A soberania do direito de votar é garantia da Constituição Federal em seu artigo 14, fornecido como instrumento de participação na vida política e que se insere nos direitos políticos do cidadão. Essa garantia abrange não apenas o direito de votar, mas também o de ser votado.
Os direitos constitucionais relativos ao voto do eleitor tomam relevância devido a sua importância no exercício da democracia. Eles são essenciais para as liberdades individuais como de expressão, à informação e à liberdade de consciência, e para a efetivação dos Direitos Sociais e Econômicos que são aspirações populares que se expressam através dos instrumentos democráticos de participação.
Assim, o direito do cidadão deverá ser exercido livremente, e sua vontade absoluta deve ser respeitada e obedecida. Mas esse respeito e obediencia deverá persseguir o processo até sua etapa final, pois somente ali o voto preencherá os requisitos de eficácia, sinceridade e autenticidade, que é ponto fundamental para a idéia de uma democrácia política real.
Durante as cinco eleições que participei como representante de partido político, assessorando candidatos e advogando diretamente junto ao Tribunal Superior Eleitoral, pude perceber na evolução do processo eleitoral uma tendência constante de desrespeito aos direitos constitucionais dos eleitores.
É nenhuma a preocupação do administrador eleitoral com a eficiência do voto do eleitor. A garantia Constitucional da liberdade do cidadão para eleger seus representantes deveria caminhar até a garantia dele saber o destino do voto dado, porque somente nesse momento, ele estará exercendo à plenitude o sentido de democracia.
A importância do eleitor, no processo eleitoral brasileiro, restringe-se a obrigação de comparecer para votar. Daí em diante vale o que o resultado eletrônico apurar. Essa conseqüência vem sendo seguidamente normatizada pelo administrador eleitoral, para quem, tecnicamente, a integridade e o sigilo do voto estarão garantidos desde que usada urna eletrônica e o sistema de informática da Justiça Eleitoral.
Se o voto foi ou não computado corretamente não cabe ao eleitor questionar. Mesmo porque, hoje, não existe meio eficaz e independente de se realizar uma auditoria do processo eleitoral.
No bojo do desinteresse do TSE em dar proteção e em conseqüência eficácia ao voto do eleitor, também foi inserido um constante descaso aos direitos dos partidos políticos, a quem pertence o mandato dos agentes com direito passivo de ser votado, também garantido pela Constituição.
A condição de desequilíbrio e exclusão dos partidos junto a administração eleitoral, pode ser bem evidenciada pelas recentes decisões do TSE quanto a realização de Testes de vulnerabilidade das urnas eletrônicas. Em tese, estes testes deveriam servir para confirmar a eficácia do voto do eleitor, na sua etapa de apuração.
Mas como forma de garantir o resultado positivo dos testes os Partidos e eleitores foram impedidos pelo administrador eleitoral de ocuparem posições deliberativas, sendo criadas para agregá-las comissões compostas exclusivamente por servidores e pessoas de confiança, indicadas pelo administrador eleitoral.
O controle absoluto dos testes pelo administrador eleitoral, joga os eleitores e partidos á condição de meros espectadores, ou no máximo para realizar procedimentos previamente autorizados, numa submissão dos agentes políticos ao poder do Tribunal, sem nenhuma liberdade de expressão, pois quem decide sobre o que deverá ser divulgado são os membros das Comissões criadas pela Justiça Eleitoral. .
Soterra também a oportunidade de verificação da eficácia do voto na modalidade passiva a incapacidade financeira dos partidos políticos, já que o processo eletrônico eleitoral, na forma como foi concebido pelo administrador eleitoral, tornou-se muito caro. Hoje para realizar a fiscalização do processo eleitoral um partido tem que dispor de técnicos de informática capacitados, bem como advogados instruídos na área de tecnologia da informação.
A contratação e manutenção de tantos profissionais quanto bastem para fiscalizar a grande quantidade de locais espalhadas pela federação, tornou-se inviável ou impossível à maioria dos partidos, o que significa obstaculizar financeiramente o direito de fiscalizar.
Essa situação ocorre porque o administrador eleitoral não admite a possibilidade de se conjugar os benefícios da tecnologia o aprimoramento e a absorção de todas as técnicas existentes, com a inclusão de métodos simples e baratos, que possibilitem o exercício do direito de fiscalizar, de forma indistinta pelos interessados.
Chama-se aqui a recente inovação da Câmara dos Deputados, incluída no artigo 5º da Minireforma Eleitoral que prevê uma auditoria independente dos resultados, possível de ser realizada por todo e qualquer cidadão independente de seu grau de instrução, posto que serão sorteadas 2% das urnas para recontagem dos votos .
Esse método de auditoria significa um barateamento imenso do processo que visa demonstrar aos agentes políticos ativos e passivos que o voto completou seu ciclo jungido dos requisitos eficácia, sinceridade e autenticidade, o ideal da pura democracia.
Resta pensar qual o modelo de processo eleitor que queremos, e nesse sentido tentar mudar as Instituições.
* Maria Aparecida Cortiz, Advogada em São Paulo, Especialista Em Auditoria Eleitoral