Direito Internacional

Woodrow Wilson: O Projeto De Internacionalismo e a Liga Das Nações

Hernane Elesbão Wiese*

 

1 Introdução

As tentativas de Woodrow Wilson em reformar a política global em 1920 ainda hoje merecem uma análise séria, especialmente àqueles tocados pelo internacionalismo liberal da última década do século XX. Essa reforma política apresenta semelhanças com a “Nova Ordem Mundial” apresentada por George Bush em 1991.

Este projeto tem por objetivo transmutar as relações internacionais para que as nações possam viver em torno de um objetivo de paz, liberdade e prosperidade (aparentemente gozado pelas democracias ocidentais).

A Liga das Nações idealizada por Wilson vem de encontro a este projeto. Esses dois pontos serão discutidos no presente paper.

 

2 Biografia

Woodrow Wilson nasceu em dezembro de 1856 na cidade de Staunton, estado da Virgínia. Logo após seu nascimento, sua família se mudou para a Geórgia e em 1870 para a Carolina do Sul. Entrou para o New Jersey College em 1875, onde estudou história e clássicos. Estudou Direito na University of Virginia e abriu seu escritório de advocacia em Atlanta, em 1880.

Em 1883 ingressou na Johns Hopkins University, onde iniciou sua carreira acadêmica, escrevendo Congressional government, livro que lhe rendeu o doutorado em 1886. Publicou um segundo livro, sob o título The State em 1886. Foi indicado como professor da Princeton University em 1890, onde ficou até 1910, onde se tornou professor de Ciência Política e reitor em 1902.

Já na carreira política foi eleito governador de New Jersey em 1911. Sua política de reformas radicais (que transformou New Jersey em um estado progressivo) o fez ganhar a disputa pela presidência dos Estados Unidos em 1912.  Em janeiro de 1918 anunciou os seus célebres Quatorze Pontos (que serão vistos mais adiante).

 

Wilson recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 1920, pelos seus esforços no estabelecimento de uma política justa para a Grande Guerra e por fundar a Liga das Nações.

Adoeceu seriamente em outubro de 1919, enquanto viajava dando palestras de apoio à Liga das Nações. Faleceu em fevereiro de 1923.

 

3 O projeto de internacionalismo global

Robert Keohane distingue três modelos de internacionalismo liberal, todos encontrados no pensamento de Woodrow Wilson. São eles:

1.      o liberalismo comercial promove o comércio livre entre os Estados, na esperança de que a interdependência econômica entre os Estados diminuam o uso da força e seus custos decorrentes;

2.      o liberalismo republicano reforça a difusão de um modelo democrático entre as nações, com o intento de que os governos sejam responsabilizados pelos seus habitantes e tenham dificuldades ao implementar políticas elitistas e militaristas;

3.      o liberalismo regulatório tem por objetivo promover a lei nas relações internacionais, bem como organizações e práticas que moderem a segurança entre os Estados.

Hoje (após duas Guerras Mundiais, a Guerra Fria, conflitos no Oriente Médio, etc.) podemos ver que a experiência de Woodrow Wilson teria melhor aceitação pelo liberais contemporâneos, que estão mais aptos a avaliar a viabilidade dessas reformas do internacionalismo liberal do que estavam os liberais da época.

Nas relações internacionais, Wilson deu importância aos direitos humanos, ao direito de autogoverno e a ilegitimidade do imperialismo formal. Além disso, defendia que os Estados Unidos da América não tinham interesse em seguir as práticas imperialistas européias, mas tinham um papel forte no desempenho de mediações entre nações conflitantes. Corroborando este pensamento, Wilson rejeitava todas as noções do Manifesto Destino e da expansão territorial. Para Wilson o comércio e a importação/exportação tinham substituído o controle físico de um território.

Mas Wilson não hesitou em usar a força para interferir na política da América Central, em nome de um governo estável e contra as ditaduras. Tal posição não foi repetida com relação a Primeira Grande Guerra Mundial. Declarou a neutralidade norte-americana neste conflito, até 1917, quando navios norte-americanos foram atacados por submarinos alemães. Após o ocorrido os Estados Unidos entraram na guerra contra a Alemanha e seus aliados, fato importante, pois a participação dos Estados Unidos ajudou a reverter o quadro da guerra, que teve fim em novembro de 1918.

 

4 A liga das nações e os quatorze pontos

A fama de Wilson como internacionalista liberal se baseia na grande visão que possuía do estabelecimento da paz na Europa no período pós-guerra, assim como a sua participação fundamental na Liga das Nações, cujos objetivos eram promover a segurança coletiva e evitar uma outra guerra.

Esta visão estava expressa nos seus Quatorze Pontos, princípios apresentados em janeiro de 1918 e que foram levados à Conferência de Versalhes em dezembro do mesmo ano. São eles:

1º.   Pactos abertos (acordos) de paz a serem alcançados abertamente, sem acordos secretos;

2º.   Liberdade das águas além das territoriais;

3º.   Remoção de todas as barreiras econômicas ao comércio;

4º.   Redução das armas nacionais ao mínimo necessário à segurança interna;

5º.   Ajustes livres imparciais e abertos às reivindicações das colônias;

6º.   Evacuação das tropas alemãs da Rússia, e respeito pela independência da Rússia;

7º.   Evacuação das tropas alemãs da Bélgica;

8º.   Evacuação das tropas alemãs da França, inclusive da contestada região da Alsácia-Lorena;

9º.   Reajuste das fronteiras italianas dentro de linhas nacionais claramente reconhecíveis;

10º.       Autogoverno limitado para o povo austro-húngaro;

11º.       Evacuação das tropas alemãs dos Bálcãs e independência para o povo balcânico;

12º.       Independência para a Turquia e autogoverno limitado para as outras nacionalidades até então vivendo sob o Império Otomano;

13º.       Independência para a Polônia;

14º.       Formação de uma associação geral de nações, sob pactos específicos com o propósito de fornecer garantias mútuas de independência política e integridade territorial, tanto para os Estados grandes quanto para os pequenos.

Regressou aos Estados Unidos em 1919, logo após firmar o acordo internacional para o estabelecimento da Liga das Nações. A Liga Nações foi a primeira organização global com dedicação à promoção de segurança coletiva em âmbito global. Porém a Liga continha várias falhas e não pôde ser implementada ao contento de Wilson.

De acordo com o princípio de segurança coletiva, os Estados não podem usar a força uns contra os outros (como se vivessem num estado de natureza hobbesiano), mas seriam obrigados a usar a força coletivamente, caso houvesse a agressão de um Estado a qualquer outro (semelhança com a lei da natureza de Locke).

A carnificina empregada na Grande Guerra convenceu os chefes de Estados europeus a aceitarem a indivisibilidade da paz, mas não a ponto de sacrificarem sua própria liberdade de escolha nas decisões acerca da segurança nacional.

Porém, tal organização teve problemas ao implementar a paz na Europa ou em qualquer outro lugar. O maior problema a essa implementação da paz foram as pesadas imposições à Alemanha, algo como uma paz punitiva. Isso mergulhou o povo alemão numa profunda insatisfação, que culminou com a ascensão de Hitler e início da Segunda Guerra Mundial. O objetivo maior da Liga das Nações havia ido por água abaixo.

Além disso, o quarto ponto de Wilson foi aplicado seletivamente pelos Estados vencedores, que se recusaram a entregar as armas a um corpo mundial sobre o qual não poderiam exercer nenhum tipo de controle.

Outros pontos de Wilson foram também implementados de forma parcial pelas Quatro Grandes Potências da Conferência (Inglaterra, França, Estados Unidos e Itália). A Polônia conseguiu a sua independência e o princípio da autodeterminação (usado por Hitler para unificar as nações de língua alemã sob o Drittens Reich) foi implementado em favor da Tchecoslováquia, Finlândia e nações bálticas. Porém houve problemas na definição do conceito de nação, o que levou à criação de Estados com grandes conflitos internos, a exemplo da Iugoslávia. Houve também a destituição alemã de suas colônias africanas e no Pacífico, transferidas para os Poderes Aliados através de mandatos. Não foi feito acordo sobre a Rússia, que atravessava uma era de guerra civil. A Inglaterra simplesmente se recusou a discutir a independência da Índia. Apesar da vontade do povo, não houve a fusão da Áustria com a Alemanha.

 

5 Conclusão

Diante de todos esses problemas, Woodrow Wilson se convenceu que a entrada dos Estados Unidos na Liga das Nações era de importância primordial para a sobrevivência da mesma. Porém a sua intensa campanha no senado para a aprovação da entrada do país na Liga não surtiu o efeito desejado. Os Estados Unidos com sua política externa isolacionista não deveriam se envolver em qualquer tipo de aliança que não estivesse adaptada aos interesses nacionais, por isso os Estados Unidos nunca se uniram à Liga das Nações. Com isso teve o início da Segunda Guerra Mundial menos de vinte anos depois.

 

 REFERÊNCIAS

 GRIFFITHS, Martin. 50 GRANDES ESTRATEGISTAS DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS. [S.l.]: Editora Contexto, [20–?]

Nova Enciclopédia Barsa. WILSON, WOODROW. São Paulo: Encyclopaedia Britannica dos Brasil Publicações, 1998, v. 14, p. 458.

Biografia de Woodrow Wilson. Disponível em: <http://www.netsaber.com.br/biografia s/ver_biografia_c_1178.html> Acesso em: 10/09/2007

 

*Acadêmico de Direito da UFSC

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Como citar e referenciar este artigo:
WIESE, Hernane. Woodrow Wilson: O Projeto De Internacionalismo e a Liga Das Nações. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-internacional/wood/ Acesso em: 08 nov. 2024