International Tax Competition
[1]Geraldo Evangelista Lopes
[2]Wéliton Cavalcante Guerra
[3]José Marcelo Carvalho Cortês
RESUMO: Este trabalho possui como objetivo traçar algumas linhas sobre o fenômeno da concorrência fiscal internacional, em um mundo globalizado economicamente, e que cujo relevo é de grande importância, pois as economias de cada Estado apresentam uma interdependência umas com as outras, e onde a competição fiscal entre Estados com seus diversos regimes econômicos e políticos apresentam um peso no cenário político, económico e financeiro dos Estados a nível mundial. Portanto observando a realidade podemos constatar a diversidade hodiernamente dos regimes econômicos e políticos, assim, é imperioso se fazer um estudo da concorrência fiscal internacional para entendermos o lado positivo e o negativo deste fenómeno dentro da sociedade atual e suas consequências e transformações advindas do Estado Fiscal, bem como a diversidade e complexidade representadas através dos seus diversos sistemas fiscais, sistemas estes fundamentados não somente na economia de um País, como na sua análise histórica política, na técnica administrativa adquirida pela cultura técnica e na segurança jurídica que este Estado apresenta. Assim em uma sociedade e em um mercado em convulsão, a concorrência fiscal internacional é um tema na ordem do dia, pelas implicações sociais e econômicas que acarreta. E, em tempo de crise, como atualmente, há cada vez mais dúvidas e incertezas sobre o fenômeno da concorrência fiscal internacional.
Palavras-chave: Concorrência fiscal internacional. Estado. Sociedade. Segurança Jurídica.
ABSTRACT: The objective of this work is to draw some lines about the phenomenon of international tax competition, in an economically globalized world, and whose relevance is of great importance, since the economies of each State are interdependent with each other, and where the fiscal competition between states with their different economic and political regimes has a weight in the political, economic and financial scenario of states worldwide. Therefore, observing the reality, we can see the diversity of economic and political regimes today, so it is imperative to carry out a study of international tax competition in order to understand the positive and negative aspects of this phenomenon within the current society and its consequences and transformations arising from the Fiscal State. , as well as the diversity and complexity represented through its different tax systems, systems based not only on the economy of a country, but also on its historical political analysis, on the administrative technique acquired by the technical culture and on the legal security that this State presents. Thus, in a society and in a market in turmoil, international tax competition is a topic on the agenda, due to the social and economic implications it entails. And, in times of crisis, as today, there are more and more doubts and uncertainties about the phenomenon of international tax competition.
Keywords: Competition supervisor international. State. Society. Legal Security.
Introdução
A palavra concorrência nos remete a algo que concorre, que quer estar à frente, ou levar vantagens por ser o primeiro, há concorrência em vários seguimentos, a concorrência entre empresas (concorrência económica), Estados (concorrência fiscal), partidos políticos, entre público e privado, entre meios de comunicação, no esporte (concorrência institucional), entre outras.
A concorrência entre empresas ou económica, podemos classificá-las como salutar, pois propicia aos consumidores mecanismos de satisfação, além de que os fatores de produção são regulados, e o crescimento econômico se opera, processando-se a distribuição dos rendimentos nas sociedades atualmente.
Porém no mundo globalizado a concorrência entre empresas vista desta maneira não está a ocorrer, só existindo no mundo das ideias, pois com a internacionalização as empresas se concentraram e deu início a monopolização ou oligopolização de mercados, necessitando assim da interferência do poder público para regular esses mercados através da legislação antitruste.
A competividade entre Estados, ou entre regiões ou administrações autónomas do mesmo Estado, no campo das relações institucionais, que influenciam diretamente na concorrência empresarial ou económica, v.g., na ordem jurídica, isto porque, se na ordem jurídica há celeridade processual com segurança jurídica na aplicação das leis que regem as sociedades empresariais, ou apresentem um sistema de arbitragem com credibilidade, uma legislação laboral segura e menos protetiva e uma legislação sobre registro e notariado desburocratizada, consequentemente este Estado será mais favorável ao empresário para aplicar seu capital na produção de bens e serviços.
Desta feita a competitividade do sistema fiscal, que engloba tanto aspecto normativo, v.g., estrutura dos impostos, as regras de incidência e não incidência, a legislação sobre isenções ou benefícios, a aplicação de taxas, datas de pagamentos ou penalidades que existam, etc, como o aspecto dinâmico, v.g., se existe entre administração fiscal e contribuinte acordos, se há um sistema de informações fiscais com maior ou menor eficácia na fiscalização e na ação da administração fiscal.
Esses sistemas fiscais diversos fazem com que as empresas transnacionais na busca de lucros e redução de custos de produção procurem jurisdições fiscais que possam aplicar seu planejamento fiscal, para que haja uma melhorara na sua atividade económica, baseando-se na jurisdição fiscal de outro Estado, mais concretamente “[…] na capacidade (…) de tirarem proveito de lacunas ou imperfeições da lei ou das disparidades fiscais nacionais, diminuindo assim (…) os custos de produção”(SANTOS, 2003, p.163).
Portanto, as empresas traçam estratégias para que obtenham menor tributação em relação a uma atividade económica. “Desta forma, as empresas contribuirão para que haja uma diminuição concreta das receitas fiscais que será regulada por métodos tais como, a convenções de dupla tributação, a troca de informação entre Estados, a utilização de cláusulas ante abuso” (ANDRADE, 2002). “O regime de preços e transferência almeja que preços praticados nas transações efetuadas entre as empresas do mesmo grupo de sociedade sejam fixados, impedindo desta maneira o falseamento do lucro tributável, obtido por cada empresa nessa operação. Quando, existindo uma relação especial entre as entidades envolvidas na transação, e estejam acordados entre elas os preços que seriam praticados na inexistência de relação especial, podemos dizer que se cumpre o princípio de plena concorrência”, (art.º 63.º n.º1 CIRC),[4] ou a existência de uma cooperação administrativa.
Desta forma a competitividade entre as empresas e entre os agentes econômicos é fundamental para a elaboração da política fiscal dos Estados, surtindo efeitos nos planos financeiro, económico e social. Portanto, os mecanismos fiscais para atrair ou fixar investimento tanto no âmbito interno como no externo são “justificados na necessidade de poupança e tributação das empresas, para que haja a redução da carga fiscal do país através de fatores de competitividade como, a área geográfica, a reforma fiscal vigente no Estado ou a escassez de recursos”, conforme entendimento dos Professores Clotilde Celorico Palma e António Carlos dos Santos (SANTOS; PALMA, 1999, p. 29).
Assim, a concorrência fiscal entre empresas tem como visão apenas a sua obtenção maior de lucros ou uma maior parcela de mercado, ressaltando-se que não há um mercado dos impostos ou um mercado de sistemas fiscais.
1. Concorrência Fiscal
A questão sobre a concorrência fiscal, tem seu estudo primeiro na doutrina de países que apresentam uma estrutura federal, onde a liberdade de circulação de bens e serviços é quase sempre total, e nesta estrutura os Estados federados têm poderes tributários autónomos ou subsidiários.
Ocorre que, com a integração das economias mundiais que vem ocorrendo nas últimas décadas, surgiu o problema de concorrência fiscal em escala internacional, principalmente nas integrações económica regionais, v.g., a União Europeia, onde os Estados tem autonomia quanto ao poder de tributação direta, enquanto houve uma quebra das barreiras à circulação de bens e serviços, principalmente do capital; porém, lentamente há uma transformação da economia local para regional e global, tendente ao fim dos condicionamentos legais e obstáculos à circulação de capitais, transformando a concorrência fiscal em um problema também global.
A concorrência fiscal tem como base as atividades políticas fiscais e os diversos sistemas fiscais existentes, as diversas estruturas fiscais, as diversas composições e articulações entre os tributos, os variados níveis de fiscalização, as ações da administração fiscal bem como a aplicação da justiça tributária.
Desta forma a concorrência fiscal entre os Estados visa de uma maneira direta ou indiretamente, que na divisão internacional da base tributária mundial um Estado tenha um crédito fiscal derivado maior que outro Estado.
Ressalta-se que, a concorrência fiscal entre os Estados obedecem limites internos e externos, sendo os limites internos decorrentes dos textos constitucionais de cada Estado, e os limites externos geralmente o poder de retaliação que um Estado tem perante os outros, quando está havendo afetação em seus recursos fiscais, o que afeta suas programações de ações políticas.
Assim com a abertura do mercado económico, surgiu grandes oportunidades às empresas, o que fez com que haja uma influência na maneira de haver concorrência, e o que vem permitindo que os Estados se reorganizem com a celebração de acordos, para a redução de direitos aduaneiros, bem como para que haja a supressão de obstáculos às transações realizadas entre Estados-Membros de blocos econômicos.
Com o surgimento da concorrência fiscal, os Estados vem constante modificando os sistemas fiscais, procurando os Estados serem países mais competitivos, promovendo o seu crescimento económico, promovendo a redução de taxas e impostos, estabelecendo isenções fiscais, e eliminando da dupla tributação ou promovendo a quebra de barreiras que permitem a livre circulação de pessoas, bens, serviços e capitais.
Portanto, na globalização em que nos encontramos, necessário se faz que os Estados promovam sua adaptação através das reformas fiscais, para desestimular que trabalhadores e investidores migrem para outro Estado que ofereça uma tributação mais baixa. Portanto, os países que estabeleçam medidas políticas e fiscais que permite a melhorar a competitividade nacional, garante um sistema fiscal eficiente.
Assim há concorrência fiscal quando um Estado através de sua política tributária possui um sistema fiscal que prejudica outro Estado, fazendo com que haja uma diminuição das receitas fiscais. Portanto, a concorrência fiscal ocorre entre sistemas fiscais de governos diferentes, pela coexistência de vários sistemas fiscais autónomos, que podem produzir efeito negativo ou positivo nas receitas fiscais obtidas.
Portanto a concorrência fiscal resulta da obtenção de uma vantagem competitiva, onde os Estados “[…] passaram a considerar nas suas decisões a necessidade de adequar os impostos ao bem estar social, ao investimento e ao progresso científico, visando atrair mais investimentos ou, pelo menos, não os deslocalizar” (CAMPOS, 2006, p.25).
Partindo deste prisma, aparece o conceito de concorrência fiscal prejudicial e concorrência fiscal benéfica, ancorados nos princípios da territorialidade, da não discriminação e no princípio da igualdade de tratamento entre Estados.
2. Concorrência Fiscal Prejudicial
A concorrência fiscal prejudicial está baseada na concepção de que o nível de tributação, especialmente do capital, está afetado a regimes especiais concedidos a residentes de outro Estado, e é perfeitamente possível um país tentar atrair um certo tipo de investimento estrangeiro, que lhe permite uma maior mobilidade, enquanto utiliza para seus residentes níveis considerados normais para tributá-los.
Nestes regimes atribuem vantagens a nível de baixa ou nula tributação, fato que é isolado na economia nacional, sendo aplicável apenas a residentes estrangeiros, que não gera ao Estado concedente resultados benéficos em relação às perdas do outro Estado.
Estes regimes destinam-se normalmente a atrair atividades que tem uma mobilidade grande, v.g., as atividades financeiras, sendo que, utilizam apenas para fins fiscais uma suposta localização, em um território que não há correspondência da realização de uma atividade económica substancial.
Estas “práticas fiscal prejudiciais” são geralmente encontrados em países classificados como “paraísos fiscais”, ou seja, pequenos territórios cujo nível de tributação é reduzido ou nulo, e que apresentam como características a falta de impostos ou tributação nominal, a não existência de troca de informações efetiva, a ausência de transparência, a prática de atividades não substanciais, ou seja, a prática de atividades fictícias ou que não acrescentem valor, os chamados “booking centres” (XAVIER, 1993, p. 297), (LEITÃO, 1993, p.306), (SILVA,2000, p.21).
As práticas fiscais prejudiciais são aplicadas em regimes fiscais especiais em territórios definidos dentro de um país, v.g., a Zona Franca da Madeira, ou em regimes fiscais direcionados a certas atividades e como forma de atração, v.g., os Centros de Coordenação da legislação belga e os centros administrativos de multinacionais que beneficiam de tratamento fiscal privilegiado. Ressalta-se que esses regimes apresentam uma tributação reduzida ou nula e não estão inseridos na economia nacional (“ring-fencing”), ou seja, são aplicados somente a residentes no estrangeiro.
Esses regimes apresentam um outro elemento comum qual seja, a inexistência de fornecimento de informações a outras administrações tributárias, o que permite aos que se utilizem destes regimes não serem tributados em sua residência quanto a esses rendimentos.
O que diferencia estes regimes, da concorrência fiscal, é quanto a decisão do nível de tributação e o nível de despesa pública. Portanto, o Estado, sem que haja reflexo na sua base tributária, pode estabelecer regime preferencial para atrair investimento estrangeiro, gerando eventuais efeitos positivos, tais como a criação de emprego e o aumento do produto. Ressaltando que, o peso destas medidas serão sentidos nos estados que terão suas bases tributárias atingidas.
3. Concorrência Fiscal Benéfica
A concorrência fiscal é consequência dos diversos sistemas fiscais existentes nos diferentes Estados, Correspondendo a uma vantagem competitiva, onde os Estados «[…] passaram a considerar nas suas decisões a necessidade de adequar os impostos ao bem estar social, ao investimento e ao progresso científico, visando atrair mais investimentos ou, pelo menos, não os deslocalizar (CAMPOS, 2006, p.25).
Sob essa ótica, podemos admitir que a concorrência fiscal fosse capaz, em algumas situações, fazer-se classificada prejudicial, no entanto será capaz quando racionalização nos sistemas fiscais, proporcionar resultados benéficos para os Estados, tornando-se neste caso benéfica.
Na União Europeia, sendo considerado um dinamizador da economia e tornando-se os sistemas fiscais harmonizados, quando da criação de um mercado único existe, estabelecendo a liberdade de circulação de pessoas, mercadorias, capitais o que permite a eliminação de […] barreiras alfandegárias internas e tem-se vindo a destruir alguns dos principais obstáculos internos a essa circulação, presentes nos ordenamentos jurídicos de cada Estado (CAMPOS, 2006, p. 24).
Desta maneira com a entrada das liberdades fundamentais, os Estados passam a aplicar mecanismos corretivos o que irá permitir que a sua competitividade seja aumentada. Ou seja, é realizável através, v.g., do sistema fiscal válido no Estado ou da disponibilização de custeios por parte dos Estados mais abastados, ou pela própria União Europeia, a países financeiramente mais desprovidos.
Destarte, o fator fiscal é uma das condições que propicia o surgimento de condições de concorrência entre Estados da melhor forma, visto que, permite aos investidores direcionar-se, não exclusivamente aos Estados com maior desenvolvimento tecnológico, maior aglomeração populacional e maior concentração riqueza, como também a países cujo sistema fiscal é mais atraente (CAMPOS, 2006, p. 24).
Isto posto havendo a liberdade de circulação para consumidores e empresa será proporcionada transferência para um Estado fiscalmente com mais vantagem, objetivando usufruir de serviços mais vantajosos, levando em consideração a carga fiscal a serem arcadas, as normas de incidência e de isenção fiscal ou as taxas vigentes no Estado; igualmente, será notável que as aplicações sejam transladadas para Estados mais tornados ou com uma baixa, ou nula, tributação. Desta maneira será permitido uma reorganização por parte dos Estados de modo a estimular outros Estados a estabelecerem uma administração competente a cobrança e a gestão de impostos. Assegurando deste modo uma melhoria na competitividade do país, e que será traduzida consequentemente na concorrência fiscal benéfica entre Estados.
4. Concorrência Fiscal Internacional
O debate técnico, científico e político sobre o fenômeno da concorrência fiscal internacional é recente, porém o problema é antigo, isto porque, havia uma visão da maioria dos autores de que a concorrência fiscal era uma forma benéfica, e que esta trazia resultados positivos.
Esta visão foi influenciada pelo modelo criado por Charles Tibeout em 1956, onde a liberdade de movimentação de fatores de produção dentro de um espaço traz resultados eficientes, baseados nos diferentes níveis de fiscalidade que financiam o fornecimento de bens e serviços públicos, e consequentemente o aumento da eficiência da despesa pública e a limitação de sua dimensão (TIEBOUT,1956, p. 420).
Esta visão apresenta algumas críticas, dentre elas a de que: “1) a capacidade contributiva e a função redistributiva dos impostos hodiernamente aplicada, neste modelo não são utilizadas, pois há a percepção baseada em que os impostos são estabelecidos tão somente “na ideia de troca ou benefício”; 2) Os Estados apresentam níveis de despesas e de impostos abaixo do desejável com este modelo, pois nele há uma tendência para o equilíbrio de subtributação, decorrente da preocupação que os Estados têm com a atração dos investimentos externos; 3) Este modelo despreza a distinta flexibilidade dos fatores de produção e dos diversos contextos de cada fator, transferindo a tributação do capital para o trabalho, e neste a tributação do trabalho mais qualificado para o menos qualificado”(TIEBOUT,1956, p. 420).
Hodiernamente a concorrência fiscal internacional é relevante no mercado económico, visto que traz afetação na forma de cada Estado atuar, tanto no sistema fiscal vigente, nas condições existentes mais favorável aos investimentos ou pelos critérios adotados para atrair capital para seu território.
Dessa maneira, os Estados para suprir às suas necessidades públicas, tais como a preservação do sistema fiscal, a ampliação de suas infraestruturas e a internacionalização das empresas nacionais e no progresso científico, atraindo mais investimento para o país, necessário que seja priorizado a técnica de planeamento fiscal, permitindo que o pais tenha um desenvolvimento económico sustentado, minimizando a carga fiscal incidente sobre os Estados e evitando com que haja a deslocalização que poderá afetar de forma negativa os demais Estados.
A Comissão Europeia com vista à regulação das práticas de concorrência fiscal prejudicial, instituiu medidas visando melhorar o enfrentamento em relação a fraude e evasão fiscal, inclusive quanto a terceiros países, por intermédio de cumprimento das obrigações fiscais e da implementação de propostas concretas com vistas a fortalecer a cooperação administrativa e o desenvolvimento económico, político e fiscal quanto a boa governança. «Quanto à complexidade dos sistemas fiscais, a Comissão afirma que para os contribuintes, uma redução dos custos e da complexidade constituiria um maior incentivo ao cumprimento das obrigações fiscais. Para as administrações fiscais, o desenvolvimento e a utilização plena das ferramentas automáticas e das técnicas de gestão de riscos libertariam recursos humanos e orçamentais para se concentrarem na realização de objectivos específicos»[5].
Com o propósito de preencher as omissões que há no sistema fiscal dos Estados a Comissão produziu uma relação de países terceiros que não segue as normas mínimas para a boa governança, concedendo-lhes a oportunidade para que cumpram estipuladas preceitos para não constarem na relação das jurisdições não cumpridoras. Tais medidas tem como objetivo uma harmonização fiscal entre os Estados Membros com a intenção de que seja assegurado uma existência de sistemas fiscais eficazes, com a automatização da troca de informação e consequentemente mais eficiente e facilitando o procedimento de ameaças transfronteiriças, além de estimular a cooperação entre Estados. Estas medidas se fazem necessárias por parte dos diversos Estados para o controlo e extinção das práticas consideradas como prejudiciais.
5. Paraísos Fiscais
São considerados paraíso fiscal, os países onde os rendimentos não são tributados, ou seja, […] as sociedades beneficiárias não terão mais do que um registo nesse território; e as pessoas singulares não terão mais do que um domicílio meramente formal (CAMPOS, 2006, p.28).
Contudo a definição de “paraísos fiscais” não é concorde, não havendo consenso, para alguns países é uma questão basicamente relativa, dado que há países que pode tornar-se “paraísos fiscais” em comparação a outros, quando apresentar tributação mais baixa ou inferior ou deixa de tributar uma situação com uma tributação elevada pelo outro país, com o qual este sendo comparado.
Já outros países seguem uma definição absoluta, adotando um critério para o percentual de tributação efetiva, v.g., a Alemanha, que considera um pais como paraíso fiscal quando este tributa com uma taxa inferior a 30% os rendimentos de uma empresa que está instalada em seu território.
Alguns países seguem uma lista ou enumeração casuística, v.g., a França, a Austrália e o Japão, outros definem os paraísos fiscais através da negativa, v.g., Reino Unido e o Canadá.
Portugal, através da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro[6], que reformou a tributação do rendimento e adoptou medidas destinadas a combater a evasão e fraude fiscais, alterando o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, o Estatuto dos Benefícios Fiscais, a Lei Geral Tributária, o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, o Código de Procedimento e de Processo Tributário e legislação avulsa, optou pelo sistema da lista, alternativamente aos outros sistemas, o que traz problemas em relação a segurança jurídica, colocando dificuldade na interpretação e na aplicação na regulamentação estabelecida no Código de Impostos sobre o Rendimentos de pessoas Coletivas – CIRC quanto as medidas específicas anti-abuso.
Os paraísos fiscais são beneficiados com infraestruturas financeiras para facilitar os fluxos de capital, proporcionando uma maior liquidez no mercado financeiro, sendo este os motivos para que os não residentes optem por estes territórios, por saberem que terão um alto grau de confidencialidade financeira, além de que, na maioria dos casos, não há qualquer atividade económica nestes territórios por parte dos não residentes, apenas a obtenção de lucros e não tributação destes valores.
Estes fatores contribuiram na formação de diferenças fiscais existentes entre Estados facilitando a evasão fiscal. Portanto, a maioria dos paraísos fiscais são […] regiões de inexistente ou diminuta supervisão financeira (o sentido técnico de off-shore), aduaneira e fiscal e regiões onde impera um rígido sigilo bancário e fiscal (SANTOS, 2002, p.197).
Desta feita, segundo o Relatório da OCDE[7], os paraísos fiscais são baseados nos seguintes fatores, o primeiro fator e primordial constitui-se na verificação se em uma jurisdição é inexistente o estabelecimento de tributação, ou se é aplicável uma tributação com baixíssimo percentual e se é um território onde os não residentes podem não ser tributados nas suas atividades ou investimentos face ao país de residência.
Outro fator é se há a proibição da prática de troca de informação pertinentes com outros Estados em relação aos contribuintes, tais como a existência de normas relativas ao sigilo bancário ou à atenuação de encargos administrativos, o que pode levar à fuga de impostos pelos investidores, à facilidade de branqueamento de capitais ou à lavagem de dinheiro.
Há outros fatores tais como a falta de transparência fiscal, v.g., no tratamento diferenciado dados aos contribuintes garantindo uma baixa tributação em determinada atividade, ou a inexistência de atividade económica, posto que se objetiva é a atração de investimento ou transações fictícias, o que é classificado com o termo “caixa-correio”.
Verifica-se alguns tipos de “paraísos fiscais”, os países onde não há qualquer previsão de tributação dos rendimentos, mais-valias e capitais, v.g., Bahamas e Ilhas Caimão, os países cuja tributação é prevista de acordo com base territorial, v.g., Panamá, Hong Kong e Libéria, os países cuja taxa de tributação é baixa, v.g., Antilhas Holandesas, Jersey, Ilhas Virgens Britânicas, Guernsey e Ilha de Man, e, finalmente, os países que atribui vantagens especificas às sociedades holding, v.g., Luxemburgo e Suíça.
Assim os paraísos fiscais podem ser aproveitados como territórios para fixação de residência, instituição de sociedades ou prática de preços de transferência, sendo que, esta situação concretiza a prática de evasão fiscal internacional. Este tipo de prática apresenta-se o comum nas empresas de grupos multinacionais, quando das operações de transferência de proveitos de uma jurisdição, cuja taxa de tributação é muito elevada para uma jurisdição em que é baixa a tributação.
Em vista disto verifica-se que, a existência de jurisdições deste tipo com as condições por elas oferecidas, notadamente o sigilo bancário, a ausência de troca de informações e a falta de transparência, está relacionada com o avanço da fraude fiscal internacional, que tem como fatores relevantes a internacionalização das empresas, o aperfeiçoamento das técnicas e práticas evasivas e a mobilidade de pessoas e de capitais.
6. Regime Fiscal Preferencial
O regime fiscal preferencial é o regime em que o Estado adota estabelecendo tributação nula em certas atividades e serviços, a falta de transparência fiscal quanto as normas vigentes e a inexistência de troca de informação com os restantes países.
Alguns países adotam o regime preferencial com o intuito de atrair capitais e atividades financeiras, e vários países pertencentes à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico – OCDE procuram adotar este regime, já que este propicia um território vantajoso, para a realização de investimentos, através de incentivos a transferência de atividades para locais onde a oferta, ou a procura no mercado interno do país é irrelevante. Entretanto, se concedido somente aos não residentes este regime é considerado como prejudicial.
O Relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico[8]identifica quatro fatores que caracterizam o regime fiscal preferencial, o primeiro estabelece que, se no regime não há tributação, ou se há tributação com taxa reduzida, os rendimentos são relevantes, e este sobre a ótica da concorrência fiscal é o fator inicial para saber se é prejudicial ou não.
O segundo fator e se há vedação aos contribuintes residente (regime é ringfencing) baseando este regime na exclusão da concessão de vantagens aos residentes ou se há proibição de que as empresas beneficiárias operem no mercado interno.
O terceiro fator é se o funcionamento do regime é transparente ou não, e o quarto fator é se há a ausência de troca de informação com os outros países.
Destaca-se que quando há falta de transparência do regime, ou a aplicação das leis e regulamentos, o Estado não irá criar medidas que possam ser defensivas, o que pode dificultar determinar quanto as empresas que investiram em um país são sujeitas, ou não, à mesma taxa de imposto. Isto se faz necessário para identificar se o regime fiscal preferencial foi a principal razão para que houvesse a deslocalização da atividade económica, ou financeira, para considerar se o regime é prejudicial ou não.
Destarte, para a identificação dos regimes fiscais preferenciais, também devem ser observados os seguintes fatores: a definição artificial da base tributável; se há falha na implementação dos princípios internacionais sobre preços de transferência; se há atração de rendimento de fonte estrangeira no pais de residência, por forma a fomentar o “treaty shopping“; se as taxas de imposto estão sujeitas a negociação; se há a existência de disposições sobre sigilo bancário; se há acesso a uma vasta rede de tratados em matéria fiscal; se os regimes são permissivos à utilização de veículos tendentes à atenuação de imposto; se o fomento nas operações são meramente formais e não substanciais.
Considerações Finais
A concepção tradicionalista a respeito da concorrência fiscal defendia que esta apresentava possibilidades da afetação eficaz dos recursos e uma constrição nos Governos quanto a limitação no âmbito da despesa pública e, consequentemente uma maior eficácia dos serviços públicos.
Contudo, correntes modernas têm defendido que os aspectos concernentes à mobilidade dos fatores, é que levam a equilíbrios de sub-tributação, bem como a problemas de distribuição dos rendimentos. Desta forma, a redução da carga fiscal visando atrair investimentos faz com que haja a diminuição dos níveis de tributação para níveis sub-eficientes, e consequentemente a redução da despesa trará incidência sobre as políticas sociais que não são favorecidas diretamente pela atividade produtiva, e que a carga tributária provoca o deslocamento do capital para fatores com menor mobilidade, como o trabalho.
Destarte, as práticas fiscais prejudiciais fogem da análise tradicional, estabelecendo que a concorrência fiscal é a correspondência entre os serviços públicos, principalmente aqueles que são úteis à atividade produtiva, e as indispensáveis receitas públicas para o seu financiamento.
Assim sendo, as práticas fiscais prejudiciais, quando analisadas isoladamente, apresentam-se como tentativas para atração de investimento com tributação baixa, porém a base tributária interna não é prejudicada.
Uma das consequências que pode ser verificada na concorrência fiscal e nas práticas fiscais prejudiciais, é a tendência para que haja um aumento da mobilidade dos fatores, e nesta mobilidade não se registrou uma queda geral na redução das receitas fiscais dos países desenvolvidos. Todavia, constatou-se uma mudança da carga da tributação do capital para o trabalho, deslocação disponíveis aos agentes que apresentem uma maior mobilidade geográfica.
A Comissão Europeia tem defendido que seus Estados Membros tentem uma aproximação entre suas legislações fiscais, procurando deste modo evitar distorções fiscais e a estabilidade das receitas, para que as empresas sejam inseridas no contexto concorrencial com facilidades, com o consequente desenvolvimento sustentável dos diversos setores da economia europeia, evitando a concorrência fiscal entre os países membros, e fazendo com que as regras comunitárias e administrativas da transparência dos sistemas fiscais dos Estados-Membros respeitem o princípio da subsidiariedade.
Para que não haja a discrepância entre as legislações fiscais os Estados possam proporcionar a abolição dos obstáculos fiscais, impulsionando a baixa da carga tributária e fazendo com que haja uma melhora na competitividade, proporcionando a existência de uma economia aberta, com um mercado único, com a circulação livre e sem a necessidade de barreiras alfandegárias, facilitando para que haja a afetação dos recursos produtivos, permitindo para que a mão-de-obra especializada seja concentrada e que possa haver entre as empresas a circulação de conhecimentos.
Ainda assim, as empresas e aos Estados é recomendado que leve em avaliação a integração econômica internacional.
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico – OCDE e a União Europeia vêm desenvolvendo medidas para tentar conter a concorrência fiscal, ou mantê-la dentro de um limite que possa ser considerado razoável, na concepção de ambos os organismos, ou eliminá-la, quando são prejudiciais. Orientando os Estados-Membros a não serem tendenciosos em relação aos seus regimes fiscais destinados atrair atividades financeiras internacionais, bem como a praticarem à concorrência fiscal prejudicial, v.g., as retenções na fonte.
A União Europeia agindo desta maneira busca um de seus objetivos, qual seja a construção de uma economia aberta e interdependente baseada em liberdades fundamentais, tais como a liberdade de circulação de trabalhadores assalariados, na liberdade de estabelecimento, na liberdade de prestações de serviços e liberdade de circulação de mercadorias, bem como promove a defesa a uma concorrência fiscal saudável entre Estados, procurando a estabilidade econômica e financeira de seus Estados-Membros, pela União Econômica e Monetária.
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SILVA, José Manuel Braz da. Os paraísos fiscais – casos práticos com empresas portuguesas. Coimbra: Almedina, 2000. ISBN 9789724013206.
TIEBOUT, Charles M. A Pure Theory of Local Expenditures. The Journal of Political Economy, Vol. 64, No. 5, (Oct., 1956), pp. 416-424, The University of Chicago Press. http://www.jstor.org/stable/1826343.
XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional. Coimbra: Almedina, 1993. ISBN 9724007499.
[1]Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade Autónoma de Lisboa – Luís de Camões/Portugal. Especialista em Direito de Família e Sucessões; Especialista em Direito Cível e Processo Civil. Bacharel em Direito pela Universidade Braz Cubas. Advogado atuante nas áreas de Direito de Família/Sucessões, Civil, Constitucional e Direitos Humanos. Pedagogo. Especialista em Docência e Pesquisa Para o Ensino Superior. Comissão Permanente de Direitos Humanos – OAB/SP. Conselho Regional de Prerrogativas da 1ª Região da OAB/SP (2013/2018); e-mail: geraldo.lopes@adv.oabsp.org.br.
[2]Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade Autónoma de Lisboa Luís de Camões – Lisboa/Portugal; especialista em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera – Uniderp – Campo Grande/Brasil; especialista em Direito Empresarial pela Universidade Evangélica de Anápolis – Unievangélica – Goiás/Brasil, Graduado em Direito pela Universidade Salgado de Oliveira – UNIVERSO, Advogado atuante na área de direito empresarial e direito tributário, em Goiás, Minas Gerais e Distrito Federal; e-mail: weliton@guerranet.net.
[3]Mestrando em Ciências Jurídicas pela Universidade Autónoma de Lisboa Luís de Camões – Lisboa/Portugal; Graduado em Direito pela Universidade Santa Úrsula – RJ/RJ; especialista em Direito Penal pela Faculdade Candido Mendes – RJ/RJ; e-mail: jmarcelocortes@carvalhocortes.com.
[4]Portal sobre finanças da República de Portugal. Disponível em: https://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/codigos_tributarios/CIRC_2R/Pages/circ-codigo-do-irc-indice.aspx. Acesso em: 23 mar. 2021.
[5]Comissão Europeia, 2012. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:52012PC0011&from=EN. Acesso em: 28 nov. 2020.
[6]Referida Lei Portuguesa reformou a tributação do rendimento e adotou medidas destinadas a combater a evasão e fraude fiscais, entre outros. Disponível em https://dre.pt/pesquisa/-/search/212015/details/maximized. Acesso em: 14 dez. 2020.
[7]Relatório Harmful Tax Competition: An Emerging Global Issue, Paris, France, OCDE, 28 de abril de 1998, disponível em https://www.oecd.org/tax/harmful/1904176.pdf. Acesso em: 14 dez. 2020.
[8]Relatório Harmful Tax Competition: An Emerging Global Issue, Paris, France, OCDE, 28 de abril de 1998. Disponível em https://www.oecd.org/tax/harmful/1904176.pdf. Acesso em: 14 dez. 2020.