Jônatas Kreuzi*
Definição de embriaguez:
Para Juliano Fabbrini Mirabete, a embriaguez “… pode ser considerada como a intoxicação aguda e transitória causada pelo álcool ou por substâncias de efeitos análogos que privam o sujeito da capacidade normal de entendimento”.
Tipos de Embriaguez (provocadas por álcool):
Voluntária: Ocorre quando o agente ingere bebidas alcoólicas a fim de atingir o estado de ebriedade.
De acordo com o art. 28 do Código Penal brasileiro, essa modalidade de embriaguez não exclui a imputabilidade penal, a não ser que a prática do delito era imprevisível e o agente não queria ou não assumiu nenhum risco de produzi-lo.
De acordo com o HC 59536 / AL, a embriaguez completa, decorrente de procedimento voluntário do acusado, não o torna inimputável. (STF)
Mais além, o RHC 48494 / MG diz claramente que “A embriaguez voluntária não é causa de isenção de responsabilidade”, sendo responsabilidade ativa do acusado. (STF)
Também nesse sentido, encontramos a seguinte jurisprudência: “Roubo, roubo. inimputabilidade penal. Inocorrência. Agente que praticou o delito sob efeito de entorpecentes. consumo voluntário que não exclui a imputabilidade penal. Inteligência do art. 28, II, do CP. (…) ainda que constatado que o agente praticou o crime de roubo sob efeito de entorpecentes, o consumo voluntário não exclui a imputabilidade penal nos termos do art. 28, II, do CP” (RT 747/698). (TJ-SC)
Idêntica é a interpretação extraída desse dispositivo paulista, que foi utilizado também pelo TJ-SC na Revisão criminal n. 2005.017275-3: “sem prova, a cargo da defesa, de que a embriaguez, além de completa, resultou de condições fisiológicas até então desconhecidas do réu, não se torna viável a isenção de pena nos moldes do art. 28, § 1º, do CP” (TACRIM-SP – AC – Rel. Haroldo Luz – RJD 14/86).
Preordenada : É uma modalidade da embriaguez voluntária, na qual o agente pretende atingir o estado de ebriedade a fim de melhor cometer o crime. O art. 61, II, I, do CP, essa modalidade de embriaguez caracteriza uma circunstância agravante.
Sobre embriaguez preordenada, rege a seguinte jurisprudência, prefeitamente compatível com a legislação penal: “E se a embriaguez foi a razão do exacerbo na sua conduta, isto, porque voluntária, de nada o socorre, não justificando sua violência e não afastando o motivo despropositado que o levou ao desfecho fatídico, já que de acordo com o princípio da action libera in causa, adotado pelo nosso sistema penal, a embriaguez preordenada faz com que o agente responda pelo resultado alcançado caso tenha se colocado voluntariamente nesse estado antes da prática do fato delituoso”. (Apelação Criminal n. 2004.035496-7, TJ-SC).
Para melhor elucidar o tema, também rege essa jurisprudência: “A circunstância legal do art. 61, II, l, do Código Penal, exige que o agente se embriague com a finalidade de criar condições psíquicas favoráveis à prática do delito, animando-se de coragem ou sufocando os resíduos de resistência; se o acusado já estava embriagado antes dos fatos e apenas aproveitou-se do ensejo para cometer o crime, arreda-se a agravante” (Ap. crim. n. 97.009880-4, de Palhoça, Rel. Des. Paulo Gallotti, j. em 23.9.97). (TJ-SC)
Culposa : Acontece quando o sujeito, imprudentemente, atinge o estado de ebriedade, mas sem a intenção de atingir tal estado.
Nesse caso, o agente que assumiu o risco de produzir o resultado, ou seja, se ele tinha consciência de que o resultado poderia ser a ação criminosa, ele é, de acordo com o art. 28 do CP, imputável.
Na jurisprudência, o HC 51976 / MG diz que a inimputabilidade ou a imputabilidade reduzida presumem a embriaguez não voluntária ou não culposa. (STF)
Outra decisão (HC 46791 / RS) versa que “A embriaguez, seja voluntária ou culposa, por si só, não caracteriza dolo eventual”, podendo caracterizar também a culpa consciente, por exemplo. (STF)
Também sobre o tema, rege o seguinte dispositivo Catarinense: “Eventual embriaguez não escusa o delinqüente, porquanto não exclui a imputabilidade penal a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância análoga, conforme preceitua o art. 28, II, do CP” (Apelação Criminal n. 99.014497-6, de Mafra, rel. Des. Francisco Borges).
Fortuita: Ocorre em função de caso fortuito ou de força maior, situações nas quais o agente fica embriagado sem sua vontade. O caso fortuito ocorre quando, por exemplo, o agente cai em um barril de aguardente e consome a bebida de forma involuntária. Já o caso fortuito pode ser representado quando o agente é obrigado a ingerir a bebida entorpecente.
De acordo com o art. 28, § 1º, ocorrendo embriaguez completa por caso fortuito ou força maior, exclui-se a imputabilidade do agente se comprovado que ele não tinha capacidade de entendimento ou autodeterminação no momento da conduta criminosa.
Segundo o HC 71803 / RS, a embriaguez que isenta o agente de pena é aquela decorrente de caso fortuito ou força maior que, mostrando-se completa, revela que ao tempo da ação ou da omissão era ele inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato, ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. (STF)
Nesse mesmo diapasão, encontramos o dispositivo, com idêntico conteúdo: “A influência do álcool só isenta o réu de pena quando proveniente de caso fortuito ou força maior” (Ap. crim n. 02.019059-0, de Papanduva, rel. Juiz José Carlos Carstens Köhler, j. 25.03.2003). (TJ-SC)
Crônica : É um tipo de embriaguez do qual são predispostos os filhos dos alcoólatras, que podem ter acessos a transtornos emocionais com a ingestão de pequenas doses de álcool. Para essa modalidade, não se deve aplicar o art. 28.
Salgado Martins, lucidamente, esclarece que no Direito Brasileiro, somente “… as psicoses heterotóxicas conseqüentes à embriaguez crônica, são abrangidas pelo conceito de doença mental e, nessa qualidade, dirimem a responsabilidade, se forem de molde a subverter totalmente a consciência ou a vontade do agente” (Sistema de Direito Penal Brasileiro, vol. 1º, pág. 296, in, ob. cit. pág. 137).
Mas para tornar o agente inimputável, é preciso comprová-la, já que a seguinte jurisprudência lúcida o seguinte: “(…) ISENÇÃO DE PENA. ART. 28, § 1º, DO CÓDIGO PENAL. ALMEJADO RECONHECIMENTO DA OCORRÊNCIA DA EMBRIAGUEZ CRÔNICA. INADMISSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE PROVAS ACERCA DO GRAU DE EBRIEDADE DO RÉU, BEM COMO SE PROVENIENTE DE CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR. EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA NÃO ISENTA DE PENA. RECURSO DESPROVIDO. Inexistindo provas nos autos do grau de ebriedade ostentado pelo apelante, bem como, que ela não decorreu de caso fortuito ou força maior, não há como isentá-lo de responsabilidade. (…)” (Apelação criminal n. 2004.030097-1, de Lages. Relator: Des. Sérgio Paladino). (TJ-SC)
Patológica : Nesse caso, o sujeito entra em um estado mental mórbido, caracterizado por uma psicose alcoólica, após a ingestão da bebida. Por isso, aplica-se o art. 26, devendo o agente ser considerado inimputável ou ter sua pena reduzida, dependendo da sua capacidade de entender o caráter ilícito da conduta.
Sobre o tema, rege a seguinte decisão: “… caso o exame de dependência alcoólica constatar que o agente sofre de embriaguez patológica, o dispositivo a ser aplicado não mais seria o art. 28, mas o art. 26, caput, ou seu parágrafo único, do Código Penal, como bem salientou o representante do parquet a quo em suas contra-razões, vez que a embriaguez patológica é caso de alcoolismo crônico, equiparado a doença ou perturbação mental, que pode chegar à inimputabilidade ou à responsabilidade diminuída”. (Recurso criminal n. 00.001127-4, TJ-SC).
Porém, segundo a Apelação Criminal n. 2004.003151-3, deve-se verificar se o agente realmente era incapaz de compreender o caráter ilícito do fato, o que é extremamente difícil: “O parecer social concluiu que o acusado é uma pessoa alcoólatra, sem exaltar qualquer outro distúrbio relevante que pudesse caracterizar a inimputabilidade penal. O apelante afirma que “foi a primeira vez que ficou assim nesse estado”. Colhe-se dos autos também que o mesmo fugiu quando surpreendido pela testemunha Linésio. Assim, não se pode concluir que à época do ato recorrente era “incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”. (TJ-SC)
Outra decisão, no mesmo sentido, versa que: “Também não se pode falar – como pretende o acusado – em embriaguez patológica (casos de alcoolismo crônico), por carecer de produção de prova pericial nesse sentido, cujo ônus competia ao próprio réu”. (Apelação Criminal n. 00.019578-2, TJ-SC).
Habitual : Ocorre nos casos em que o agente costuma beber regularmente sem qualquer perturbação da saúde mental, ocorrendo a desintoxicação com a suspensão do uso da bebida. Deve, nesse caro, ser aplicadas as regras do art. 28.
De acordo com o HC 81185 / RJ, percebe-se que a embriaguez habitual, por si só, não torna o agente inimputável, já que é distinta da embriaguez crônica e de quaisquer patologias e/ou doenças mentais. (STF)
Também nesse sentido, versa o seguinte acórdão, utilizado na Apelação criminal n. 30.928, de São Lourenço d’Oeste (TJ-SC): “A embriaguez habitual não serve de dirimente e nem de circunstância atenuante. É que a ação daquele que se embriaga habitualmente foi livre na sua atuação inicial voluntária actio libera in causa” (RT 423/435).
Entretanto, segundo o RMS 18017 / SP, encontramos uma definição diferente para essa modalidade de embriaguez, caso seja praticada em serviço: “A embriaguez habitual no serviço, ao contrário da embriaguez eventual, trata-se de patologia, associada a distúrbios psicológicos e mentais de que sofre o servidor. O servidor acometido de dependência crônica de alcoolismo deve ser licenciado, mesmo compulsoriamente, para tratamento de saúde e, se for o caso, aposentado, por invalidez, mas, nunca, demitido, por ser titular de direito subjetivo à saúde e vitima do insucesso das políticas públicas sociais do Estado”. (STJ)
Dessa forma, para o STJ, a embriaguez habitual está intimamente relacionada com a embriaguez patológica se praticada em serviço.
Tipos de embriaguez (provocada por substância com efeitos análogos ao álcool):
De acordo com o art. 28, inciso II, a embriaguez também pode ser provocada por substâncias com efeitos análogos ao álcool, tais como a maconha, cocaína, morfina, éter, clorofórmio, LSD, etc., sendo o agente, nesse caso, sujeito às mesmas disposições legais aplicadas à embriaguez provocada por álcool.
No mesmo sentido, enquadra-se o seguinte acórdão: “A embriaguez, voluntária ou culposa, causada pelo álcool ou por outras substâncias análogas, não elide a responsabilidade penal (art. 24, II, do CP). Enquadram-se, na última categoria, os estupefaciantes, tais como ‘maconha’, a morfina, a cocaína, os antidistônicos, o éter, etc” (JTACRIM 85/394). (TJ-SC)
Mais além, outra jurisprudência diz que: “Inimputabilidade por ser o réu viciado em drogas – Inocorrência – Acusado que não se declarou dependente em nenhuma das oportunidades em que foi ouvido e tampouco requereu a realização do exame de dependência toxicológica – Inexistência nos autos de qualquer indício de que ele não seja plenamente imputável” (Ap. crim. 2003.001990-1, de navegantes, Rel. Des. Carstens Köhler). (TJ-SC)
Porém, de acordo com os artigos 45 e 46 da recente Lei de Tóxicos, nos casos de dependência ou de uso decorrente de caso fortuito ou força maior de drogas, o agente é inimputável se, no momento da prática do delito, era inteiramente incapaz de compreender o caráter ilícito do fato. Se, por outro lado, o agente era parcialmente incapaz de compreender esse caráter ilícito, o art. 46 determina a redução da pena de uma dois terços.
Fases da Embriaguez:
Incompleta: Situação na qual o sujeito está sob o efeito do álcool, o que o deixa desinibido, louquaz, mas ainda consciente. É a chamada “fase de excitação”.
Na jurisprudência: “Em verdade, o apelante voluntariamente embriagou-se e, nesse estado, encorajou-se para a prática do fato delituoso, sendo descabida sua pretensão em reduzir a reprimenda em face da alegada embriaguez incompleta…”. (Ap. crim. n. 99.013033-9, TJ-SC)
Completa: Ocorre quando o agente está na “fase da depressão”, na qual o agente não tem mais consciência e vontades livres, com inclusive a perda da coordenação motora. A lei brasileira refere-se à apenas esse tipo de embriaguez.
Na jurisprudência, encontramos a seguinte decisão, perfeitamente compatível: “É do art. 28, do Código Penal, que não excluem a imputabilidade penal, a “embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos” (inciso II). A isenção de pena, prevista no par. 1o do mesmo artigo, está “para o agente que, por embriaguez completa, proveniente em caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento””. (Ap. crim. n. 25.388, TJ-SC)
Também nesse sentido, mas com um enfoque processual sobre a matéria, rege o HC 73010 / SP nos mostra que: “… transitada em julgado a sentença condenatória, a via do habeas-corpus não é adequada para comprovar-se a embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior e, portanto, que, no momento do delito, o agente era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento. Cumpre acionar a via da revisão criminal – artigo 621 do Código de Processo Penal”. (STF)
Comatosa: Também chamada de “fase letárgica”, acontece quando o indivíduo cai em sono profundo, sendo essa modalidade apenas útil quando da prática de crimes omissivos puros ou comissivos por omissão.
Nesse diapasão, segundo a Medicina Legal, existe uma “c) fase siderativa ou comatosa, em que o embriagado não mais consegue manter-se em pé; deitado ou caído ao solo, é dominado por sono profundo, só reagindo a estímulos violentos (…).
Embriaguez como contravenção:
Se o agente “apresentar-se publicamente em estado de embriaguez, de modo que cause escândalo ou ponha em perigo a segurança própria ou alheia” (art. 62 da LCP), caracteriza-se a contravenção penal. Além disso, vender bebidas a menores, a pessoas embriagadas ou a pessoas que se sabe sofrer das faculdades mentais, também caracteriza a contravenção penal, de acordo com o art. 63. Porém, caso o agente cometa, nessa situação, um ilícito penal, a contravenção deve ser absolvida.
Embriaguez ao volante:
Em 23/09/1997, instituiu-se, com a lei nº. 9.503, o Código de Trânsito Brasileiro, o qual tipificou, em seus artigos 306 e 310, a embriaguez ao volante e a entrega da direção do veículo a pessoa em estado de embriaguez, respectivamente.
Essa matéria, de acordo com o art. 22, XI, da Constituição federal, é de competência legislativa privativa da União, sendo inconstitucional qualquer lei sobre o trânsito que não seja federal, como declarado na ADI-MC 3269 / DF, sobre a inconstitucionalidade de uma lei do Distrito Federal que permitia o leilão de veículos de motoristas alcoolizados. (STF)
De acordo com o RHC 82517 / CE, o crime previsto no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro (embriaguez ao volante) é crime de perigo, cujo objeto jurídico tutelado é a incolumidade pública e o sujeito passivo, a coletividade. (STF)
Também sobre o tema da embriaguez versa o HC 60065 / RS, pelo qual “Delito de trânsito, praticado em estado de embriaguez, para se concluir pela não ocorrência de dolo eventual, torna-se necessário o exame acurado de provas, incabível na via sumaríssima de “Habeas Corpus””. (STF)
Outra clara decisão versa que: “Para a caracterização do delito de embriaguez ao volante devem concorrer quatro requisitos: a) conduzir veículo automotor, b) que o agente esteja sob a influência do álcool ou substância de efeitos análogos, c) que o veículo esteja sendo conduzido na via pública e d) que o agente, na condução de veículo automotor, em via pública, exponha a dano potencial a incolumidade de outrem”. (Apelação criminal n. 2006.023991-5, TJ-SC).
Exames de embriaguez:
Analisando-se o art. 277 do CTB, vê-se que motoristas suspeitos podem ser alvo de exames que, pode meio de aparelhos homologados pelo Contran, detectem a embriaguez, sendo a recusa do condutor a se submeter a tais exames considerada uma caracterização do estado de embriaguez (art. 277, § 2º). A quantidade de álcool para caracterizar tal estado é, de acordo com o art. 276, de seis decigramas por litro de sangue.
Sobre a recusa em se submeter a exame de teor alcoólico, encontramos referência no HC 76566 / PA: “O fato de conduzir perigosamente veículo automotor, que acabou por causar a morte de uma das vítimas e provocar lesões corporais em outras, bem como a recusa em se submeter ao exame de teor alcoólico, afiguram-se bastantes para indiciar que a conduta do guiador pode ser tida, pelo menos em princípio, como imprudente e culposa, e, portanto, típica, subsumindo-se os fatos, em tese, nos artigos. 302, 303 e 306 do CTB”. (STJ)
Mais além, as seguintes jurisprudências versam que: “… a embriaguez ao volante pode ser comprovada por qualquer dos meios admitidos em direito, não se exigindo exame de dosagem alcoólica. Andar inseguro, fala mole, hálito etílico, voz pastosa, direção insegura, em ziguezague, constatada por testemunhas, basta à certeza moral da embriaguez” (Ap. Crim. n. 2001.000132-8, de São Joaquim, j. em 13/3/01 – TJ-SC).
“… o teste do bafômetro não é a única prova admitida para se constatar a embriaguez, podendo tal exame ser suprido pela averiguação clínica ou idôneos elementos testemunhais, como as declarações dos policiais que atenderam a ocorrência, que consistem em prova suficiente para a condenação” (Ap. Crim. n. 99.021041-3, de Itajaí, rel. Des. Nilton Macedo Machado – TJ-SC)
Processo Civil:
No processo Civil, sobre a possível exclusão de cobertura securitária em casos de embriaguez ao volante, no REsp 959472 / PR, encontramos a seguinte conclusão: “A embriaguez, por si só, não constitui causa de exclusão da cobertura securitária, sendo necessária a prova de que o agravamento de risco dela decorrente influiu decisivamente na ocorrência do sinistro”. (STJ)
Sobre o mesmo caso (exclusão de cobertura securitária), rege o REsp 774035 / MG: “Cláusula restritiva, contida em contrato de adesão, deve ser redigida com destaque a fim de se permitir, ao consumidor, sua imediata e fácil compreensão. O fato de a cláusula restritiva estar no meio de outras, em negrito, não é suficiente para se atender à exigência do Art. 54, § 4º, do CDC”. (STJ)
No mesmo sentido, versa a seguinte decisão: “Em situações como a dos autos, não basta a prova da embriaguez ou culpa do segurado para que se caracterize a infração contratual, com força o bastante para fazer prevalecer a cláusula liberatória da obrigação de indenizar constante da avença. Mister, consoante a orientação predominante na doutrina e na jurisprudência, que o ato do segurado seja voluntário e autônomo. Desta sorte, sem cabal demonstração de que o segurado contribuiu voluntariamente para o acidente, será medida de justiça mandar a seguradora honrar o contrato e pagar a indenização ao beneficiário”. (Apelação cível n. 2004.034818-4, TJ-SC).
Decisões gerais sobre embriaguez:
Confissão de embriagado não confessada em juízo:
De acordo com o HC 70376 / SP, “O acusado que, embora na fase policial tenha confessado a autoria do delito, não a confirma em juízo, esquivando-se sob a alegação de que não se recordava do ocorrido em virtude de embriaguez, não pode ser beneficiado com a atenuante do art. 65, III, d, do Código Penal. Habeas Corpus indeferido”. (STF)
Outra decisão versa que: “A confissão extrajudicial, retratada em Juízo, mas roborada por farto material probante colhido durante a instrução criminal, autoriza a prolação de um decreto condenatório” (Ap. crim. n. 32.850, de Itajaí, TJ-SC)
Provas da embriaguez:
Sobre as provas da embriaguez, encontramos uma jurisprudência que diz que: “(…) Ademais, a embriaguez deve ser comprovada através de atestado médico idôneo, não valendo como prova, unicamente, o boletim de ocorrência, que somente tem presunção juris tantum de veracidade”. (AC n. 99.013615-9, da Capital, Rel. Des. Carlos Prudêncio, j. em 30/09/99 – TJ-SC).
Nesse diapasão, conclui esse dispositivo: “Inexistência de provas acerca do grau de ebriedade do réu, bem como se proveniente de caso fortuito ou força maior – Impossibilidade da aplicação do benefício de isenção de pena do art. 28, § 1º, do código penal” (Revisão criminal n. 2005.017275-3) (TJ-SC).
Sobre o reexame de provas, encontramos outras duas: A primeira, O HC 66591 / RJ, versa sobre o reexame das provas no âmbito restrito do “habeas Corpus”, que não é possível e não anula acórdãos condenatórios. (STF)
E o HC 56225 / SP nos diz que: “Não se fala em nulidade pela ausência de realização de exame pericial para verificar alegado estado de embriaguez, se este sequer foi requerido pela defesa”. (STJ)
Assim, percebemos que a defesa deve requerer exames periciais para averiguar a embriaguez do acusado, antes do âmbito do habeas corpus, no qual não é possível nem mesmo a revisão de acórdãos.
Estado de embriaguez X agravante do motivo fútil
No RE 63226 / RS, versa-se sobe a “… incompatibilidade entre a qualificativa do motivo fútil e o estado de embriaguez do réu”. (STF)
Sobre esse mesmo tema rege também o REsp 816464 / SP: “… incompatibilidade do estado de embriaguez com a agravante do motivo fútil, na inteligência de que a embriaguez, por não permitir juízo de proporção entre o motivo e sua ação, exclui a futilidade do motivo do crime”. (STJ)
Nesse sentido, também rege a seguinte jurisprudência de Curitibanos: “Revisão criminal – Homicídio qualificado pelo motivo fútil – Pretensão de excluir a futilidade do motivo pela ocorrência da embriaguez – Improcedência, porque, in casu, foi preordenada, além de ser circunstância agravante da pena”. (Revisão criminal n. 2.617, TJ-SC).
A Constituição Federal
É de máxima importância que a legislação penal do nosso país seja interpretada à luz da Constituição Federal, sobretudo em seu art. 5, que corresponde a vários direitos e garantias fundamentais imprescindíveis para a manutenção do Estado Democrático de Direito, que a nossa carta Magna adotou como regime político.
O art. 5º versa que: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes …”. Assim, o código Penal jamais pode, ao tentar cumprir o seu papel para com a sociedade, deixar de resguardar esses direitos aos indivíduos.
Do inciso II (“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”), devemos lembrar que a lei é única, total, máxima, deve ser respeitada, por todos independentemente de renda e/ou condição social, de acordo com o princípio da isonomia, também garantido pela Carta Magna.
Do inciso II (“ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”) remetemos ao fato de que já foram abolidas as penas de tortura em nosso país, devendo o Direito Penal ser colocado em prática pelos operadores do direito para garantir a defesa contra as práticas de tortura e tratamentos desumanos.
Pelos incisos XXXV (“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”) e XXXVI (“a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”), percebemos o importante poder do judiciário, em todas as instâncias, sendo fundamental que ele siga certas premissas para a manutenção da democracia e a garantia da defesa dos direitos fundamentais, tendo os operadores jurídicos vital importância no processo.
No que concerne o tema da embriaguez, nenhum dos dispositivos do art. 5º refere-se expressamente ao tema, embora alguns deles possam-se relacionar indiretamente à alguns casos de aplicação da lei em crimes cometidos sob embriaguez. O que eu quero dizer é que as garantias do direito à vida, violadas por pessoas embriagadas, bem como a violência e prática de tortura por pessoas em estado de ebriedade, são inconstitucionais e devem ser protegidas. Assim, a embriaguez não pode ser usada como desculpa para a prática de crimes, sobretudo os inconstitucionais.
Porém, o princípio da anterioridade da lei penal garante que um mero juízo de valor não pode ser motivo para a aplicação da lei, e isso também vale para os casos de crimes cometidos sob embriaguez. Assim, também deve haver, para os casos de embriaguez, leis que tipifiquem certas condutas reprováveis e que deveriam receber a condenação. Mas nisso, o Código Penal foi inteligente, uma vez que tornou inimputável apenas os crimes cometidos sob embriaguez completa e fortuita (ou proveniente de força maior), além de alguns casos de embriaguez crônica e/ou patológica.
Bibliografia:
MIRABETE, Juliano Fabbrini – Manual de Direito Penal: Parte Geral – Vol. 1
Superior Tribunal Federal – www.stf.gov.br
Tribunal de Justiça de Santa Catarina – www.tj.sc.gov.br
Superior Tribunal de Justiça – www.stj.gov.br
* Acadêmico da 3ª fase de Direito da UFSC e da 3ª fase de Administração da UDESC.
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