A quarta revolução industrial, revelada pelo uso da internet das coisas e computação em nuvem, será responsável por acabar com 7 milhões de empregos até 2021. Qual o cenário para os profissionais do Direito?
Estudos sobre o futuro do trabalho são cada vez mais frequentes. A transformação da sociedade nas relações interpessoais e de emprego deram origem às projeções que, mesmo sob diferentes perspectivas apontam para um caminho: daqui há dez anos o mercado de trabalho será bem diferente do que conhecemos hoje.
Um exemplo é o estudo “Projetando 2030: uma visão dividida do futuro”, encomendado pela Dell Technologies ao Institute For The Future. Um dado desse levantamento chama a atenção – 85% das profissões que serão exercidas em 2030 sequer foram inventadas.
A preocupação quanto ao cenário não se limita somente aos nossos empregos. Lança olhar para a educação, futuro e empregabilidade dos nossos filhos. O Fórum Econômico Mundial indica no relatório “Futuro do Trabalho” que 65% das crianças, hoje no primário, terão empregos completamente novos quando começarem a trabalhar.
Como fica a carreira do advogado nesse cenário?
O Direito é uma das profissões mais formalistas e tradicionais do mundo. Demorou para muitos profissionais da área perceberem que seriam afetados por esta revolução gigantesca que veio para ficar. Há quem sequer tente entender o movimento atual. Apegam-se, com unhas e dentes, ao conhecimento e status conquistados no passado para desafiar o futuro.
Atualmente, não é difícil toparmos com publicações, principalmente estrangeiras, que questionam a real necessidade de um humano para realizar determinadas atividades. O objetivo é claro. Provocar advogados, juízes e demais “agentes da lei” a investigarem o potencial da tecnologia em suas rotinas.
É fácil notar o quão recente é a preocupação da classe jurídica com relação ao tema. A Associação Brasileira de Lawtech e Legaltechs (AB2L) – entidade fundada em 2017 reunindo empresas desenvolvedoras de tecnologia e inovação na área jurídica – e as OAB´s intensificaram a agenda de cursos, palestras, seminários e reuniões de comissões temáticas (sempre com grande audiência) para debater o uso e influência da tecnologia no Direito.
A realidade das profissões relacionadas ao Direito está em um momento de extrema importância e em um ponto que será frontalmente impactada pela nova realidade.
Temos um enorme potencial para mudar a realidade do mercado, especialmente no Brasil
A adoção da tecnologia no mercado ainda está em fase inicial, mesmo sendo amplamente debatida em inúmeros estudos nos Departamentos Jurídicos e escritórios.
Nos grandes centros temos a sensação de que a tecnologia jurídica já está na fase da disrupção, mas na prática não é bem assim. Basta uma visita às comarcas do interior para percebermos o quão longe estamos desta nova realidade.
Conforme obra escrita pelo professor Richard Susskind (Tomorrow’s Lawyers: An Introduction to Your Future), há 3 estágios básicos para interação dos advogados com a tecnologia: negação; informação e disrupção.
1. Negação: fase na qual os advogados estão relutantes em aceitar que o mercado está se modificando e buscam maneiras para continuar praticando o modelo tradicional de advocacia. Neste estágio os Diretores Jurídicos e sócios de escritórios enxergam as novas tecnologias fornecidas pelas startups com desprezo. Consideram as empresas muito pequenas e sem estrutura para fornecer os serviços necessários.
2. Informação: as empresas e escritórios iniciam a busca por novas fontes de serviços. Os advogados mais antenados começam a se interessar pelo que as Legaltechs estão fazendo e o motivo pelo qual encantam seus clientes.
3. Disrupção*: a tecnologia é massivamente inserida no meio jurídico. A automação de documentos supera a eficiência de advogados experientes e incentiva a contratação de mão de obra menos qualificada, porém bem treinada. É a mescla entre inovação e a capacidade que profissionais habilitados têm de manuseá-las.
Não podemos negar que o dia a dia dos advogados está sendo modificado pela tecnologia, mesmo que lentamente. Tarefas que antes demoravam dias para serem realizadas, hoje podem ser finalizadas em poucos minutos.
Com certeza, novas ocupações e oportunidades surgirão no mercado jurídico, remodelando o atual cenário, exigindo novas competências, habilidades e novas disciplinas dos profissionais que tem apenas duas escolhas – pegar carona no progresso ou ver a banda passar do lado de fora.
* Caso ainda não tenha se deparado com esta palavra, Disrupção é adjetivo utilizado para qualificar as tecnologias que atualmente rompem com a dinâmica econômica estabelecida até o momento de sua inserção no mercado. O termo disruptivo é utilizado para descrever inovações que oferecem produtos acessíveis e que criam um mercado de consumidores, desestabilizando as empresas que eram líderes no setor.
Sobre o autor
Luiz Felipe Tassitani é advogado sênior na Sompo Seguros S/A. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Mackenzie, com MBA em Seguros e Gestão Jurídica Estratégica pela FIA – Fundação Instituto de Administração. Escreve, regularmente, em seu perfil no Linkedin.