Laísa Santos
É certo e incontroverso que todo o projeto afetivo, inclusive, o casamento, tende, naturalmente, à ideia de permanência. Não há casamento que seja celebrado pensando em sua dissolução.
No entanto, é preciso observar que, muito mais relevante do que a manutenção do casamento, com o sacrifício da felicidade dos cônjuges, é o respeito à liberdade, a autonomia e as garantias individuais.
Cessando o afeto e a intenção de um projeto de vida em comum, surge, para cada parte, o direito de dissolver a união matrimonial.
Breve histórico sobre separação e divórcio
Na estrutura do Código Civil de 1916 e nas constituições passadas, o casamento era indissolúvel. Motivado por uma pressão social bastante relevante, o ordenamento jurídico pátrio, com o advento da Emenda Constitucional n. 9, de 28 de junho de 1977, permitiu a realização do divórcio, como causa de dissolução nupcial.
Naquela época, foi permitido o divórcio após cinco anos de separação prévia. Ou seja, o casal tinha que, primeiramente, buscar a separação judicial e, após este elástico prazo, voltar ao juiz para obter o divórcio.
Com a evolução da sociedade e das relações familiares e conjugais, a Constituição Federal de 1988 reduziu os prazos e formalidades, permitindo o divórcio após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei ou na hipótese de comprovação da separação de fato por mais de dois anos.
Somente em 2010, com a Emenda Constitucional 66/2010, houve a alteração do artigo constitucional, suprimindo a necessidade de prévia separação judicial ou de fato para fins de divórcio, acabando também com a discussão sobre a culpa pelo fim do relacionamento. Neste cenário, foi possibilitado o divórcio direto, tornando-se um mero exercício da autonomia privada, sem prazo contemplado em lei e independentemente da vontade da outra parte.
Qual é a diferença entre separação e divórcio?
Em outras palavras, a separação põe fim à sociedade conjugal. Isso significa dizer que, depois de separada, a pessoa deixa de ter que cumprir com os deveres conjugais, como a fidelidade recíproca e a coabitação. Da mesma forma, os bens adquiridos em momento posterior à separação também não serão partilhados, independentemente do regime de bens adotado no casamento.
Atente-se que, apesar do fim da sociedade conjugal, a separação não extingue o vínculo matrimonial. Desta forma, as pessoas separadas estão impedidas de se casarem novamente até que realizem o divórcio.
Por sua vez, o divórcio extingue tanto a sociedade conjugal quanto o vínculo matrimonial.
Nos dias atuais e, diante da simplificação do processo para findar o vínculo matrimonial, a separação é bem pouco utilizada.
Mas afinal, ainda existe separação no sistema jurídico brasileiro?
Embora muito pouco utilizada, a separação ainda é prevista na legislação pátria. Contudo, admitida a tese de supressão da separação no ordenamento jurídico brasileiro – visto que, muitos doutrinadores, entendem não mais existir tal instituto – situações bastante relevantes surgem, trazendo controvérsias jurídicas.
Primeiro, é relevante destacar a preservação do estado civil das pessoas que já estão separadas, em juízo ou em cartório. Com isso, ainda que a separação não mais exista, as pessoas que estão separadas, seja por decisão judicial ou por escritura pública, permanecerão com o estado civil de separadas, submetidas às obrigações pactuadas quando da dissolução da sociedade conjugal.
Neste caso, nada impedirá que, a qualquer tempo, as pessoas separadas venham a se divorciar, seja consensual ou litigiosamente.
Um segundo ponto que merece destaque é sobre a situação dos processos de separação em andamento. Entende-se que, havendo processo de separação ainda em andamento, sem a prolação de sentença (decisão final proferida pelo juízo), deve o juiz, de ofício ou a requerimento do interessado, intimar a parte para retificar o pedido para divórcio, ao invés da separação.
Por fim, considerando que se manterá integro o estado civil de separado em relação às pessoas que obtiveram separação, é de se afirmar a possibilidade de reconciliação, a qualquer tempo, restabelecendo o casamento, conforme expressamente previsto na legislação. Havendo incapazes (como, por exemplo, filhos menores), a reconciliação deverá ser, necessariamente, via judicial.
E a separação de corpos?
Mantida, ou não, a separação em nosso sistema jurídico, continua sendo uma possível medida a separação de corpos, como um mecanismo de proteger a dignidade das pessoas que vivem uma relação afetiva.
Trata-se, na verdade, de um afastamento temporário (que poderá ser convertido em definitivo, através do divórcio) de um dos cônjuges do lar do casal, obstando uma convivência que pode afrontar a integridade física, psíquica, intelectual, patrimonial ou sexual de um deles.
A sua concessão está ligada ao risco de desentendimentos graves, geradores de violência ou com possibilidades de agressões físicas ou mesmo morais, quando os cônjuges ainda estão sob o mesmo teto e a situação torna-se insustentável. A tutela visa proteger não só um dos cônjuges, como também os filhos, tanto física como psicologicamente. Ela se faz necessária, na maioria das vezes, por violências e pressões psicológicas entre pessoas que coabitam a contragosto.
O deferimento desta medida levará em conta, tão somente, o simples esfacelamento da afetividade, independentemente da prova efetiva de ocorrência de dano à integridade física ou psíquica de um dos esposos, dos filhos ou de terceiros agregados ao lar conjugal.
Ressalta-se que a medida tem cunho eminentemente preventivo, devendo ser adotada para evitar futuro atentado contra a personalidade das pessoas que habitam a residência do casal.
É possível a decretação do divórcio de maneira imediata?
Sim! Em 2020, ganhou destaque nas redes sociais uma decisão proferida por uma das varas de família da comarca de São Paulo que deferiu, liminarmente, um pedido para decretar o divórcio de maneira imediata, antes mesmo da ciência da outra parte sobre a existência do processo.
Na decisão, o juiz argumentou que o divórcio independe de qualquer condição, bastando tão somente a vontade de um dos cônjuges. De lá pra cá, inúmeras foram as decisões proferidas pelos tribunais do País, decretando, liminarmente, o divórcio entre os cônjuges.
Ainda, diante da pandemia ocasionada pelo novo coronavírus, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou, em junho do ano passado, o Provimento n. 100, que trata, dentre outros assuntos, da possibilidade do divórcio virtual, simplificando ainda mais o desfazimento do vínculo matrimonial – desde que, claro, preenchido os requisitos para a sua realização.
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