Economia

O necessário corte de despesas

O necessário corte de despesas

 

 

Ives Gandra da Silva Martins*

 

 

 

Em artigos anteriores para o jornal “Valor”, tenho realçado que a aparência de desenvolvimento econômico no país não corresponde à realidade, pois crescemos menos que os demais países emergentes, o nível de captação de investimentos caiu assustadoramente, e aumentaram juros, tributos e corrupção, segundos os organismos internacionais.

 

Compreende-se, que, para manter a moeda estável, a clássica política monetária – resumida por Irving Fischer em “substituir a impaciência de gastar pela oportunidade de investir” – tenha sido adotada pelo Governo, mas mostra-se excessiva a calibragem para o alto, que gera juros reais muitíssimo superiores ao mercado internacional e fantasticamente desestimuladores de inversões de risco.

 

Poderia, todavia, o Governo adotar, de um lado, política monetária nos mesmos padrões, mas com calibragem mais suave e, de outro lado, fazer o que uma boa administração de qualquer empresa privada faz, ou seja, cortar despesas inúteis, exercer severo controle sobre os agentes públicos para reduzir a corrupção e baixar a carga tributária para gerar desenvolvimento.

 

Uma política monetária aliada ao combate aos desperdícios seria, de rigor, o melhor caminho para repor o país na trilha do desenvolvimento e não, como no ano de 2004 (Folha 31/10/04), ter destinado 50 bilhões de reais para pagamento de juros e apenas 1 bilhão e 700 milhões para investimentos.

 

Ocorre que a marca dos governos do partido do presidente é o inchaço da máquina pública pela admissão de correligionários, a multiplicação desnecessária de departamentos governamentais e um inaceitável tratamento preferencial aos de sua ideologia. É o que ocorre, agora, no caso das fantásticas indenizações que estão sendo concedidas a antigos guerrilheiros – considerável parte delas chegando ou ultrapassando a casa do milhão de reais – e além de assegurar-lhes, até o fim da vida, subsídios de Ministros do STF, como se nunca mais tivessem podido trabalhar desde aquela época, embora quase todos exerçam atualmente uma atividade profissional e estejam muito bem de vida.

 

Segundo “O Estado de S. Paulo”, 1 bilhão e 400 milhões de reais foram destinados aos opositores do regime de exceção de 64 a 85, que, se foi condenável –e, como membro da Anistia Internacional à época em que existia no Brasil um ramo dessa instituição, sempre assim considerei— nas técnicas de repressão utilizadas, ofertou ao Brasil muito mais estabilidade econômica, emprego e desenvolvimento do que nos dias de hoje, em que patinamos e caminhamos para trás. À época, éramos a 8ª. Economia do mundo; hoje já somos a 15ª., ultrapassados por países que estavam atrás de nós, como China, Índia, México, Espanha e este ano seremos ultrapassados pela Rússia.

 

Ora, se um governo não quer cortar despesas, persiste em contratar correligionários sem concurso e não promove as licitações necessárias –creio que estas práticas foram elemento fundamental para a derrota de Marta Suplicy, visto que, para sustentá-las, foi obrigada a aumentar fantasticamente a tributação em São Paulo (74% sobre o governo anterior)— à evidência, é obrigado a pagar juros, de um lado, para demonstrar que não é caloteiro e, de outro, torna a máquina ineficiente, pois operada não pelas pessoas melhor qualificadas, mas por meros correligionários políticos.

 

Parece-me que se o presidente Lula não lancetar esta pústula de sua Administração inchada por correligionários e aliados de ocasião, jamais conseguirá fazer o país progredir –é ainda dos países que mais alto risco de investimento apresenta — e amargará pífios índices de crescimento, como os que vimos mantendo, se comparados ao crescimento mundial.

 

Política monetária severa para evitar inflação de demanda ou excessivo consumo –de longe, não é o caso do Brasil—só será bem sucedida, se houver coragem para estruturar o Estado com base em uma burocracia profissionalizada, concursada –como ocorre entre militares e magistrados—, que o auxilie a governar o país, independentemente das preferências eleitorais e dos nem sempre confessáveis conchavos políticos. Desta forma, a máquina respeitaria o princípio da eficiência (art. 37 da C.F.) e estaria em melhores condições de prestar serviços públicos à sociedade do que hoje, que apenas se utiliza da sociedade em seu próprio benefício.

 

Espero que os resultados eleitorais acordem o Presidente Lula e que ele saiba distinguir quem são seus amigos e querem o bem do Brasil, na sua administração, e não apenas o poder, à luz de um discurso distributivista ineficiente e ultrapassado no mundo inteiro.

 

SP. 05/11/2004.

 

 

* Advogado tributarista, professor emérito das Universidades Mackenzie e UniFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, é presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, do Centro de Extensão Universitária e da Academia Paulista de Letras.

 

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Como citar e referenciar este artigo:
MARTINS, Ives Gandra da Silva. O necessário corte de despesas. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/economia/o-necessario-corte-de-despesas/ Acesso em: 22 dez. 2024