A Constituição e a possível empresa Pré-Sal
Ives Gandra da Silva Martins*
A Constituição Federal hospedou, no seu Título VII, a dualidade de iniciativa, para que o Estado possa atuar no plano econômico, expressa nos arts. 173 e 175. As regras de direito privado prevalecem, no regime jurídico do art. 173, mesmo que empresas estatais dele participem, como ocorre com a Petrobrás – que é empresa estatal e segue os ditames do referido dispositivo.
No regime jurídico de prestação de serviços públicos, veiculado pelo art. 175, prevalecem as regras de direito público, embora possa haver a participação de capitais privados. Em outras palavras, o Estado pode participar, conforme a natureza da atividade, tanto no regime do art. 173, quanto na disciplina jurídica do art. 175 da lei suprema.
A exploração do petróleo e seus derivados definidos no art. 177 encontra sua conformação normativa no art. 173 da Lei Suprema, estando a empresa estatal brasileira que atua na área perfilada a seguir, rigorosamente, os preceitos delineados pelo mencionado comando maior. Tem controle acionário por parte do Governo Federal, mas atua com participação ativa do setor privado, com um sem número de acionistas particulares fortalecendo-a, visto que detém das melhores tecnologias de exploração petrolíferas no mundo.
O presidente Lula anunciou que, para explorar o pré-sal, pretende criar um nova empresa. À evidência, não pretende desfalcar, enfraquecer, debilitar os quadros técnicos e patrimoniais da Petrobrás, que há mais de 50 anos tem apresentado excelentes resultados, sendo responsável pela quase autonomia brasileira na extração e produção do precioso líquido.
Se não pretende enfraquecer a Petrobrás, terá que começar da estaca zero um tipo de exploração que a Petrobrás faria com conhecimento e capitais. Vale dizer: patinará, no início, se não pretender desestabilizar a Petrobrás em detrimento do Brasil.
Parece-me, todavia, que um óbice não técnico, mas jurídico, impedirá a criação da empresa. Como a exploração do petróleo segue o regime do art. 173 da C.F., essa empresa terá que ser constituída com todas as condicionantes do parágrafo primeiro desse dispositivo, que não lhe outorga nenhum privilégio trabalhista, fiscal, societário e concorrencial, devendo, pois, ser conformada nos moldes da Petrobrás. Não poderá fugir às regras do perfil empresarial, com o que resta afastada a possibilidade de todos os lucros serem aplicados em função dos humores governamentais.
Vejo dificuldades no projeto da nova empresa, que há de ser criada por lei, ter o aval legislativo, como, aliás, o Senador Dornelles, constituinte que foi, já alertou o Congresso Nacional.
Por enquanto, prefiro não acreditar numa recaída estatizante do Presidente Lula- pressionado pelos seus colegas, aprendizes de ditadores (Chavez e Morales) -, nem que pretenda prejudicar os acionistas da Petrobrás, que, pela Lei atual, teriam o direito (Estado majoritário, acionistas minoritários) de beneficiar-se da pesquisa conduzida até agora por essa empresa, com sua alta tecnologia e eficácia.
Esta é outra questão que merece reflexão do Presidente e de todos os brasileiros.
* Professor Emérito das Universidade Mackenzie e UNIFMU e da Escola de Comando e Estado maior do Exército. Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, da Academia Paulista de Letras e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Site: http://www.gandramartins.adv.br
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