Prescrição Trienal na Lei Societária
Moacir Leopoldo Haeser*
A celeuma da introdução da alínea “g”, no Inc.II, do art.287 da lei 6.404/76, pela Lei 10.303/2001 e as demandas dos antigos acionistas da CRT, por diferença de ações, contra a BRASIL TELECOM.
Continua causando celeuma a questão da prescrição trienal introduzida pela Lei nº 10.303/2001, mediante o acréscimo da alínea “g”, no art. 287, Inc.II, da Lei.6.404/76 , que dispõe sobre as Sociedades por Ações, objeto de pedido de Uniformização de Jurisprudência pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
A nova disposição legal tem merecido a crítica dos melhores doutrinadores por ser lacunosa, não fixar o termo a quo prescricional e ser inócua diante da impossibilidade de sua aplicação e, ainda, por violar princípios da igualdade e do devido processo legal (CF. art. 5º, caput e inciso XXXV(MODESTO CARVALHOSA, in “Comentários à Lei das Sociedades Anônimas”, 4ª Volume, São Paulo, Saraiva, 2003, p. 495), além da sofrível falta de técnica legislativa aparentando uma abrangência que não possui (do acionista contra a companhia, qualquer que seja o seu fundamento).
Destacados julgadores também a tem repudiado, especialmente quando invocada para tentar frustrar o direito de milhares de aderentes a Contratos de Participação Financeira da COMPANHIA RIOGRANDENSE DE TELECOMUNICAÇÕES – CRT, hoje incorporada pela BRASIL TELECOM S/A, que, ao contrário dos demais assinantes que receberam corretamente suas ações, por ter a empresa RETARDADO a conversão em ações em seu nome, receberam MENOS AÇÕES do que teriam direito. Isso porque a relação é de Direito Civil, de natureza contratual e decorre da má-fé objetiva na execução do contrato e do mandato recebido para agir em nome do aderente, sendo o prazo vintenário.
É evidente que os prazos prescricionais previstos no art. 287 da lei 6.404/76 tratam de assegurar direitos societários, não cogitando a norma de estabelecer quaisquer outros prazos prescricionais relativos a outros direitos que não os que decorrem de uma dessas relações.
Nos comentários ao art. 1.089, do Código Civil, MARIA HELENA DINIZ esclarece com sua costumeira proficiência que a sociedade anônima é disciplinada por lei especial (Lei nº 6.404/76 com alterações das Leis nº 9.457/97 e nº 10.303/2001), e, nos casos omissos, subsidiariamente pelas disposições do Livro II da Parte Especial do Código Civil. Os demais Livros da Parte Geral e da Parte Especial do Código Civil aplicar-se-ão, diretamente, no que for cabível aos atos e negócios jurídicos da sociedade anônima.
As demandas de adimplemento contratual são de natureza civil, pois questionam o correto cumprimento de um contrato firmado com a sociedade anônima e o mau exercício do MANDATO outorgado pelo aderente, com resultado lesivo pela postergação da conversão em ações, muitas vezes para o ano seguinte, sem observância do preço de emissão previamente fixado pela Assembléia (art.170 da Lei 6404) e o obrigatório registro da subscrição de capital no Balanço Anual (art.182 da mesma lei).
A posição já pacificada no SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA é de que a regra prescricional aplicável é a relativa às ações pessoais, sendo vintenária.
Ademais, conveniente lembrar vetusta regra de hermenêutica de que não pode a mesma questão jurídica ser submetida a duas normas diferentes de prescrição. A edição de nova regra relativa a prescrição de relações societárias (art.287 da Lei 6.404) não afeta relações obrigacionais submetidas ao Código Civil. Tão-somente deverá ser considerada a regra de direito intertemporal do art.2.028 do novo Código Civil quanto à redução dos prazos.
Não se pode esquecer, ainda, as causas interruptivas ou suspensivas da prescrição, em especial, no caso, a regra do art. 168, Inc.IV do Código Civil, então vigente, que estabelece que não corre a prescrição em favor do mandatário contra o mandante relativo à responsabilidade pelos danos causados, pelo menos até que este preste as devidas contas pelos atos praticados, não se podendo esquecer que o fluxo de qualquer prazo só pode ocorrer da efetiva ciência do titular do direito lesado, se inerte permanecer (dormientibus não socorrit jus), interrompendo-se o prazo prescricional pelo pedido de informações, de exibição, de prestação de contas ou qualquer ato inequívoco de reconhecimento do direito.
Por questoes de espaço, em separado a jurisprudência a respeito da matéria.
* Desembargador aposentado e advogado
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