RESUMO: Este artigo tem o escopo de discutir as conseqüências de meio ambiente de trabalho viciado. Nossa Constituição Federal incluiu entre os direitos dos trabalhadores a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de implantação de normas de saúde, higiene e segurança, determinando a garantia a um meio ambiente do trabalho saudável. Aqui, se pretende discutir as nuances da tutela jurisdicional visando este direito.
PALAVRAS CHAVE: Tutela jurisdicional; meio ambiente de trabalho, proteção do trabalhador.
1 – CONSIDERAÇÕES INICIAIS;
Atualmente, há uma demanda diária de ações ajuizadas perante a justiça do trabalho, requerendo adicionais de insalubridade, periculosidade, horas extras e danos morais. Além disso, os juízes vêm compensando as agressões físicas e psíquicas, em pecúnia através de acordos ou sentenças trabalhistas, visando suprir as deficiências dos ambientes nos quais os trabalhadores tem sido exposto diariamente.
O número de trabalhadores afastados e aposentados em razão de acidentes ou doenças ocupacionais é alarmante e demonstra a preocupante exposição da saúde do trabalhador, aumentando a cada dia os benefícios acidentários concedidos pela previdência social.
Num cenário de grandes disparidades sociais, oriundos de uma realidade globalizada, as garantias de saúde concedidas pelas legislações aos trabalhadores, tornam-se importantes instrumentos de uma política social através da valorização do trabalho formal.
Neste sentido, torna-se importante uma reflexão sobre os aspectos de proteção à saúde do trabalhador, especialmente, em relação à necessidade imperiosa de uma tutela jurisdicional a fim de garantir a uma efetiva proteção ao meio ambiente do trabalho.
2 – O TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL
O Brasil durante quase quatro séculos utilizou da mão de obra escrava, predominantemente africana para o cultivo de cana-de-açúcar, algodão, mineração, café, pecuária e outros serviços. Num período de transição para a mão de obra assalariada teve-se a utilização da mão de obra imigrante.
Devido ao sistema de “plantation” o Brasil necessitava de enorme quantidade de mão de obra para o cultivo da cana-de-açúcar e a solução encontrada pela metrópole (Portugal) para conseguir mão de obra barata foi à escravidão.
Pode-se afirmar que, no Brasil, a escravidão teve início com a produção de açúcar na primeira metade do século XVI. Os portugueses traziam os negros africanos de suas colônias na África para utilizar como mão-de-obra escrava nos engenhos de açúcar do Nordeste. Os comerciantes de escravos portugueses vendiam os africanos como se fossem mercadorias. Os mais saudáveis chegavam a valer o dobro daqueles mais fracos ou velhos.
O transporte era feito da África para o Brasil nos porões dos navios negreiros, amontoados, em condições desumanas e muitos morriam antes de chegar ao Brasil, sendo que os corpos eram lançados ao mar.
O escravismo brasileiro era dedicado ao o sustento do sistema capitalista que já dominava a Europa e Ásia.
O trabalho na agricultura do sistema “plantation”, bem como na cafeicultura paulista eram exaustivos, chegava cerca de 12 horas diárias ou mais de labor.
Já no século XVIII, a mão-de-obra escrava também foi muito utilizada na mineração, com a descoberta do ouro em Minas Gerais e Mato Grosso. Dentre todas as atividades onde se utilizou a mão de obra escrava, esta sem dúvida foi a mais cruel.
Os homens eram submetidos às piores formas de trabalho, expostos aos mais diversos problemas de saúde e sob vigilância rigorosa para não haver contrabando de minerais. Para se ter idéia, tinha-se como expectativa de vida no trabalho de um homem à variação entre 10 e 15 anos.
Tudo isso sem contar a escravidão doméstica, que consistia em mão-de-obra escrava para atividades como faxina, cozinha, amas-de-leite, babás, dentre outras, em sua maioria realizada por mulheres.
Portanto, seja nas fazendas de açúcar, seja nas minas de ouro, os escravos eram muito mal tratados. Trabalhavam de sol a sol, recebiam apenas trapos de roupa e uma alimentação de péssima qualidade. Passavam as noites nas senzalas, em galpões escuros, úmidos, com pouca higiene e acorrentados para evitar fugas. Além disso, eram constantemente castigados fisicamente, sendo que o açoite era a punição mais comum no Brasil.
3 – A TRANSIÇÃO DO ESCRAVISMO PARA O TRABALHO ASSALARIADO
O tráfico negreiro foi proibido em 1850, devido a forte pressão inglesa sobre D. Pedro II, para por fim ao trabalho escravo. A Inglaterra necessitava de ampliar seu mercado externo e isso seria impossível se não houvesse trabalho remunerado.
Assim, a mão-de-obra escrava passou a ficar escassa, fator que levou aos cafeicultores brasileiros a buscarem outra forma de trabalho, o trabalho dos imigrantes europeus.
A vinda dos imigrantes europeus para o Brasil no século XIX foi financiada pelo governo e pelos agricultores paulistas, bem como da região sul, com promessas de novas conquistas em uma “terra promissora e de oportunidades”. Esses trabalhadores vinham para o Brasil em busca de melhores condições de vida e de trabalho, tendo em vista a inserção da máquina a vapor nos diversos campos de produção na Europa, o que diminuiu drasticamente os salários destes trabalhadores.
Somente em 1888 houve a abolição da escravatura no Brasil, com a assinatura da Lei Áurea. No entanto, este fato não modificou em quase nada a forma de trabalho, haja vista que o homem negro passou a ser “livre”, mas totalmente perdido, sem referências pessoais ou profissionais, muitas vezes sem ter até lugar para onde ir. Daí continuava trabalhando para o seu senhor, recebendo um mísero salário e ainda deveria arcar com suas próprias despesas, como comprar roupas, alimentos e a pagar aluguel ao seu novo “patrão”. Em suma, a vida de ex-escravo não era fácil.
4 – O TRABALHO ASSALARIADO NO BRASIL
O trabalho assalariado teve início no Brasil nos fins do século XIX e se desenvolveu ao longo do século XX. Surgiu-se, então, as primeiras indústrias têxteis, as alimentícias, assim como grandes siderúrgicas e metalúrgicas, sendo estas últimas a partir das décadas de 1940 e 1950, com apoio dos governos Vargas e Kubitschek.
Os primeiros industriais aproveitaram da inexperiência dos operários para explorá-los ao máximo, sendo que até 1930, os trabalhadores não tinham nenhum direito garantido por lei. As jornadas eram de 12 horas diárias ou mais, os salários baixíssimos, não havia assistência à saúde ou prevenção de acidentes de trabalho, a mão-de-obra infantil era vastamente utilizada por ser mais barata, os operários eram castigados e vigiados durante o horário de trabalho. Além disso, os movimentos grevistas eram tratados com retaliação policial.
Devido às grandes pressões e às lutas dos trabalhadores, somente entre 1930 e 1940, no governo Vargas, foram promulgadas as primeiras leis trabalhistas. A CLT, em 1943, veio para garantir certos direitos como à assinatura da carteira de trabalho, a licença-maternidade, as férias remuneradas, o décimo – terceiro salário, o aviso prévio, a instituição do salário mínimo, o direito de greve, a proibição do trabalho infantil, dentre outros.
5 – OS DIREITOS HUMANOS: EVOLUÇÃO E POSITIVAÇÃO
Segundo Norberto Bobbio (1996, p. 117) a noção de direitos humanos somente encontrará a exatidão procurada pelos doutrinadores se considerar os seus “vários fundamentos possíveis”, apoiados no “estudo das condições, dos meios e das situações nas quais este ou aquele direito pode ser realizado”.
Enrique Pérez Luño citado por Evanna Soares, conceitua os direitos humanos:
um conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento histórico, concretizam as exigências de dignidade, liberdade e igualdade humanas, as quais devem ser reconhecidos positivamente pelos ordenamentos jurídicos a nível nacional e internacional. (SOARES, 2004, p. 26)
No Brasil, em 1824, a primeira Constituição trouxe idéias do liberalismo, e a criação de um Estado com divisão de poderes, consagrando, assim, os direitos individuais.
Já em 1948, houve a Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela Assembléia Geral da ONU e, no século XX, acontecimentos políticos exigiram que a positivação dos direitos humanos alcançasse o direito internacional.
Segundo Pérez Luño citado por Evanna Soares (2004, p. 41), há que se destacar três relevantes motivos para a positivação internacional dos Direitos Humanos: no plano da fundamentação tem-se um retorno à exigência do seu caráter universal e supra-estatal, livrando-os do arbítrio da jurisdição individual dos Estados; quanto à titularidade, ampliou-se os sujeitos ativos, para não só proteger os cidadãos de um único Estado, mas todos os homens, como fez a Declaração Universal da ONU; quanto à natureza jurídica tem-se a tutela e garantia desses direitos.
6 – O MEIO AMBIENTE SAUDÁVEL COMO DIREITO HUMANO
Em 1972, na Conferência sobre Meio Ambiente das Nações Unidas realizada em Estocolmo, foi reconhecido o direito da humanidade a um meio ambiente saudável.
o homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute das condições de vida adequadas em meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar vida digna e gozar de bem estar e tem a solene obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações futuras. (SOARES, 2004, p. 56)
Dessa forma, considera-se o meio ambiente:
pressuposto de exercício lógico dos demais direitos do homem, vez que, em sendo o direito à vida ‘o objeto do direito ambiental’, somente aqueles que possuírem vida, e, mais ainda, vida com qualidade e saúde, é que terão condições de exercitarem os demais direitos humanos, nestes compreendidos os direitos sociais, da personalidade e políticos do ser humano. (SOARES, 2004, p. 57)
Assim, não há que se falar em proteção à vida sem se proteger o que dá manutenção à mesma. Segundo José Afonso da Silva (2000, p. 78) o objeto tutelado pela lei ambiental é a “qualidade do meio ambiente em função da qualidade de vida”.
Evanna Soares (2004, p.61) defende a idéia de que o direito humano ao meio ambiente de trabalho saudável possui inegável “status” de direito fundamental, pelo que deve ter tratamento prioritário tanto para tutela material como processual pelo Poder Público.
Neste contexto, oportuno se faz neste momento definir o que seriam esses direitos: Bonavides acredita que os direitos fundamentais “são os do homem que as Constituições positivaram”, recebendo nível mais elevado de garantias ou segurança, pois, cada Estado, tem seus direitos fundamentais específicos. Entretanto, o autor acrescenta que os direitos fundamentais “estão vinculados aos valores de liberdade e dignidade humana, levando-nos, assim, ao significado de universalidade inerente a esses direitos como ideal da pessoa humana”. (BONAVIDES, 2000, p. 514-518)
Já Canotilho ensina que a positivação dos direitos fundamentais, considerados “naturais e inalienáveis” do indivíduo pela Constituição como normas fundamentais constitucionais, é que vincula o direito. “Sem o reconhecimento constitucional, estes direitos seriam meramente aspirações ou ideais, seriam apenas direitos do homem na qualidade de normas de ação moralmente justificadas”. (CANOTILHO, 1998, p.369)
Quanto à terminologia de direitos humanos e direitos fundamentais, surge a necessidade de diferenciação: direitos humanos são sempre direitos do ser humano inerente a sua dignidade e convívio social, sem, contudo, apresentar juridicidade constitucional, enquanto os direitos fundamentais encontram-se positivados na esfera constitucional. Ingo Wolfgang SARLET, assim os define:
Em que pese sejam ambos os termos (“direitos humanos” e “direitos fundamentais”) comumente utilizados como sinônimos, a explicação corriqueira e, diga-se de passagem, procedente para a distinção é de que o termo “direitos fundamentais” se aplica para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado Estado, ao passo que a expressão “direitos humanos” guardaria relação com os documentos de direito internacional, por referir-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem o ser humano como tal, independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional e que, portanto, aspiram a validade universal para todos os povos e tempos, de tal sorte que revelam um inequívoco caráter supranacional (internacional). (SARLET, 2006, p.35-36)
Ainda assim, não poderia tais conceitos ser entendidos como sinônimos, pois a efetividade de cada um é diferente. Neste ponto Ingo Wolfgang SARLET é incisivo ao afirmar que:
Além disso, importa considerar a relevante distinção quanto ao grau de efetiva aplicação e proteção das normas consagradoras dos direitos fundamentais (direito interno) e dos direitos humanos (direito internacional), sendo desnecessário aprofundar, aqui, a idéia de que os primeiros que – ao menos em regra – atingem (ou, pelo menos, estão em melhores condições para isto) o maior grau de efetivação, particularmente em face da existência de instâncias (especialmente as judiciárias) dotadas do poder de fazer respeitar e realizar estes direitos. (SARLET, 2006, p. 40)
Desse modo, os direitos humanos seriam garantias inerentes à existência da pessoa, albergados como verdadeiros para todos os Estados e positivados nos diversos instrumentos de Direito Internacional Público, mas que por fatores instrumentais não possuem aplicação simplificada e acessível a todas as pessoas.
Por outro lado, os direitos fundamentais são constituídos por regras e princípios, positivados constitucionalmente, cujo rol não está limitado aos dos direitos humanos, que visam garantir a existência digna (ainda que minimamente) da pessoa, tendo sua eficácia assegurada pelos tribunais internos.
Atualmente, a doutrina os classifica em direitos humanos fundamentais em primeira, segunda, terceira e quarta dimensões[1], cujos conteúdos ensejariam os princípios: liberdade, igualdade e fraternidade.
Direitos de primeira dimensão ou de liberdade seriam os direitos e as garantias individuais e políticos clássicos, as chamadas liberdades públicas. Visam inibir a interferência indevida do Estado na vida do cidadão.
Nesse sentido é a observação feita por Carlos Henrique Bezerra Leite, para quem os direitos de primeira dimensão “são uma espécie de comando negativo imposto ao poder estatal, limitando a atuação deste em função das liberdades públicas asseguradas ao indivíduo“. (LEITE, 2005, p.12).
Os direitos de segunda dimensão ou de igualdade referem-se aos direitos sociais, econômicos e culturais, surgidos no início do século XX. Eram os direitos de caráter social. Neste caso, a interferência do Estado era desejada para garantir a igualdade material dos indivíduos.
Bezerra Leite, compara brilhantemente os direitos fundamentais de primeira e segunda geração:
O conteúdo dos direitos individuais, portanto, é um dever de não-fazer por parte do Estado em prol de certos interesses ou direitos, como o direito à vida, à liberdade nos seus multifários aspectos (locomoção, expressão, religião, organização de grupos), ao passo que os direitos sociais constituem um dever de fazer, de contribuir, de ajudar, por parte dos órgãos que compõem o Poder Público. (LEITE, 2005, p.13)
Já os direitos de terceira dimensão ou de solidariedade ou fraternidade são os da coletividade, de titularidade coletiva ou difusa. Entre eles, encontra-se o direito à paz, ao meio ambiente equilibrado, à comunicação e à proteção do consumidor (DE LUCCA, 2008).
Assim, na terceira dimensão dos direitos fundamentais compreende uma saudável qualidade de vida, ao patrimônio comum da humanidade, ao progresso, à comunicação, aos direitos dos consumidores, das crianças e idosos, entre outros direitos metaindividuais (difusos e coletivos). Esses direitos são titularizados por pessoas indeterminadas e indetermináveis, dada a sua própria natureza.
Bonavides cita a quarta dimensão de direitos originários do mundo globalizado: os direitos à democracia, à informação, ao pluralismo. Seriam estes direitos que possibilitariam a legítima globalização política. (BONAVIDES, 2000, p.524)
Considerando o que foi exposto, podemos afirmar que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito humano, no âmbito internacional, bem como direito fundamental, no âmbito interno, de terceira geração, razão pela qual a atual Constituição Federal fez referência a sua proteção em diversas passagens, entre as quais vale destacar as seguintes:
Art.
Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: (…) VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º. Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (…) VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
Por fim, diante desses dispositivos apresentados, fica evidente que o meio ambiente do trabalho é espécie do gênero meio ambiente, do mesmo modo que a relação de emprego é espécie do gênero relação de trabalho. Então, claro está, que o meio ambiente de trabalho sadio e equilibrado é direito fundamental de todos os trabalhadores, sendo dever do Poder Público e da coletividade defendê-lo e preservá-lo para a presente e futura gerações.
7 – O MEIO AMBIENTE DO TRABALHO
A lei 6.938 de 1981, no seu art. 3º, item I, define meio ambiente como “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”.
Rodolfo de Camargo Mancuso citado por Evanna Soares define o meio ambiente do trabalho como sendo:
o ‘habitat laboral’, isto é, tudo que envolve e condiciona, direta e indiretamente, o local onde o homem obtém os meios para prover o quanto necessário para sua sobrevivência e desenvolvimento, em equilíbrio com o ecossistema. A contrario sensu, portanto, quando aquele ‘habitat’ se revele inidôneo a assegurar as condições mínimas para uma razoável qualidade de vida do trabalhador, aí se terá uma lesão ao meio ambiente do trabalho. (SOARES, 2004, p. 71)
Na lição de José Afonso da Silva, o meio ambiente pode ser considerado como “a interação entre o conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas” (SILVA, 2000, p. 2)
Já a Constituição da República de 1988, no seu artigo 200, VIII, estabeleceu que compete ao sistema único de saúde a colaboração na proteção do meio ambiente, nele contido o do trabalho. Aqui, o legislador almejou a proteção a um ambiente saudável onde o trabalhador passa grande parte de sua vida.
Desta forma, sugere Celso Antonio Pacheco Fiorillo que, para a nossa Constituição: “a proteção do meio ambiente do trabalho tem natureza vinculada à proteção da saúde que, sendo direito de todos, está tutelada pelas normas instrumentais destinadas à proteção dos interesses difusos”. (FIORILLO, 1995, p. 98)
A Lei Maior protege, ainda, em seu art. 7º, o direito de trabalhadores urbanos e rurais à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança, garantindo o adicional de remuneração para atividades insalubre, penosas ou perigosas, bem como o seguro contra acidentes do trabalho, a ser pago pelo empregador, sem a exclusão de indenização se incorrer com dolo ou culpa.
Observa-se que o meio ambiente do trabalho é um direito humano, e que por conseqüência deve ser saudável e seguro, para que haja a garantia da efetiva proteção à vida e à saúde no habitat laboral.
As desigualdades no ambiente do trabalho podem ser toleráveis ou não toleráveis, sendo certas estas que formam as iniqüidades e que deveriam ser reduzidas, ou se possível, evitadas.
A expressão meio ambiente do trabalho deve abranger tudo que se refira ao habitat laboral, especialmente o local de trabalho e suas imediações, incluindo a ergonomia, medidas preventivas de doenças e acidentes do trabalho, educação e conscientização de empresários e trabalhadores para manutenção de um meio ambiente do trabalho adequado, implantação de equipamentos de proteção coletivo e individual, inutilização de substâncias e máquinas que agridam a saúde do trabalhador ou causem sua morte, elaboração fiscalização e cumprimento de normas protetivas à saúde do trabalhador, dentre outras.
Outro aspecto importante é que nem sempre um ambiente de trabalho fisicamente perfeito é saudável para o trabalhador, isso porque questões de ordem moral e psicológica também podem comprometê-lo negativamente.
Além da abrangência em decorrência do lugar e dos meios de efetivação do trabalho, dentro do meio ambiente do trabalho inclui-se todos os trabalhadores, sendo certo que, a palavra trabalhador não deve cingir só os trabalhadores subordinados, mas também os não subordinados, os estagiários, aprendizes, trabalhadores de cooperativa, avulsos, rurais, domésticos, profissionais liberais. Se assim não for, ficariam estes à margem do direito ao meio ambiente do trabalho saudável e seguro, o que seria inadmissível, tendo em vista o “status” deste direito como direito humano universal.
Pode-se afirmar que o homem trabalhador é o destinatário do direito ao meio ambiente do trabalho, que focaliza todas as categorias de trabalhadores, independentemente do regime por ele adotado. Dentre os trabalhadores em geral, os que se encontram no setor informal, encontra-se o maior desafio para se promover uma adequação do meio ambiente do trabalho.
A OIT reconhece que a pobreza em conjunto com o subemprego e o desemprego influenciam na degradação do meio ambiente do trabalho. Em razão da falta de emprego e da pobreza, homens, mulheres e crianças se submetem a trabalho em condições mais absurdas e prejudiciais a sua saúde.
Segundo Evanna Soares (2004, p.90), a partir da década de
Nesse sentido, faz-se oportuno trazer à colação os escritos de Raimundo Simão de Melo:
O meio ambiente do trabalho adequado e seguro é um dos mais importantes e fundamentais direitos do cidadão trabalhador, o qual, se desrespeitado provoca agressão a toda a sociedade, que, no final das contas é quem custeia a previdência social, que, por inúmeras razões, corre o risco de não poder mais oferecer proteção até mesmo aos seus segurados do próximo século. Como é do conhecimento dos que acompanham os meios de comunicação, as estatísticas oficiais, cujos dados, como também se sabe, não são reais, mostram que os números de acidentes de trabalho e de doenças profissionais e do trabalho são assustadores, destacando-se entre estás últimas, a surdez profissional, LER (lesões por esforços repetitivos), doenças de coluna, silicose e intoxicação por chumbo e manuseio com agrotóxico na lavoura. Em conseqüência disso, o Brasil continua a figurar nos anais mundiais como recordista em acidentes de trabalho, perdendo feio para países da América Latina, como, por exemplo, a vizinha Argentina. (MELO, 1997, p.250).
Em regra, o mercado informal de trabalho é marcado por extensas jornadas de trabalho, por exposição à violência, principalmente, quando o trabalho é efetuado nas ruas das cidades, ou até mesmo aos riscos de acidentes com animais e insetos, ao ser realizado nas zonas rurais. Às vezes, há também a exposição dos familiares dos trabalhadores aos riscos, chegando a existir verdadeiras fábricas domésticas que utilizam produtos tóxicos sem o manuseio adequado e sem aparelhos de proteção individual.
O mercado informal de trabalho remete os obreiros a preocupantes condições de trabalho onde os trabalhadores perdem a saúde e a vida. Além disso, em regra, as normas protetivas de saúde não são garantidas aos trabalhadores informais.
A melhoria das condições de trabalho é um dos objetivos centrais da OIT, que vem promovendo ações normativas voltadas à prevenção e também à capacitação, a fim de alcançar um processo produtivo com desenvolvimento ecológico racional e sustentável.
Importa salientar que essa situação presente de desrespeito ao ambiente de trabalho exige firme e contundente ação dos sindicatos, das entidades e associações de classe, bem como do Ministério Público do Trabalho, com o ajuizamento de ações coletivas em busca da concretização do direito a um meio ambiente de trabalho sadio, saudável, seguro, confortável e ecologicamente equilibrado. Cabendo, também, ao Poder Judiciário um papel fundamental na concretização do direito fundamental ao meio ambiente de trabalho, já que é a última porta que o cidadão e a sociedade têm a bater para fazer valer as disposições da Constituição Federal e das Leis.
8 – O TRABALHO INSALUBRE E PERIGOSO E SEUS ADICIONAIS
A Constituição da República prevê em seu art. 7º, XXIII o “adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei”.
Já a CLT, nos artigos 189 a 197, bem como as Normas Regulamentadoras 15 e 16, prevêem a regulamentação das atividades insalubres e perigosas. Vale dizer que as atividades penosas ainda não foram regulamentadas pelo legislador.
Parece contraditório que a Constituição da República assegure um meio ambiente do trabalho adequado e, ao mesmo tempo, estipule adicionais que compensem financeiramente o trabalhador exposto a riscos ocupacionais.
A previsão de tais adicionais reflete a cultura da monetarização do risco ocupacional. O legislador originário preocupou-se com a realidade brasileira onde a erradicação do trabalho danoso à saúde ou a redução dos riscos deste trabalho é um ideal distante de ser alcançado no Brasil.
Dessa forma, foram instituídos os adicionais como forma de desestimular a exploração de mão-de-obra em trabalhos insalubres, perigosos ou danosos, de forma a incentivar ao empresário que utilize maneiras para eliminar os riscos, a fim de não arcar com os adicionais legais.
A CLT, no art. 189, define atividades ou operações insalubres como:
aquelas que por sua natureza, condição ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos.
O trabalho insalubre aos poucos provoca doenças ou agrava as já existentes no trabalhador. Sabendo disso, o Ministério do Trabalho e Emprego fixou parâmetros para a caracterização das atividades e operações insalubres, através da NR-15, classificando os agentes insalubres em três graus, bem como estabelecendo os limites de tolerância destes agentes.
Também na CLT, no art. 193, há definição para as atividades ou operações perigosas como àquelas que “impliquem o contato permanente com inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado”. Os agentes periculosos são aqueles que quando agem podem provocar imediatamente e instantaneamente a incapacidade para o trabalho ou a morte.
A CLT possui um capítulo dedicado à segurança e medicina do trabalho que visa à melhoria das condições de trabalho, bem como a organizar inspeções e medidas administrativas, tratando das CIPA’s, dos EPI’s, dentre outros, o que demonstra a preocupação com a prevenção de acidentes e doenças ocupacionais.
No entanto, a insistência pela manutenção dos adicionais acomoda as situações e mantêm viva a cultura da compensação financeira pelo risco e pelo sofrimento no trabalho. O absurdo da monetização é bem explicado por Evanna Soares que diz:
Chega-se ao absurdo de trocar a utilização de um equipamento de proteção individual por um acréscimo de 40%, 20% ou 10% sobre o salário mínimo, decorrente do adicional de insalubridade […] Quando os trabalhadores vão a juízo reclamar contra as empresas descumpridoras das normas de saúde e segurança no trabalho, não costuma pedir a condenação do empregador à obrigação de fazer (fornecimento desse equipamento, ou uma providência que elimine o perigo de acidente grave nos serviços de eletricidade, por exemplo), mas, sim, o pagamento do adicional de insalubridade […] Falta uma consciência acerca dos valores envolvidos – vida, saúde, integridade física e segurança do trabalhador – que não podem ser compensados por um adicional sobre o salário, ainda que fosse em montante expressivo, o que não é na realidade. (SOARES, 2004, p. 120)
Para o empregador chega a ser bem menos oneroso pagar o referido adicional do que investir para tornar o meio ambiente do trabalho saudável.
A partir da análise do Direito do Trabalho Comparado, conclui-se que os legisladores adotaram três estratégias básicas diante de agentes agressivos: aumentar a remuneração para compensar o maior desgaste do trabalhador (monetização do risco), opção mais cômoda e menos inteligente; proibir o trabalho insalubre, hipótese ideal, mas nem sempre possível; ou reduzir a duração da jornada, alternativa que representa o ponto de equilíbrio cada vez mais adotado.
Para o azar dos trabalhadores brasileiros, o Brasil optou pela primeira alternativa desde 1940 e não acompanhou a evolução da questão ora tratada mundo afora.
As indenizações em dinheiro, decorrentes de DORT’s, acidentes de trabalho, devem ser a última solução para o problema do meio ambiente laboral, e não pode ser confundida como sendo a venda da saúde do trabalhador, ou a contraprestação aceita pelo trabalhador para laborar num ambiente impregnado de agentes patogênicos. A compensação correta a ser fornecida ao trabalhador de locais insalubres seria a verdadeira eliminação ou redução do período exposto ao risco.
Infelizmente, no Brasil, os adicionais se tornaram meio de compensação à perda da saúde do trabalhador e, ainda, renda adicional indispensável à manutenção e sobrevivência de famílias, sendo certo que, existem obreiros que preferem laborar em condições danosas, com o objetivo de receber o respectivo adicional e, consequentemente, aumentar a renda familiar, a ter reduzido a ação dos agentes danosos a sua saúde.
Assim, se de um lado compensam-se as conseqüências dos agentes patogênicos, de outro tomam-lhe o direito à saúde plena, e muitas vezes a vida. Antes de se pagar os adicionais de insalubridade ou periculosidade, deve-se ter em mente o direito do homem a um habitat saudável e livre de agentes insalubres.
9 – O MEIO AMBIENTE DE TRABALHO ADEQUADO E O DEVER JURÍDICO DE PROTEÇÃO
A proteção ao meio ambiente de trabalho reflete-se na proteção do homem trabalhador para que este não adoeça, não sofra acidentes, não perca membros ou sentidos, e tampouco perca a vida.
Ao se proteger o meio ambiente de trabalho saudável, está se protegendo não só o bem estar do trabalhador, como também o próprio sistema previdenciário social, que não terá gastos com aposentadoria por invalidez, auxílio acidente, reabilitação profissional ou até mesmo pensão a ser paga aos dependentes do trabalhador em caso de morte.
O conceito de acidente do trabalho segundo a OIT, através do protocolo 155 de 2002, diz no art. 1 que “o termo acidente de trabalho designa os acidentes ocorridos no curso do trabalho ou em relação com o trabalho, que causem lesões mortais ou não”.
Em regra, quase todo acidente de trabalho ocorre devido às más condições de trabalho, aos riscos da atividade desenvolvida, pelo fato de o trabalhador estar em contato permanente com agentes danosos, ou ainda pelas extensas jornadas de trabalho à que estão acometidos.
A OIT indica quatro meios para prevenção e manutenção de um meio ambiente saudável. O primeiro é a eliminação do risco, segundo a eliminação da exposição da pessoa ao risco, terceiro é o isolamento do risco e, por fim, o quarto através do fornecimento de equipamentos que protejam a pessoa exposta ao risco.
Já o art. 166 da CLT, nos informa que a empresa é obrigada a fornecer EPI a todo empregado que tiver contato a riscos de acidentes e danos à saúde, observado as medidas anteriormente adotadas para proteção do indivíduo. Seguindo, portanto, a orientação inversa daquela indicada pela OIT.
O fornecimento de Equipamento de Proteção Individual, além de mais cômodo, geralmente é mais barato, isso quando ele é devidamente fornecido. Certo é que a empresa repassa o custo com os EPI’s aos seus produtos finais, e quem sofrerá as conseqüências dos riscos a que são expostos é o trabalhador.
Outro meio de prevenção não indicado pela OIT, mas que merece destaque, é o fracionamento das operações em diversos estabelecimentos ou setores. Isso ocorre visando que o malefício só atinja o mínimo de trabalhadores possíveis.
Vale dizer que um membro ou sentido ceifado não pode ser substituído por outro, podendo até uma doença adquirida em decorrência de um ambiente patogênico ser tratada, mas a saúde não será totalmente restaurada ao trabalhador.
Desta forma, prevenir doenças ocupacionais tratando o meio ambiente de trabalho é tarefa árdua a ser realizada por todos, trabalhadores, empregadores e o pelo próprio poder público.
A recomendação 164 da OIT prevê como obrigação do empregador:
10. Entre las obligaciones que incumben a los empleadores para lograr el objetivo señalado en el artículo 16 del Convenio podrían figurar, habida cuenta de las características de las diversas ramas de actividad económica y de los diferentes tipos de trabajo, las siguientes:
a) proporcionar lugares de trabajo, maquinaria y equipos y utilizar métodos de trabajo que, en la medida en que sea razonable y factible, sean seguros y no entrañen riesgos para la seguridad y la salud de los trabajadores;
b) dar las instrucciones y la formación necesarias, habida cuenta de las funciones y las capacidades de las diferentes categorías de trabajadores;
c) asegurar una supervisión adecuada del trabajo efectuado, de las prácticas de trabajo utilizadas y de las medidas de seguridad e higiene del trabajo aplicadas;
d) adoptar medidas de organización en lo que atañe a la seguridad y salud de los trabajadores y el medio ambiente de trabajo, adaptadas al tamaño de la empresa y a la índole de sus actividades;
e) proporcionar, sin ningún costo para el trabajador, las ropas de protección individual y los equipos de protección adecuados que parezca necesario exigir cuando no se puedan prevenir o limitar los riesgos de otra forma;
f) asegurarse de que la organización del trabajo, particularmente en lo que atañe a la duración del trabajo y a los períodos de descanso, no cause perjuicio a la seguridad y la salud de los trabajadores;
g) tomar todas las medidas razonables y factibles con miras a eliminar toda fatiga física o mental excesiva;
h) efectuar estudios e investigaciones o mantenerse al corriente en otra forma de la evolución de los conocimientos científicos y técnicos necesarios para cumplir con las disposiciones de los apartados precedentes.[2]
Estabelece também o art. 157 da CLT:
Art. 157 – Cabe às empresas:
I. cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho;
II. instruir os empregados, através de ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais;
III. adotar as medidas que lhes sejam determinadas pelo órgão regional competente;
IV. facilitar o exercício da fiscalização pela autoridade competente.
Assim, cabe ao Poder Público, além do dever de normatizar o meio ambiente do trabalho, o dever de preservar e proteger o ambiente do trabalho no âmbito de seus servidores e dos trabalhadores em geral, qualquer que seja a atividade a ser exercida e em qualquer lugar onde sejam desempenhadas.
10 – A TUTELA JURISDICIONAL DO MEIO AMBIENTE DE TRABALHO
Como já exposto, a preocupação com o meio ambiente ganhou relevante contexto após a promulgação da Constituição da República de 1988.
O art. 196 da CR/88 dispõe que “a saúde é direito de todos e dever do Estado” cabendo ao empresário o dever de manter o ambiente do trabalho saudável salvaguardando assim o direito do trabalhador à saúde.
Ademais, a carta Magna atribuiu a competência ao Ministério Público, nos termos do seu art. 129, III, a promoção de “inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”.
O meio ambiente, também, foi inserido no art. 7º, caput, e inc. XXII, que dispõem, respectivamente, sobre os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais e a redução de riscos inerentes ao trabalho, através de normas de saúde, segurança e higiene, inclusive, art. 200, onde compete ao SUS, “colaborar na proteção do meio ambiente, nele inserido o do trabalho”.
Contudo, a Constituição da República Federativa do Brasil, após a publicação da EC/45, concedeu à Justiça do Trabalho a competência da tutela jurisdicional relativa as demandas acerca do meio ambiente laboral . Vejamos:
Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:
I as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
Sabe-se que a competência da Justiça do Trabalho foi significativa ampliada com a promulgação da Emenda Constitucional 45/2004, passando a contemplar todas as controvérsias oriundas e/ou decorrentes da relação de trabalho. Antes, tal competência era limitada às ações entre “trabalhadores e empregadores“, ou seja, decorrentes da “relação de emprego” disciplinada pela CLT, e, “na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho“.
O novo texto do art. 114 fez uso, apenas, da expressão relação de trabalho, cujo significado, bem mais amplo do que o de relação de emprego, o que já era pacífico tanto na doutrina quanto na jurisprudência trabalhista.
Com isso, a Justiça do Trabalho passou a ser competente para processar e julgar as ações sobre os autônomos, os trabalhadores eventuais, os estatutários, os cooperados, entre outros.
Neste contexto, a competência da Justiça do Trabalho não é mais limitada apenas àquelas ações relativas às relações de emprego, sendo que basta, então, que a causa de pedir e o(s) pedido(s) sejam oriundos ou decorrentes de uma relação de trabalho. Daí conclui-se que sendo o ambiente de trabalho o local onde as relações de trabalho se desenvolvem, é evidente que as ações sobre esse tema são da competência material da Justiça do Trabalho.
Vale salientar que antes mesmo da promulgação da Emenda Constitucional 45/2004, o Supremo Tribunal Federal já tinha entendimento pacificado, que o ambiente de trabalhão já seria competência da Justiça do Trabalho. Tal entendimento já constava na Súmula 736, aprovada na Sessão Plenária de 26.11.2003:
Compete à justiça do trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores.
No mesmo sentido eram as reflexões de Raimundo Simão de Melo:
Ora, se o meio ambiente de trabalho seguro constitui direito fundamental/social dos trabalhadores, constitucionalmente assegurado, e, ao Ministério Público do Trabalho incumbe, perante a defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais garantidos (art. 83 e inciso III da Lei Complementar n. 75/93), dúvida não pode existir sobre a competência trabalhista no tocante à prevenção e reparação dos danos ao meio ambiente do trabalho (MELO, 1997, p.153).
No Brasil, a ação competente para esse tipo de demanda é a Ação Civil Pública que pode ser proposta por diversos entes, que visam uma condenação a uma obrigação de fazer ou não-fazer.
O desrespeito ao ambiente de trabalho ficou claro no processo julgado pela juíza substituta Flávia Cristina Souza dos Santos Pedrosa, na 19a Vara do Trabalho de Belo Horizonte. No caso, o reclamante, um vigilante de carro-forte, propôs reclamação trabalhista, alegando ter sido assediado moralmente durante todo o contrato mantido com a empresa. A reclamada passou a exigir um número maior de rotas em tempo cada vez menor, não permitindo o gozo dos intervalos intra e interjornadas, nem mesmo a ida a banheiros. As jornadas eram extenuantes, não era realizada a manutenção regular dos equipamentos e, entre outras violações, havia pressão para que os empregados usufruíssem somente 20 dias de férias.
A magistrada destacou que, no ano de 2009, o Ministério Público do Trabalho propôs Ação Civil Pública contra a empresa, em razão das várias denúncias de assédio moral. A empresa foi condenada a pagar de indenização por danos morais, no valor de R$700.000,00 (setecentos mil reais) e a sentença foi mantida quase integralmente em grau de Recurso Ordinário.
As testemunhas ouvidas no processo reforçaram o cenário demonstrado na Ação Civil Pública, declarando que para cumprir a rota do dia, os motoristas precisavam fazer loucuras no trânsito. Confirmaram ainda, que não havia banheiro no carro-forte sendo necessário satisfazer as necessidades fisiológicas ali dentro. Para a juíza, não restou dúvidas de que o regime de trabalho imposto aos empregados era intenso e acelerado, com extensas jornadas.
A juíza sentenciante, não aceitou o argumento utilizado pela reclamada de que o trabalho extraordinário e à venda de férias seriam benéficos ao trabalhador, pois a limitação da jornada e o descanso anual visam à recomposição da energia pelo empregado. A troca de direitos relacionados à segurança e saúde do trabalhador por dinheiro somente deveria ser admitida excepcionalmente, não poderia se tornar prática rotineira.
Concluindo que a reclamada não cumpriu com o seu dever, violando e ignorando vários direitos de seus empregados, além de desrespeitar normas básicas de proteção à saúde e integridade física e moral, a magistrada condenou a empresa a pagar ao trabalhador indenização por danos morais, no valor de R$25.000,00. Houve recurso da decisão, que ainda aguarda julgamento no TRT mineiro.[3]
Outro aspecto relevante e a prescrição. Embora o art. 7º, XXIX, da CR/88 tenha definido a prescrição bienal e quinquenal quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, Evanna Soares entende que é inaplicável tal prescrição nos casos de tutela jurisdicional pertinentes ao ambiente do trabalho:
visto que os direitos pertinentes ao ambiente do trabalho extravasam o conceito de ‘créditos trabalhistas’, nada obstante se deva ressaltar que a adequação desse ambiente pode resultar em verbas a serem pagas ao trabalhador, como nos casos em que a sentença reconheça a existência de jornada de trabalho acima do limite legal, ou a exploração do trabalho em condições insalubres ou perigosas, e determine a sua adequação, sem prejuízo do pagamento dos adicionais de horas extras, e de insalubridade ou periculosidade aos obreiros prejudicados[…] o ambiente laboral não constitui um simples direito trabalhista, emergente do contrato de emprego, que se esgote no pagamento de uma prestação
Na verdade estamos diante de um tipo de ação que deveria ser imprescritível, uma vez que o ambiente laboral somente se tornaria saudável quando fosse modificado por algum fator externo.
A justificativa para a imprescritibilidade das verbas decorrentes do ambiente incorreto de trabalho seria que a ação que visa à condenação do empregador ou do poder público para tornar um ambiente de trabalho saudável seria uma condenação de uma obrigação de fazer ou não-fazer e enquanto o ambiente laboral fosse desfavorável à prática de qualquer atividade, a contagem do prazo prescricional não se iniciaria, tudo isso, tendo em vista que os malefícios à saúde do trabalhador.
Desta forma, conclui-se que a prescrição existe, mas em termos práticos não tem valor, uma vez que somente quando o meio ambiente laboral se tornar saudável ou deixar de apresentar riscos à saúde e à vida do trabalhador a ação perderia o seu objeto.
11 – CONSIDERAÇÕES FINAIS:
A história do enriquecimento humano demonstra que o trabalhador foi explorado pela busca incansável do capital, o que levou ao trabalhador a “comercializar” sua saúde em troca de adicionais que não compensam as perdas ocasionadas.
A saúde e a vida que são tratados pela Constituição de 1988, como bens indisponíveis, de garantia geral a todos os seres humanos, confirmada pela Declaração Universal dos Direitos Humanos que garante a igualdade, liberdade e a vida como direitos gerais a todos os indivíduos.
O meio ambiente do trabalho, é o local onde se desenrola boa parte da vida do trabalhador, e a sua qualidade depende de inúmeros fatores químicos, biológicos, físicos, climáticos e comportamentais que interagem de forma a prejudicar ou beneficiar a vida do trabalhador.
Como desdobramento do direito humano à vida, o meio ambiente do trabalho também é considerado como um direito humano e como tal deve ser preservado. Desta forma, o meio ambiente laboral merece especial atenção do legislador, que tem o dever jurídico de protegê-lo e do empregador. Além disso, o meio ambiente laboral sadio e ecologicamente equilibrado é direito fundamental dos trabalhadores de terceira geração.
Uma tentativa do legislador brasileiro foi à criação de adicionais de insalubridade e periculosidade como forma de compensação, mas que desestimulam o empregador a manter os trabalhadores em ambientes saudáveis.
Os valores destes adicionais são tão baixos, que para o empregador é mais vantajoso arcar com o pagamento do que adequar o ambiente laboral, uma vez que essa adequação necessitaria gastos vultosos. Torna-se mais cômodo ao empregador fornecer simples EPI’s, ou às vezes nem mesmo fornecê-lo, analisando a monetarização do risco.
O meio de garantia a um efetivo meio ambiente de trabalho é a tutela jurisdicional através da ação civil pública julgada pela Justiça do Trabalho, visando à adequação do ambiente laboral livre de riscos ao trabalhador.
Infelizmente este poderoso instrumento dado à coletividade não tem sido utilizado com freqüência, o que acaba por retratar uma faceta nada agradável de nossa sociedade, que é a de assistir passivamente a determinadas condutas lesivas ao seu interesse.
No entanto, nos poucos casos em que a tutela jurisdicional é requerida e tem sido de grande valia para a defesa de um meio ambiente de trabalho saudável e de proteção à saúde do trabalhador.
Assim, aguardamos ansiosamente o dia em que a coletividade se utilizará com maior freqüência das tutelas jurisdicionais de forma a fazer o cumprimento da legislação. Além disso, esperamos que os sindicatos, as entidades e associações de classe, o Ministério Público do Trabalho, bem como o Poder Judiciário possam atuar de forma a concretizar o direito fundamental ao meio ambiente de trabalho.
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RESUMO: Este artigo tem a finalidade de discutir o instituto da alienação parental. Sabe-se que é uma novidade em nosso ordenamento jurídico, mas reflete a uma realidade a muito vivida por filhos vítimas de desentendimentos de seus pais. O que se pretende aqui é analisar a nova lei que regulamentou o comportamento desviado dos genitores em relação aos seus filhos, no caso de dissolução da sociedade conjugal.
PALAVRAS-CHAVE: Alienação Parental, Síndrome da alienação, Lei 12.138/10.
SUMÁRIO:
1 – Considerações Iniciais
2 – A definição de Alienação Parental
3 – A Evolução do instituto da família e a alienação parental
4 – Observações acerca da Lei 12.138/10
5 – Considerações Finais
Referências Bibliográficas
1 – Considerações Iniciais
Em 27 de agosto de 2010, fora publicada a Lei de Alienação Parental, com o objetivo principal de conferir maiores poderes aos juízes, a fim de proteger os direitos individuais da criança e do adolescente, vítimas de abuso exercido pelos seus genitores.
É certo que o direito positivou a conduta de desrespeito aos filhos, após atrocidades presenciadas no judiciário e da ausência de lei regulamentadora que permitisse uma maior atuação do Estado-juiz para solucioná-la.
A sociedade moderna tinha a idéia de que em caso de dissolução da sociedade conjugal, a guarda dos filhos era preferencialmente da mãe. Isso porque havia a noção de que a mãe teria um instinto materno, que garantiria à criança um desenvolvimento saudável, daí criou-se o mito de que a mulher seria a mais apta a ficar com a guarda dos filhos. Assim, consoante Pereira, “as concepções jurídicas e culturais se misturavam”. (PEREIRA, 2004, p.134)
Todavia, com as alterações de paradigmas da sociedade contemporânea e dada a concepção igualitarista dos direitos e deveres de homens e mulheres e o respeito às diferenças garantidos pela CF/88 e pelos Tratados e Convenções Internacionais, se incorporou ao ordenamento jurídico brasileiro o novo conceito de família, que introduziu no cotidiano dos casais o partilhamento de direitos e obrigações.
Neste contexto, desmistificado o entendimento de que as mulheres seriam as mais aptas a cuidarem dos rebentos, muitos homens optaram por não abdicarem da guarda e da convivência com seus filhos. Em razão disso, tem-se, não raras vezes, um litígio acerca da concessão da guarda dos menores.
Esse é o germe da Alienação Parental, a criança em meio ao conflito dos pais.
2 – A definição de Alienação Parental
A Síndrome de Alienação Parental (SAP) é termo proposto por Richard Gardner, em 1985, para a situação em que a mãe ou o pai de uma criança a treina para romper os laços afetivos com o outro cônjuge, criando fortes sentimentos de ansiedade e temor em relação ao outro genitor.
Em princípio, Richard Gardner definiu em 1985 a Síndrome de Alienação Parental (SAP) nos Estados Unidos como sendo:
um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor (o que faz a “lavagem cerebral, programação, doutrinação”) e contribuições da própria criança para caluniar o genitor-alvo. Quando o abuso e/ou a negligência parentais verdadeiros estão presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assim a explicação de Síndrome de Alienação Parental para a hostilidade da criança não é aplicável. (GARDNER, 1985, p.2)
Dessa forma, a SAP consistiria num processo de “programar a criança para que odeie um dos genitores, sem justificativa, de modo que a própria criança ingressa na trajetória de desmoralização desse mesmo genitor” (TRINDADE, 2008, p.102).
As estratégias utilizadas pelo alienador são muitas e variadas, mas a SAP possui um denominador comum que se organiza em torno de avaliações prejudiciais, negativas, desqualificadas e injuriosas em relação ao outro genitor.
Torna-se comum às crianças envolvidas na SAP temerem somente o genitor alvo
(alienado), ficando receosas de deixar o genitor programador (alienante) para ir a outros locais, como a casa de amigos ou de parentes. Para Gardner, “o medo da criança com SAP é centrado sobre o genitor alienado; já a criança com distúrbio de ansiedade de separação tem medos focados na escola, mas que se espalham a muitas outras situações e destinos” (GARDNER, 2009).
São quanto aos critérios informadores do processo alienatório admitidos por Richard A. Gardner e citado por François Podevyn:
1. A obstrução do contato: o alienador busca a todo custo obstaculizar o contato do não-guardião com o filho e para tanto se utiliza os mais variados meios tais como interceptações de ligações e de cartas, críticas demasiadas, também tomam decisões importantes da vida do filho sem consultar o outro genitor;
2. As denúncias falsas de abuso: é a mais grave das acusações que o guardião pode fazer seria incutir na criança a idéia de que o outro genitor estaria abusando sexualmente ou emocionalmente fazendo com que a criança tenha medo de encontrar com o não-guardião;
3. A deterioração da relação após o divórcio: o rompimento da relação conjugal faz com que o alienador projete nos filhos toda a frustração advinda da separação, persuadindo a criança a se afastar do não guardião, com a alegação de que ele abandonou a família;
4. A reação de medo: a criança passa a ser protagonista do conflito dos pais e por medo do guardião voltar-se contrai si a criança se apega a esse e afasta do outro.
A Lei da Alienação Parental, após longo trâmite, já que o projeto de lei 4053 era datado de 2008, foi sancionada no dia 26 de agosto de 2010, sob o número 12.318 e prevê medidas que vai desde o acompanhamento psicológico, até a aplicação de multa, ou mesmo a perda da guarda da criança a pais que estiverem alienando os filhos. Esta lei altera o artigo 236 da lei 8.069/90 e estabelece a seguinte definição para a alienação parental:
Art. 2o Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
Importa destacar que a lei nos informa, exemplificativamente, algumas condutas que foram criminalizadas no parágrafo único do art. 2:
Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:
I – realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;
II – dificultar o exercício da autoridade parental;
III – dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV – dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
V – omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
VI – apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
VII – mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.
Destarte, pode-se concluir que a síndrome da Alienação Parental pode ser definida como a formação psicológica negativa da criança ou do adolescente, praticada de forma agressiva pelos seus genitores, membros da família, ou por qualquer pessoa que obtenha sua guarda, ou vigilância, que cria obstáculos significativos à manutenção dos vínculos afetivos em relação aos seus genitores.
3 – A Evolução do instituto da família e a alienação parental
A idéia de família veio se modificando ao longo do tempo. Não há como negar que a nova tendência da família moderna é a sua composição baseada na afetividade, que surge pela convivência entre pessoas e pela reciprocidade de sentimentos.
Segundo José Sebastião de Oliveira: “a afetividade, traduzida no respeito de cada um por si e por todos os membros — a fim de que a família seja respeitada em sua dignidade e honorabilidade perante o corpo social — é, sem dúvida nenhuma, uma das maiores características da família atual” OLIVEIRA (2002, p. 233).
Dissolvida a sociedade conjugal, o afeto dos pais em relação aos filhos deveria reger o rompimento. Contudo, não é o que acontece na prática, as mágoas tomam conta do ex-casal e os filhos são sempre os mais prejudicados.
Vale dizer que após o rompimento conjugal, a parentalidade entre os entes permanece, já que os pais devem compartilhar a tarefa de continuar educando seus filhos, haja vista que os deveres decorrentes do pátrio poder são irrenunciáveis e envolvem sujeitos ainda em formação, que gozam, inclusive, de tutela legal especial.
Outro aspecto relevante no conflito da SAP são as diferenças culturais, as de valores, assim como as divergências quanto à percepção do que seja a melhor educação e o melhor trato com os filhos, o que de forma fundamental, acirram os conflitos do ex-casal e desencadeiam sérios problemas à saúde mental do menor.
Observa-se na SAP a arbitrariedade no exercício da autoridade parental pelo guardião, que, aproveitando a proximidade com o menor, procura, a todo custo, afastar o outro genitor das decisões concernentes à vida do filho, exercendo, assim, uma paternidade ou maternidade irresponsável, podendo, inclusive resultar na destruição do vínculo afetivo do menor com o genitor vítima da alienação.
A SAP pode ser graduada em estágios, a saber, leve, moderado e grave.
No estágio leve, a criança se sente constrangida somente no momento em que os pais se encontram, afastado do guardião, a criança mantém um relacionamento normal com o outro genitor.
Já no estágio moderado, a criança apresenta-se indecisa e conflituosa nas suas atitudes, sendo que em certos momentos já mostra sensivelmente o desapego ao não-guardião.
No estágio grave, a criança apresenta-se doente, perturbada ao ponto de compartilhar todos os sentimentos do guardião, não só escutando as agressividades dirigidas ao não guardião como passa a contribuir com a desmoralização do mesmo, as visitas nesse estágio são impossíveis.
O afastamento é fruto de uma programação lenta e diária do guardião para que o filho, injustificadamente, rejeite o seu outro genitor.
Neste contexto, ocorre por parte do pai e da mãe imbuído pelo sentimento de vingança e que tenta desacreditar, desfazer a boa imagem do ex-parceiro conjugal em relação ao filho, um abuso no exercício de seu direito de educar e criar seus rebentos, lesionando o direito ao exercício da autoridade parental do ex e privando o menor da convivência com o ele, impedindo-os de estreitarem o laço afetivo que os une, ou mesmo, em fase mais agravada, destruindo-o. É o que acontece na SAP.
Dessa forma, o genitor alienador, por não perceber que, embora a conjugalidade tenha se rompido, a parentalidade e o exercício da autoridade parental por parte do outro genitor que, a bem dos filhos, deveria ser eterna, violando o direito do menor à convivência familiar saudável. Afinal, a convivência saudável com o pai e a mãe é direito do menor, pois só assim, irá conhecer a cultura, os valores de ambos os genitores.
O genitor alienador, muitas vezes, não leva em conta que a todo momento, está descumprindo com o dever constitucional e fundamental de assegurar o bem estar e desenvolvimento psicológico, espiritual, físico e mental do menor.
Ressalta-se que a alienação não acomete somente o genitor alienado, mas também os familiares de ambos os lados. Os parentes do alienador chegam a contribuir na tarefa de afastamento, uma vez que acolhem os sentimentos do guardião e acreditam que essa é a atitude mais certa e justa.
Em contrapartida, os familiares do genitor alienado também são afastados da criança, em especial, os avós que são, normalmente, os entes mais próximos dos pais, incorrendo também o alienador em desrespeito ao direito dos idosos à convivência familiar, consoante o que determina o art. 3º da Lei 10.741/2003, o Estatuto do Idoso.
Por fim, termina-se o relacionamento entre casais, mas não se pode esquecer o afeto em relação aos filhos e isso deveria imperar nas atitudes dos pais ao separarem bem esta situação de rompimento.
4 – Observações acerca da Lei 12.138/10:
A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável e a lei veio com o objetivo de punir ou inibir aquele genitor que descumpre os deveres inerentes à autoridade parental ou decorrente da tutela ou da guarda do menor.
Foram incluídos como legitimados passivos desta lei os avós, bem como qualquer pessoa que tenha o menor sob sua guarda e/ou vigilância, tais como tutores, guardiões, educadores, babás, etc, determinando que não só os genitores serão sujeitos às medidas protetivas.
Havendo indício da prática da alienação parental, o juiz poderá determinar perícia psicológica ou biopasicossial, mas o laudo não vinculará a decisão do magistrado.
As conseqüências da SAP na vida da criança são graves e provocam uma total anormalidade no desenvolvimento psíquico, tais como: ansiedade, depressão crônica, nervosismo, agressão, transtorno de identidade e incapacidade de adaptação à ambiente normal. Na fase adulta, a criança que foi vítima dessa violência emocional apresentará um sentimento incontrolável de culpa por constatar que foi cúmplice de uma grande injustiça com o não guardião.
A SAP não é uma situação irreversível, desde que tratada de forma eficaz e com a intervenção de profissionais especializados no assunto, por meio da adoção conjunta de medidas legais e terapêuticas.
Nos casos em que o estágio alienatório seja leve, o mais recomendável é a mediação, meio extrajudicial de resolução de conflitos em que as partes buscam o diálogo com instrumento eficaz para se chegar a um senso comum, no caso em tela, como se chegar ao melhor interesse da criança.
Entretanto, flagrada a presença da SAP e o menor apresentando-se num quadro clínico mais grave, é indispensável à intervenção judicial para que, além de tentar reestruturar a relação do filho com o não-guardião, imponha ao genitor guardião a responsabilização pelas atitudes de violência emocional contra o filho e contra o outro genitor.
O artigo 6 da Lei 12.318/10, institui as providências que o juiz poderá tomar após detectar a alienação parental:
Art. 6o Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso:
I – declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador;
II – ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;
III – estipular multa ao alienador;
IV – determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;
V – determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;
VI – determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente;
VII – declarar a suspensão da autoridade parental.
Parágrafo único. Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar
O pagamento de multa ao alienador nos dá impressão de compensação pelos danos causados ao filho. O problema é que a lei não se refere a valor, nem à hipótese de sua incidência, nem mesmo a quem esta será revertida.
Por fim, a lei nos indica que a atribuição ou alteração da guarda dar-se-á por preferência ao genitor que viabiliza a efetiva convivência da criança ou adolescente com o outro genitor nas hipóteses em que seja inviável a guarda compartilhada.
5 – Considerações Finais
Após esta breve exposição, chegamos a alguns questionamentos: Será que o simples exame dos autos e rápidas audiências serão suficientes para detectar que um menor está sendo programado para, injustificadamente, rejeitar seu genitor? Será que uma prestação jurisdicional célere, mas em que não se observam o melhor interesse do menor, protegendo sua formação e personalidade e os direitos do genitor alienado e os dos idosos privados da convivência com o menor é uma medida eficaz e justa?
Pensar o afeto é vivenciá-lo. Pensar o desenvolvimento afetivo dos seres em estágio formativo é ser para com eles afetuoso.
No entanto, não é suficiente nem saudável apenas pensar em fazer o bem, deve-se praticar o bem, preservando o ser objeto do afeto, seja na conotação positiva ou negativa.
Assim, conclui-se que para atender o melhor interesse da criança e do adolescente é imprescindível uma postura clara, comprometida e de maturidade dos genitores para lidar com as questões afetivas. É o que se espera!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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* Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas, Bacharel em Administração de Empresas e Direito pela Universidade FUMEC. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho. Especialista em Educação a Distância pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Mestranda em Direito Privado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Especialista em Direito Público – Ciências Criminais. Tutora em EAD de direito do consumidor. Advogada.
** César Leandro de Almeida Rabelo, Bacharel em Administração de Empresas e em Direito pela Universidade FUMEC. Especialista em Docência no Ensino Superior pela Pontifícia Universidade Católica do Estado de Minas Gerais. Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho pelo CEAJUFE – Centro de estudos da área jurídica federal. Mestrando em Direito Público pela Universidade FUMEC. Advogado do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade FUMEC.
[1] Importa esclarecer que a terminologia “direitos de primeira, segunda e terceira gerações” é duramente criticada por diversos autores já que estes direitos se completam, expandem-se, acumulam-se não se substituem ou se sucedem.
[2] http://www.itcilo.it/actrav/osh_es/m%F3dulos/com/app.htm acessado em 11 de maio de 2009 às 20:04
Processo: |
0001172-62.2010.5.03.0019 RO |
Número CSJT: |
01172-2010-019-03-00-9 RO
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Origem: |
19a. Vara do Trab.de Belo Horizonte |
Recorrente(s) |
Prosegur Brasil S.A. – Transportadora de Valores e Seguranca (1) |
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Cledson Eduardo Santos (2) |