Direito Penal

O equivocado entendimento jurisprudencial de se fixar a competência pela prevenção, ao crime de receptação, quando não conexo com o crime precedente

O equivocado entendimento jurisprudencial de se fixar a competência pela prevenção, ao crime de receptação, quando não conexo com o crime precedente

 

 

Warley Belo *

 

 

Se o furto ocorre em comarca diversa da receptação, como se determina a competência?

 

É inegável a existência de conexão probatória ou instrumental entre os crimes de furto, por exemplo, e receptação, nos termos do art. 76, III do CPP. Para a configuração do delito de receptação, essencial a comprovação da origem ilícita da res. Em princípio, assim, considerando o concurso de jurisdições de mesma categoria e a identidade das penas abstratamente cominadas aos delitos, a competência é determinada pela prevenção, a teor do art. 78, II, ‘c’ do CPP. Entretanto, se desconhecida a autoria do crime de furto deve incidir a regra geral do art. 70 do CPP, prevalecendo a competência do lugar em que se consumou o crime de receptação. É dizer: embora ao furto – por exemplo – seja cominada pena mais grave, a competência será do juízo do local em que ocorreu a receptação.

 

Se existe conexão, caso em que se sabe quem praticou o furto ou o roubo ou se há investigação paralela a determinar a autoria desses crimes, não há dúvida: a competência é do local desses crimes precedentes. Todavia, a competência será a do local da receptação – e não o é por força da prevenção, frise-se – se a autoria do furto permanece indeterminada. Isso porque não há conexão quando só há uma única demanda e, se existissem duas, a competência dependeria da autoria do crime precedente (furto)1.

 

Damásio Evangelista de Jesus2 aponta que a receptação “consuma-se com o ato da aquisição, recebimento, ocultação etc. Ocorrendo com a efetiva tradição.” Desse modo, a consumação no crime de receptação se dá no local em que perpetrada a tradição da coisa, nos termos do art. 70, do CPP.

 

Se o crime precedente é de autoria desconhecida, a competência para o julgado é, pois da comarca onde se deu a receptação, ao contrário do que temos assistidos em julgados que dão a competência – equivocadamente – pela prevenção.

 

Notas de rodapé

 

1 A jurisprudência já decidiu assim: “Conflito de competência. Receptação. Furto. Autoria desconhecida. Conexão inexistente. Local da consumação.   I – Noticiados os delitos de receptação e furto – mas indeterminada a autoria deste último, não tendo sido sequer instaurado inquérito para a sua apuração, evidencia-se a inexistência de conexão, devendo haver a apuração isolada da receptação.   II – Firma-se a competência, para o processo e julgamento do feito, do juízo em que consumada a receptação, ou seja, onde perpetrados os atos de aquisição, recebimento ou ocultação do bem – ocorridos com a efetiva tradição.   III – conflito conhecido para determinar a competência do juízo de direito de Ipameri-GO, o suscitado.” (CC 17.834/SP, Relator ministro Gilson Dipp, in dj 17/2/99).

 

2 Direito Penal, vol. 2, 26ª. Ed., SP: Saraiva, p. 506.

 

 

 * Advogado Criminalista em BH/MG – Mestre em Ciências Penais / UFMG Professor de Direito Penal da Faculdade de Direito Kennedy / MG Professor de Pós-graduação UFJF (JUiz de Fora – MG) / UNESC (Colatina – ES) / FAI-DOCTUM (Caratinga – MG)

 

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Como citar e referenciar este artigo:
BELO, Warley. O equivocado entendimento jurisprudencial de se fixar a competência pela prevenção, ao crime de receptação, quando não conexo com o crime precedente. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direitopenal-artigos/o-equivocado-entendimento-jurisprudencial-de-se-fixar-a-competencia-pela-prevencao-ao-crime-de-receptacao-quando-nao-conexo-com-o-crime-precedente/ Acesso em: 22 nov. 2024