: “O Defensor dos Frascos e Comprimidos”.
Creio que no começo do primeiro governo da República de Garanhuns, Lulinha-Paz-e-Amor, desejando que os brasileiros comessem mais peixes e frutos do mar – desejo em si bastante desejável – criou mais um dos seus muitos ministérios e secretarias: Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca. Nome pomposo, sem nenhuma dúvida.
Hoje a referida secretaria já está estruturada como 38.o ministério, com 75 % de não-concursados comissionados e já tem suas metas para resolver o problema, fazendo com que alguns brasileiros sejam beneficiados pela peixada, não só na sexta-feira santa em que é obrigação nacional autoimposta comer peixe. Êta povo supersticioso e ignorante!
Eis o que diz a respeito desse ministério um excelente artigo do Correio Braziliense (29/7/2009):
“A atividade pesqueira nacional tem uma representação notável
“A alteração ressaltou uma característica da pasta: a profusão de funcionários comissionados. Sob influência de petistas catarinenses — Altemir Gregolin é protegido da líder do governo no Congresso, senadora Ideli Salvatti (PT-SC) —, o Ministério da Pesca vai funcionar com 496 servidores, dos quais 75% contratados sem concurso. O novo braço do executivo é alvo de fortes críticas da oposição e de ambientalistas. Mantém uma relação desgastada com o Ibama [do companheiro Jair do Val-Palmares], que perdeu a prerrogativa de emitir licenças para a indústria pesqueira.”
De
“Comandado pelo petista Altemir Gregolin, o órgão ocupa nove salas no Bloco D da Esplanada dos Ministérios. Hoje, conta com 210 funcionários em Brasília, dos quais 42 são do quadro efetivo e 88 comissionados. Os restantes são requisitados de outros órgãos. Tão logo seja publicado o decreto necessário para definir o staff da pasta, serão contratados 286 servidores, todos comissionados. Com a medida, que dobrará o número de funcionários, o Ministério da Pesca terá 75,4% do pessoal admitido sem realização de concurso público.”
“O percentual está muito acima da média do governo federal. Segundo o Boletim Estatístico de Pessoal do Ministério do Planejamento, edição de junho deste ano, o Poder Executivo federal tem 542,8 mil servidores civis ativos [Mais de meio milhão!!!] dos quais 78,3 mil lotados em cargos e funções comissionadas [Beleza pura!], ou seja, 14,5% do total. O processo de criação do ministério foi controverso.”
“Durante votação no Congresso do projeto que tratava de sua implementação, a oposição fez todo tipo de provocação. O líder do PSDB na Câmara, José Aníbal (SP), até hoje costuma fazer graça. “Daqui a pouco vão criar o Ministério da Banana. O que falta para a pesca não é ministério, é política e gestão.” Falou e disse a Voz da Sensatez, um sóbrio entre ébrios!
Mas assim como a melhor maneira de não se apurar deslizes administrativos é criar uma comissão de inquérito, a melhor maneira de não gerar desenvolvimento é criar ministérios na Ilha da Fantasia, povoada por burocratas inúteis e corruptos governando um país do Faz-de-Conta.
Brasil: um país de todos [ou de tolos?]
apêndice I: uma aparente ofensa
Lulla chamou de “imbecis” os que criticam o bolsa família e alegam que se trata de puro assistencialismo, que os que recebem o benefício não procuram mais emprego e ficam na pasmaceira, que se trata, enfim, de um programa puramente eleitoreiro, etc.
Incluo-me entre esses “imbecis” e não me sinto ofendido. Ser chamado de “imbecil” por Lulla é um grande elogio.
Mas somente para aqueles que não votaram nem jamais votarão nele!
apêndice II: já que é assim…
Dilma Roussef, a mãe do PAC (Programa para Alavancar a Companheira), disse que um metalúrgico já é presidente do Brasil, que um negro já pode ser presidente do Brasil. Se é assim, então, por que não uma mulher?
De pleno acordo! Aproveitando o ensejo, lanço aqui a candidatura de Gisele Bündchen pelo PEB (Partido Estético Brasileiro). Ela pode não resolver nenhum dos nossos graves problemas socioeconômicos e políticos, mas em compensação teremos a beleza no Poder.
Ah! Gisele, Gisele…[prolongados suspiros ao entardecer…]. Ela é o Brasil que deu certo! Um colírio para os olhos de milhões de desesperançosos brasileiros
* Mario Guerreiro, Doutor em Filosofia pela UFRJ. Professor Adjunto IV do Depto. de Filosofia da UFRJ. Ex-Pesquisador do CNPq. Ex-Membro do ILTC [Instituto de Lógica, Filosofia e Teoria da Ciência], da SBEC [Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos]. Membro Fundador da Sociedade Brasileira de Análise Filosófica. Autor de Problemas de Filosofia da Linguagem (EDUFF, Niterói, 1985); O Dizível e O Indizível (Papirus, Campinas, 1989); Ética Mínima Para Homens Práticos (Instituto Liberal, Rio de Janeiro, 1995). O Problema da Ficção na Filosofia Analítica (Editora UEL, Londrina, 1999). Ceticismo ou Senso Comum? (EDIPUCRS, Porto Alegre, 1999). Deus Existe? Uma Investigação Filosófica. (Editora UEL, Londrina, 2000) . Liberdade ou Igualdade? ( EDIPUCRS, Porto Alegre, 2002). Co-autor de Significado, Verdade e Ação (EDUF, Niterói, 1985); Paradigmas Filosóficos da Atualidade (Papirus, Campinas, 1989); O Século XX: O Nascimento da Ciência Contemporânea (Ed. CLE-UNICAMP, 1994); Saber, Verdade e Impasse (Nau, Rio de Janeiro, 1995; A Filosofia Analítica no Brasil (Papirus, 1995); Pré-Socráticos: A Invenção da Filosofia (Papirus, 2000) Já apresentou 71 comunicações em encontros acadêmicos e publicou 46 artigos. Atualmente tem escrito regularmente artigos para www.parlata.com.br,www.rplib.com.br , www.avozdocidadao.com.br e para www.cieep.org.br , do qual é membro do conselho editorial