Direito Constitucional

Constitucionalidade dos projetos de emenda à Constituição em tramitação que visam a instaurar o sistema parlamentar de governo no Brasil

Em tempos de contínuas crises políticas no Brasil, sempre se traz à baila a mudança do sistema governo vigente no Brasil. Em 1993, após a promulgação da Constituição de 1988, foi realizada uma consulta popular sob a forma de plebiscito, no qual o povo brasileiro escolheu o sistema e a forma de governo. Foram mantidos o sistema presidencialista e a forma republicana, derrotados o sistema parlamentarista e a forma monárquica. Inobstante a decisão soberana do povo expressada no plebiscito de 1993, congressistas brasileiros apresentaram, a posteriori, projetos de emenda à constituição que alteram o sistema de governo.

Neste ensaio, as PECs serão apresentadas em cinco tópicos, não coincidindo com o número de Propostas que estão tramitando no Congresso Nacional por questões didáticas, dada, sobretudo as similitudes existentes entre elas. Com relação à constitucionalidade de tais textos, a priori se discute sobre as teorias e conceitos constitucionais, tais como o poder constituinte, as emendas constitucionais, as cláusulas pétreas, a soberania popular etc. Em seguida, com base na teoria constitucional e no ordenamento jurídico pátrio aferido, oferece-se subsídios que possam denotar a possibilidade de tramitação e eventuais limites constitucionais impostos à PEC´S que alteram o sistema de governo vigente no Brasil, tendo como nuance a vontade popular expressada pelo plebiscito de 1993.

1. Inventário das PECs parlamentaristas em tramitação

Encontram-se atualmente em tramitação, 06 (seis) Propostas de Emenda à Constituição, neste ensaio apresentadas em 05 (cinco) tópicos. Visam a alterar o sistema de governo vigente no Brasil a PEC 20/1995 do Deputado Eduardo Jorge que contém disposições idênticas à PEC 309/2017 do Deputado Bonifácio de Andrada, a PEC 32/2015 do Senador Fernando Collor que é a uma reapresentação da PEC 31/2007 do mesmo senador, a PEC 102/2015 do Senador Antônio Carlos Valadares, a PEC 09/2016 do Senador Aloysio Nunes Ferreira e, por último, a PEC 245/2016 do Deputado Beto Rosado.

2. As propostas parlamentaristas de Eduardo Jorge e Bonifácio de Andrada

A Proposta de Emenda à Constituição do Deputado Eduardo Jorge é a mais avançada das proposições em estudo, contendo disposição transitória que cria a figura de um Ministro-Coordenador, esta servindo de base para a criação da PEC 309/2017 de Bonifácio de Andrada. Merece destaque que o Deputado Bonifácio foi autor do substitutivo na comissão especial do parlamentarismo que apreciou a PEC 20/1995 de Eduardo Jorge. A PEC 20/1995, mais despachada, possui duas versões: O projeto original apresentado pelo Deputado Eduardo Jorge e o substitutivo apresentado pelo relator da comissão especial do parlamentarismo, Bonifácio de Andrada. Em linhas gerais, o projeto original da PEC 20/1995 é bem mais prolixo que o substitutivo aprovado na comissão especial do parlamentarismo. Na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara – CCJC, o  texto em comento foi aprovado com uma única emenda, apresentada pelo próprio autor do projeto, que previa a realização de um referendo posterior à aprovação da PEC. O substitutivo da PEC 20/95, apresentado pelo relator da comissão especial, Dep. Bonifácio Andrada, é mais enxuto que o projeto original de Eduardo Jorge, no entanto, preenche lacunas existentes na redação original. Segundo o autor, o modelo proposto pela PEC foi inteiramente baseada na fórmula preparada pela Frente Parlamentarista Nacional Ulysses Guimarães, elaborada à época do plebiscito em janeiro de 1993 (BRASIL, 1995, 2001).

Os três pilares da proposta original são: nova redação do Capítulo II (do Poder Executivo) do Título IV (da Organização dos Poderes), adaptação de artigos esparsos da Constituição ao novo sistema e a previsão de plebiscitos em cada estado da federação para adoção do parlamentarismo (BRASIL, 1995, 2001).

O Presidente acumula funções de chefe de estado, enquanto o Primeiro-Ministro exerce a função de chefe de governo. Trata-se de uma característica inerente ao sistema parlamentarista: A divisão da função executiva. Exclui-se o cargo de Vice-Presidente da República (BRASIL, 1995, 2001).

O Presidente da República, chefe de Estado e representante da nação brasileira, teria como funções precípuas: Funcionar como árbitro do Governo e ser responsável com os demais Poderes da União pela indissolubilidade da Federação e pelo funcionamento das instituições democráticas, podendo dissolver a Câmara dos Deputados e convocar eleições extraordinárias.

As PECs estabelecem, dentre as principais atribuições do Presidente, a indicação, nomeação e exoneração do Conselho de ministros, sendo que o a ação se dará por solicitação do Primeiro-Ministro quando tratar-se dos Ministros de estado.

O Presidente, enquanto comandante supremo das forças armadas, permaneceria com os mesmos poderes: Declarar guerra, decretar a mobilização nacional, celebrar a paz (contando com o aval do Congresso Nacional nesses casos), nomear e promover oficiais-generais das Forças Armadas por indicação do Governo e designá-los para os cargos que lhes são privativos, decretar estado de defesa, estado de sítio, intervenção federal e conferir condecorações e distinções honoríficas.

O projeto substitutivo delineia, dentro das funções do Presidente, a nomeação dos Ministros do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores, os Chefes de missão diplomática de caráter permanente, os Governadores de Territórios, o Procurador-Geral da República, o Advogado-Geral da União, o Presidente e os Diretores do Banco Central, além dos Ministros do Tribunal de Contas da União. A diferença com relação ao texto original é a nomeação do Advogado-Geral da União que naquele era função privativa do Primeiro-Ministro, neste do Presidente. No âmbito do processo legislativo, o Presidente mantém a função de sancionar, promulgar e fazer publicar as leis.

O Primeiro-Ministro tem legitimidade para propor Proposta de Emenda à Constituição, competência para a iniciativa de lei Complementar e lei Ordinária, edição de Medida Provisória e estabelecimento do plano plurianual, das diretrizes orçamentarias e os orçamentos anuais. Expurga-se do ordenamento o poder de veto e adiciona-se a solicitação ao Poder Legislativo de nova deliberação acerca do Projeto de lei ou de algumas de suas disposições, explica-se: O Presidente da República poderia solicitar à Câmara dos Deputados, mediante mensagem justificada, uma nova deliberação acerca de determinado projeto de lei. A nova deliberação da Câmara dos Deputados seria efetuada pelo voto da maioria absoluta (BRASIL, 1995, 2001).

A eleição para Presidente da República ocorreria nos moldes atuais: Eleição por sufrágio universal, direto e secreto, noventa dias antes do término do mandato presidencial, eleito o candidato mais votado (BRASIL, 1995, 2001).

Com relação ao mandato do Presidente, o projeto original estatuiu em seis anos com a possibilidade de reeleição. O  substitutivo diminui a duração mandato em relação ao projeto original: O mandato do Presidente da República seria de cinco anos (BRASIL, 1995, 2001).

Com relação à filiação ou vinculação a partido político, a redação das PECs prevê que o Presidente da República, desde a sua posse, não pode exercer atividade político-partidária, ainda que honorífica, salvo no período pré-eleitoral quando concorrer à reeleição (BRASIL, 1995, 2001).

Seguindo o modelo colegiado, o Governo será exercido pelo Primeiro Ministro e pelos demais integrantes do Conselho de Ministros, repousando sua confiança no parlamento. No texto substitutivo, torna-se explícito que a confiança no governo deve repousar nas duas Casas do Congresso Nacional.

De acordo com a redação das PECs, os membros do Conselho de Ministros são responsáveis coletivamente pelos atos do conselho e individualmente pelos atos dos respectivos Ministros. Compete ao Conselho de Ministros a direção superior da administração, a elaboração de planos nacionais e regionais de desenvolvimento e deliberação acerca das questões suscitadas pelo Presidente da República, Primeiro-Ministro ou pelos Ministros de Estado. Quanto às configurações do Conselho de Ministros, a proposta original e o seu substitutivo apresentam diferenças substanciais. A principal delas é o exercício da Presidência do Conselho de Ministros que no projeto original cabe ao chanceler (seguindo o sistema referencial alemão e inglês), enquanto que, no substitutivo, cabe ao Presidente da República, na esteira do sistema referencial francês. Nas duas versões, o Conselho de Ministros delibera pela maioria dos votos, cabendo ao seu Presidente (Primeiro-Ministro ou Presidente da República) o voto de qualidade (BRASIL, 1995, 2001).

O Primeiro-Ministro é o chefe de governo indicado pelo Presidente da República após ouvido o partido (governo de maioria) ou a coligação majoritária (governo de coalizão) da Câmara dos Deputados, cabendo-lhe, dentre outras funções a manutenção da unidade política e administrativa do Governo; a indicação dos Ministros de Estado e elaboração do plano plurianual de investimentos, a lei de diretrizes orçamentárias e as propostas dos orçamentos (BRASIL, 1995, 2001).

Seguindo o modelo proposto na maioria dos projetos supramencionados, a indicação do Primeiro-Ministro cabe ao Presidente da República com posterior aprovação da câmara baixa. Neste projeto, o processo de aprovação do nome indicado apresenta similaridades com o sistema alemão, com diferença apenas na necessidade do debate prévio, que é dispensado na Alemanha. O programa de governo é debatido na Câmara dos Deputados, devendo ser aprovado pela maioria absoluta. Em caso de rejeição, o Presidente da República faz nova indicação. Rejeitada a segunda indicação, a Câmara dos Deputados pode escolher unilateralmente, por maioria absoluta, o Primeiro-Ministro, aprovando seu programa de governo. Caso candidato algum consiga essa maioria, o Presidente da República pode nomear o mais votado por maioria simples ou, após ouvido o Conselho da República, dissolver a Câmara dos Deputados e, em seguida, convocar eleições extraordinárias (BRASIL, 1995, 2001).

Com relação aos Ministros de Estado, o texto da PEC não apresenta grandes alterações em relação à atual redação da Constituição, apenas, obviamente, no que diz respeito à autoridade a quem deve responder que, no caso, passa a ser o Primeiro-Ministro (BRASIL, 1988, 1995, 2001).

O substitutivo apresenta inovação em relação ao projeto original: 

O Líder da minoria e o colégio de seus vice-líderes autorizados a responder pelos assuntos correspondentes aos Ministérios existentes gozarão, no que couber, na forma regimental, de tratamento compatível com o concedido em lei ao Primeiro-Ministro e aos demais integrantes do Conselho de Ministros (BRASIL, 2001)

Trata-se de disposição alienígena copiada da Inglaterra, onde, do mesmo modo que o governo organiza o gabinete, a oposição, de modo paralelo, organiza o seu shadow cabinet, reproduzindo-se um gabinete informal dentro do parlamento para acompanhar os assuntos tratados nos respectivos ministérios (BERLINSKI, DEWAN, DOWDING e SUBRAHMANYAM apud PALOTTI, 2017, p. 40).

4 No que concerne à relação do governo com o Parlamento, pode-se pronunciar censura ou confiança, ensejando a exoneração do governo no caso de aprovação da censura ou quando rejeita a confiança. No projeto original, as proposições seriam apreciadas apenas pela Câmara dos Deputados, o substitutivo, de modo diverso, estabelece que o Congresso Nacional deveria se manifestar, ou seja, caberia também ao Senado Federal a apreciação da moção de censura e o voto de confiança (BRASIL, 1995, 2001).

O Primeiro-Ministro solicita voto de confiança à Câmara dos Deputados na versão original, enquanto no substitutivo, tal proposição seria analisada em sessão conjunta do Congresso Nacional. Negada a confiança por maioria absoluta, o Governo apresenta a sua exoneração.

Com relação à moção de censura, há importantes diferenças entre o original e o substitutivo. No projeto original, na esteira do que preconiza o sistema referencial alemão, a moção de censura imprescinde de prévia manifestação do Primeiro-Ministro, devendo constar a indicação de nome para Primeiro-Ministro e seu respectivo plano de governo. Existe um limite temporal de seis meses a partir da posse do Primeiro-Ministro para a aprovação da moção de censura. No substitutivo, decorridos seis meses da posse do Primeiro-Ministro, o Congresso Nacional poderia aprovar moção de censura ao governo em sessão conjunta. Se não houver quorum de deliberação em uma das Casas, prevaleceria a decisão da outra. Em ambos os projetos, rejeitada censura, seus signatários não poderiam subscrever outra, antes de decorrido novo prazo de seis meses. O substitutivo estabelece um limite quantitativo de três moções na mesma sessão legislativa (BRASIL, 1995, 2001).

Há grandes diferenças entre as hipóteses de dissolução da Câmara do Deputados do projeto original e seu substitutivo. Havia, no texto original, apenas duas possibilidades de dissolução: A primeira, quando a Câmara não conseguisse eleger nenhum candidato por maioria absoluta. A segunda, quando a maioria parlamentar que aprovou a investidura do Primeiro-Ministro nega apoio à execução do Programa de Governo. No primeiro caso, a iniciativa cabe ao próprio chanceler em exposição motivada ao Presidente da República. No segundo caso, configura-se hipótese em que será facultado ao Presidente a dissolução. Em todos os casos, a Câmara dos Deputados não pode ser dissolvida durante a vigência do estado de defesa ou do estado de sítio. O substitutivo apresenta a possibilidade de dissolução como prerrogativa do Presidente da República quando houver grave crise política e institucional, sendo imprescindível a prévia consulta ao Primeiro-Ministro e às Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal com a concordância do Conselho da República. Para tanto, apresenta limitações temporais e circunstanciais, não sendo possível a dissolução nos dois primeiros anos da legislatura, na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio (BRASIL, 1995, 2001).

No projeto original, exonerado, o governo continua em função até a posse do novo gabinete, limitando-se à prática dos atos estritamente necessários à gestão dos negócios públicos. O substitutivo, de modo antagônico, estabelece que a demissão do governo não produz efeitos até a posse do novo Primeiro-Ministro (BRASIL, 1995, 2001).

A PEC em comento estabelece obrigatória consulta popular consubstanciada em plebiscito, ocorrendo rejeição, retorna-se ao texto constitucional vigente na data da promulgação da Emenda (BRASIL, 1995, 2001).

Os estados decidem sobre a adoção do sistema parlamentarista em seus respectivos governos, devendo as respectivas Assembleias Legislativas adaptar as Constituições Estaduais ao modelo proposto (BRASIL, 1995, 2001).

Como norma de transição, o substitutivo propõe a introdução da figura do Ministro-Coordenador na estrutura do governo presidencialista que teria como função primordial auxiliar o Presidente da República, cabendo-lhe à articulação político-administrativa do Governo e a coordenação dos Ministérios. O Ministro-Coordenador será nomeado e exonerado por ato do Presidente da República. Sua escolha deveria recair preferencialmente sobre um congressista. O substitutivo dispõe que os atos de nomeação assinados pelo Presidente da República, bem como as proposições legislativas encaminhadas ao Poder legislativo deverão ser referendados pelo Ministro-Coordenador. O Ministro-Coordenador deverá comparecer a sessão conjunta do Congresso Nacional para apresentar relatório sobre a execução do governo ou expor assunto de significação nacional, importando em crime de responsabilidade a ausência injustificada. A Câmara dos Deputados poderá, pelo voto da maioria absoluta de seus membros, solicitar ao Presidente da República o afastamento do Ministro-Coordenador (BRASIL,  2001).

No ano de 2017, o Deputado Bonifácio de Andrada apresentou a PEC 309/2017 recriando a figura do Ministro-Coordenador, agora não mais como simples auxiliar do Presidente da República, mas inserido em uma remodelação de governo inspirado no modelo adotado na França, visando uma articulação mais efetiva do Poder Legislativo com o Poder Executivo, procurando-se uma solução para as relações institucionais entre os poderes (BRASIL, 2017).

A PEC em comento dispõe que o Ministro-Coordenador participará da escolha dos demais Ministros do Governo. Empossado o Ministério, o Ministro-Coordenador levará ao Presidente da República as linhas básicas de seu programa de governo para aprovação, em seguida, comparecerá ao Congresso Nacional e fará a exposição do programa (BRASIL, 2017).

O Ministro-Coordenador, em ato subscrito pelo Presidente da República, poderá exercer qualquer atribuição privativa ao Presidente da República. Além disso, deverá comparecer ao Congresso Nacional para prestar informações e relatórios de sua gestão (BRASIL, 2017).

Todos os atos do Governo assinados pelo Presidente da República deverão conter também a assinatura do Ministro-Coordenador para ter validade e seguirá a forma dos costumes para os demais Ministros de Estado (BRASIL, 2017).

Para fortalecer as ações de Governo e a sua própria liderança, o Ministro Coordenador poderá solicitar ao Congresso Nacional um voto de confiança para permanecer à frente do Governo, além disso, o Ministro-Coordenador, após seis meses de exercício, poderá sofrer um pedido de afastamento aprovado pela maioria absoluta de Deputados e Senadores. Havendo o afastamento, um novo Ministro-Coordenador seria indicado pelo Presidente da República (BRASIL, 2017).

A proposta acima, expõe o relator, é uma resposta às deficiências autocráticas do presidencialismo atual e destaca aspectos do nosso parlamentarismo do passado, mormente do parlamentarismo do Império, que devem ser levados em conta para formulação de um novo sistema que possa superar politicamente a atual existência institucional do país (BRASIL, 2017).

3. PEC 32/2015 de Fernando Collor

A PEC 32 de 2015 é uma reapresentação da PEC 31/2007 de autoria do Senador e ex-Presidente Fernando Collor de Mello. Na esteira da proposta, “o Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República e pelo Conselho de Ministros, cabendo a este a direção e a responsabilidade da política do Governo, assim como da Administração Federal.” (COLLOR, 2009; BRASIL, 2015a).

Similar aos sistema referencial francês, o Presidente da República seria eleito pelo voto direto com mandato de quatro anos e possibilidade de segundo turno. No tocante à reeleição, a proposta não veda (BRASIL, 2015a).

O Presidente permaneceria com as mesmas funções de Estado que a Constituição hoje lhe delega, sendo comandante supremo das Forças Armadas e garantidor da unidade, independência, defesa nacional e o livre exercício das instituições democráticas. Seria de sua competência, dentre outras, a nomeação e exoneração do Presidente do Conselho de Ministros e dos Ministros de Estado e a dissolução da Câmara dos Deputados. Dentro do processo legislativo, o Presidente poderia sancionar, promulgar e vetar as leis sob proposta do Presidente do Conselho de Ministros (BRASIL, 2015a).

Sobre a organização do Poder Legislativo Federal, o projeto não apresenta inovações, permanecendo, portanto, o modelo atual: Parlamento bicameral, legislatura de quatro anos, eleição dos deputados pelo sistema proporcional e de três senadores pelo princípio majoritário (BRASIL, 2015a).

Seguindo o modelo colegiado, o Governo seria exercido pelos integrantes do Conselho de Ministros, repousando a confiança na Câmara dos Deputados pela política do Governo e pela Administração Federal, e cada Ministro, individualmente, pelos atos que praticar no exercício de suas funções. À exceção de alguns casos, todos os atos do Presidente da República devem ser referendados pelo Presidente do Conselho e pelo Ministro competente como condição de validade (BRASIL, 2015a).

O Presidente do Conselho é o Primeiro-Ministro. Seria de sua competência a indicação e solicitação de exoneração dos Ministros de Estado, a expedição de regulamentos etc. Quanto ao processo legislativo, o chanceler pode tomar a iniciativa dos projetos de lei do Governo e editar medidas provisórias, e, ainda, propor, ao Presidente da República decretos que disponham sobre organização e funcionamento da administração federal (BRASIL, 2015a).

O Primeiro-Ministro seria escolhido pelo Presidente da República e submetido à aprovação da maioria absoluta da Câmara dos Deputados, que decidirá sobre sua aceitação, o respectivo plano de governo e os nomes que comporão o Conselho de Ministros. Rejeitado o programa de governo, o Presidente da República indicaria outro nome. Após a segunda rejeição consecutiva, o Presidente da República dissolverá a Câmara dos Deputados, convocando novas eleições (BRASIL, 2015a).

Uma inovação desta proposta é que haverá um Vice-Ministro nomeado pelo Ministro e aprovado pelo Conselho de Ministros os demais em cada Ministério. Exonerado o Conselho de Ministros, e enquanto não se constituir o novo, os Vice-Ministros responderão pelo expediente das respectivas pastas (BRASIL, 2015a).

Competiria ao Conselho de Ministros, dentre outros: opinar sobre as questões encaminhadas pelo Presidente da República e as suscitadas pelo Primeiro-Ministro e Ministros de Estado; elaborar programa de governo e apreciar a matéria referente à sua execução;  elaborar o plano plurianual, a lei de diretrizes orçamentárias e as propostas dos orçamentos; deliberar sobre as questões que afetem a competência de mais de um Ministério. O Conselho de Ministros decide por maioria de votos, prevalecendo, em caso de empate, o voto do Presidente do Conselho (BRASIL, 2015a).

No que concerne à relação com o Parlamento, tal proposta institui a moção de desconfiança e a possibilidade de dissolução da Câmara baixa. A moção de desconfiança em face do Conselho de Ministros será acompanhada de proposta da composição de um novo Conselho e do respectivo programa de Governo que, aprovados pela maioria absoluta da Casa, ensejam a substituição do Conselho (BRASIL, 2015a).

Não há previsão, na referida proposta, de solicitação de voto de confiança (BRASIL, 2015a).

A PEC em apreço prevê a possibilidade de dissolução em dois casos bem especificados: Quando verificada a impossibilidade da manutenção do Conselho de Ministros por falta de apoio parlamentar, comprovada em moções de desconfiança aprovadas, consecutivamente, em face de três Conselhos, e a rejeição de medida provisória por maioria absoluta da Câmara (BRASIL, 2015a).

Acerca da eficácia das propostas em comento, a aprovação não dependeria de nenhuma consulta popular a priori ou a posteriori, adotando-se o sistema de governo após a promulgação da referida emenda (BRASIL, 2015a).

Tal proposta prevê a instituição do sistema de governo parlamentarista nos estados (BRASIL, 2015a).

4. PEC 102/2015 de Antônio Carlos Valadares

A PEC 102/2015 foi subscrita pelo Senador Antônio Carlos Valadares justificada pelas características do sistema que permite “que a vida política de uma nação possa se desenrolar de forma mais tranquila, sem os sobressaltos que são gerados pelo presidencialismo” (BRASIL, p. 15, 2015b). No parlamentarismo, argumenta o Senador, “crises políticas podem ser superadas sem qualquer forma de tensão institucional, pela substituição do Governo e, no limite, pela convocação de novas eleições, permitindo maior estabilidade e paz social.” (BRASIL, 2015b).

A proposta tem por bases o modelo parlamentarista republicano brasileiro (de 1961 a 1963), os debates da Constituinte sobre o tema e a fórmula preparada pela Frente Parlamentarista Nacional “Ulysses Guimarães”, elaborada à época do plebiscito de 1993 (BRASIL, 2015b).

Sobre a organização do Poder Legislativo Federal, a proposta não apresenta grandes inovações, mantendo-se a mesma configuração do sistema atual: Parlamento bicameral, legislatura de quatro anos (salvo dissolução), eleição dos deputados pelo sistema proporcional e de  três senadores por estado (BRASIL, 2015b).

A Câmara dos Deputados e o Senado Federal, ou qualquer de suas Comissões, poderão convocar Ministro de Estado ou quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência da República ou ao Gabinete do Primeiro-Ministro para prestarem, pessoalmente, informações sobre assunto previamente determinado, importando crime de responsabilidade a ausência sem justificação adequada. Da mesma forma, o Primeiro-Ministro e os Ministros de Estado poderão comparecer ao Senado Federal, à Câmara dos Deputados, ou a qualquer de suas Comissões, por sua iniciativa e mediante entendimentos com a Mesa respectiva, para expor assunto de relevância do Governo ou de seu Ministério (BRASIL, 2015b).

O chefe de estado é o Presidente que conduz as Forças Armadas e faz a política externa, mantendo relações com estados estrangeiros. Detém a iniciativa de constituição do Governo, nomeando o Primeiro-Ministro e, por indicação deste, os demais ministros de estado, além de exonerá-los quando a Câmara dos Deputados lhe retirar confiança. No contexto do processo legislativo, cabe ao Presidente: Sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, além de editar decretos. A PEC em apreço prevê eleições diretas para o cargo de presidente com possibilidade de reeleição (BRASIL, 2015b).

O Governo goza da confiança do Presidente da República e da Câmara dos Deputados, sendo composto pelo Conselho de Ministros, que é o órgão de condução da política geral do Governo e o órgão superior da Administração Pública Federal. O Conselho de Ministros, integrado por todos os Ministros de Estado, seria presidido ordinariamente pelo Primeiro-Ministro e, extraordinariamente, pelo Presidente da República, quando esse julgar conveniente. O Conselho de Ministros decide por maioria de votos, prevalecendo, em caso de empate, o voto do Primeiro-Ministro. Os membros do Conselho de Ministros são responsáveis coletivamente pelos atos do Conselho e individualmente pelos atos dos respectivos ministérios, dirigindo, cada ministro, a sua pasta com autonomia e responsabilidade. Competiria ao Conselho de Ministros, dentre outros: opinar sobre as questões encaminhadas pelo Presidente da República; examinar as questões suscitadas pelo Presidente do Conselho de Ministros ou pelos Ministros de Estado; elaborar programa de governo e apreciar a matéria  referente à sua execução; elaborar o plano plurianual, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias e as propostas de orçamento previstas na Constituição (BRASIL, 2015b).

O Primeiro-Ministro promove e coordena as atividades do Conselho de Ministros, mantendo a unidade de orientação política e administrativa do Governo podendo, eventualmente, acumular qualquer Ministério. Dentre as competências do Primeiro-Ministro destaca-se o exercício da presidência do Conselho de Ministros e a indicação dos Ministros de Estado. No âmbito do processo legislativo, poderá adotar medidas provisórias; propor ao Presidente da República decretos que disponham sobre organização e funcionamento da administração federal, tomar a iniciativa dos projetos de lei do Governo; exercer o poder regulamentar etc. (BRASIL, 2015b).

Regra geral, o Presidente da República, em caso de vaga, após consulta ao partido ou aos partidos políticos com maioria majoritária que compõem a maioria da Câmara dos Deputados, nomeará o Primeiro-Ministro dentre os membros do Congresso Nacional. O nome indicado pelo Presidente da República será apreciado pela Câmara dos Deputados. O rito dessa eleição proposta por esta PEC guarda especificidades não dispostas nos projetos retromencionados. (BRASIL, 2015b).

O Primeiro-Ministro comparecerá perante a Câmara dos Deputados para submeter o programa de governo. A Câmara dos Deputados, deliberaria, pelo voto da maioria simples, a indicação e o programa de governo. Não obtendo a aprovação da Câmara dos Deputados, o Presidente da República procederia à nova indicação. Restando inexitosa a segunda nomeação, caberia ao Senado Federal escolher, por maioria absoluta, o Primeiro-Ministro e aprovar seu programa de governo. Caso o Senado não conseguisse eleger o Primeiro-Ministro por maioria absoluta, o Presidente da República poderia nomear o mais votado. Destaca-se que a PEC, aparentemente, torna a nomeação do eleito por maioria simples uma faculdade do Presidente, no entanto, talvez, por atecnia legislativa, a proposta não dispõe de outras alternativas que o Presidente possa considerar (BRASIL, 2015b).

Com relação aos Ministros de Estado, são nomeados e exonerados por ato do Presidente da República por solicitação do Primeiro-Ministro (BRASIL, 2015b). 

O Governo se esgota pela aprovação da moção de censura ou não aprovação do voto de confiança. O Primeiro-Ministro solicita voto de confiança à Câmara dos Deputados que, negada por maioria absoluta, acarreta na exoneração do gabinete (BRASIL, 2015b).

Na PEC 102/2015 existe um limite temporal, só podendo ser proposta censura depois de decorridos seis meses da formação do governo e da última apresentação da censura. A moção de censura em apreço, assim como na Alemanha, conterá a indicação de um Primeiro-Ministro, o qual, se aprovada a proposição, deverá ser nomeado pelo Presidente da República (BRASIL, 2015b).

Além disso, em qualquer oportunidade, o Primeiro Ministro poderá solicitar voto de confiança à Câmara dos Deputados, mediante declaração ou proposição que considere relevante (BRASIL, 2015b).

Aprovada a moção de censura ou rejeitada a confiança pela maioria da Câmara, o governo será destituído, permanecendo os ocupantes nos respectivos cargos até a posse do novo gabinete, limitados à prática dos atos estritamente necessários à gestão pública (BRASIL, 2015b).

Quanto à hipótese de dissolução, se verifica quando a maioria parlamentar que aprovou a investidura do Primeiro-Ministro nega apoio à execução do programa de governo. Competiria ao Presidente da República em exposição motivada ao Primeiro-Ministro dissolver a Câmara dos Deputados. O projeto em apreço apresenta limites circunstanciais e temporais, sendo assim, a Câmara dos Deputados não poderá ser dissolvida nos seis meses posteriores a sua eleição, no último semestre do mandato do Presidente da República ou durante a vigência do estado de sítio, do estado de emergência ou da intervenção federal. Decretada a dissolução da Câmara dos Deputados, o Presidente da República convocará eleições extraordinárias e nomeará um Conselho de Ministros provisório (BRASIL, 2015b).

Acerca da eficácia da proposta em comento, esta não cogita a adoção de consulta popular (BRASIL, 2015b).

O projeto prevê que os estados e o Distrito Federal poderão adotar o sistema parlamentarista de governo, sendo vedada a sua implantação durante o mandato do Governador ou a menos de um ano da eleição do seu sucessor (BRASIL, 2015b).

Quanto à adoção do parlamentarismo nos Municípios, veda-se expressamente (BRASIL, 2015b).

5. PEC 09/2016 de Aloysio Nunes Ferreira

O projeto em apreço tem o propósito de instituir no Brasil um sistema de governo designado como parlamentarista misto por envolver aspectos do presidencialismo e do parlamentarismo, tendo como referência principal a Proposta de Emenda à Constituição 20/1995 e o respectivo substitutivo aprovado na Comissão Especial. Similar ao sistema referencial francês, nesta proposta, o Presidente da República preside o Conselho de Ministros, o que caracteriza o sistema como semipresidencialista (BRASIL, 2016a)

O Presidente da República é o Chefe de Estado e Comandante Supremo das Forças Armadas, cabendo-lhe a garantia da unidade, da independência nacional e da defesa do Brasil e o livre exercício das instituições democráticas. A eleição para Presidente da República ocorre nos moldes atuais: Eleição por sufrágio universal direto e secreto com possibilidade de segundo turno e mandato de quatro anos, não de cinco como estabelece o substitutivo da PEC referencial. Com relação à filiação ou vinculação à partido político, a PEC não veda. Dentre as principais atribuições do Presidente, se estabelece a indicação, nomeação e exoneração do conselho de ministros, sendo que a ação se dará por solicitação do Primeiro-Ministro quando tratar-se dos Ministros de estado. O Presidente, enquanto comandante supremo das forças armadas pode declarar guerra, decretar a mobilização nacional, celebrar a paz (contando com o aval do Congresso Nacional nesses casos), nomear e promover oficiais-generais das Forças Armadas por indicação do Governo e designá-los para os cargos que lhes são privativos, decretar estado de defesa, estado de sítio e intervenção federal e conferir condecorações e distinções honoríficas. No âmbito do processo legislativo, o Presidente mantém a função de sancionar, promulgar e vetar as leis. Adiciona-se o pedido de reconsideração de projeto de lei ao Congresso Nacional, ouvido o Primeiro Ministro (BRASIL, 2016).

Os atos assinados pelo Presidente da República são referendados pelo Primeiro-Ministro (BRASIL, 2016a).

Seguindo o modelo colegiado, o Governo é exercido pelo Primeiro Ministro e pelos demais integrantes do Conselho de Ministros, repousando sua confiança nas duas casas do Congresso Nacional. Nos moldes do sistema referencial francês, a PEC propõe que o Conselho de Ministros, integrado por todos os Ministros de Estado, seja presidido pelo Presidente da República e, na sua ausência, pelo Primeiro-Ministro. O Presidente da República nomeia e o Primeiro-Ministro indica os demais integrantes do conselho de ministros (BRASIL, 2016a).

O Primeiro-Ministro é o chefe de governo indicado pelo Presidente da República após ouvido o partido (governo de maioria) ou a coligação majoritária (governo de coalizão) da Câmara dos Deputados. Uma vez convidado, o Primeiro-Ministro apresentará ao Presidente da República o programa de governo que, se aprovado, será comunicado ao Congresso Nacional para posterior discussão. Diferentemente dos projetos anteriores, este não explicita as regras caso o nome do Primeiro-Ministro não seja aprovado na primeira rodada. Observa-se, no entanto, que o art. 86-C, que trata da apreciação do voto de confiança, dispõe o seguinte: 

§ 8º Em caso de vaga do cargo de Primeiro Ministro, o Presidente da República abre período de consulta aos partidos representados na Câmara dos Deputados;

§ 9º Nos três dias posteriores ao vencimento do prazo do § 8º o Presidente da República submeterá à Câmara dos Deputados o nome do Primeiro-Ministro;

§ 10 A aprovação da Câmara dos Deputados dependerá ´da maioria absoluta de seus membros.

§ 11 Recusada a aprovação, o Presidente da República deverá, em igual prazo, apresentar outro nome. Se também este for recusado, apresentará no mesmo prazo, outro nome. Se nenhum for aceito, caberá ao Senado Federal indicar, por maioria absoluta de seus membros, o Presidente do Conselho, que não poderá ser qualquer dos recusados. (BRASIL, 2016a, p. 10)

Nessa linha, aparentemente trata-se de uma atecnia legislativa do referido projeto, pois inexiste previsão de rito nos artigos em que Câmara rejeita o nome do Primeiro-Ministro, quando do inicío de nova legislatura, mas possui um rito próprio quando da rejeição da confiança ou aprovação da censura, portanto, pode-se questionar se as regras contidas no § 8º e ss, se aplica a todos os casos de vacância.

A proposta estabelece que são funções precípuas do Primeiro-Ministro: Exercer a direção superior da Administração Federal; elaborar o Programa de Governo; indicar, para nomeação pelo Presidente da República, os Ministros de Estado e solicitar sua exoneração; promover a unidade da ação governamental, elaborar planos e programas nacionais e regionais de desenvolvimento. No âmbito do processo legislativo, o Primeiro-Ministro: Em caso de relevância e urgência, poderá adotar medidas provisórias; solicitar urgência para apreciação de projetos de sua iniciativa e expedir decretos e regulamentos para a fiel execução das leis. O Primeiro-Ministro deverá comparecer mensalmente ao Congresso Nacional, para informar sobre a execução do Programa de Governo e expor assunto de relevância para o País, importando crime de responsabilidade a ausência injustificada (BRASIL, 2016a).

Com relação aos Ministros de Estado, o texto da PEC não apresenta grandes alterações em relação à atual redação da Constituição, apenas, obviamente, no que diz respeito à autoridade a quem deve responder, que, no caso, passa a ser o Primeiro-Ministro (BRASIL, 2016a).

Seria de competência do Conselho de Ministros: Opinar sobre as questões encaminhadas pelo Presidente da República; discutir e aprovar os decretos, as proposições legislativas e as demais questões suscitadas pelo Primeiro-Ministro ou pelos Ministros de Estado; elaborar o programa de governo e apreciar as matérias pertinentes à sua execução; elaborar o Plano Plurianual de Investimentos, a proposta de Lei de Diretrizes Orçamentárias, a Lei Orçamentária Anual e as demais proposições legislativas sobre matéria orçamentária e deliberar sobre as questões afetas à competência de mais de um ministério (BRASIL, 2016a).

Com relação à oposição, o líder da minoria e o colégio de seus vice-líderes estão autorizados a responder pelos assuntos correspondentes aos Ministérios existentes gozarão, no que couber, na forma regimental, de tratamento compatível com o concedido em lei ao Primeiro-Ministro e demais integrantes do Conselho de Ministros (BRASIL, 2016a).

No que concerne à relação do governo com a Câmara dos Deputados, pode-se pronunciar moção de censura ou voto de confiança, ensejando a exoneração do governo no caso de aprovação de moção de censura ou quando ocorrer a não aprovação de voto de confiança (BRASIL, 2016a).  

O voto de confiança dependeria de solicitação do Primeiro-Ministro ao Congresso Nacional, mediante declaração ou no exame de proposição que considere relevante. Negada a confiança por maioria absoluta, o Governo apresenta a sua exoneração. Também enseja confiança, o reinício do Governo, encerrada a legislatura (BRASIL, 2016a).

Com relação à moção de censura, na linha do sistema referencial alemão, deve constar a indicação de nome para Primeiro-Ministro. O projeto apresenta limitações temporais e quantitativas. Existe um limite temporal de  seis meses da posse do Primeiro-Ministro para que, o Congresso Nacional possa apreciar moção de censura ao governo. Rejeitada a moção de censura, seus signatários somente poderão subscrever outra quando decorridos seis meses da rejeição. É vedada a iniciativa de mais de três moções que determinem a destituição do Governo na mesma sessão legislativa. A demissão do governo não produz efeitos até a posse do novo Primeiro-Ministro (BRASIL, 2016a).

Verifica-se a possibilidade de dissolução da Câmara dos Deputados na hipótese de grave crise política e institucional, verificada ante a impossibilidade do Conselho de Ministros se manter, comprovada em moções de desconfiança, opostas consecutivamente, três vezes. A iniciativa dar-se-á por ato do Presidente, ouvido o Conselho da República e precedida de consulta ao Primeiro-Ministro e aos Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Verifica-se limitações temporais “não haverá dissolução no primeiro ano da legislatura” (BRASIL, 2016a, p. 8) e circunstanciais “na vigência do estado de defesa, ou do estado de sítio” (BRASIL, 2016a, p.8).

Assim como a PEC 20/1995, esta propõe uma norma de transição ao se introduzir a figura do Ministro-Coordenador na estrutura do governo presidencialista, tendo como função primordial auxiliar o Presidente da República, cabendo-lhe à articulação político-administrativa do Governo e a coordenação dos Ministérios (BRASIL, 2016a).

O modelo apresentado é similar à versão original da PEC 20/1995: 

Art. 2º Fica criado, enquanto vigorar o atual sistema presidencialista, o cargo de Ministro-Coordenador, observadas as seguintes normas:

I – o Presidente da República será auxiliado pelo Ministro-Coordenador, de sua livre nomeação e exoneração, cuja escolha deverá recair, preferencialmente, sobre um membro do Congresso Nacional;

II – ao Ministro-Coordenador, além de outras atribuições outorgadas e delegadas pelo Presidente da República, conforme disposto no art. 87, parágrafo único, inciso IV, cabe a articulação político-administrativa do Governo, competindo-lhe coordenar os Ministérios, sob a orientação do Presidente da República, e presidir reuniões ministeriais, na sua ausência;

III – o Ministro-Coordenador será ouvido pelo Presidente da República sobre os atos de nomeação de sua competência, assim como sobre as proposições encaminhadas ao Poder Legislativo;

IV – o Ministro-Coordenador comparecerá a sessão conjunta do Congresso Nacional, para apresentar relatório sobre as atividades de execução do Governo ou expor assunto de significação nacional, na última quinta-feira de cada mês, importando crime de responsabilidade sua ausência injustificada. (BRASIL, 2016a, p.18).

A Câmara dos Deputados, poderia, pela maioria absoluta de seus membros, solicitar ao Presidente da República o afastamento do Ministro-Coordenador.

Quanto à eficácia, a PEC em comento não prevê a realização de consulta popular.

6. PEC 245/2016 de Beto Rosado

A PEC 245 de 2016 justifica-se porque o subscritor entende que o parlamentarismo é mais propício à mensuração do apoio legislativo e popular a um determinado programa de governo, como também entende que esse sistema dispõe de mecanismos institucionais mais eficazes para fazer frente às eventuais crises de legitimidade política que afetem o regular funcionamento dos governos instituídos (BRASIL, 2016b).

Sobre a organização do Poder Legislativo Federal, o projeto apresenta a mesma configuração do sistema atual: Parlamento bicameral, legislatura de quatro anos, eleição dos deputados pelo sistema distrital e de quatro senadores por estado seguindo o princípio majoritário (BRASIL, 2016b).

A Câmara dos Deputados e o Senado Federal, ou qualquer de suas Comissões, podem convocar o Primeiro-Ministro, Ministro de Estado ou quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência da República ou ao Conselho de Ministros para prestarem, pessoalmente, informações sobre assunto previamente determinado, importando em crime de responsabilidade a ausência sem justificação adequada. Da mesma forma, o Primeiro-Ministro e os Ministros de Estado poderão comparecer ao Senado Federal, à Câmara dos Deputados, ou a qualquer de suas Comissões, por iniciativa própria e mediante entendimentos com a Mesa respectiva, para expor assunto de relevância do governo ou dos Ministérios. Além disso, as Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal podem encaminhar pedidos escritos de informação ao Primeiro-Ministro e aos Ministros de Estado (BRASIL, 2016b).

O Chefe de Estado é o Presidente da República, Comandante Supremo das Forças Armadas, cabendo-lhe zelar pela preservação da ordem constitucional e democrática, promover o relacionamento harmônico entre os poderes constituídos, garantir a soberania nacional e contribuir para a paz e solidariedade internacional.

A PEC em comento propugna pelas eleições diretas para o cargo de Presidente, similar ao sistema atual, o Presidente é filiado a partido político e tem mandato de quatro anos com possibilidade de reeleição. Seria de sua competência, dentre outras, a nomeação e exoneração do Primeiro-Ministro e dos Ministros de Estado; a dissolução da Câmara dos Deputados; estabelecimento de relações com Estados estrangeiros; declarar guerra e conferir condecorações e distinções honoríficas. O Presidente da República poderia delegar ao Primeiro-Ministro certas atribuições. Dentro do processo legislativo, o Presidente pode sancionar, promulgar e vetar as leis (BRASIL, 2016b).

Seguindo a linha colegiada, o Governo é exercido pelo Conselho de Ministros, que se compõe do Primeiro-Ministro e dos Ministros de Estado, repousando a confiança na Câmara dos Deputados. Os membros do Conselho de Ministros são responsáveis coletivamente pelos atos do Conselho e individualmente pelos atos dos respectivos Ministros. Cada ministro dirigiria a sua pasta com autonomia e responsabilidade, obediente ao plano de governo aprovado pela Câmara, podendo ser responsabilizado politicamente (BRASIL, 2016b).

Competiria ao Conselho de Ministros, dentre outros: exercer, sob a Presidência do Primeiro-Ministro, a direção superior da administração federal; promover a unidade da ação governamental e elaborar planos nacionais e regionais de desenvolvimento; opinar sobre as questões suscitadas pelo Presidente da República, Primeiro-Ministro ou Ministros de Estado; deliberar sobre as questões que afetem a competência de mais de um Ministério. De modo sui generis, em caso de relevância e urgência, o Conselho de Ministros, mediante proposta do Primeiro-Ministro, poderá adotar Medidas Provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional (BRASIL, 2016b).

A chefia de governo cabe ao Primeiro-Ministro, pois ele exerceria a chefia da administração pública federal e presidência do Conselho de ministros. O Primeiro-Ministro promove e coordena as atividades do Conselho de Ministros. Seria de sua competência a indicação e solicitação de exoneração dos Ministros de Estado, expedição de decretos; edição de decretos etc. O Primeiro-Ministro poderá solicitar urgência para apreciação de projetos de sua iniciativa (BRASIL, 2016b).

A escolha do Primeiro-Ministro compete ao Presidente da República após consulta ao partido político ou coalizão que compõe a maioria da Câmara dos Deputados.  O Primeiro-Ministro compareceria perante a Câmara dos Deputados para submissão do programa de governo. A indicação é votada pela Câmara dos Deputados, que deve deliberar por maioria absoluta. Rejeitado o programa de governo, o Presidente da República indicaria outro nome. Após a segunda rejeição consecutiva, a própria Câmara dos Deputados elegeria o Primeiro-Ministro pelo voto da maioria absoluta dos seus membros, devendo o Presidente da República nomear o eleito. Caso a Câmara dos Deputados não conseguisse eleger o Primeiro-Ministro a partir da segunda rejeição consecutiva, facultaria-se ao Presidente da República, ouvido o Conselho da República, dissolver a Câmara dos Deputados e convocar eleições extraordinárias ou, optando pela não dissolução da Câmara dos Deputados, nomear unilateralmente o Primeiro-Ministro (BRASIL, 2016b).

Seguindo os modelos tradicionais de parlamentarismo, o Primeiro-Ministro, após ter sido nomeado, indica os demais integrantes do Conselho de Ministros (os Ministros de Estado) para nomeação pelo Presidente da República (BRASIL, 2016b).

O Governo encontra-se sujeito à confiança e censura da Câmara dos Deputados. Em qualquer oportunidade, o Primeiro Ministro poderá solicitar voto de confiança à Câmara dos Deputados, mediante declaração ou proposição que considere relevante. A Câmara dos Deputados, conforme dispõe a PEC em apreço, pode pronunciar moção de censura ao Governo, existindo limite quantitativo, não se podendo subscrever três moções que determinem a destituição do governo na mesma sessão legislativa, e temporal, antes de decorridos seis meses da formação do governo ou da última apresentação de moção. A moção de censura deve conter a simultânea indicação do nome para Primeiro-Ministro e do seu Programa de Governo e só pode ser votada, ouvido o Primeiro-Ministro. Aprovada a moção de censura ou rejeitada a confiança pela maioria da Câmara, o governo seria destituído, permanecendo os ocupantes nos respectivos cargos até a posse do novo gabinete (BRASIL, 2016b).

Compete ao Presidente da República, sob proposta do Primeiro-Ministro, dissolver a Câmara dos Deputados, apresentando-se como justificativa a hipótese da maioria parlamentar que aprovou a investidura do Primeiro-Ministro negar apoio à execução do Programa de Governo. Os projetos em apreço apresentam limites quantitativos, circunstanciais e temporais. A PEC 245/2016 estabele que a Câmara dos Deputados não pode ser dissolvida no último semestre da legislatura e, quando da vigência de estado de sítio, estado de defesa ou se pendente de deliberação de moção de censura (BRASIL, 2016b).

O Governo exonerado continua em função até a posse do novo Governo, limitando-se à prática dos atos estritamente necessários à gestão dos negócios públicos (BRASIL, 2016b).

Acerca da eficácia das propostas em comento, a aprovação não depende de plebiscito, adotando-se o sistema de governo após a promulgação da referida emenda (BRASIL, 2016).

7. Constitucionalidade e  alteração do sistema de governo

Nos ditames da teoria constitucional, existe uma força propulsora, na expressão de Bulos (2014), que cria, revisa, reforma e também atua na mutação das cartas políticas. Bonavides (2004) lembra que o Poder constituinte sempre existiu em todas as sociedades políticas, no entanto, só a partir do século XVII, houve uma teorização, tendo como plano de fundo o iluminismo, a Revolução americana, a Revolução francesa, a filosofia do contrato social, o racionalismo francês etc. Nessa linha, a expressão revela uma forma de poder que, a partir das Revoluções liberais do século XVIII, tem como titular o povo e não mais os monarcas absolutistas da Idade Moderna.

O poder constituinte, em sua clássica feição, teve como teórico por excelência o Abade Emmanuel Joseph Sieyès. Sieyés inseriu “o poder constituinte na moldura do sistema representativo” (BONAVIDES, 2004, p. 189 ). Assim, nas democracias o poder constituinte tem como titular o povo, mas o seu exercício se dá por meio de representantes escolhidos através do sufrágio.

O poder constituinte pode ser manifestado de várias formas, dependendo de como as normas são produzidas. Temer (2007) explica que algumas normas constitucionais têm caráter originário; outras, por derivação; exatamente por isso a distinção entre poder constituinte originário e poder constituinte derivado.

O poder constituinte originário visa a criar um Estado, portanto, a cada nova Constituição cria-se um Estado, seja a Carta proveniente de assembleia popular, seja de movimento revolucionário. Quanto ao poder constituinte derivado, destina-se à reforma do texto constitucional. Essa competência reformadora se corporifica por meio de instrumentos denominados de “Emendas à Constituição” (TEMER, 2007), cuja atividade de criação normativa constitucional é limitada materialmente pelo poder constituinte originário que instituiu as cláusulas pétreas. A Constituição de 1988 as elenca: 

Art. 60 § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I – a forma federativa de Estado;

II – o voto direto, secreto, universal e periódico;

III – a separação dos Poderes;

IV – os direitos e garantias individuais.

Em outras palavras, a emenda constitucional é uma “via permanente de reforma da Constituição”, trata-se de um caminho ordinário que a Lei Maior estabelece para introdução de novas regras ou preceitos no texto constitucional. Segundo predispõe o art. 60 da Constituição, essa poderá ser emendada mediante proposta de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal. Essa atividade de criação normativa constitucional é limitada materialmente pelas denominadas cláusulas pétreas, das quais não se inclui a forma republicana e o sistema presidencialista, pelos menos não explicitamente (BONAVIDES, 2004).

A Carta de 1988 delegou a seus verdadeiros representantes, o Povo, através de plebiscito, a escolha da forma e do sistema de governo. O plebiscito de 1993 foi realizando em obediência ao disposto no art. 2º do Ato das disposições constitucionais transitórias – ADCT:  

Art. 2º No dia 7 de setembro de 1993 o eleitorado definirá, através de plebiscito, a forma (república ou monarquia constitucional) e o sistema de governo (parlamentarismo ou presidencialismo) que devem vigorar no País.

§ 1º Será assegurada gratuidade na livre divulgação dessas formas e sistemas, através dos meios de comunicação de massa cessionários de serviço público.

§ 2º O Tribunal Superior Eleitoral, promulgada a Constituição, expedirá as normas regulamentadoras deste artigo. (BRASIL, 1988)

Buscava, tal consulta, a ratificação, através do voto popular; da República, enquanto forma de governo e do presidencialismo, enquanto sistema de governo; conforme escolha feita pelo constituinte de 1988. Com a emenda constitucional 2 de 1992, a data do plebiscito foi alterada para abril de 1993: 

Artigo único. O plebiscito de que trata o art. 2º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias realizar-se-á no dia 21 de abril de 1993.

§ 1º A forma e o sistema de governo definidos pelo plebiscito terão vigência em 1º de janeiro de 1995.

§ 2º A lei poderá dispor sobre a realização do plebiscito, inclusive sobre a gratuidade da livre divulgação das formas e sistemas de governo, através dos meios de comunicação de massa concessionários ou permissionários de serviço público, assegurada igualdade de tempo e paridade de horários.

§ 3.º A norma constante do parágrafo anterior não exclui a competência do Tribunal Superior Eleitoral para expedir instruções necessárias à realização da consulta plebiscitária (BRASIL, 1992).

Em 1995 foi apresentada a PEC 20/1995 que busca alterar o sistema de governo para o parlamentarismo. Na sua justificativa, o autor do projeto, o Deputado Eduardo Jorge, defende que as frentes que defenderam o parlamentarismo no plebiscito saíram fortalecidas, o que quer dizer que, na sua avaliação, a questão pode ser ventilada novamente. O relator na CCJ aprovou o projeto, pugnando pela sua constitucionalidade, pois não apresenta vícios de natureza material (BRASIL, 1995).

Mantido o sistema presidencialista e a forma de governo republicana por decisão direta do titular do poder constituinte originário (o povo), indaga-se a possibilidade de alteração de sistema de governo via Proposta de Emenda à Constituição – PEC. Nesse diapasão, em 1997, impetrou-se o Mandado de Segurança 22972 (MS 22972) contra atos da Mesa da Câmara dos Deputados, da Comissão de Constituição e Justiça e de Redação e da Comissão Especial destinada a analisar e proferir parecer na Proposta de Emenda à Constituição 20/1995. Argumentaram os impetrantes, que os legisladores constituintes originários, ao estabelecerem que a forma e o sistema de governo seriam decididos através de plebiscito, excluíram do poder constituinte derivado a decisão acerca do tema, outorgando-a diretamente ao eleitorado, ou seja, o povo, conforme dicção do art. 2º do ADCT. Sendo assim, a forma e o sistema de governo encontram-se vinculado à vontade popular manifestada no plebiscito supracitado, no qual, como é cediço, deu-se a vitória pela república e presidencialismo.

Em decisão monocrática, o ministro Néri da Silveira do STF, mesmo indeferindo a medida liminar do Mandado de Segurança, concluiu que o poder constituinte derivado não teria o condão de introduzir a forma monárquica de governo ou o sistema parlamentarista de governo. Mantidos, pela soberana vontade popular, o presidencialismo e a república, não há mais de se cogitar de revisão ou emenda alguma, pois o plebiscito disposto no art 2º do ADCT é vinculativo. Se a opção do eleitorado se desse em sentido diverso, neste caso, aí sim, na esteira do que defende o renomado ministro, proceder-se-ia a uma revisão da Constituição para adaptá-la à nova realidade política. Tal julgamento de mérito do Mandado de Segurança ainda se encontra pendente no STF sob a relatoria do Ministro Alexandre de Moraes.

Segundo Bonavides (2004, p. 208), toda Constituição pode ser emendada, salvo a matéria constante em virtude de limites expressos e tácitos que procedem da vontade absoluta e soberana do poder constituinte originário.

A melhor doutrina distribui as limitações do poder de reforma constitucional em tês grupos: temporais, circunstanciais e as materiais explícitas e implícitas (BULOS, 2014).

As limitações temporais são aquelas que só poderão ser empreendidas após decorrido certo prazo pré-fixado, o que não consta na atual redação da Constituição. As limitações circunstanciais estão previstas no art. 60 §1º, vedando-se emendas na vigência de intervenção federal, estado de defesa ou estado de sítio (SILVA, 2005).

Com relação aos limites materiais do poder de reforma, tratam-se de dispositivos que não podem ser objeto de emenda ou revisão. São os núcleos intangíveis, denominados de cláusulas pétreas, cuja transgressão ocasiona a inconstitucionalidade da iniciativa de emenda, fazendo com que a proposta não seja sequer objeto de deliberação. Em seu ensaio, Falcão (2009), ao trazer à baila as cláusulas pétreas das Constituições republicanas, nos informa que o presidencialismo jamais integrou o rol de intangibilidade, a forma republicana, sim. A Constituição de 1988, de forma inovadora, foi a primeira Carta da história repulicana que não incluiu nem a forma, nem o sistema nesse rol. (BONAVIDES, 2004).

Cumpre destacar que os limites materiais não se resumem àqueles circunscritos no art. 60 §4º. Existem outros de igual eficácia que decorrem da natureza instituições, portanto invioláveis. Esses valores se inferem de outros lugares da Constituição ou neles se acham formulados, portanto são limitações materiais implícitas (BULOS, 2014).

As propostas de emenda à Constituição estão sujeitas ao controle prévio de constitucionalidade a ser exercido pelo Poder Legislativo, através de suas Comissões Permanentes de Constituição, Justiça e Cidadania cuja função precípua é analisar a compatibilidade do projeto de lei ou proposta de emenda constitucional apresentados com o texto da Constituição Federal (MORAES, 2016).

Examinando-se os pareceres das respectivas CCJC do Senado ou da Câmara dos Deputados, no que concerne às propostas que alteram o sistema de governo em vigor, todas foram unânimes ao propugnarem pela adequação da matéria às normas constantes no art. 60 da Constituição, visto que não há pretensão de se abolir a forma federativa de Estado, o voto direto, secreto universal e periódico, nem a separação dos Poderes ou os direitos e garantias individuais. Não incidem na espécie, igualmente, as vedações do § 1º’ do art. 60, em que não estão em vigor intervenção federal, estado de defesa ou estado de sítio (BRASIL, 1995, 2001, 2015b, 2016).

No Mandado de Segurança 22972, os impetrantes alegam a inconstitucionalidade da PEC pelo fato de que a decisão política acerca da alteração do sistema de governo caberia diretamente ao próprio povo que já se manifestara de forma contrária no plebiscito: 

(…) forçoso é concluir que a revisão constitucional (emenda constitucional ora vergastada) encontra-se vinculada à vontade popular manifestada no plebiscito realizado em 1993, conformando-se o tema, outrossim, em cláusula gravada com o ônus da petrificação, impossível de ser reformada pelo legislador constituinte originário. (STF – MS: 22972 DF, Relator: Min. NERI DA SILVEIRA, Data de Julgamento: 18/12/1997, Data de Publicação: DJ DATA-02-02-98 P-00025) (risco nosso – quiseram dizer derivado)

Nesse diapasão, a inconstitucionalidade já existe antes do proposta tornar-se emenda constitucional, porque o próprio processamento já desrespeita frontalmente a Constituição por se tratar de matéria normativa petrificada. Em decisão monocrática, o ministro-relator Néri da Silveira acatou os argumentos relativos ao mérito, mas negou a liminar sob o argumento de que o mandado de segurança encontra-se prejudicado pois: 

Objeto de deliberação significa, sem a menor dúvida, objeto de votação, porque é neste momento que se delibera a favor da emenda ou contra ela. Por outro lado, se a direção dos trabalhos do Congresso cabe ao Presidente do Senado; se este, pelo próprio Regimento Comum do Congresso Nacional (artigo 73) pode, liminarmente, rejeitar a proposta de emenda que não atenda ao disposto no artigo 47, § 1º, da Constituição (e quem tem poder de rejeição liminar o tem, igualmente, no curso do processo) (STF – MS: 22972 DF, Relator: Min. NERI DA SILVEIRA, Data de Julgamento: 18/12/1997, Data de Publicação: DJ DATA-02-02-98 P-00025)

Portanto, na linha do que defende o Ministro Néri da Silveira, não é possível o controle de constitucionalidade repressivo a cargo do Judiciário em simples proposição e superviniente tramitação de normas eventualmente inconstitucionais, essa só se verificaria com a deliberação, ou seja, com a votação no plenário do Congresso Nacional. Sendo assim, a inconstitucionalidade das PECs que alteram o sistema de governo só é consubstanciada com a sua votação em plenário, não olvidando do controle preventivo a ser realizado pelo próprio Poder Legislativo que pode travar sua tramitação.

Penetrando no mérito da MS 22972, Néri da Silveira propugnou pela inconstitucionalidade de PECs que institui o parlamentarismo por, na sua linha de pensamento, tratarem-se de normas tendentes a abolir a separação dos poderes, bem como em decorrência do resultado do plebiscito a que se refere o art. 2º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias de 1988.  

No que concerne à relevância do fundamento do pedido, tenho-a como efetivamente presente, no confronto entre o conteúdo da Proposta de Emenda à Constituição nº 20-A, com o objeto aludido, e o disposto no art. 60, § 4º, III, da Carta Magna, ao vedar proposta de emenda tendente a abolir “a separação dos Poderes”, o que se sustenta resultará da aprovação da Emenda impugnada, bem assim, em decorrência do resultado do plebiscito a que se refere o art. 2º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias de 1988. São todos aspectos relevantes a serem apreciados no julgamento final do writ. (STF – MS: 22972 DF, Relator: Min. NERI DA SILVEIRA, Data de Julgamento: 18/12/1997, Data de Publicação: DJ DATA-02-02-98 P-00025)

Com relação ao princípio da separação dos poderes, necessário trazer-se à baila as lições de Sousa (1976, p. 101): 

(…) a teoria da separação de poderes, tal como foi aplicada pelo liberalismo, teve uma outra significação. Pretendeu-se estabelecer entre os poderes do Estado – o Legislativo, o Executivo e o Judiciário – esferas dentro das quais cada um atuasse com independência, fiscalizando-se mutuamente para a salvaguarda da liberdade dos cidadãos.

O grande sistematizador da teoria dos três poderes foi Montesquieu em sua icônica obra “Do Espírito das Leis”, empregando-os como técnica de salvaguarda da liberdade. Distingue Montesquieu (2012) em cada Estado três sortes de poderes: o poder legislativo, o poder executivo e o poder judiciário. A cada um desses poderes  correspondem, segundo o pensador francês, determinadas funções: Com o poder executivo, ocupa-se o príncipe ou magistrado da paz e da guerra, que envia e recebe embaixadores, estabelece a segurança e previne as invasões. Através do poder legislativo fazem-se leis para sempre ou para determinada época, bem como se aperfeiçoam ou ab-rogam as que já se acham feitas. O terceiro poder – o judiciário – pune os crimes e julga os dissídios da ordem civil. Interessa salientar que a análise da teoria dos três poderes encontra-se no Capítulo VI do Livro 11° de “Do Espírito das Leis”, intitulado de “Da Constituição da Inglaterra”. Segundo Montesquieu (2012), há um país no mundo que fez da liberdade política objeto de sua Constituição, essa nação é a Inglaterra e o princípio no qual se assenta a garantia da liberdade é a separação de poderes. Ressalta Bonavides (2010) que nessa época, na Inglaterra, formava-se o começo da experiência parlamentar de governo.

Em sua Iniciação à Teoria do Estado, Sousa (1979, p. 102) aponta o que seria um dos equívocos da separação de poderes: 

O que a experiência de um século mostrou foi que entre os dois poderes políticos – o Legislativo e o Executivo – não pode deixar de haver relações constantes, acabando sempre um por prevalecer sobre o outro. Em certas época e em alguns países, este predomínio coube ao Legislativo (parlamentarismo), mas, de um modo geral, especialmente depois da segunda guerra mundial, o Executivo, por toda parte, se afirma vigorosamente.

Nesse contexto, valoroza a lição de Temer (2008, p. 121), segundo o qual a doutrina de Montesquieu não revela apenas a distinção de funções de cada órgão do poder, mas também a atividade de contenção dos poderes entre si. Trata-se aqui “do sistema de independência entre os órgãos do poder e de inter-relacionamento de suas atividades”, fórmula do sistema de Cheks and Balances, a que alude a doutrina americana.

Conclui-se, portanto, que a teoria de tripartição do poder está longe de se relacionar com o sistema presidencialista, até porque, a própria sistematização da teoria por Montesquieu foi realizada observando um sistema de gabinete. Nessa linha, se infere que, por natureza, não há rigidez na separação de poderes. A fórmula do Cheks and Balances reforça a ideia, além disso, a própria Constituição de 1988 estatui as funções típicas e atípicas de cada poder .

Destarte, pode-se defender, como faz Bonavides (2010), que o governo presidencial, em comparação ao governo parlamentar, resulta numa separação mais rígida, pois no parlamentarismo há uma interpenetração do poder legislativo no poder executivo. Isso não quer dizer que inexiste separação de poderes em regimes de gabinete. Além disso, o que a Constituição veda, adverte Brossard em Brasil (2001, p. 56), são as propostas tendentes a abolir, não as de simplesmente modificar ou reformar a separação de poderes.

Com relação à teoria esposada de que o resultado do plebiscito criou uma barreira instransponível, vale uma análise mais percuciente.

Como já visto, o plebiscito de 1993 está previsto no ADCT – dispositivo de norma transitória da Constituição Federal, não tendo por isso aplicabilidade permanente. Segundo Bulos (2014, p. 2682), as disposições transitórias possuem natureza jurídica de normas constitucionais de eficácia exaurida e aplicabilidade esgotada, portanto o plebiscito consumiu-se no instante em que foi realizado.  

O plebiscito de 93 é dispositivo de norma transitória da Constituição Federal, não tendo por isto aplicabilidade permanente. Consumiu-se no instante em que foi realizado. A teoria da normas transitórias e das normas permanentes anula qualquer apelo contraditório a respeito da matéria no campo jurídico. (BRASIL, 2001)

Portanto, feita a escolha pelo povo, estaria exaurida a transitória previsão constitucional. Indaga-se, porém, se o exaurimento diz respeito apenas à convocação do plebiscito ou se o exaurimento se estende à própria deliberação da matéria. Na esteira dos argumentos dos impetrantes da MS 22972, que, no mérito, fora acolhida pelo ministro-relator, defendeu-se a extenção: 

Assim, de uma exegese sistêmica e lógica do Texto Supremo, se extrai que tal “revisão” só viria a ocorrer caso a decisão plebiscitária fosse favorável à monarquia e/ou ao parlamentarismo, hipótese em que a estrutura normativo-constitucional deveria, com efeito, sofrer adaptações. Mantidos, pela soberana vontade popular, o presidencialismo e a república, não se há mais de cogitar de revisão ou emenda alguma.

De forma contrária, posiciona-se Bonifácio de Andrada em relatório da CCJC que propugnou pela constitucionalidade e admissibilidade da PEC 20/1995: 

Sob o aspecto político institucional, seria um absurdo atrelar permanentemente o País a uma decisão popular de caráter momentâneo, o que representaria o engessamento da própria evolução política do País. (BRASIL, 2001)

Estando a possibilidade de deliberação exaurida, há mais uma indagação no que concerne se essa deliberação se estende ao próprio povo. Explica-se: Os legisladores constituintes originários, ao estabelecerem que a forma e o sistema de governo seriam decididos através de plebiscito, na realidade, se autoexcluíram, ao menos até a realização da consulta, do poder de reforma constitucional acerca do tema, outorgando-o diretamente ao eleitorado (BRASIL, p.113, 2001).

Questiona-se, seguindo essa linha de pensamento, se a decisão tomada em sede de plebiscito exauriu-se de tal forma que não pode ser deliberada nem mesmo pelo titular da decisão.

A Carta Magna de 1988 estatui que: “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição” (art. 1º, parágrafo único, CF). Observa-se que a questão da eficácia do plebiscito não pode ser resumida à natureza dos ADCT, pois perpassa um princípio basilar de qualquer Estado que pretenda ser Democrático de Direito, trata-se do princípio representativo.

Bulos (2014) explica que o princípio representativo é a emanação do poder que advém do povo, pois nas democracias modernas, o povo não se apresenta na função de governo, mas sim os representantes que tomam decisões em seu nome, escolhidos por meio de eleições livres e periódicas. Portanto, a conclusão de Gomes (2016) é certeira quando afirma que, sem as eleições, sequer pode-se cogitar da existência do Estado Democrático de Direito. Nela, reluz a soberania popular, afirmando-se a cidadania em toda a sua plenitude. Além das eleições, a soberania popular também será exercida mediante plebiscitos e referendos.No ordenamento jurídico pátrio, essas duas formas de participação popular nas questões de Estado divergem em virtude do momento da convocação: 

Enquanto o plebiscito é uma consulta prévia que se faz aos cidadãos no gozo de seus direitos políticos, sobre determinada matéria a ser, posteriormente, discutida pelo Congresso Nacional, o referendo consiste em uma consulta posterior sobre determinado ato governamental para ratificá-lo, ou no sentido de conceder-lhe eficácia (condição suspensiva), ou, ainda, para retirar-lhe a eficácia (condição resolutiva) (MORAES, pág. 181, 2004)

Com efeito, através do plebiscito de 1993, o povo, entidade histórica responsável pela definição dessas certas opções constitucionais, se manifestou, declarando uma determinada ideia de Direito, a manutenção de um Estado republicano e presidencialista. Fez-se uma escolha, tal escolha, é tipicamente manifestação do poder constituinte material, portanto, trata-se, indubitavelmente, de norma constitucional, sendo assim, está sujeita à alteração por meio de emenda, exceto se for verificado limitações materiais ou circunstanciais, quando, nesse caso, a deliberação é vedada. Não existem limitações matérias explícitas, pois o sistema presidencialista não foi petrificado, como bem adverte Falcão (2018), nesta Constituição, aliás, não foi petrificado em nenhuma Constituição da nossa história.

Não se verificam, assim, nos projetos apresentados, vícios materiais explícitos. O que se verifica, na verdade, é um pressuposto formal implícito face ao principio da soberania popular para validade de qualquer emenda constitucional que altere o sistema de governo. Para ser válida e eficaz, a proposta necessita de aval popular, mediante consulta consubstanciada ou em plebiscito ou em referendo.

8. Considerações Finais

 Após a promulgação da Constituição de 1988, tramitaram no Congresso Nacional quatorze PECs que visam a alterar o sistema de governo brasileiro. Sobre essas propostas, nove foram apresentadas na Câmara dos Deputados e cinco no Senado Federal. Seis propostas estão em tramitação, as demais foram arquivadas. Todas essas proposições visam a mudar o sistema de para o parlamentarismo, sendo que, apenas a PEC 309/2017 do Deputado Bonifácio de Andrada, propõe uma modificação do sistema vigente para torná-lo mais parecido com o governo de gabinete.

Em linhas gerais, observa-se em tais propostas, embora apresentado em alguns de seus relatórios como de inspiração francesa, que os modelos apresentados nos projetos são majoritariamente parecidos com o modelo alemão, até pelas similitudes existentes entre os dois modelos de estado, principalmente no tocante ao federalismo e ao bicameralismo. Também se observa a grande quantidade de projetos que concebem a adoção de moção de censura com prévia indicação de gabinete, modelo esse de origem germânico, sem contar na adoção, com diferenças eventuais, do rito de escolha do Primeiro-Ministro que precisa de chancela do parlamento através de prévia aprovação do nome ou do plano de governo. Também se verifica a possibilidade de escolha unilateral do Primeiro-Ministro pelo próprio parlamento sem anuência do Presidente.

Sabe-se que o parlamentarismo adequa-se às especificidades existentes nos respectivos países. Não existem modelos prontos de parlamentarismo, portanto, os modelos concebidos nas PECs apresentadas são adaptações dos sistemas referenciais à realidade brasileira.

Com relação às balizas jurídicas que a implantação do parlamentarismo pode ter, faz-se tal análise em duas frentes: A inconstitucionalidade material por violação à(s) cláusula(s) pétrea(s) e a inconstitucionalidade formal por eventual ausência de rito específico.

Consignou-se, com relação à inconstitucionalidade material das referidas normas, que, com as devidas vênias à decisão monocrática do Ministro Néri da Silveira em sede de Mandado de Segurança, não há violação ao art. 60 §4 º da Constituição, nem implicitamente, nem explicitamente, tendo em vista que o parlamentarismo não se encontra no rol de petrificação, aliás, nunca esteve em nenhuma constituição republicana. Na atual, nem mesmo a forma republicana goza de tal prerrogativa.

Nessa esteira, especificamente com relação à inconstitucionalidade da implantação do parlamentarismo, o que se poderia verificar seria uma eventual inconstitucionalidade formal caso a proposta não fosse sujeita à consulta popular. O que se infere, portanto, é um pressuposto formal implícito face ao princípio da soberania popular para validade de qualquer emenda constitucional que altere o sistema de governo, tendo em vista que a referida matéria já fora sujeita à consulta popular consubstanciada no plebiscito convocado em 1993. Destarte, a matéria em si é plenamente constitucional à exceção das propostas que não preveem plebiscito ou referendo.

9. Referências

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Como citar e referenciar este artigo:
GOMES, Diego Franklyn Melo. Constitucionalidade dos projetos de emenda à Constituição em tramitação que visam a instaurar o sistema parlamentar de governo no Brasil. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2018. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/constitucionalidade-dos-projetos-de-emenda-a-constituicao-em-tramitacao-que-visam-a-instaurar-o-sistema-parlamentar-de-governo-no-brasil/ Acesso em: 21 nov. 2024