Emmanuelle dos Santos Silva[1]
RESUMO
O presente artigo discute a cerca dos direitos dos empregados domésticos, dando enfoque aos contratos de trabalho com impacto de dano moral sob a Lei nº 13.467/2017. Através da pesquisa bibliográfica, este estudo traz uma abordagem geral sobre o tema e uma abordagem mais específica, de acordo com o caso concreto. O objetivo desta divisão é abordar tanto os direitos do empregado doméstico, como os impactos de dano moral que estes venham a causar sob os aspectos da nova CLT.
Palavras-chave: Empregado doméstico. Dano Moral. Nova CLT.
1. INTRODUÇÃO
Numa perspectiva histórica, o trabalhador doméstico foi por muitos anos discriminado em suas atribuições laborais, como se esta fosse uma profissão menos importante que os trabalhos urbanos ou rurais. As leis anteriores à Constituição de 1988, trouxeram muito timidamente uma definição do que seriam esses profissionais e quais suas atribuições. Nesse sentido a Lei n° 5859/1972, define como trabalhador doméstico qualquer pessoa que presta serviço de natureza continua e sem finalidade lucrativa no âmbito familiar. Nas entrelinhas, se fosse no contexto atual, pessoas que trabalhavam em ambiente doméstico, não eram empregados, não possuíam quaisquer direitos de natureza trabalhista.
Ainda nesse sentido a história do trabalho doméstico é marcada pela segregação e preconceito, fato que, ao lado de outras peculiaridades dessa relação laboral, influenciou negativamente na evolução de uma legislação justa e isonômica. No Brasil, tendo como base a CLT de 1943, somente com a Lei 5.859/72 o tema foi tratado especificamente, todavia reservou poucos direitos aos domésticos, como já mencionado no parágrafo anterior.
Infelizmente a Constituição de 1988, não corrigiu a deficiência legislativa acerca desse tipo de trabalhador, não o conceituava, e estendia poucos direitos trabalhistas a ele, elencando apenas alguns incisos do artigo 7°. Alguns desses incisos possuem eficácia plena e aplicabilidade imediata e outros tem eficácia limitada.
Até o ano de 2013, a legislação pertinente ficou aquém do regime jurídico atribuído aos demais trabalhadores urbanos e rurais. Somente, em abril de 2013, com a EC nº 72, dezesseis novos direitos foram conquistados por esses profissionais, sendo que apenas nove deles tiveram aplicação imediata; os demais só foram regulamentados com a Lei Complementar 150/2015. Esse dispositivo instituiu novo regime jurídico e delineou vários direitos, formando um microssistema que permite, inclusive, aplicação subsidiária da CLT.
Dito isso, o presente trabalho intenciona apresentar um breve resumo histórico do trabalhador doméstico, suas perdas e seus ganhos ao longo da história, e como este se apresenta hoje, com o advento das leis trabalhistas, especialmente a Lei n° 13 467/2017, lei que altera a Consolidação das Leis Trabalhistas.
Ademais, no segundo tópico, serão apresentados alguns efeitos nos contratos de trabalho desses profissionais com impacto de dano moral à luz da “nova” CLT, ou seja, serão apresentadas algumas situações que podem resultar em dano moral a esses trabalhadores.
2. TRABALHADOR DOMÉSTICO: EVOLUÇÃO HISTÓRICA E CONSOLIDAÇÃO DE DIREITOS
O desenvolvimento das civilizações só se deu em razão da necessidade do ser humano em produzir, seja em benefício próprio, seja por necessidade de um grupo. Dessa forma pode-se pensar o trabalho como uma necessidade humana. Nisso, desde os tempos mais remotos, é possível observar as mais diferentes atividades laborais, desempenhadas pelas mais diversas pessoas. Os trabalhadores objeto desde trabalho, considerando seu conceito, começou sendo os escravos, eles que por muitos anos, nas mais diversas sociedades, desempenham trabalhos no âmbito doméstico sem fim lucrativo, com todas as obrigações e abusos, e sem nenhum ganho de caráter trabalhista.
É comum observar, devido as desigualdades vividas pela sociedade, em detrimento de um desenvolvimento socioeconômico fragilizado, baseado em um modelo capitalista, diferentes formas de trabalho. No entanto, por maior ascensão no mercado, o emprego doméstico vem se destacando, todavia, as dificuldades encontradas por estes funcionários, ainda são frequentes.
Também, historicamente o labor doméstico foi caracterizado pelo trabalho feminino, com predominância absoluta do labor das mulheres sobre os homens. Isso se deu, pela predominância de caráter patriarcal na sociedade brasileira. Vê-se ainda nos dias atuais, apesar da valiosa conquista das mulheres, que muitas profissões separadas por sexo, como se a capacidade para as exercer se relacionasse ao gênero.
A abolição da escravatura, trouxe o fim do trabalho escravo, todavia os escravospermaneceram trabalhando nos mesmos lugares, nas casas das fazendas, em troca de local de moradia e alimentação, como domésticos. A forma de trabalho, entretanto, permaneceu à mesma, ficando o trabalhador à disposição do seu empregador para todo o trabalho solicitado no âmbito de ingerência deste, sem qualquer limite de jornada. A subordinação era subjetiva, não alcançando apenas o trabalho doméstico, mas a própria pessoa do trabalhador.
A legislação brasileira referente ao trabalho doméstico foi evoluindo, mas não na mesma velocidade do progresso social e das demais categorias de trabalhadores, rurais e urbanos. Foi evoluindo a passos bem lentos. Isso decorreu, certamente, em razão da origem escravocrata e preconceituosa do trabalho doméstico.
No Brasil, as Ordenações do Reino trouxeram as primeiras orientações aplicáveis ao trabalho doméstico; seguidas pelo Código Civil de 1916, o qual regulava a locação de serviços; depois foi editado o Decreto Lei 3.078 de 1941, o qual regulava a locação de empregados em serviços domésticos. E a lei que antes da Constituição Federal de 1988, melhor abordou o assunto, a Lei n° 5.859/1972, que disciplinou especificamente o trabalho doméstico, trazendo apenas alguns direitos em comparação aos demais trabalhadores urbanos e rurais.
A justificativa trazida para a escassez de direitos dos trabalhadores domésticos, era de que ele não trazia qualquer lucro direto ao seu empregador, ao contrário dos empregados no comércio e na indústria, por exemplos, regulados pela CLT e os do campo, que produziam serviços e bens através dos quais os empregadores extraiam a mais-valia.
Vê-se que com a evolução dos direitos sociais, ratificados pela Constituição Federal de 1988, no Capítulo II, a partir do artigo 6°, lá no art. 7°, houve a extensão de alguns direitos à categoria dos domésticos, tais como: direito ao salário mínimo, a irredutibilidade salarial, a gratificação natalina, o repouso semanal remunerado, o pagamento das férias anuais com acréscimo de, pelo menos, um terço, a licença gestante, a licença paternidade, o aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, a aposentadoria e a integração à previdência social.
Não obstante a proteção Constitucional, as férias eram fruídas em períodos menores que os demais trabalhadores, conforme artigo 3º da Lei 5.859/1972, sendo que os demais preceitos da CLT não se aplicavam a tal categoria, consoante artigo 7º, “a” do referido diploma legal:
Os preceitos constantes da presente Consolidação, salvo quando for, em cada caso, expressamente determinado em contrário, não se aplicam:
a) aos empregados domésticos, assim considerados, de um modo geral, os que prestam serviços de natureza não econômica à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas.”
Outro direito negado, e que feria à dignidade da mulher gestante, era que a elas não havia garantia de emprego no ambiente doméstico, pois a ela não se aplicava o artigo 7º, I da Carta Superior e 10, II, b do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Este último prevê o seguinte: “fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa: b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez, até 5 meses após o parto.”
Constata-se que com a migração da população brasileira para as cidades, o trabalhador doméstico passou a conviver mais próximo de outras categorias que tinham uma maior gama de direitos assegurados. Destarte, suas reivindicações foram aumentando e chegavam ao foro trabalhista demandas para pagamento de FGTS, indenização de seguro desemprego, horas extraordinárias, adicional noturno, férias de trinta dias, multa pelo atraso no pagamento de verbas rescisórias, sob o argumento de que a Constituição Federal,previa a não discriminação e o valor social do trabalho e a dignidade da pessoa humana pilares da República Federativa do Brasil, sem discriminação das profissões. Desse modo, com estes argumentos, várias decisões judiciais estendiam à categoria dos domésticos direitos não assegurados especificamente pela legislação, buscando o Poder Judiciário um progresso social desta categoria.
Feito esse apanhado histórico, retornamos ao artigo 7° da Constituição Federal, onde encontramos os incisos aplicados aos empregados domésticos, quais sejam: IV, VI, VII, VIII, X, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XXI, XXII, XXIV, XXVI, XXX, XXXI e XXXIII e, atendidas as condições estabelecidas em lei e observada a simplificação do cumprimento das obrigações tributárias, principais e acessórias, decorrentes da relação de trabalho e suas peculiaridades, os previstos nos incisos I, II, III, IX, XII, XXV e XXVIII, bem como a sua integração à previdência social.
Ressalte-se que foi a Emenda Constitucional 72 de 02 de abril de 2013, que alterou a redação do parágrafo 7° da CF, “para estabelecer a igualdade de direitos trabalhistas entre os trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais”. Sendo, pois, de aplicabilidade imediata aos empregados domésticos, conforme destaca Bezerra Leite, os seguintes direitos:
salário mínimo; irredutibilidade de salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo de trabalho; garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável; décimo terceiro salário; proteção do salário na forma da lei; duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e 44 semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; repouso semanal remunerado, de preferencia aos domingos; remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinquenta por cento à do normal; gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do salario normal; licença à gestante sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias; licença-paternidade; aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; aposentadoria; reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho; proibição de diferença de salário, de exercício de funções e de critérios de admissão por motivo de sexo, idade, cor, ou estado civil; proibição de qualquer discriminação no tocante a salario e critérios de admissão do trabalhador com deficiência; proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 anos.
Por outro lado, aponta ainda o mesmo autor, os direitos do trabalhador doméstico cujos exercícios dependem de regulamentação infraconstitucional:
relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa; seguro desemprego, em caso de desemprego involuntário; Fundo de Garantia do Tempo de Serviço; remuneração do trabalho noturno superior ao diurno; salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda; assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas; seguro contra acidente de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa.
Percebe-se com o exposto até aqui, que houve inúmeros avanços no que tange aos direitos do trabalhador doméstico de modo que hoje podemos falar em um microssistema de regulação desse tipo de trabalho. Para tanto, destaca-se a Lei Complementar 150, de 1° de junho de 2015, que inovou substancialmente o regime previsto anteriormente e regulamentou, em grande parte, os direitos previstos em normas de eficácia limitada criando pela Emenda Constitucional 72/2013, ao permitir, em seu art. 19, expressamente a aplicação subsidiária dos dispositivos legais de proteção ao empregado e especialmente, da CLT, desde que observadas as peculiaridades do trabalho doméstico.
Nesse sentido, a CLT será aplicada como fonte direta do trabalho doméstico nas hipóteses em que a LC 150 determinar diretamente sua aplicação e, subsidiariamente, quando houver lacuna na referida lei complementar, desde que as normas do texto consolidado sejam compatíveis com as peculiaridades do tipo de trabalho ora abordado.
Por fim, pode-se afirmar que as normas do artigo 7°, § único da CF, as normas da LC 150/2015 e da CLT, formam esse microssistema normativo de regulação do trabalho doméstico. Assim, a CLT será aplicada ao trabalhador doméstico quando: a LC 150/2015 mandar aplicar a CLT; lacuna da 150/2015; e compatibilidade da norma da CLT a ser aplicada com as peculiaridades do trabalho doméstico, ressalte, com as alterações dadas pela Lei n° 13.467/2017.
3. EFEITOS NOS CONTRATOS DE TRABALHO COM IMPACTOS DE DANO MORAL SOB A LEI Nº 13.467/2017
3.1 O QUE SÃO DANOS MORAIS
A Constituição Federal, que é a nossa lei maior, nos garante que todo ser humano, tem direito a dignidade, o chamado princípio da dignidade da pessoa humana. Quando alguém é lesado em sua dignidade, se diz que essa pessoa sofreu um dano moral. Dano moral, portanto, é um prejuízo à dignidade da pessoa humana, ou seja, são aqueles que lesam não o patrimônio de alguém, mas a sua pessoa. É quando o cidadão é desrespeitado em seus atributos existenciais, pois trata-se de perdas sofridas por um ataque à moral e à dignidade das pessoas, pois agridem a honra, a intimidade, a privacidade e a integridade, podendo esse fato causar dor, sofrimento, humilhação, tristeza ou vexame, caracterizados como ofensa à reputação da vítima.
Para que se configure o dano indenizável é preciso que um direito seja lesado, onde haja relação entre a ação e o direito lesado e que a responsabilidade não possa ser afastada, nessas circunstancias, a solução encontrada pelo Direito foi de compensar o dano moral sofrido, através do pagamento de um valor, trazido em reais, de forma que se dê um pouco de conforto à pessoa que sofreu o prejuízo uma vez, que os danos morais, tratam-se de bens imateriais, ou seja, são imensuráveis. Esse valor, portanto, jamais vai trazer a vítima à situação anterior, mas que seja capaz de amenizar e trazer um certo auxílio ao seu sofrimento. É por isso que, tecnicamente não se fala em indenização, mas sim em compensação ou satisfação do dano moral.
É importante lembrar que os danos morais são prejuízos à dignidade do indivíduo. É algo grave, não podendo ser qualquer incomodo, aborrecimento ou chateação, uma vez que os valores a serem fixados, serão baseados a partir de critérios subjetivos referentes a cada caso e de acordo com a gravidade da ofensa e da repercussão social. Porém toda pessoa que sentir ofendida em sua moral, dignidade ou honra, poderá entrar com uma ação na justiça, pedindo reparação, desde que tenha comprovado o dano.
3.2 SITUAÇÕES QUE PODEM GERAR DANOS MORAIS AO EMPREGADO DOMÉSTICO
Assédio Moral
O trabalhador doméstico é uma das figuras mais assediadas moralmente no Brasil, contudo mesmo havendo grande incidência e um crescente aumento das ações de dano moral na justiça brasileira, a classe doméstica ainda tem muita dificuldade de comprovar que foi lesada pelo empregador, ou seja, não consegue provar o dano moral sofrido, isto porque, o empregado doméstico, na maioria das vezes está sozinho com o empregador no momento do dano, não havendo testemunhas para relatarem a lesão, além do medo e da pressão psicológica que impedem os mesmos de buscar os direitos que fazem jus. Tudo isso atrelado a um baixíssimo índice de sindicalização e um deficiente acesso a serviços jurídicos prejudicam a demanda de ações e a possibilidade de reparação.
Assédio moral por sua vez, constitui uma espécie de manipulação perversa que atenta contra a dignidade ou integridade psíquica ou física do empregado. Trata-se de uma violência em que o empregador ou superior hierárquico humilha, constrange e ataca o empregado, expondo-o em situações incômodas e humilhantes, através da exposição prolongada e repetitiva de um comportamento hostil ou a situações vexatórias.
O assédio moral pode provocar danos psicológicos e físicos na pessoa, em razão do grande stress, causados pelas constantes humilhações e provocações. Vale lembrar, como já mencionado anteriormente, a dignidade da pessoa humana constitui um dos fundamentos da Constituição Federal, (art. 1º, III da CR/88) e o tratamento indigno não pode ser tolerado no ambiente de trabalho, local no qual o empregado se encontra exatamente para buscar seu sustento digno.
Como exemplo de assédio moral a empregada doméstica, podemos citar a decisão da 10ª Turma do TRT-MG que manteve a condenação de um casal ao pagamento de indenização por assédio moral à ex-empregada doméstica, que era tratada com desrespeito, sendo chamada por nomes ofensivos e que faziam referência à sua raça. As filhas dos reclamados, inclusive, utilizaram um site de relacionamento da internet, para ofender a trabalhadora, que era chamada de “gorda”, “ladra” e “neguinha”. Para o desembargador relator, Márcio Flávio Salem Vidigal, embora isso tenha ocorrido após o término do contrato de trabalho, acaba por reforçar as declarações das testemunhas e leva à constatação de que, na casa dos reclamados, a reclamante era agredida e tratada com hostilidade.
Acusar por furtos ou qualquer outro crime sem ter certeza e prova
Esta situação infelizmente é muito comum nas ações de danos morais a empregadas domésticas, justamente por existir uma relação de convivência dentro de uma determinada residência, podendo estabelecer-se uma relação de confiança ou desconfiança. Uma ofensa inverídica gera constrangimento, fere a honra, a dignidade, e a imagem da pessoa.
Diante desse tipo de situação o empregador deve apenas informar o ocorrido as autoridades competentes para que possa ser feita investigação que identifique o autor do crime. Isso é totalmente diferente de se acusar alguém da prática de um crime, sem provas. A polícia irá tomar ciência da notícia criminosa, passará a investigar se houve o crime e quem o praticou.
Como exemplo dessa situação, podemos citar uma ação que foi ajuizada perante a Vara do Trabalho de Patrocínio, uma empregada doméstica reivindicou a condenação de seus ex-empregadores ao pagamento de indenização por danos morais, bem como a declaração da rescisão indireta do contrato de trabalho, ao argumento de que foi injustamente acusada de furtar objetos da residência do casal. Ao acolher os pedidos formulados pela trabalhadora, o juiz titular da Vara, Sérgio Alexandre Resende Nunes, acentuou que a acusação infundada de furto é ato lesivo que atinge a honra, a imagem e a dignidade do empregado, gerando a obrigação de indenizar.
Não assinar carteira de trabalho
A ausência de assinatura na carteira de trabalho pelo empregador, por si só, ofende a honra do funcionário e da dá direito a indenização por danos morais, uma vez que o empregador tem obrigação legal de fazer isso.
Anteriormente a reforma trabalhista, a empresa estava sujeita a multa de um salário mínimo regional, por empregado registrado, com a reforma a valor da multa passou a ser de R$ 3.000,00 (três mil reais) como dispões a Lei nº 13.467/2017:
“Art. 47. O empregador que mantiver empregado não registrado nos termos do art. 41 desta Consolidação ficará sujeito a multa no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) por empregado não registrado, acrescido de igual valor em cada reincidência.
§ 1º Especificamente quanto à infração a que se refere o caput deste artigo, o valor final da multa aplicada será de R$ 800,00 (oitocentos reais) por empregado não registrado, quando se tratar de microempresa ou empresa de pequeno porte.
§ 2º A infração de que trata o caput deste artigo constitui exceção ao critério da dupla visita.” (NR)
No que diz respeito ao empregado doméstico, por uma questão de equilíbrio, a multa do empregador doméstico deve ser de R$ 800,00. Como não está especificado, o juiz poderá aplicar uma multa de R$ 3.000,00 ou de R$ 800,00, de acordo com o seu entendimento. O Instituto Doméstica Legal já está trabalhando par que a multa do empregador doméstico também seja estabelecida em R$ 800,00, que é o caso de microempresas e empresas de pequeno porte que não registram o empregado, de acordo com a reforma trabalhista.
Delegar funções diferentes ou além da combinada na contratação
No momento da contratação é importante estabelecer uma lista de funções das quais o empregado doméstico ficará responsável, como: passar roupas, lavar louça, preparar o almoço, limpar quartos, limpar banheiros, tirar o lixo e etc. Essas atividades precisam estar determinadas, uma vez que atividades exigidas pelo empregador fora desse contexto, configuraria abuso e eventual dano moral.
Quando o empregado realiza atividades além das previstas em seu contrato de trabalho, sem receber acréscimo salarial, constitui acúmulo de funções, nesse caso há uma incompatibilidade entre a natureza da função descrita no contrato e a realidade. Quando a empregada doméstica é contratada apenas para limpar a casa e depois ganha uma nova função de tomar conta das crianças por exemplo, sem que haja acréscimo salarial, a mesma estará diante de uma situação não estabelecida no contrato, que se não for acordada ou persistir gerará um abuso por parte do empregador e um eventual dano moral. Nesse caso, a empregada doméstica tem direito a entrar com uma ação trabalhista contra o empregador e obter uma indenização relativa ao pagamento das funções extras executadas.
A melhor maneira de evitar essa situação, é criando um contrato de trabalho claro, que descreva as funções a serem executadas pela empregada. Também é muito importante atualizar esse contrato sempre que uma nova função ou responsabilidade for atribuída
4. DANO MORAL E A LEI 13.467/2017
Com o objetivo de colaborar com o debate acadêmico, doutrinário e jurisprudencial quanto à determinação do dano moral segundo a Lei 13.467, apresentamos uma reflexão quanto aos critérios de fixação do valor da reparação. Contudo é sabido por todos, que a honra, dignidade e intimidade de um ser humano não tem preço, porém quando ocorre um desprezo a esta singular natureza do ser humano, a devida reparação se faz necessário, devendo o julgador se pronunciar a respeito na fixação da justa reparação. É nesse sentido que, de modo a se evitar decisões conflitantes que a nova Lei veio a estabelecer critérios, de modo a definir os fundamentos das reparações de dano moral, porém sempre respeitando o livre arbítrio do magistrado, para que, dentro do seu juízo de apreciação, fixe a justa indenização ao determinado caso concreto.
Com o advento da Lei nº 13.467/2017 (Nova CLT), o legislador inicia o regulamento do instituto do dano moral, ou dano extrapatrimonial, limitando as hipóteses de incidência apenas as elencadas neste título. ‘Art. 223-A. Aplicam-se à reparação de danos de natureza extrapatrimonial decorrentes da relação de trabalho apenas os dispositivos deste Título.’ o que não se compatibiliza com a própria realidade dos fatos, haja vista a dinâmica da sociedade moderna. Desse modo, entendemos que uma legislação, por mais elaborada e moderna que seja, não tem o condão de conter todos os casos, como se extrai do dispositivo legal.
Dentro desse contexto, concluímos que não há como limitar a aplicação do dano moral apenas aos casos especificados do dispositivo legal como dispões a própria Lei 13.467/2017: “Art. 223-B. Causa dano de natureza extrapatrimonial a ação ou omissão que ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica, as quais são as titulares exclusivas do direito à reparação.”
Em uma análise preliminar, podemos perceber que vários direitos da personalidade que fixam a configuração de dano moral não foram compreendidos, entre eles o direito a vida plena e feliz, à vida privada, à beleza, a qualidade de vida e etc, o que exigirá do magistrado, a devida inclusão do fato real à norma legal.
Art. 223-C. A honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física são os bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa física.’
‘Art. 223-D. A imagem, a marca, o nome, o segredo empresarial e o sigilo da correspondência são bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa jurídica.’
O artigo seguinte contempla a possibilidade de responsabilidade solidária ou subsidiária, de forma que a distribuição da indenização seja feita de forma igualitária entre os responsáveis pela lesão, com base no principio da razoabilidade e proporcionalidade. Art.223-E da nova CLT. “Art. 223-E. São responsáveis pelo dano extrapatrimonial todos os que tenham colaborado para a ofensa ao bem jurídico tutelado, na proporção da ação ou da omissão.” Ressaltamos que a solidariedade e assistência não se presume, ela decorre de lei ou de contrato. Como prever a Lei 13.467/2017:
Art. 223-F. A reparação por danos extrapatrimoniais pode ser pedida cumulativamente com a indenização por danos materiais decorrentes do mesmo ato lesivo.
§ 1º Se houver cumulação de pedidos, o juízo, ao proferir a decisão, discriminará os valores das indenizações a título de danos patrimoniais e das reparações por danos de natureza extrapatrimonial.
§ 2º A composição das perdas e danos, assim compreendidos os lucros cessantes e os danos emergentes, não interfere na avaliação dos danos extrapatrimoniais.’
Dessa forma, poderá haver a cumulação de danos extrapatrimoniais, decorrente da indenização por dano moral ou dano estético, com os de danos patrimoniais (danos emergentes ou lucros cessantes), decorrentes do mesmo evento lesivo, contudo a lei exige que o magistrado discrimine caso a caso, os valores relativos a cada tipo de indenização.
Já o parágrafo 2ª do presente artigo é até mesmo repetitivo na medida em que os magistrados, não interferem na avaliação dos danos patrimoniais com os danos morais.
“Art. 223-G. Ao apreciar o pedido, o juízo considerará:
I – a natureza do bem jurídico tutelado;
II – a intensidade do sofrimento ou da humilhação;
III – a possibilidade de superação física ou psicológica;
IV – os reflexos pessoais e sociais da ação ou da omissão;
V – a extensão e a duração dos efeitos da ofensa;
VI – as condições em que ocorreu a ofensa ou o prejuízo moral;
VII – o grau de dolo ou culpa;
VIII – a ocorrência de retratação espontânea;
IX – o esforço efetivo para minimizar a ofensa;
X – o perdão, tácito ou expresso;
XI – a situação social e econômica das partes envolvidas;
XII – o grau de publicidade da ofensa.
§ 1º Se julgar procedente o pedido, o juízo fixará a indenização a ser paga, a cada um dos ofendidos, em um dos seguintes parâmetros, vedada a acumulação:
I – ofensa de natureza leve, até três vezes o último salário contratual do ofendido;
II – ofensa de natureza média, até cinco vezes o último salário contratual do ofendido;
III – ofensa de natureza grave, até vinte vezes o último salário contratual do ofendido;
IV – ofensa de natureza gravíssima, até cinquenta vezes o último salário contratual do ofendido.
§ 2º Se o ofendido for pessoa jurídica, a indenização será fixada com observância dos mesmos parâmetros estabelecidos no § 1º deste artigo, mas em relação ao salário contratual do ofensor.
§ 3º Na reincidência entre partes idênticas, o juízo poderá elevar ao dobro o valor da indenização.”
Certamente para os aplicadores do direito, este artigo trata da parte mais trabalhosa e árdua pois os mesmos deverão fixar o valor da indenização de acordo com a extensão do dano, como podemos perceber nos termos do art. 944 do Código Civil Brasileiro: “Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização”.
Nesse contexto, o julgamento da indenização por dano moral deve considerar a gravidade do dano, a capacidade patrimonial dos ofensores e a dimensão dos prejuízos sofridos, tudo isso atrelado aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, devendo o magistrado, considerar todos os detalhes do caso concreto para fazer a aplicação da norma legal em questão, para fixar uma indenização que se configure mais justa.
O problema que será examinado pelo magistrado no caso concreto é a dignidade humana, que como já foi falado, trata-se de algo imensurável, ou seja, que não tem preço, por possuir um valor inestimável em face da natureza insubstituível e única da personalidade humana, daí a incalculabilidade de se usar parâmetros para todos os indivíduos.
5. CONCLUSÃO
A Lei 13.467/2017, sancionada pelo Governo, que altera mais de cem artigos da CLT, também promove mudanças na relação entre patões e empregados domésticos. Isso ocorre porque a lei que rege a categoria (LC 150/15) está subsidiada pela CLT, ou seja, o que não for tratado pela Lei do Emprego Doméstico, deve seguir as novas regras da Reforma Trabalhista.
Com relação ao dano moral, é de conhecimento de todos que a honra e a dignidade não têm preço, porém ocorrendo o ilícito, ou abusividade de determinado fato, a regra geral será a procedência da justa e devida reparação. Sendo assim, ocorrendo a abjeção a esta especial natureza do ser humano, que no caso do empregado doméstico, como já mencionado no presente trabalho, pode ser através de assédio moral, não assinar a sua carteira de trabalho, atribuir funções diversa da acordada entre outros, a devida reparação se faz necessária, sendo obrigação do julgador estabelecer uma fixação justa para a reparação do dano causado.
Portanto, é nesse sentido que concluímos que as decisões judiciais nos contratos de trabalho por dano moral, tem que fazer relação com a nova legislação em questão (Lei nº13.467/2017), de modo a se evitar decisões conflitantes ou contraditórias, de modo a parametrizar os valores das reparações por dano moral, porém sempre deixando ao livre arbítrio do magistrado, fixar justa indenização de acordo com o caso concreto apresentado.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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[1] Acadêmica do curso de Direito da Universidade Estadual do Maranhão – UEMA. E-mail: mannu_ssilva@hotmail.com