Direito Penal

Lavagem de Dinheiro: Bem Jurídico Protegido

 

                        Nas questões relativas à lavagem de dinheiro, sempre revela-se interessante a discussão a respeito de qual seria o “bem jurídico protegido”: Referimos em nossa obra – Crime de Lavagem de Dinheiro, que se trata-se análise da ordem de visão da política criminal. Existem ainda várias interpretações a respeito de qual seria o “bem jurídico” protegido pela Lei de Lavagem de Dinheiro.

 

                        Algumas interpretações consideram a existência de apenas um bem jurídico protegido. São exemplos: “A administração da Justiça”[1]; as obrigações da Polícia de apuração do crime antecedente[2]; o mesmo bem jurídico do delito antecedente[3]; o patrimônio[4], e a ordem sócio-econômica[5]. Mas há outros que interpretam o bem jurídico atingido pelos delitos de lavagem de dinheiro como “pluriofensivos”, mesclando uns com outros.

 

                        Em apertada síntese, consideramos melhor interpretação aquela que entende que os crimes de lavagem de dinheiro ofendem, ao mesmo tempo, “A administração de Justiça”, e “a ordem sócio-econômica”. Senão vejamos:

 

                        a) Administração da Justiça: Tendo a característica penal dos chamados “crimes parasitários”, que dependem da existência de outro antecedente, observamos na doutrina estrangeira duas espécies de conclusões: Parte da doutrina, como na Suíça, entende que o bem jurídico tutelado é a Administração da Justiça, na medida em que visa suplementar a eficiência na apuração e punição das infrações penais que, reconhecidamente pelo legislador, abalam sobremaneira a ordem pública e não conseguem encontrar, por si só, a resposta adequada da própria Administração de Justiça com vistas à defesa da sociedade. Então a criminalização de condutas concebidas como “processamento de ganhos ilícitos” vem potencializar a aplicação da justiça em relação aos crimes precedentes.

 

                        b) A Ordem Sócio-Econômica: Considerando, por outro foco, a quantidade astronômica de dinheiro lavado no mundo inteiro de se admitir que o impacto na ordem sócio-econômica é brutal, em todos os níveis. Empresas regulares perdem a concorrência porque aquelas que utilizam fundos provenientes das ações criminosas conseguem ter capital suficiente para provocar outros delitos, como dumping, underselling, formação de cartel com outras nas mesmas situações e condições etc. O quebramento destas empresas gera desemprego, possibilita o domínio de mercado, atacando diretamente as leis naturais da economia, como a livre concorrência e a oferta e procura. No mais das vezes, acaba gerando inflação na medida em que esta(s) empresa(s) “dominantes” estabelecem monopólios e fixam os preços dos produtos, livremente. Mas a lavagem de dinheiro também promove o incremento da própria “empresa criminosa”, aperfeiçoando, por exemplo, as formas de tráfico e venda de entorpecentes, dificultando a ação gerando mal irreparável à saúde pública da sociedade.

 

                        Parece-nos correto considerar, então, que ambos situam-se na órbita do bem jurídico tutelado pela Lei, tanto a tutela da Administração da Justiça como também a tutela da ordem sócio-econômica.

 

 

 

* Marcelo Batlouni Mendroni, Promotor de Justiça/SP do GAECO – Doutor em Direito Processual pela Universidad Complutense de Madrid



[1] São adeptos a essa interpretação: ARTZ, Gunther:“Schweizericsche Zeitschrift für Strafrecht. Das schweizerische Geldwäschereigebot im Lichte americanischer Erfahrungen, Revue Penale, 1989; e PIETH, Mark: „Bekämpfung der Geldwäscherei, Modellfall Schweiz?“. Helbin und Lichtenhahn Verlag. Stutgart, 1992.

[2] SALDITT, Franz: “Der Tatbestand der Geldwäsche“. Strafverteidiger Forum, 1992

[3] HUND, Horst: “Zeitschrift der rechtspolitik”. Der Geldwäschetatbestand – mißglückt oder mißverstanden?, ZRP, 1996

[4] ARRIETA, Andrés Martínz: “La Criminalidad organizada. Aspectos sustantivos, procesales y orgánicos”. Blanqueo de Capitales. Cuadernos de Derecho Judicial, II-2001, pág. 382: “No cabe duda que el bien jurídico protegido es el patrimonio, esto es, el conjunto de bienes amparados por una relación jurídica[…]La existencia de un patrimonio com origen en un hecho delictivo grave conocido vulnera abiertamente las normas reguladoras para la obtención de patrimonio y la protección que se le suministra”.

[5] FORTHAUSER, Roman: “Geldwäscherei de lege lata e ferenda”. VVF. Munchen, 1992; CAPARRÓS, Eduardo A. Fabián: “El delito de blanqueo de capitales”. Ed, Colex, 1998

 

Como citar e referenciar este artigo:
MENDRONI, Marcelo Batlouni. Lavagem de Dinheiro: Bem Jurídico Protegido. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direitopenal-artigos/lavagem-de-dinheiro-bem-juridico-protegido/ Acesso em: 13 mar. 2025