Fidelidade programática e partidária, enquadramento no espectro político, linha ideológica definida. Fatores que nortearam o surgimento do sistema político-partidário que vige hoje no mundo ocidental cede, de forma cada vez mais acentuada e irreversível, espaço à linearidade dos partidos políticos na administração pública. Os “planos de governo”, outrora reflexo das divergências entre agremiações políticas, hoje atestam a situação de nosso sistema representativo, que beira o caos frente à crescente influência do mercado na gerência do Estado.
A máxima neoliberal de não-intervenção estatal na economia hoje se inverte. Em nome da chamada “estabilidade política” exigida pelo capital estrangeiro – financiador do crescimento nacional – a máquina estatal põe-se a serviço desses especuladores, restringindo qualquer mudança estrutural que venha a ameaçar a política de subserviência e submissão. Limitam-se gastos com políticas públicas necessárias para remendar o abismo existente entre os extremos da sociedade brasileira, e força-se o administrador público a ser um fantoche, manipulado por interesses escusos e muitas vezes invisíveis ao cidadão. Desta forma, a verdadeira estabilidade, representada por poderes de soberania independentes e plenamente ativos, por instituições nacionais sólidas e idôneas e na manutenção do Estado democrático de Direito, é substituída pela linearidade dos partidos políticos que se sucedem frente ao governo central, sem possibilidade de implementar significativas mudanças na sociedade sem pagar para tanto um alto preço.
Atestamos esta realidade hoje, quando uma agremiação política que nasceu e construiu suas bases à esquerda do espectro político, anuncia como maior triunfo a manutenção do status quo, construído por governos proclamados direitistas. Ainda pior é, ao analisar o governo anterior, perceber que quem segurava as rédeas da nação foi, outrora, engajado nos quadros esquerdistas, perseguido pelo regime ditatorial militarista vigente durante duas décadas. A partir daí, surge a falaciosa idéia de que as convicções ideológicas de determinado mandatário ou agremiação política sucumbe mediante a fúnebre, porém ainda ameaçadora máquina estatal: O cidadão depositou seu voto de confiança desejoso por mudanças práticas, e ganha em troca uma política continuísta e a desculpa que “o Presidente quer, mas seus Ministros não permitem” ou que “o partido quer, mas a estabilidade não pode ser rompida”.
Não se deve, entretanto, abster-se de considerar a imensa corrupção sistêmica impregnada na máquina estatal. Um país onde mais de 40% dos fundos investidos simplesmente não chegam aonde deveriam, onde o proposital sucateamento das instituições educacionais, de saúde e segurança chegam a níveis mundialmente alarmantes e que ainda pretende tornar-se líder entre as nações subdesenvolvidas não pode ser sério. E não importa qual partido encontre-se no poder: Direita ou Esquerda, um prova-se mais incompetente que outro para fechar as torneiras da corrupção.
Infelizmente, o que se vê hoje é uma crescente prostituição das ideologias e programas partidários. Os conceitos de direitistas e esquerdistas confundem-se cada vez mais com os de governistas e oposicionistas, considerando que é obrigação do governante seguir a cartilha previamente ditada pelos interesses do mercado, e obrigação do oposicionista criticar sistematicamente todas as posturas adotadas pelo governo, justamente para tomar para si os louros do poder. Recusamo-nos a acreditar num país onde as garantias fundamentais dos cidadãos são constantemente usurpadas e ignoradas. Ironicamente, o único lugar que nossas garantias antes dos interesses do Estado é justamente na Constituição Federal.
* Bruno Crasnek Luz, 20, acadêmico da 7ª fase do curso de graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina, é estagiário da assessoria do Gabinete do Juiz Substituto de 2º Grau Henry Petry Junior, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Foi bolsista de Iniciação Científica pelo programa PIBIC/CNPq entre 2005 e 2007.
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