RESUMO: A presente pesquisa aborda a possibilidade de responsabilização internacional do Estado por dano ambiental, bem como a utilização das responsabilidades objetiva ou subjetiva para verificar a responsabilidade internacional por dano ao meio ambiente, observando qual tipo de responsabilidade é potencialmente mais eficaz na reparação do dano. Para tanto, realizam-se considerações atinentes ao histórico do Direito Internacional Ambiental, expondo-se os princípios dele, adentrando-se em seguida no tema central, a responsabilidade internacional do Estado por dano ambiental, dissecando seu conceito, características, elementos, enveredando por uma análise das excludentes de ilicitude, após ressaltarem-se as responsabilidades subjetiva e objetiva, observando-se que, no campo da responsabilidade internacional dos Estados por dano ambiental, a teoria objetiva é mais segura, abordando também, um breve estudo sobre a reparação do dano. Exibem-se ainda as fontes do Direito Internacional Ambiental, analisando cada uma individualmente, observando sua conexão direta com a responsabilidade internacional do Estado por danos ao meio ambiente, finalizando com a conclusão da existência da possibilidade de responsabilização internacional dos entes estatais por danos ambientais, bem como a maior eficácia da responsabilidade objetiva em relação à subjetiva quando se trata de lesões ao meio ambiente.
Palavras-chave: Responsabilidade. Internacional. Estados. Dano. Meio. Ambiente.
ABSTRACT: This research approaches the possibility of international responsabilization of the State for environmental damage, such as the utilization of the subjective and objective responsibility to verify the international responsabilization for environmental harm, observing which type of responsabilization is potentially more efficient in the reparation of the damage. To achieve that purpose, will be made some considerations concerning the International Environmental Law historical, exposing the principles of it, later on, go within the central subject, the international responsibility of the State for environmental damage, dissecting the concept, characteristics, elements, analyzing the illicit excludes, after accentuate the subjective and objective responsibilities, observing that in the field of the international responsibility of the States for environmental damage, the objective theory is more safe, approaching yet, a brief study about damage reparation. Exhibits yet the fonts of the Environmental International Law, analyzing itch one individually, observing the direct connection with the international responsabilization of the State for environmental damage, finalizing with a conclusion of the existence of the possibility of international responsabilization of the state parts for environmental damage, such as the major efficient of the objective responsabilization compared to the subjective when it is about harm to the environmental.
Key-words: Responsibility. International. States. Damage. Environmental.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 DIREITO INTERNACIONAL AMBIENTAL. 1.1 BREVE HISTÓRICO DO DIREITO INTERNACIONAL AMBIENTAL. 1.2 PRINCÍPIOS DO DIREITO INTERNACIONAL AMBIENTAL. 2 A RESPONSABILIDADE. INTERNACIONAL DO ESTADO POR DANO AMBIENTAL. 2.1 CONCEITO DE RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL. 2.2 CARACTERÍSTICAS DA RESPONSABILIDADE. 2.2.1 PROTEÇÃO DIPLOMÁTICA. 2.3 ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL. 2.3.1 ATO ILÍCITO. 2.3.2 RESPONSABILIDADE POR ABUSO. 2.3.3 NEXO CAUSAL OU DE IMPUTABILIDADE. 2.3.4 DANO. 2.4 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. 2.5 RESPONSABILIDADE OBJETIVA. 2.6 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE. 2.7 A REPARAÇÃO DO DANO. 3 FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL AMBIENTAL. 3.1 CONVENÇÕES INTERNACIONAIS (TRATADOS). 3.2 COSTUME INTERNACIONAL. 3.3 PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO RECONHECIDOS PELAS NAÇÕES CIVILIZADAS. 3.4 DECISÕES JUDICIAIS. 3.5 ENSINAMENTOS DOS DOUTRINADORES QUALIFICADOS. 3.6 RESOLUÇÕES DA ONU. 3.7 AS SOFT LAWS . CONCLUSÃO.
INTRODUÇÃO
O tema abordado na presente pesquisa é de extrema relevância para a sociedade como um todo, de influência direta no futuro da humanidade.
A metodologia utilizada neste trabalho será a pesquisa cientifica por meio de doutrina de autores renomados, a pesquisa por meio eletrônico utilizando a internet, bem como periódicos, artigos e trabalhos científicos, em um texto exegético do material coletado.
Desde os primórdios tempos da industrialização, passando pela globalização, até o desenvolvimento científico e tecnológico atuais, lado a lado com a cada vez mais crescente capacidade comercial dos Estados, cobrou-se um preço muito alto pelo progresso: a degradação do meio ambiente.
Obtendo projeção internacional na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, em Estocolmo, Suécia, que proclamou o direito ao meio ambiente como direito fundamental da pessoa humana, a degradação ambiental tornou-se centro de preocupação de todas as nações, independentemente de seu grau de desenvolvimento, buscando através de um número razoável de tratados e convenções, limitarem o avanço da deterioração constante, que se torna um problema ainda mais grave ao experimentar-se suas agressivas consequências, vislumbrando-se sombrias previsões científicas.
Este estudo tem por objetivo averiguar os seguintes problemas: existe a possibilidade de responsabilização internacional do Estado por dano ambiental? Qual das duas responsabilidades, subjetiva ou objetiva, é potencialmente mais eficaz para aplicação da responsabilização do Estado no dano ambiental?
Na esfera internacional, que trata deste assunto, durante muito tempo, mostrou-se falha, principalmente pelo fato de que, no cenário internacional, não existe um poder central capaz de forçar o agente causador do dano a repará-lo, sem que ele intervenha diretamente na soberania dos atores internacionais.
Tem-se também a pretensão de analisar o delicado tema de que tipos de sanção e reparação podem ser cobrados de entes soberanos como os Estados, sem colocar em risco sua soberania.
A escolha do tema justifica-se pelo interesse e curiosidade em questões ambientais, e determinantemente influenciada pelos recentes acontecimentos no Golfo do México, quando uma explosão da plataforma de petróleo Deepwater Horizon, da britânica British Petroleum despejou milhares de barris de petróleo no oceano, em um dos piores desastres naturais da história humana, provocando danos irreparáveis ao ecossistema, de consequências desconhecidas, mas certamente danosas, que se propagarão por décadas, no qual se questiona: tais consequências são passíveis de responsabilização? Se possível, como se dá a reparação?
A pesquisa divide-se em três partes, abordando primeiramente o “Direito Internacional Ambiental”, que trata brevemente da história do Direito Internacional Ambiental, adentrando em seu desenvolvimento no período pós-Segunda Guerra Mundial e sua evolução dentro do século XX, destacando a realização da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, que marcou definitivamente a preocupação com o meio ambiente em escala internacional, citando acidentes ecológicos que influenciaram diretamente a opinião pública, formando a consciência de que os recursos naturais, se não aproveitados com razoabilidade e prudência, tendo a precaução e a prevenção como expoentes, podem acabar.
Ainda neste capítulo, abordam-se os princípios do direito internacional ambiental, segundo a doutrina de José Juste Ruiz, desmembrando cada um deles, que são fundamentais ao ordenamento jurídico e grandes norteadores tanto para a organização de legislação sobre o tema, como a aplicação às situações a ele relacionadas.
Adentrando no tema “A Responsabilidade Internacional do Estado por Dano Ambiental”, conceitua-se e caracteriza-se a Responsabilidade Internacional do Estado, aprofundando-se na questão da proteção diplomática e da relação direta que tal questão tem com o direito internacional ambiental, analisando as características e elementos da responsabilidade internacional, conceituando-se em seguida as responsabilidades subjetiva e objetiva, expondo sua aplicação na responsabilidade internacional ambiental, bem como sua adoção ao responsabilizar um Estado por um ato ilícito, ou lícito que tenha consequências danosas a outro Estado, elencando, além disso, as excludentes de responsabilidade possíveis e o peso de sua admissão quando se trata de Direito Internacional Ambiental, bem como a impossibilidade de não admiti-las nesse ordenamento jurídico, completando com a análise de cada forma de reparação do dano, elencando decisões judiciais internacionais relacionadas a algumas dessas formas em casos concretos de dano ambiental, verificando-se a aplicabilidade de alguns módulos de reparação dentro dele.
Quanto ao último capítulo, expõem-se as “Fontes do Direito Internacional Ambiental” dissecando esses instrumentos essenciais para a elucidação dos casos concretos, mencionando individualmente cada uma das fontes, desde as Convenções Internacionais (Tratados), passando pelo Costume Internacional, analisando os Princípios Gerais do Direito Reconhecidos pelas Nações Civilizadas, além das relevantes Decisões Judiciais, estendendo-se pelos Ensinamentos de Doutrinadores Qualificados, abordando as Resoluções da Organização das Nações Unidas (ONU) e finalmente expondo as polêmicas soft laws.
Encerra-se com as considerações finais, apresentando a conclusão em relação às hipóteses aqui levantadas, sobre a possibilidade de responsabilização do Estado por dano ambiental, bem como a mais eficaz forma, para o meio ambiente, de aplicar essa responsabilidade, seja subjetiva ou objetivamente.
Observa-se que a presente pesquisa não tem o intuito de adentrar no instituto da Responsabilidade Civil no direito interno, delimitando seus objetivos no âmbito da Responsabilidade Internacional do Estado, bem como não se pretende analisar a Responsabilidade Criminal, que embora reconhecidamente significante, não foi objeto deste trabalho, eximindo-se da pretensão de elucidar todas as questões relacionadas ao extenso tema, trazendo solução por meio de posicionamentos doutrinários para a problemática apresentada.
1 DIREITO INTERNACIONAL AMBIENTAL
1.1 BREVE HISTÓRICO DO DIREITO INTERNACIONAL AMBIENTAL
O Direito Internacional Ambiental surge ao longo do século XX, desenvolvendo-se no período pós-Segunda Guerra Mundial, juntamente com a intensificação da proteção internacional dos direitos humanos, ao se estabelecer uma consciência ecológica da opinião pública internacional, que se deparou com o vislumbre de um ecossistema ameaçado, observando sua influência e impacto sobre a coletividade, começando a clamar por uma tutela específica que tratasse exclusivamente do meio ambiente.
O Direito Internacional Ambiental, de tal forma, tornou-se uma resposta a esse clamor, e, à medida que os problemas ambientais se tornaram mais graves, e os prognósticos dos cientistas levavam à necessidade de “prevenção” e “precaução”, a noção da importância delas passou a exigir mais da tutela ambiental, que se concentrava na reparação do dano já consumado, observando-se a imprescindibilidade de uma tutela específica, e esta tomou forma com o Direito Internacional Ambiental, como elenca Guerra (2006, p. 06):
“O direito internacional ambiental é derivado de um processo de expansão do direito internacional moderno, que não trata apenas de fronteiras, como o direito internacional clássico, mas também de problemas comuns, processo típico de um período de globalização jurídica”.
Entendimento que Soares (2003) sabiamente perpetua, ao mencionar os traços característicos do direito internacional do meio ambiente e sua distinção da política internacional, da ciência e da tecnologia, e como os mesmos se refletem na qualidade de suas normas.
Apesar de não englobar todos os aspectos ambientais, algumas convenções internacionais afirmam tal responsabilidade, ao regularem atividades de risco em alguns casos específicos, que Arantes Neto (2007, p. 209), explica:
“No contexto de proteção internacional contra o dano ambiental, a responsabilidade internacional por ato lícito afirma-se, de forma clara e específica, em algumas convenções internacionais que regulam atividades de risco […]”.
Observa-se por meio dos doutrinadores que o Direito Internacional Ambiental busca a solução ou amenização dos problemas enfrentados atualmente por toda a sociedade global dentro da questão do meio ambiente, tentando prover, por meio de tratados internacionais, entre outros, a tutela ambiental, seja por padrões ambientais determinados, seja por leis específicas e internas, ou os princípios do Direito Internacional Ambiental observados por diversos países, estabelecendo reparação ou compensação pelo dano ambiental sofrido por um indivíduo ou pelo Estado, harmonizando as leis nacionais dos Estados relacionadas ao assunto, em âmbito global, que Sunkin, Ong e Wight (2001, p. 2-3) apontam:
“O direito internacional ambiental é um ramo relativamente novo de direito internacional. É geralmente aceito que um verdadeiro movimento ambiental internacional, em termos globais, apenas começou em 1972, na realização da Conferência sobre o Meio Ambiente Humano em Estocolmo, o qual gerou a agora famosa Declaração de Estocolmo. À parte de tais instrumentos globais, muito da lei é encontrado no florescente número de tratados ambientais que tem sido, ou são, estabelecidos para responder a algum problema ambiental em particular. Alguns desses problemas têm estado entre nós por um tempo, outros são mais recentes. Todos agora requerem ação imediata. Outro aspecto importante do direito internacional ambiental é a sua natureza específica de muitos tratados ambientais modernos. Esses requerem ambos detalhadas regulamentações conforme são contrárias a amplas orientações para combater efetivamente e leis explícitas, as quais são não obstante suscetíveis a simples procedimentos de reforma quando novas informações científicas, como por exemplo, estão disponíveis. Em muitos casos existe a necessidade de cooperação internacional na identificação, monitoramento e prevenção ou controle do problema ambiental em questão. Esses fatores significam que negociações de novos tratados são muito prováveis de ser uma técnica mais efetiva para mudanças legais do que a confiança no normalmente lento crescimento de opinio júris e a máquina estatal darem origem a novas regras de costume das leis internacionais. O resultado é mais codificado do que o prevalecimento das regras acumuladas. [1] [tradução nossa]”
Segundo Freitas (2007), pode-se dizer que o primeiro instrumento que marcou definitivamente a preocupação de âmbito internacional com a proteção ambiental, ocorreu em 1972, na cidade de Estocolmo, Suécia, quando foi realizada a primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, motivada pelo clamor da sociedade diante de uma série de acidentes ecológicos de grandes proporções ocorridos em diversas partes do mundo, desde os idos dos anos 30, como famoso Caso da Fundição Trail, que se aborda mais à frente, até os anos de 1950 e 1970, com os casos de intoxicação por mercúrio de pescadores e suas famílias, em Minamata, no Japão.
Realizada a Conferência, apesar de ser extremamente marcada pela forte divergência entre as percepções ambientais e os interesses econômicos dos Estados, ela contribuiu de forma direta e historicamente para que o meio ambiente conquistasse a atenção da comunidade internacional, dando ênfase à urgente necessidade de criar-se um sistema de proteção internacional do meio ambiente, conforme muito bem observa Reis (2010, p. 9):
“Conclui-se, portanto, que a Declaração de Estocolmo de 1972 […] foi responsável por tornar o meio ambiente uma questão global. […] A Declaração de Estocolmo foi ainda o ponto de partida para o desenvolvimento do direito internacional do meio ambiente como um campo autônomo dentro do direito internacional, e abriu as portas para o surgimento de diversos tratados versando sobre matéria ambiental, além de declarações universais, como a Carta da Natureza, adotada em 1982, pela Assembléia-Geral da Organização das Nações Unidas.”
Iniciou-se assim, uma verdadeira expansão da consciência ambiental, consequentemente fazendo crescer a quantidade de tratados e convenções, além de outras conferências, que versavam sobre o assunto e consolidando permanentemente diversas normas e princípios de natureza ambiental, consagrados no âmbito do ordenamento jurídico internacional, como se demonstra no próximo tópico.
2.2 PRINCÍPIOS DO DIREITO INTERNACIONAL AMBIENTAL
Como todo ramo do direito, é necessário analisar cada um dos princípios adotados dentro do Direito Internacional Ambiental. Notadamente esta pesquisa adotará a classificação exposta por Ruiz (2000) na qual afirma que são sete os princípios do Direito Internacional Ambiental:
a) princípio da cooperação internacional para a proteção do meio ambiente;
b) princípio da prevenção do dano ambiental transfronteiriço;
c) princípio da responsabilidade e reparação de danos ambientais;
d) princípio da avaliação do impacto ambiental;
e) princípio da precaução;
f) princípio do poluidor-pagador;
g) princípio da participação cidadã.
O princípio da cooperação internacional para a proteção do meio ambiente é uma ramificação do princípio da cooperação internacional e a responsabilidade comum, mas diferenciada, que teve dinamização em 1945, com o estabelecimento da ONU, que em sua Carta coloca como um de seus principais propósitos o processo de cooperação internacional.
A cooperação internacional tem a possibilidade de ser vista como um importante instrumento para os temas atuais que necessitam do consenso dos Estados para a produção de diretrizes normativas, do qual tanto se carece na atualidade. Analisando-se sob este ponto de vista, tal cooperação é fundamental para a proteção do meio ambiente em sua forma global, pois tal princípio possibilita o desenvolvimento de ações e da estruturação necessária para adoção e aplicação de políticas via tratados internacionais objetivando a proteção ambiental, que podem ser encontrados em alguns instrumentos conhecidos, como a Declaração de Estocolmo em 1972, na Convenção da ONU sobre o Direito do Mar, em 1982 ou a Declaração do Rio, em 1992.
Já o princípio da prevenção do dano ambiental transfronteiriço foi estabelecido pelo famoso “Caso da Fundição Trail” (Trail Smelter Case), caso que é apontado, conforme Arantes Neto (2007) e grande parte da doutrina estudada como a primeira manifestação do Direito Internacional do Meio Ambiente quanto às relações bilaterais resultando de um acordo de arbitragem que visava solucionar uma reclamação dos Estados Unidos contra o Canadá, que ocasionava dano de poluição transfronteiriça suportada por pessoas, animais e bens em parte do Estado de Washington devido à poluição de dióxido de enxofre produzida por uma fundição de zinco e chumbo de uma empresa particular canadense, levada por correntes de ar que traziam partículas e a fumaça tóxica (dióxido de enxofre).
Na decisão arbitral proferida pelo Tribunal Arbitral, que ocorreu em março de 1941, tendo o caso se iniciado em 1935, reconheceu-se o direito do Estado que, conforme Nascimento Silva (2002) “tem sempre o dever de proteger outros Estados contra atos injuriosos praticados por indivíduos dentro de sua jurisdição”, confirmando a existência de uma obrigação de reparação por parte de um Estado diante de um dano causado a outro Estado.
Adentrando-se no princípio da responsabilidade e reparação de danos ambientais, pode-se observar que tal princípio é amplamente distribuído dentro da prática do Direito Internacional Ambiental, no entanto existem diversas discussões e discordâncias quanto à natureza e alcance da responsabilidade em si, conforme Ruiz (2000) “a maior parte dos instrumentos jurídicos internacionais somente cita esta responsabilidade, em um tom essencialmente exortatório […]”.
Analisando o princípio da avaliação do impacto ambiental, observa-se que ele consta em diversos ordenamentos ambientais internos, tendo importância na esfera internacional, e se encontra, entre outros, dentro da Declaração do Rio.
Percebe-se que o princípio da precaução observa a recomendação de uma atuação cautelosa e preventiva relativas às intervenções ao meio ambiente, e que, na dúvida, deve-se decidir em favor do meio ambiente, o que foi adotado na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada no Rio de Janeiro em 1992, em seu item 15, que visa proteger o meio ambiente, observando o princípio da precaução.
O princípio do poluidor-pagador, que também é conhecido como princípio do poluidor usuário, pode ser definido em sua aplicação, segundo Antunes (1998) como uma espécie de “princípio de responsabilidade”, sendo um princípio que tem o objetivo de fazer com que o poluidor seja punido por suas omissões ou ações que porventura tenham prejudicado de alguma forma o meio ambiente, visando à recuperação da degradação realizada,
Finalmente, no princípio da participação cidadã, que está incrustado, sobretudo nos sistemas de direito interno, assim como, obviamente, no ramo do Direito Internacional Ambiental, pois tal participação sempre dependerá dos ordenamentos internos, visando uma ação conjunta entre todos os que estão comprometidos com os interesses difusos e coletivos da sociedade, em especial com a causa ambiental.
3 A RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL DO ESTADO POR DANO AMBIENTAL
3.1 CONCEITO DE RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL
Como bem elenca Reis (2010), “A responsabilidade pode ser definida como o dever de reparar o dano causado a terceiros, por atos ilícitos culposos ou dolosos”, vislumbrando tal definição no âmbito do direito interno, ele pode ser aplicado no plano internacional, sendo tal responsabilidade um instituto jurídico no qual um Estado que pratica um ato culposo ou doloso, no âmbito do Direito Internacional, prejudicando outro Estado, deve a este uma reparação.
A definição de para a responsabilidade internacional do Estado é fixada Ramos (2004, p. 74):
“[…] a responsabilidade internacional do Estado é uma relação jurídica, qualificada como sendo instituição, princípio geral do direito, obrigação jurídica ou mesmo situação jurídica pela doutrina e jurisprudência, na qual o Direito Internacional justamente reage às violações de suas normas, exigindo a preservação da ordem jurídica vigente.”
Não existe autoridade suprema no plano internacional, portanto, os Estados, conjuntamente e em pé de igualdade, são os que editam tais normas, e, devido a esse fato, muitas vezes a reparação pelo ilícito, ainda que configurado, fica inviabilizada, observando Reis (2010, p. 33).
“[…] responsabilidade internacional do Estado relaciona-se às consequências que o direito internacional atribui ao descumprimento, por um Estado, de normas de direito internacional a que, em geral, ele próprio se submeteu. O descumprimento de ditas normas, por sua vez, configura, em regra, ilícito internacional.”
Conforme elenca Roessing Neto (2006), um Estado pode ser responsabilizado por desobedecer a normas de Direito Internacional, entendendo que tal alegação é inverídica, provavelmente se submeterá a um processo judicial, a ser julgado por um tribunal arbitral, concordando com a alegação, provavelmente tentará solucionar o conflito negociando com o Estado afetado.
Mazzuoli (2004) pontua que o surgimento da teoria moderna da responsabilidade internacional ficou marcado quando, em Jerusalém, nos anos 40, um grupo terrorista assassinou um mediador e um observador franceses, após o estabelecimento do Estado de Israel. Como diversos outros agentes internacionais sofreram severos danos pessoais foi apresentada uma reclamação à ONU, que solicitou um parecer à Corte Internacional de Justiça, que opinou afirmando que a reclamação da organização internacional não poderia ser confundida com a apresentada pelas vítimas, e que a ONU, um sujeito de direito internacional, possuindo personalidade jurídica distinta, detinha o poder de oferecer uma reclamação internacional.
O professor Soares (2003) observa, no entanto, que a Comissão de Direito Internacional da ONU (CDI) já apontava em sua agenda de trabalhos desde 1944 uma programação de estudos de normas que tratassem de responsabilidade internacional do Estado, até que, finalmente em 1955, o Professor Garcia Amador iniciou o estudo tratando, em seis relatórios, de questões relacionadas à responsabilidade dos Estados por danos a pessoas ou bens estrangeiros. Esses trabalhos foram suspensos durante um tempo, devido aos posicionamentos divergentes sobre o tema, que se ateve a apenas tratar dos danos causados a estrangeiros, observando que esses são uma ínfima parte dos casos em que a responsabilidade internacional surge, sendo nomeado, então, em 1963, o relator da Comissão, Professor Robert Ago.
Foi ele quem fixou as bases dos futuros projetos sobre responsabilidade internacional, em oito relatórios, sendo estes aceitos pela CDI, constituindo a primeira parte do projeto sobre responsabilidade internacional dos Estados. Outros sete relatórios foram apresentados pelo substituto de Robert Ago, Willem Riphagen, que examinou a segunda e terceira partes do projeto original, redigindo os cinco primeiros artigos da segunda parte, também adotados pela CDI. Depois, seu substituto, Gaetano Aranjo-Ruiz redigiu os arts. 6º a 14 da segunda parte do projeto, que foram aprovados, outros seis artigos e um projeto para a terceira parte, que a CDI não examinou.
Em 1996, James Crawford, novo relator, redigiu o texto do primeiro projeto de convenção internacional sobre responsabilidade internacional do Estado, acrescentando as partes faltantes e sendo aprovado na 48ª sessão da CDI, contando o projeto com 58 artigos que elencam desde o nascimento da responsabilidade, até seus elementos e formas de exoneração, bem como formas e graus da responsabilidade internacional do Estado, a implementação da responsabilidade internacional observando a aplicação de sanções e dispositivos em geral, sendo que, no caso da responsabilidade internacional por danos causados por atos não proibidos, a CDI a tem em sua agenda como tema prioritário, resultando de tal agenda uma proposta sobre o assunto com 33 artigos.
É importante frisar, no entanto, que o projeto que fala especificamente sobre a responsabilidade internacional do Estado por ato lícito foi aprovado em 2001, dependendo, porém de assinaturas e adesões.
Atualmente, verifica-se a tendência progressiva de certa restrição da faculdade do Estado ofendido em aplicar unilateralmente medidas repressivas ao Estado ofensor, incentivando a aplicação de sanções de natureza econômicas a infrações mais leves, observando que tal tendência se justifica na cooperação contemporânea entre os Estados, os quais buscam juntos, paz e desenvolvimento de todos, objetivos os que não estariam em harmonia com sanções impostas por Estados, unilateralmente. Sendo assim, para se pedir reparação, em regra deve existir a aplicação de uma sanção, a ser evitada pelo Estado ofensor, se este, justa e adequadamente, reparar o dano.
De fato, ainda hoje é frágil a existência da responsabilidade internacional do Estado, devido à ausência de um poder central na sociedade internacional além de organismos de atuação estatal mais eficaz. No entanto, é um meio essencial para a reparação de danos suportados por um Estado devido a ações executadas por outro, tendo o intuito de compelir os Estados a cumprirem compromissos internacionais e reparação justa àquele prejudicado.
3.2 CARACTERÍSTICAS DA RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL DO ESTADO
Conforme pesquisado, a responsabilidade internacional dos entes estatais tem em seu fundamento básico, a vinculação deles à efetiva realização dos compromissos assumidos no plano internacional, tendo como objetivo principal a reparação de um dano causado por um Estado, em função de um ato ilícito praticado por este, contra outro.
De acordo com Reis (2010), a CDI fundamentou a caracterização da responsabilidade nos conceitos de normas primárias e secundárias, sendo que as normas primárias são formadas por obrigações de direito internacional que sendo descumpridas, geram obrigações de reparação ou aplicação de sanções, formando esta a obrigação secundária, observando que o sentido final da obrigação secundária é o de substituir a obrigação primária, ou seja, reparar os danos causados ou a aplicação de pena que inibe o Estado infrator a se precaver e não cometer o ato novamente.
Tal posição, no entanto, é oposta ao posicionamento de Kelsen (1987) que discorda do conceito de normas primárias e secundárias, entendendo que a noção de regra jurídica é vista como um princípio operante de conexão de um ato de coerção a uma situação material, sendo assim, a consequência jurídica será única, somente a sanção, conforme Kelsen (1987, p. 128):
“Se o Direito é concebido como ordem coercitiva, uma conduta apenas pode ser considerada como objetivamente prescrita pelo Direito e, portanto, como conteúdo de um dever jurídico, se uma norma jurídica liga à conduta oposta um ato coercitivo como sanção. […]. A afirmação de que um indivíduo é juridicamente obrigado a uma determinada conduta é idêntica à afirmação: uma norma jurídica prescreve uma determinada conduta ligando à conduta oposta um ato coercitivo como sanção.”
Ainda segundo Reis (2010), em relação às obrigações secundárias, existem três posicionamentos doutrinários diversos. Enquanto a doutrina clássica considera que o descumprimento da obrigação primária gera a obrigação de reparação pelos danos causados, outra corrente se ampara na possibilidade de adoção, pelo Estado lesado, de medidas coercitivas a fim de obter o cumprimento da obrigação, enquanto uma terceira corrente defende que a violação de uma obrigação internacional dá origem ao direito do Estado ofendido obter reparação ou impingir uma punição.
Na atualidade, a tendência do direito internacional é restringir o direito do Estado ofendido em escolher sanções, emergindo o entendimento de que a reparação preceda a sanção, ainda que esta seja, teoricamente, permitida.
Além dessas, uma das principais características da responsabilidade internacional do Estado é que ela se opera sempre de Estado para Estado, ainda que a vítima seja um indivíduo ou o ato causador do dano tenha sido praticado por uma pessoa, sendo necessário que o Estado da vítima endosse a reclamação, e, por meio desse endosso, o Estado se torna parte da lide, substituindo o indivíduo.
Necessário frisar-se que, com a projeção da proteção internacional dos direitos humanos, entre os quais se insere o direito ao meio ambiente, existe uma disposição cada vez maior de acesso do indivíduo sem intervenção estatal às cortes internacionais, observando Reis (2010, p. 45):
“[…] a liberação do acesso do indivíduo às cortes internacionais sem necessidade de endosso do Estado favorecerá em muito a proteção do meio ambiente, na medida em que este é considerado um direito humano fundamental e o livre acesso do indivíduo para reclamar sua proteção evita a ocorrência de entraves burocráticos e políticos […] “
Ressaltando tal evolução, Soares (2003) adiciona que a possibilidade do desaparecimento da necessidade de endosso estatal para que a reclamação do indivíduo chegue às cortes ou tribunais arbitrais internacionais é real, corroborada por exemplos como o direito dos indivíduos na Comunidade Europeia reclamarem diretamente à Corte da Comunidade pedindo anulação de medidas tomadas pela Comunidade Europeia que contrariem seus direitos, entre outros.
3.2.1 PROTEÇÃO DIPLOMÁTICA
Conforme exposto, o individuo não possui personalidade jurídica para propor reclamação internacional, portanto é necessário que o Estado endosse sua reclamação, tornando-se parte na lide. Por meio da proteção diplomática, o Estado endossa a reclamação de seu nacional, vítima do dano provocado por Estado estrangeiro, objetivando obter uma reparação.
Tal endosso dá controle ao Estado para que se torne responsável pela ação, à revelia do particular lesado, devendo a indenização que porventura sobrevier da lide pertencer ao Estado, podendo, no entanto, haver normas de direito interno que legislem sobre um ressarcimento ao indivíduo.
Apesar de ser facultativo aos indivíduos o pedido de proteção diplomática do Estado, eles não possuem o direito à sua aquisição. A concessão ou não de tal endosso é um ato discricionário do Estado, que pode negar ou conceder a proteção, além de poder concedê-la à revelia do indivíduo, sem necessidade de pedido, como por exemplo, se um cônsul ou diplomata tem notícia de lesão do direito de algum nacional do Estado que representa, costuma agir à revelia da vítima, sem precisar que esta requeira a proteção do Estado, agindo de imediato.
Para que ocorra o endosso do Estado a um pedido de algum nacional, é necessário que ele seja pessoa física ou jurídica do Estado reclamante, que tenha esgotado todos os recursos internos possíveis e disponíveis para a garantia de seus direitos e não ter agido com culpa ou colaborado para o evento danoso. Tal medida é necessária para uma proteção maior das relações jurídicas internacionais, conferindo ao nacional o direito de interpor uma reclamação com o intuito de reparar o dano em seu próprio ordenamento jurídico, evitando assim, uma imediata interposição de reclamação internacional, que pode ser desgastante para as relações entre os Estados.
Em relação à matéria de meio ambiente, Reis (2010) afirma que a flexibilização da regra do esgotamento dos recursos internos pode ocorrer em alguns casos, como por exemplo, quando os recursos internos do Estado se mostrem inoperantes, inacessíveis ou flagrantemente falhos ao sujeito lesado, ficando em casos assim, permitido ingresso com a reclamação via diplomática. Nesses casos, existe um artigo na Convenção sobre Responsabilidade Internacional por Danos Causados por Objetos Espaciais, que garante aos Estados o direito de apresentar pedido de indenização sem que se esgotem previamente os recursos jurídicos locais para tal satisfação.
Quanto ao quesito relacionado à nacionalidade da vítima, como dito anteriormente, em regra geral deve ser pessoa física ou jurídica nacional do Estado reclamante, e em caso de polipatria, quaisquer dos Estados de que seja nacional poderá proporcionar-lhe proteção, ficando, porém, prejudicada a proteção diplomática nos casos em que a vítima seja nacional tanto do reclamante quanto do reclamado.
Reis (2010) também observa que nos casos de poluição transfronteiriça, se um particular sofre um dano cuja origem é a poluição proveniente de um Estado estrangeiro, não deverá necessariamente ter a nacionalidade do Estado reclamante, devendo o Estado intervir para fazer valer sua competência territorial que porventura tenha sido violada por atos de poluição de outro Estado, devendo o critério dominante ser o territorial, justificando a intervenção do Estado reclamante mesmo quando os danos prejudicarem pessoas ou bens de outros que não sejam seus nacionais, justificando-se tal afirmativa pelo fundamento da defesa da soberania do Estado em seu território.
Em decisões na jurisprudência internacional, tal excepcionalidade prevaleceu como no Caso Nottebohm (Liechetenstein versus Guatemala), no qual, em uma representação a Guatemala não reconhecia a naturalidade do indivíduo que fez a reclamação, sendo vencida pelo fato da Corte reconhecer a naturalidade do indivíduo, e sua legitimidade para apresentar a ação.
3.3 ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL
Na doutrina, não existem divergências quanto ao ilícito internacional e o nexo de causalidade entre o ilícito praticado e o ente estatal serem os elementos constitutivos da responsabilidade internacional do Estado. Porém, quanto à necessidade de ocorrência do dano, diverge-se no que se refere ao fato de o dano ser ou não elemento do ilícito.
3.3.1 ATO ILÍCITO
Conforme explana Reis (2010), o ato ilícito se constitui da violação a uma norma de direito internacional, seja por meio de ação ou de omissão, caracterizando-se como a violação de uma obrigação internacional, gerando o direito de reparação ao Estado ofendido ou que este impinja sanções ao Estado infrator, sendo constituído por um elemento objetivo, a conduta e um elemento subjetivo, a atribuição da conduta a um sujeito de direito internacional.
Nem todo ato contrário a uma regra de direito internacional, no entanto, configura ato contrário ao direito, havendo excepcionalidades em que sua violação não ocasiona a existência de um fato ilícito, como, por exemplo, havendo um Estado assinado o Ato de Berlim, no qual estipula que a ocupação de um território nulo situado na costa da África, somente permite a aquisição da soberania se esta é notificada às potências, deixa de fazer esta notificação ao ocupar o território. O Estado em questão violou o Ato de Berlim, mas a ação não desencadeia uma responsabilidade internacional, deixando de produzir consequências jurídicas, não sendo um injurídico internacional.
Em relação à conduta, Reis (2010) também elenca que, geralmente a simples violação de regras jurídicas internacionais configura o ato ilícito, porém, existem ocasiões em que é necessário um elemento ligado à conduta por um nexo de causalidade.
Nota-se, porém que o conceito de ato ilícito no plano internacional não é o mesmo no direito interno, sendo assim, o que pode ser considerado ilícito internacionalmente falando, poderá ser um ato lícito no direito interno, pois, com base na concepção de ato ilícito conforme o qual a ilicitude dele é uma característica jurídica definida de acordo com certo ordenamento, são as regras de direito internacional que classificarão um ato como lícito ou ilícito, portanto a ilicitude de um ato não é a principal característica dele, mas sim a qualificação jurídica que é dada por certo ordenamento, sendo assim as normas jurídicas de certo direito interno e as internacionais podem considerar o ato como ilícito ou lícito, diferentemente, elencando Reis (2010, p. 51):
“Observe-se também que, embora a ilicitude possa ocorrer com relação a quaisquer das fontes de direito internacional, em geral, a violação ocorre com relação a normas costumeiras e princípios gerais, em que ao contrário dos tratados, não existem normas escritas que diminuam as possibilidades de controvérsias.”
Existem ainda atos que, mesmo considerados lícitos no plano internacional, são passíveis de gerar responsabilidade, como a utilização pacífica da energia nucelar, testes nucleares ou poluição marítima. Nesses casos, é considerada a responsabilidade por risco, pois o dano, apesar de não estar presente, há o risco de sua concretização, valendo observar que, em casos como esses, a atividade em si é lícita, e não gera a responsabilização do Estado, o que a gera é a forte possibilidade de ocorrência ou a ocorrência de danos a outros Estados.
3.3.2 RESPONSABILIDADE POR ABUSO DE DIREITO
Conforme apresentado anteriormente, a responsabilidade internacional tem origem na realização de um ato ilícito, e até mesmo no exercício de atividades lícitas que, de alguma forma, ofereçam riscos a outros Estados. No entanto, a doutrina também discute a possibilidade do direito internacional reconhecer a responsabilidade por abuso de direito, uma norma que é clássica em alguns desdobramentos de direito interno.
Apesar de teoricamente se vislumbrar aplicável no plano internacional, o estabelecimento da certeza de que houve uso abusivo de um direito quando não existem regras provindas de uma autoridade central é muito difícil, ainda mais quando os agentes submissos ao estabelecimento ou não da responsabilidade são os próprios Estados.
Acciolly e Silva (2002) apontam sabiamente que “o que caracteriza abuso de direito é, precisamente, o referido exercício abusivo das competências possuídas pelo Estado”, aludindo que o que se considera ilícito não são os atos dos Estados realizados dentro de seus territórios que seriam fonte de responsabilidade do Estado, mas seu exercício despótico
A admissão de responsabilidade por abuso de direito no âmbito do direito internacional se encontra na existência ou não de uma regra primária de dele que limite o exercício de direitos pelo Estado, proibindo seu uso abusivo, sendo que, reconhecida esta regra, a responsabilidade surgirá da violação da regra primária, que limita o exercício de direitos pelo Estado, e não do uso abusivo do direito propriamente dito.
No cenário atual do direito internacional, conforme Reis (2010) expõe, é de se observar a existência maior de tratados multilaterais que estabeleçam direitos e deveres entre os atores internacionais, além do fortalecimento de alguns blocos, como, por exemplo, o aparecimento da União Europeia, a teoria do abuso do direito é extremamente aplicável.
3.3.3 NEXO CAUSAL OU DE IMPUTABILIDADE
Conforme elenca Reis (2010), o nexo de causalidade ou imputabilidade é “o vínculo jurídico que liga o ilícito ao seu causador”.
Conforme exposto anteriormente, o ilícito é composto de um elemento objetivo, que pode ser caracterizado pela conduta, e de um elemento subjetivo, que pode ser caracterizado na existência de um sujeito de direito internacional a quem tal conduta possa ser atribuída.
No direito interno, para que exista atribuição da conduta é necessária a presença de sujeito capaz, a realização material do elemento objetivo do delito por meio de conduta omissiva ou comissiva e a existência de uma “culpa”, a qual está relacionada entre o dano a um direito subjetivo e o causador do dano. O elemento culpa é obviamente um elemento puramente psicológico, portanto, complexa é a abordagem ao se falar em culpa quando o causador do dano é uma entidade abstrata, um sujeito de direito internacional.
No entanto, ao abordar tal assunto, Mello (1994) esclarece que o alcance da imputabilidade está diretamente ligado ao conceito de soberania estatal, portanto, o Estado deve e pode responder por alguns atos como soberano, uma vez que os atos estejam diretamente ligados a sua soberania, como nos casos em que o Estado permitiu ou não reprimiu a prática de algum ato que levou a ocasionar o dano.
Portanto, a noção de culpa, apesar de ter características psicológicas, não se funda na atitude psicológica do Estado que descumpriu a obrigação jurídica, ela se funda na transgressão da norma em si, e tal transgressão para que tenha como responsável o Estado, obrigatoriamente deverá ser a sequela de uma culpa ou negligência que ofendam uma obrigação internacional. Conforme bem elenca Accioly (1961) “[…] resulta, naturalmente, de ato ou omissão que possa ser atribuído ao Estado, em virtude de seu comportamento”. Devido a tal conflito e complexidade da atribuição de culpa ao Estado, o projeto da CDI não utiliza a expressão culpa.
É extremamente importante a exclusão da culpa pelo projeto da CDI, pois, tal medida representa um avanço na luta pela proteção dos direitos individuais. Apesar de ainda não estar concretizado, o projeto representa o pensamento de renomados juristas quanto aos princípios e regras gerais da responsabilidade do Estado e a evolução de tal pensamento em relação ao Direito Internacional, pois, enquanto no campo do direito interno a aferição de culpa não representa perigo à noção de igualdade entre as partes, no âmbito do direito internacional, a aferição de culpa quando se fala de apurar a responsabilidade de Estados, não existe igualdade, pois tal figura não existe entre eles, e, quando se observa a responsabilidade internacional, especialmente quando ela está relacionada ao meio ambiente, os interesses em jogo não são somente o de particulares do direito interno, mas, muitas vezes, o de toda a comunidade internacional.
Ainda abordando o tema, Reis (2010) aponta que “para que haja a responsabilidade internacional, o ato ilícito deve ser imputado ao Estado na condição de sujeito de direito internacional”. Tal posicionamento se fixa na idéia de que, para que haja imputabilidade, é necessário também que o ato ilícito seja atribuído ao Estado na condição de sujeito de direito internacional, notando que, atualmente a personalidade jurídica é reconhecida pelas organizações internacionais, e pode-se imputar a elas eventual ilícito internacional.
Porém, o Estado é definitivamente responsável pelos atos de seus funcionários, ainda que o órgão estatal tenha agido em desobediência a ordens do Estado, pois este não pode invocar elementos de seu direito interno para aferir a imputabilidade de ações das quais seria responsável a personalidade de direito interno, quando o próprio Estado deve ser condizente às suas responsabilidades na comunidade internacional.
3.3.4 DANO
O dano, tanto moral quanto material, pode ser consequência ou resultado da ação ou omissão do Estado, é um elemento que tem gerado grande discussão doutrinária e jurisprudencial, tal discussão se centraliza na necessidade ou não de se ter dano na responsabilidade internacional.
O projeto da CDI sobre responsabilidade internacional do Estado por atos ilícitos adotou o posicionamento de que toda transgressão a um acordo internacional ou direito subjetivo estatal em si já representa dano material ou moral, de tal forma que, ainda que a extensão do dano causado seja um elemento central para aferir o valor da reparação, ele não é uma condição para que se caracterize o ilícito.
Não incluir o dano como condição para configuração de ilícito internacional, gerou críticas de diversos doutrinadores, como Soares (2003), que considera abstrata em excesso pelo fato de que, se o fato ilícito não gera dano, não se pode falar em reparação, então, sem o elemento do dano, não há que se falar em responsabilidade internacional, já que o próprio elemento é consequência do ilícito, analisando Pereira (2000, p. 95-96).
“[…] tendo em vista ser o inadimplemento de uma obrigação internacional um elemento necessário, mas isoladamente sem a demonstração do dano sofrido, não é suficientemente forte para caracterizar um delito internacional. O dano sofrido por um Estado ou por um súdito nacional deste Estado, como estrangeiro, no Estado causador do dano, é sempre um elemento que autoriza a um Estado ou seu súdito em particular, a formular uma reclamação contra o outro.”
Para Reis (2010), a CDI, ao não incluir o dano como elemento do ilícito, mesmo assim abrange as situações em que a transgressão da norma internacional mesmo que não tenha sequela patrimoniais diretas, ocasionem dano moral. Como por exemplo, no caso de questões ambientais, quando um Estado não implementa medidas de proteção ambiental previstas em convenção ou tratado internacional, sua não implementação, em um primeiro momento, não acarreta nenhum dano material, porém, no entanto, pode ocasionar dano moral, ensejando a responsabilização estatal.
É importante lembrar, no entanto que o simples acontecimento do dano não configura o desencadeamento da responsabilidade estatal se tal dano não é derivado de conduta ilícita e não está elencado nos casos que envolvem responsabilidade por risco, como por exemplo, aponta Rezek (2007), que quando um Estado proíbe o funcionamento de indústrias poluentes, e tal proibição prejudica danosamente investimentos estrangeiros, apesar do dano econômico, nesse caso a esse Estado um ilícito internacional não poderá ser imputado.
3.4 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA
Apesar de ser admitida a responsabilidade do Estado por danos derivados de atos lícitos, a responsabilidade internacional do Estado tem em síntese o fundamento de que será baseada em atos ilícitos, não bastando somente sua prática, mas a existência do elemento volitivo, dolo ou culpa, não sendo o Estado responsável até a comprovação da ocorrência de negligência, imprudência ou dolo para a concretização do dano. Ao incidir tal fundamento, enseja a discussão sobre as responsabilidades objetiva também chamada de teoria do risco e subjetiva, conhecida como teoria da culpa, observando Reis (2010) “o ilícito internacional é composto de um elemento subjetivo e de um elemento objetivo”.
No caso do elemento subjetivo, conforme observa Reis (2010), sua concepção está baseada no entendimento clássico de que não existe responsabilidade sem culpa, sendo o Estado responsável por atos ilícitos dos seus membros deve ele estar relacionado a um sujeito jurídico internacional ao qual se possa atribuir à conduta ilícita, e é necessária, além da ocorrência de infração de uma obrigação ou norma jurídica internacional pelo Estado, a ocorrência de culpa ou dolo, como condição para imputação do ilícito
Dessa forma, a responsabilidade internacional do Estado seria resultado de um ato culposo ou doloso estatal, não bastando a prática do ilícito para configurar a responsabilidade, mas também a comprovação de que o Estado agiu com culpa ou dolo, conforme observa Melo (2000, p. 735).
“A Responsabilidade Internacional Subjetiva é o instituto que tem como fato gerador um ato comissivo ou uma abstenção (elemento objetivo), qualificados como ilícitos atribuíveis ao Estado (elemento subjetivo), que são a causa de uma obrigação de reparar […] “
Originariamente, de acordo com Reis (2010), o instituto da responsabilidade internacional baseou-se na noção de culpa como quesito indispensável à responsabilidade por um ilícito internacional, tal quesito prevalece na jurisprudência internacional por oferecer uma maior proteção ao Estado.
Em se tratando de responsabilidade internacional por dano ambiental, é importante frisar que a responsabilidade subjetiva, que, conforme apontado tem como sua principal característica a aferição de culpa, o projeto da CDI sobre responsabilidade internacional dos Estados não incluiu essa expressão em seu artigo 2º, que trata da conceituação do ato ilícito. A CDI optou pelo ponto de vista de que a ação ou omissão do Estado é dada pela norma jurídica, excluindo assim a verificação de eventual elemento psicológico.
A responsabilidade objetiva, que aborda-se posteriormente, tem contínua e frequentemente sido utilizada em alguns casos relacionados ao direito ambiental, como exploração cósmica e energia nuclear, além de, principalmente nos casos de proteção internacional ao meio ambiente, em especial quando o dano decorre de atividades lícitas, mas que oferecem risco ambiental.
Caso relevante e que recentemente colocou em voga a discussão da responsabilidade do estado por dano ambiental, e desta forma, a responsabilidade objetiva ou subjetiva do Estado, foi o litígio em 2007 entre Argentina e Uruguai, no qual existia discórdia referente à decisão de instalação de fábricas de celulose na cidade de Fray Bentos, que está localizada nas margens do rio Uruguai, e que serve de fronteira entre os dois Estados.
A Argentina, receando que a instalação da fábrica tivesse por consequência danos irreparáveis à sua economia e meio ambiente com a poluição provável que seria emitida no rio, levou o conflito à Corte Internacional de Haia, sob o argumento de que o Uruguai violara um tratado bilateral entre os dois países, obrigando a consulta prévia de um ao outro antes de permitir quaisquer obras que afetassem o rio.
Na decisão final, a Corte concluiu que, apesar dos argumentos da Argentina não autorizarem a suspensão da construção das fábricas de celulose, o Uruguai torna-se responsável pelos riscos e danos que derivem da construção de tais fábricas.
O caso relatado tem importância jurídica fundamental no Direito Internacional, principalmente dentro do Direito Internacional Ambiental, pois, com tal decisão, aplicando a responsabilidade por risco ao Uruguai, foram utilizados princípios fundamentais como os da precaução, preservação e proteção ao meio ambiente, que são inerentes ao Direito Ambiental, tornando-se precedente para futuros litígios que envolvam situações parecidas.
3.5 RESPONSABILIDADE OBJETIVA
De toda forma, conforme explana Aquino (2009) ao observar a responsabilidade objetiva do Estado, também conhecida como responsabilidade por risco, atém-se à verificação de que ela é composta pela ocorrência de infração a uma obrigação jurídica internacional, independente da constatação de culpa ou dolo, sendo tal infração a natureza do elemento objetivo do ilícito, constituído por uma conduta, que pode representar uma infração internacional, ou precisar, para que se configure a infração, de um elemento externo conexo a ela por um nexo de causalidade, apontando Soares (2003) que “Consiste na reparação devida em função da prática de um ato lícito, que, embora permitido no Direito Internacional, culmine em prejuízos para outro Estado. O dever de reparar independe de culpa.”
Conforme salienta Reis (2010), a responsabilidade objetiva, ao contrário da subjetiva, não decorre da prática do ato contrário ao direito, ela acaba surgindo dos danos ocasionados pela prática de atos lícitos, não proibidos pelo direito internacional, como por exemplo, a exploração de petróleo.
Soares (2003) observa que tal responsabilidade foi versada primeiramente em uma convenção sobre Responsabilidade Civil contra Terceiros no Campo da Energia
Nuclear, em Paris desde 1960, muito embora outros autores considerem o já mencionado caso da Fundição Trail como a primeira manifestação sobre o tema responsabilidade internacional objetiva dos Estados por dano ambiental.
O autor enumera, no entanto, que é relutante a aplicação da responsabilidade por risco no âmbito da responsabilização internacional dos Estados, posicionamento que é acompanhado por Rezek (2007) “não se admite em direito das gentes uma responsabilidade objetiva, independente da verificação de qualquer procedimento faltoso, exceto em casos especiais”.
Outros autores defendem a eventual responsabilização do Estado, utilizando o critério objetivo, diante da prática de um ilícito e independentemente de elementos internacionais que o regulem, conforme aponta Pereira (2000, p. 107-109):
“[…] se houve a efetiva violação de normas tidas e aceitas como direito internacional, causando danos injustos a outrem, o Estado é responsável internacionalmente, sem se apurar o elemento culpa […], devendo reparar o dano causado. […] Esta teoria (objetiva), despoja a responsabilidade internacional de todo o elemento subjetivo e se funda exclusivamente no fato de que houve um ferimento às normas lidas e aceitas de direito internacional, juntamente com o fato de que o dano haja sido produzido ou causado efetivamente: e, de que haja um nexo causal entre este dano e o agente que causou. […]”
No entanto, a CDI, apesar de adotar a responsabilidade por risco, ela garante que ela decorrerá somente nos casos em que existam tratados que regulem as situações em questão e que as ações realizadas pelos Estados sejam consideradas lícitas no Direito Internacional, cabendo às ilícitas, a responsabilidade subjetiva.
Conforme consta nos relatórios da CDI, a preclusão da ilicitude do ato não afasta a possibilidade de que o Estado tenha obrigação de reparar o dano ocasionado pelo ato.
A responsabilidade por risco é produto de convenções, que se constituem de matérias específicas, como já apontado anteriormente, danos nucleares, poluição marinha ou danos ocasionados por objetos espaciais, procurando a CDI uma codificação das regras que visam ter um ponto de vista geral, já que a responsabilidade internacional do Estado não é bem sucedida em produzir rapidamente normas que compreendam diversas situações, além de que, a responsabilidade objetiva por atividades lícitas é prevista em tratados específicos, que abordam o tema de responsabilidade por risco.
No caso do Brasil, de acordo com Reis (2010), é seguro afirmar que existe um avanço positivo na responsabilização objetiva do poluidor no âmbito internacional, ainda que somente exista quando prevista em tratados.
Não havendo tal previsão, o sistema adotado, ainda que se trate de dano ao meio ambiente, é a responsabilidade subjetiva, que fica sujeita à análise de culpa, e, apesar da CDI haver excluído culpa como elemento do ilícito, o projeto ainda não se encontra em vigor, não sendo um instrumento obrigatório, prevalecendo internacionalmente a responsabilidade subjetiva, inclusive com o elemento culpa como quesito para configuração do ilícito.
A CDI adotou um Draft [2] de artigos em relação à prevenção de danos transfronteiriços decorrentes de atividades perigosas, tendo por base o conceito de prevenção e minimização de danos que venham a decorrer delas, observando Soares (2003, p.781).
“Interessante consignar o posicionamento da CDI no que se refere ao tema da responsabilidade por risco. Relembre-se de que suas funções estatutárias são de propugnar pó ruma codificação […] e por um desenvolvimento progressivo do Direito Internacional, funções essas que devem ser consideradas com alguma reserva, pois poderiam ser contraditórias, uma vez que a doutrina não tem o mesmo poder jurígeno que os Estados […]. No caso da responsabilidade subjetiva, sua contribuição tem sido da maior relevância quando mais não fora, no sentido de colocar ordem na situação caótica das normas, na maioria, de origem costumeira e jurisprudencial[…]”
Conforme Reis (2010) observa, apesar da jurisprudência contrária, a teoria objetiva definitivamente fornece maior segurança jurídica no campo das relações internacionais, em especial quando se fala de dano ao meio ambiente, ponderando a realidade contemporânea, na qual existe grande complexidade e os eventos são ocasionados por fatores e agentes diversos, colocando grandes empecilhos na averiguação e comprovação de culpa e desta forma, dificultando a reparação do dano.
3.6 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE
Existem situações que eximem o Estado de responder pelos danos causados a outros Estados. Essas circunstâncias se dão em casos de legítima defesa, represálias, prescrição liberatória, caso fortuito ou força maior, estado de necessidade, renúncia do indivíduo lesado, consentimento do estado prejudicado e culpa da vítima.
No entanto, apesar disso, abrangendo-se somente o ordenamento jurídico brasileiro, existem divergências doutrinárias sobre a admissão ou não de excludentes de responsabilidade quando se trata de danos ambientais, pois, a doutrina, em sua grande maioria, quando estabeleceu a responsabilidade objetiva por dano ao meio ambiente, tomou como regra a teoria do risco integral.
Por essa teoria, o nexo causal que é composição imprescindível para se configurar a responsabilidade, se estabelece entre a atividade realizada pelo agente e o dano, causado ou possível, motivo pelo qual todas as excludentes que não digam respeito ao nexo causal são afastadas.
Para diversos doutrinadores, ainda o caso fortuito ou força maior não são passíveis de admissão, a não ser que, no caso fortuito, este não tenha absolutamente qualquer relação com a atividade desenvolvida pelo agente poluidor, o que excluiria o próprio nexo causal, no entanto, existe outra corrente de doutrinadores que entendem que, quando se fala em responsabilidade objetiva por dano ambiental, o nexo causal deve levar em conta a conduta do agente e o prejuízo causado, justificando a aceitação de excludentes de ilicitude, observando Reis (2010, p. 66):
“[…] ainda que se considere o meio ambiente como bem maior, a não admissão de excludentes em sede de direito internacional, é, a nosso ver, uma situação utópica, a não ser quando expressamente prevista em tratados que estipulem a responsabilidade objetiva. No cenário internacional, os Estados não estão em situação de igualdade, não possuem os mesmos recursos e não estão subordinados a um poder central, o que justifica que tenham suas responsabilidades atenuadas e por vezes, excluídas, dependendo da análise do caso concreto […]”
É importante frisar que, apesar de quando se trata de responsabilidade subjetiva, é impossível não aplicar excludentes de ilicitude, porém, o artigo 26 do Draft da CDI, garante que “nada neste capítulo preclui a ilicitude de qualquer ato de um Estado que não esteja em conformidade com uma obrigação advinda de uma norma peremptória de direito internacional geral”.
Assim, considerando-se os princípios gerais das normas internacionais do meio ambiente e o artigo mencionado, para Reis (2010), com a entrada em vigor do Draft, não seriam admitidas excludentes em se tratando de ofensa a qualquer obrigação internacional em relação à proteção ao meio ambiente, e que, enquanto existe a possibilidade de excludente, é indispensável uma análise minuciosa do caso concreto para a aplicação ou não de excludente de ilicitude.
Encontrando fundamento dentro do artigo 51 da Carta da ONU que garante ao Estado seu direito de legítima defesa individual ou coletiva em caso de ataque armado, tratando-se de um princípio aceito universalmente, pressupondo que, no caso de uma agressão injusta contra um membro das nações unidas, havendo uma reação imediata do Estado, elencam Accioly e Silva (2002), que tal reação deverá ser adequada à agressão ou perigo iminente, essa reação pode ser defensiva ou ofensiva, por parte do Estado, contra uma atitude de força, considerada ilícita, praticado por outro Estado ou Organização Internacional.
Ramos (2004) aponta que a doutrina também diverge, ao adentrar neste tópico, no entanto, majoritariamente, considera que o artigo 51 reduziu o uso da legítima defesa somente às hipóteses de ataque armado, no entanto, outra parte, minoritária, da doutrina, considera que tal conceito pode ser ampliado, abrangendo os casos de agressão econômica ou política.
Para o Professor Soares (2003), ao se considerar o desrespeito à proteção ao meio ambiente, ainda que seja consequência de grave violação internacional, não se configuraria ataque armado e não justificaria a legítima defesa, dando o exemplo da Guerra do Golfo, no qual o Conselho de Segurança da ONU, ao autorizar intervenção armada no Iraque, autorizou devido à agressão armada de um país contra um membro da ONU e não devido à poluição cometida pelo Iraque ao poluir as águas do Kuwait ao lançar petróleo no Golfo Pérsico.
Nas palavras de Reis (2010) “A violação do meio ambiente pode ser utilizada como forma de coação ou ameaça, surtindo efeitos tão nocivos quanto os de um ataque armado”, observando que, quando o Iraque poluiu intencionalmente as águas do Golfo Pérsico, prejudicou diretamente o outro Estado, cabendo averiguação da violação ambiental, e se ela teria sido utilizada como outro meio de ameaça, além do ataque armado.
Além da legítima defesa, previstas no artigo 22 do Draft da CDI, essas represálias são atos lícitos praticados como forma de rebater atos ilícitos praticados por um Estado contra outro.
Tem a mesma função da legítima defesa, somente podendo ser utilizada após o Estado ofendido sofrer um ataque, e, conforme Accioly e Silva (2002), a represália deve ser a única forma encontrada pelo Estado para combater o ilícito suportado. Essas medidas seriam ilícitas caso não fossem represálias a outro ilícito praticado, portanto, a excludente só existe se houverem dois Estados em confronto, não podendo ser invocada contra um terceiro Estado que seja eventualmente prejudicado pelo confronto dos outros dois.
Reis (2010) aponta que, ao colocar tal excludente em termos ambientais, “deve-se atentar para o perigo de as contramedidas serem utilizadas a título de reação a uma violação ambiental quando, na verdade, podem mascarar políticas de proteção de mercados”.
Existe também a prescrição liberatória que constitui o silêncio do Estado ofendido em relação ao dano suportado após um grande intervalo de tempo, sendo aceito pela jurisprudência internacional, embora não existam regras claras, inclusive sobre o lapso temporal necessário para que a excludente ocorra.
Em relação ao dano ao meio ambiente, Reis (2010) observa que a excludente deve ter aplicação limitada, afinal, geralmente os efeitos de danos ambientais são sentidos no decorrer do tempo, existindo grandes distancias temporais entre conduta e sequela.
Exemplo prático é o caso dos danos sofridos devido à poluição ou atividade nuclear, cujos efeitos demoram anos, e algumas vezes, décadas, para serem sentidos.
A não consideração de tal excludente dentro do direito internacional do meio ambiente também pode levar em conta o fato do instituto ser considerado direito humano de terceira geração, e, portanto, tem característica de imprescritibilidade, com a capacidade ser reclamada a qualquer tempo.
No Brasil, a doutrina é pacífica ao afirmar que, como o direito ao meio ambiente é direito fundamental, a pretensão à reparação de danos a ele é imprescritível.
No artigo 23 do Draft da CDI, encontra-se o caso fortuito ou força maior, que acontece quando o ilícito ocorre em função de evento que esteja além do controle do
Estado e o impeça de agir de outra forma senão a de causar o dano.
Tal impossibilidade pode ocorrer devido a algum acontecimento natural como inundações, terremotos ou em função da intervenção humana, como nos casos de perda de parte do território ou no caso de revolta armada, que decorram de interferência de um terceiro Estado.
Em relação ao meio ambiente, essa excludente, ainda que se leve em conta as responsabilidades comuns, mas diferenciadas atribuídas aos Estados, conforme elenca Reis (2010), a alegação de crise econômica ou política não justifica o desleixo do Estado em relação a suas obrigações ambientais, e, o próprio artigo 23 exclui a aplicação dessa excludente se a situação de força maior for uma sequela independente ou combinada com outros fatores, de uma conduta estatal que tenha provocado o dano, ou quando o próprio Estado assume o risco.
Outra excludente é o estado de necessidade, prevista no artigo 25 do Draft da CDI, e tal artigo dispõe que o estado de necessidade não pode ser evocado por um Estado como causa de excludente de ilicitude de um ato violador de suas obrigações internacionais, a menos que seja o único meio de resguardar um interesse essencial do Estado contra um perigo iminente e não prejudique interesses essenciais de outro Estado.
É uma excludente que é utilizada apenas em casos excepcionais, pois, diversamente do que ocorre com represálias ou legitima defesa, o estado de necessidade não exige quaisquer atos prévios do Estado ofendido, afetando Estados inocentes.
Apesar da cautela com a qual deve ser aplicada, tal excludente inclusive tem jurisprudência internacional, as quais algumas são citadas no Draft, para melhor compreensão de sua utilização.
Reis (2010) ao comentar a excludente, cita inclusive um caso constante no Draft, diretamente ligado ao meio ambiente, no qual, por trás do interesse ambiental, alegado por essencial, podiam-se vislumbrar interesses econômicos.
O caso da Jurisdição das Peixarias (Fisheries Jurisdiction Case), no qual o Canadá, em 1994, por um ato declarou que os estoques do peixe rodovalho estavam em extinção, e as medidas regulatórias adotadas pela Organização das Peixarias do Atlântico Norte (Nafo) eram ineficientes, resolvendo o Canadá tomar medidas urgentes para a prevenção dos estoques do peixe. Após, interveio contra pesqueiros espanhóis, gerando conflitos com a Espanha e União Europeia, alegando a Espanha que a medida tomada pelo Canadá, de que queria resguardar a preservação dos peixes, não podia ser aceita, já que a Nafo estabelecia tal regulamento prevendo a proteção e o Canadá assinara tal regulamento, pois fazia parte da Convenção.
Existe também a renúncia do indivíduo lesado, que é uma excludente diretamente ligada à proteção diplomática, anteriormente estudada, e significa a renúncia do Estado ofendido à proteção oferecida.
Conforme instrui a doutrina, um particular pode abdicar ao amparo diplomático de seu país em um contrato estabelecido com um governo estrangeiro, dando privilégios ao Estado com o qual contratou, sendo assim, os outros Estados.
Pontuam Accioly e Silva (2002), que essa renúncia é a chamada doutrina Calvo, criada em 1868 por Carlos Calvo, ministro das relações exteriores da Argentina.
De acordo com esse posicionamento, o sujeito pode, em um negócio jurídico, incluir uma cláusula na qual abdica da proteção diplomática de seu Estado patrial, no caso de surgirem discussões quanto ao referido negócio, dessa forma, os Estados estrangeiros deveriam negar proteção diplomática, ainda que requisitado, ao seu nacional, sendo os tribunais locais os únicos com competência para analisar controvérsias no negócio jurídico.
A cláusula Calvo é amplamente criticada por parte da doutrina pelo fato da proteção diplomática ser um direito do Estado e não do indivíduo, que, portanto não poderia renunciar a algo que não é seu, porém, a cláusula foi eficaz tanto na prática quanto na jurisprudência internacionais, sendo aplicada em contratos de concessão firmados, nos quais estrangeiros renunciam à proteção diplomática de seus respectivos países, comprometendo-se a se submeter à competência jurídica local, se surgirem complicações em relação aos contratos, quanto à sua execução ou inexecução, explicando Accioly e Silva (2003), que a nulidade da cláusula Calvo pode ser alegada sob o argumento de que “a proteção diplomática constitui, antes, o exercício de um direito e um interesse do Estado reclamante do que um direito ou interesse do seu nacional”.
Além disso, Reis (2010) pontua que parte da doutrina compreende que a proteção diplomática está no campo dos direito individuais disponíveis, podendo, portanto, ser renunciável a qualquer tempo.
Bem como o consentimento do Estado prejudicado, previsto no artigo 20 do
Draft da CDI, que é o consentimento válido dado por um Estado a outro, que exclui a ilicitude do ato que venha a causar dano.
Em relação à matéria ambiental, um exemplo clássico é a permissão de um Estado para que o outro realize em seu território, testes nucleares, uma atividade que, isoladamente, já representa risco de dano ambiental.
Reis (2010) aponta que essa excludente deve ser vista com reservas ao ser aplicado em relação ao meio ambiente, pois “questões atinentes ao meio ambiente, na grande maioria das vezes, não se limitam à esfera local, adquirindo dimensões globais”.
De tal forma, ainda que um Estado permita que o outro pratique atos de ilicitude que tenham por consequência a degradação ambiental, não haverá excludente de ilicitude, seja diante do Estado ofendido ou perante a comunidade internacional, quando se tratar de área que tenha importância global.
Por fim, a excludente da culpa da vítima, que, conforme aponta Reis (2010) essa excludente, na qual a responsabilidade do Estado é abrandada ou até mesmo excluída quando o lesado dá causa ao dano que sofreu, não é aplicável ao se abordar questões ambientais, pois a combinação de fatores que levam á deterioração ambiental e do interesse global presente, a quantidade de vítimas e causas prejudicam a aplicação da excludente em questões relacionadas ao meio ambiente.
3.7 A REPARAÇÃO DO DANO
Conforme alhures exposto, ao se verificar a existência de responsabilidade internacional, o Estado ofendido tem direito à reparação do dano por parte do Estado ofensor, conforme aponta Reis (2010), no plano internacional, a reparação do dano pode ocorrer por meios diplomáticos, políticos, jurisdicionais ou por arbitragem, no entanto, na prática, a forma como ocorrerá a reparação depende da natureza e gravidade do dano, das condições econômicas, políticas e sociais tanto do Estado ofendido, como do ofensor.
Em geral, os Estados acordam em reparação monetária, pois, diversas vezes, ainda que a reparação das coisas no estado em que se encontravam seja desejada, tal artifício torna-se impossível, especialmente no caso de dano ambiental, que termina por não recompor o espaço físico afetado satisfatoriamente, portanto, uma reparação monetária visa também um caráter preventivo, que inibiria as atividades de futuras agressões. Em relação à reparação por danos morais, tal pode dar-se por reconhecimento formal do caráter ilícito do ato ou por meio de pedido de desculpas.
A grande questão em relação à reparação do dano é como chegar a uma justa indenização. A doutrina é pacífica sobre o fato de que tal compensação deve ser acrescida de juros de mora, objetivando atingir um montante que compense pelo menos parte da extensão do dano sofrido, senão um todo. Em relação aos lucros cessantes, devido às dificuldades em estimar-se seu montante, jurisprudência e doutrina divergem quanto à sua inclusão.
Para alcançar-se o nível mais próximo de reparação integral do dano, é imperativa a combinação de diversas espécies de reparação.
Constante no Draft da CDI no artigo 30, alínea “a”, a cessação do comportamento ilícito frequentemente é confundida com a restituição em espécie e analisada, e de acordo com Reis (2010) em conjunto com outras formas de reparação, sendo considerada pelo relatório da CDI fora da moldura da reparação em sentido próprio.
Tal entendimento se explica pela diferente função desse instituto, que tem caráter preventivo, além do fato de referir-se ao ilícito em si mesmo e não às suas consequências jurídicas, ao contrário das demais formas em sentido amplo.
Chega-se à conclusão de que, ainda que a cessação tenha influência na reparação em favor do Estado prejudicado, já que o prosseguimento do ato ilícito terá influência direta no alcance dos danos causados, tendo por consequência também influência na quantidade e qualidade da reparação do dano, o instituto estudado neste tópico está diretamente relacionado à preservação da regra primária, que se compõe na obrigação de direito internacional que, uma vez não adimplida dá vazão à obrigação secundária de reparação de dano e aplicação de sanção.
Soares (2003) exemplifica que a cessação do ilícito se igualaria a uma restituição integral a extinção de uma ocupação territorial, mostrando casos em que se poderia cumular um pedido de cessação com pedido de reparação de danos, citando o anteriormente mencionado caso da Fundição Trail, que além de pedirem o fechamento da fábrica que emitia os gases nocivos ou redução de suas atividades, foi requerida indenização pelos danos sofridos.
Dentro da responsabilidade internacional do Estado por dano ambiental, a cessação do comportamento ilícito é mais importante entre os outros remédios, observando os valores de necessidade de cooperação entre os Estados na preservação do meio ambiente, que são o fundamento do Direito Internacional Ambiental, além de obviamente vislumbrar-se um caráter preventivo em relação à sanção devido à inadimplência de uma obrigação internacional relacionada ao meio ambiente, que demonstra um dos principais objetivos das normas internacionais de proteção ambiental, ou seja, evitar o dano impreterivelmente.
É importante ressaltar que a cessação do comportamento ilícito não tem por objeto extinguir as consequências do ato ilícito, seu objeto é o ilícito em si, portanto a obrigação do Estado ofensor de cessar a conduta ilícita e cumprir a regra primária de direito internacional não está ligada a qualquer tipo de reclamação do Estado prejudicado, ou seja, a cessação da conduta não irá abrandar um possível pedido de indenização, por exemplo.
Também, conforme aponta Reis (2010), em alguns casos, além da cessação da conduta, existe a possibilidade de a mesma ação constituir também a restituição em sentido estrito, que será exposta posteriormente.
Localizada na alínea “b” do artigo 30 do Draft da CDI, as seguranças e garantias de não repetição apontam que o Estado responsável por um ilícito internacional tem a obrigação de oferecer as seguranças necessárias e garantias contra a não repetição, se as circunstâncias requererem.
Apontadas por Reis (2010) como propensas a restabelecer a confiança entre os Estados envolvidos no ilícito, estão fundadas na pretensão de continuar a relação, ainda que esta tenha sido afetada pelo dano, sendo requeridas na maioria das vezes, juntamente com a satisfação, visando preservar o futuro de uma relação abalada pelo ilícito.
Aplicando tal modalidade no Direito Ambiental, tais seguranças e garantias de não repetição, são um importante instrumento na reparação do dano, pois garantem que uma obrigação referente ao meio ambiente, ainda que tenha sido violada, não será desobedecida novamente.
A reparação em sentido estrito, também conhecida como stricto sensu ou restitutio in integrum (restituição na íntegra) é uma das formas de reparação em sentido amplo, sendo ela a mais tradicional forma de medida repressiva por infração de uma norma internacional adotada pela doutrina do Direito Internacional das responsabilidades, constando no projeto da CDI. Existem duas correntes doutrinárias que explicam esse tipo de reparação.
Para uma parte, encabeçada por Soares (2003), a restituição em sentido estrito alude o restabelecimento do que existia antes do dano. Para outra corrente, da qual Rezek (2007) compartilha o entendimento, a reparação em sentido estrito é o restabelecimento da situação que existiria se o dano jamais houvesse ocorrido.
Seguir uma ou outra posição é de relevância singular, ao avaliar que a posição que defende a reparação de forma que se restabeleça a situação de forma a restaurar o ambiente lesado como se o dano não houvesse ocorrido, consideram os lucros cessantes, atribuindo á reparação em sentido estrito uma qualidade compensatória.
Em termos de direito ambiental, como bem elenca Reis (2010), a reparação integral ou não do meio ambiente depende da adoção de uma posição ou outra. É sabido que na maioria das vezes, a simples restituição da situação passada não será suficiente para reparar o dano, já que o meio ambiente está sempre em constante transformação e um dano ambiental, dependendo de suas proporções, poderá interferir permanentemente em alguma situação futura, que não teria ocorrido caso o dano não tivesse acontecido, como por exemplo, no caso de poluição transfronteiriça de rios que cause a morte da fauna. O simples ato de despoluir o rio não irá reparar inteiramente o dano causado, portanto, caberia uma restituição compensatória, nesse caso.
No artigo 35 do projeto da CDI sobre responsabilidade internacional do Estado, a posição adotada é a mais restrita, na qual a restituição consiste em restaurar a situação que existia antes da provocação do dano, desde que tal restauração não seja materialmente impossível e não envolva ônus desproporcional ao benefício advindo da restituição em vez da compensação.
Tal opção por uma posição mais restrita tem a vantagem de concentrar-se na situação real e não em uma situação hipotética do que poderia ter havido caso o dano não houvesse ocorrido. Adotada tal posição, conforme o próprio relatório da CDI, a reparação poderá ser integrada de uma compensação, objetivando atingir uma reparação integral do dano que o ilícito causou.
Todavia, conforme elenca o professor Soares (2003) a jurisprudência adota, conforme a análise de cada caso concreto, uma posição ou outra seja criando a situação que existia antes do dano, restabelecendo a relação original entre as partes ou restabelecendo uma situação que existiria ou teria existido se o dano jamais tivesse ocorrido.
A literatura e doutrina estudadas apontam frequentemente dois exemplos claros de ambas as posições. Na situação de adoção de posição mais restrita, é a decisão da Corte Centro-Americana de Justiça (primeira Corte Internacional de Justiça, que existiu brevemente) em uma disputa entre El Salvador e Nicarágua, na qual os dois Estados entraram em litígio devido ao Tratado de Bryan-Chamorro, firmado entre Estados Unidos e Nicarágua, o qual estabelecia que o governo da Nicarágua concedesse em favor dos Estados Unidos uma área para a instalação de uma base naval, ameaçando a segurança nacional de El Salvador, que também detinha propriedade das águas do Golfo de Fonseca, e seria prejudicado pelo acordo entre os outros dois Estados. El Salvador foi vencedor da disputa, e foi estabelecido que o governo da Nicarágua restabelecesse e mantivesse a situação preexistente entre si e El Salvador antes do tratado.
O caso da fábrica de Chorzow vem como exemplo prático dentro da responsabilidade internacional do Estado de se restaurar uma situação preexistente, quando Alemanha e Polônia entrarem em litígio, quando a Polônia promoveu a nacionalização da fábrica em questão, cujo capital de ações majoritariamente pertencia à Alemanha. A Corte Internacional de Justiça, em sentença de 13/09/1928, adotou a posição de que a reparação deveria fazer desaparecer todas as implicações do ato ilegítimo, restabelecendo a situação preexistente se o ato praticado pela Polônia não houvesse ocorrido, conforme aponta Soares (2003, p.774):
“O princípio essencial que decorre da noção mesma de fato ilícito e que parece se depreender da prática internacional, notadamente da jurisprudência dos tribunais arbitrais, é que a reparação deverá, tanto quanto for possível, apagar todas as consequências do ato ilícito e restabelecer o estado que verossimilmente existiria se dito ato não tivesse sido cometido.”
Ainda em relação à restituição em espécie, observa-se que a doutrina ainda distingue em forma de outra modalidade, a restituição material e a restituição jurídica.
A restituição material não apresenta maiores problemas quanto à sua definição. Conforme aponta Reis (2010) “ela se dá com a devolução material do objeto ou o retorno de pessoa ao Estado lesado”.
Esse tipo de restituição se mostra, não raras vezes, praticamente impossível, porém, existem alguns exemplos na jurisprudência, como no caso do Templo de Preah Vihear, no qual as partes adversas eram Tailândia e Camboja, que pleiteavam objetos retirados do templo mencionado pelo primeiro Estado, localizado no segundo Estado, o qual a Corte Internacional de Justiça decidiu em favor do Camboja.
No que concerne à restituição jurídica, conforme também elenca Reis (2010), essa acontece quando a restituição alude na alteração da regra legal do Estado que tenha sido autor, ou das relações jurídicas entre o Estado autor e um ou mais Estados.
Um exemplo claro de restituição jurídica, é o já citado caso da situação entre Nicarágua e El Salvador, pois o reconhecimento do direito de El Salvador implicou em alterações no Tratado de Bryan-Chamorro, estabelecido entre Estados Unidos e Nicarágua.
Em relação ao Direito Internacional Ambiental, Soares (2003) aponta a questão da impossibilidade material da restituição da situação anterior, e que, no caso de uma restituição material, existe a forte probabilidade de não se realizar, fato que não se verifica quando se fala em restituição jurídica. Ao ocorrer um dano irreversível ou o desaparecimento de uma coisa infungível, o que tornará impossível sua restituição, é necessário partir-se para outras formas de reparação, que substituam a coisa danificada ou extinta.
No Direito Internacional Ambiental, esse fenômeno tem consequências ainda mais drásticas, como no caso de, por exemplo, uma poluição constante e pequena, cuja interrupção ou amenização não melhorarão imediatamente seus efeitos na água ou atmosfera de um Estado vizinho, cujo meio ambiente já foi poluído pelas atividades do Estado poluidor, há de ser considerada, portanto, materialmente, uma restituição impossível, dando causa a uma indenização, utilizando-se a modalidade de restituição jurídica.
Prevista no artigo 36 do Draft da CDI, a compensação, conforme aponta Reis (2010) é a forma de reparação mais comum, pois, geralmente é a mais buscada.
A compensação, conforme Soares (2003) é caracterizada por não possuir função punitiva ou aflitiva em relação ao Estado violador de uma obrigação internacional, quando essa função é típica de outras modalidades de reparação do dano. É um ressarcimento no sentido técnico-jurídico, equalizando os valores entre coisas fungíveis, visando somente cobrir os danos materiais diretamente suportados pelo Estado ofendido, sem o intuito de servir como medida punitiva.
A doutrina e jurisprudência são pacíficas quanto à admissão de juros de mora e danos emergentes no valor da indenização pelos danos que o Estado lesado tenha sofrido, compreendidos como danos diretos ao patrimônio, ou seja, os danos gerados por causa da própria lesão. No entanto, existem divergências relacionadas ao pagamento de lucros cessantes, de acordo com as considerações de Soares (2003, p. 770):
“Na verdade as dificuldades em conceder os lucros cessantes prendem-se à intricada questão da determinação dos nexos causais entre o dano e o ilícito […] e a outra menos complexa, da previsibilidade do autor do dano em relação aos resultados danosos à pessoa lesada.”
Rezek (2007), no entanto, alega que a indenização justa deve compreender o correlativo ao que no Brasil intitula-se de juros moratórios, que resultam do tempo de espera, pela vítima, do recebimento real do que lhe é devido, compensando também, conforme o caso concreto, os lucros cessantes, não os danos indiretos, que são aqueles relacionados ao dano causado remotamente ou correlato, mas sim aos danos causados que tenham sido resultado imediato e direto do ato ilícito.
Reis (2010) observa que a inclusão dos lucros cessantes deve ser ponderada e analisada conforme o caso concreto, considerando a previsibilidade e o nexo de causalidade entre o dano e o ilícito.
Em relação aos danos ao meio ambiente, tal critério torna-se ainda mais difícil ao se avaliar tal questão, pois, conforme afirma Tessler (2004) o juízo crítico de perdas de ganhos deve ser utilizado nesse caso, pois o dano ambiental pode trazer graves sequelas à saúde humana, e, em função da degradação do meio ambiente, também pode perder-se um negócio. Tal possibilidade pode ser visualizada no exemplo citado anteriormente, do caso do Sr. Poro e da indústria francesa Houillères Du Bassin de Lorraine, proprietário de um restaurante atingido pela poluição da indústria.
Observa-se, conforme bem aponta Reis (2010), que não existe critério totalmente objetivo para avaliação do dano ambiental, e que esta, especialmente quando se trata de bens como o ar e a biodiversidade, é uma tarefa extremamente complexa e difícil, compreendendo que diferentes critérios podem ser acertados para se chegar a uma soma justa, dentro da razoabilidade que se deve ter quando se fala em dano ambiental, verificando-se uma disposição em utilizar rotativa e cumulativamente, a reparação em espécie e a indenização dentro dos limites da reparação do dano.
Também inclusa no projeto da CDI sobre responsabilidade internacional, está prevista no artigo 37, prevendo que o Estado responsável por um ilícito internacional está obrigado a dar satisfação pelo dano causado na medida em que tal satisfação não possa ser realizada por meio de restituição ou compensação, consistindo em um reconhecimento da infração, declaração de pesar, pedido de desculpas formal ou semelhante, não devendo ser desproporcional à ofensa causada e, sem intenção de humilhar o Estado ofensor.
Tal modalidade dá a entender que o dano que lhe dá causa tem raízes de ordem política ou jurídica, apontando o Professor Soares (2003) que alguns doutrinadores consideram que a implicação de uma nomenclatura moral seria imprópria ao se referir a danos sofridos na ordem internacional por um Estado, afirmando ainda que a satisfação é uma das formas mais típicas de reparação quando se fala em dano no Direito Internacional.
Ao se tratar de meio ambiente, conforme aponta Reis (2010), tal modalidade se mostra ter importância política em conjunto com a opinião pública, que ocorre quando um Estado reconhece que cometeu uma infração a uma obrigação internacional, sendo um mecanismo importante, nas palavras de Soares (2003), a publicidade do comportamento perante a comunidade internacional, ainda que exista um pagamento de uma quantia simbólica, que pode parecer ineficaz quando se considera o dano causado, na questão da reparação do dano ambiental, no sistema da responsabilidade internacional subjetiva do Estado, verifica-se a força dos movimentos da opinião pública nacional ou internacional, que podem ser mais eficazes, ponderando os relacionamentos e imagem dos atores internacionais.
4 FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL AMBIENTAL
De acordo com Roessing Neto (2006) a classificação tradicional do Direito Internacional pode ser usada para organizar as fontes do Direito Internacional Ambiental, encontradas no artigo 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça, que são:
a) convenções Internacionais (tratados);
b) costume internacional;
c) decisões judiciais;
d) ensinamentos dos doutrinadores qualificados
e) princípios gerais do direito reconhecidos pelas nações civilizadas.
Essas fontes tornaram-se, conforme observa Valadão (2003) “estaca conceitual, que serve de base para que a maioria dos doutrinadores elabore suas concepções de fontes do Direito Internacional […]”.
Além dessas fontes, existe uma discussão sobre se as Resoluções da ONU poderiam ser consideradas fontes do Direito Internacional, especialmente no campo do Direito Internacional Ambiental onde se observa uma intensa propagação da utilização de um instrumento jurídico que é referido como soft laws, que serão abordadas mais adiante, e se tornaram bastante proeminentes, influenciando diretamente no instituto do Direito Internacional Ambiental.
4.1 CONVENÇÕES INTERNACIONAIS (TRATADOS)
Birnie e Boyle (2002) definem os tratados como acordos escritos ou orais, entre organizações internacionais e Estados, regidos pelo Direito Internacional, enquanto outros doutrinadores, como Seitenfus e Ventura (2003), que se referem a eles como acordos concluídos dos quais fazem parte dois ou mais sujeitos membros do Direito Internacional onde tais acordos estão destinados a produzir certos efeitos jurídicos, sendo eles regidos pelo Direito Internacional, bem como outros os consideram regras estabelecidas expressamente reconhecidas pelos Estados que os em questão, conforme elencam Sunkin, Ong e Wight (2001, p. 3):
“Regras expressamente estabelecidas reconhecidas pelos Estados em questão, as convenções internacionais ou tratados representam a mais clara forma de obrigação legal entre os Estados. Portanto, vem sido sugerido que a existência de um tratado relacionado a qualquer assunto em particular irá normalmente providenciar uma afirmação mais clara e conclusiva dos direitos e deveres dos Estados-partes para suas relações um com o outro. Tratados geralmente requerem, em adição a sua assinatura, na conclusão das negociações, ratificação pelas partes. No caso de tratados multilaterais, a ratificação por um número mínimo de Estados-partes é frequentemente requerido antes que eles entrem em vigor (ainda assim apenas entre aqueles Estados que o ratificaram). Regras relativas à conclusão, aplicação, interpretação, reserva, alteração, invalidação, suspensão e rescisão dos tratados são encontradas na Convenção de Viena, de 1969 na Lei dos Tratados, a qual codifica e em certos aspectos adiciona ao costume internacional sobre o assunto. [3] [tradução nossa]”
Um tanto quanto recentes, os tratados que versam sobre a questão ambiental são sempre polêmicos, e, apesar de as conferências parecerem nunca chegar a um resultado definitivo, sugerindo uma procrastinação dos assuntos mais urgentes e, consequentemente, os que causariam abalo ou perdas para a maioria das estruturas econômicas tanto de países desenvolvidos quanto de países em desenvolvimento, são uma fonte fundamental, pois expressam de forma clara e concisa as obrigações e direitos das partes signatárias.
O mencionado litígio entre Argentina e Uruguai é um exemplo clássico de como os tratados funcionam, e na decisão da Corte Internacional de Justiça que analisou o tratado bilateral entre os dois Estados, que o Uruguai seria responsável pelos riscos e danos derivados da instalação da fábrica em questão, utilizando-se da responsabilidade objetiva como solução demonstra não só a possibilidade da responsabilização internacional estatal pelo dano ambiental causado, como a tendência a utilizar-se da responsabilidade objetiva como meio mais eficaz para decidir litígios relacionados às questões às lesões ao meio ambiente.
Conforme observa Roessing Neto (2006), apesar dos tratados não serem obrigatórios para os países que se recusam a ser parte deles, eles acabam tornando-se um tipo de obrigação moral, e como passar do tempo, ganham status de direito costumeiro, tornando-se, em longo prazo, obrigatórios aos Estados que não eram signatários do tratado desde o início, tal qual expõe-se a seguir.
4.2 COSTUME INTERNACIONAL
Ao analisar o costume internacional, Sunkin, Ong e Wight (2001, p. 4) observam que:
“Enquanto são uma significante fonte de obrigações legais internacionais entre Estados em geral, o costume internacional preenche um papel menos significante no direito internacional ambiental. Isso é devido ao fato de que regras de costume geralmente tomam tempo para se desenvolver, e raramente preenchem os requerimentos específicos do direito internacional ambiental. É amplamente aceito que dois primordiais elementos são exigidos a estar presentes no estabelecimento de quaisquer regra de costume internacional. Essas são, primeiramente, o elemento físico, evidenciado por padrão consistente de prática pelos Estados e em segundo, o elemento psicológico de aceitação pelos Estados, nos quais tal ação seja requerida ou permitida por lei, o chamado critério opinio júris. A presença desses dois elementos, de prática estatal e opinio júris, é suficiente para provar a existência de uma regra vinculante de costume internacional. [4] [tradução nossa]”
A definição de costume internacional vem amparada em Seitenfus e Ventura (2003), que o fixam como “prática de aceitação geral que se converte em direito”. Especificando que tal fonte tem elementos material e subjetivo, nos quais o material seria “a repetição de atos, comportamentos e opiniões, na administração de suas relações externas ou da organização interna, pelos sujeitos de direito internacional”. Enquanto o elemento subjetivo se daria na “existência, livremente consentida, de uma convicção por parte dos sujeitos, no sentido de que sua [do costume] aplicação é obrigatória”.
Segundo Roessing Neto (2006), o costume internacional foi por um longo tempo a fonte central do Direito Internacional, cessando depois da Segunda Guerra Mundial, devido ao grande número de novos membros da comunidade internacional, além do surgimento de outros problemas, como o abordado nessa pesquisa, os ambientais tornando complexa a utilização de um costume internacional uniforme, em um mundo dividido em mais de 190 Estados, sendo atualmente uma fonte secundária.
No entanto não se pode dizer que, quando uma convenção internacional ou tratado, alhures abordado, se torna costume internacional, ele seja utilizado como fonte secundária para a eventual aplicação da responsabilidade internacional ambiental, pois realmente se torna a exceção à regra quando se diz respeito ao mundo globalizado da atualidade.
Utilizando tal fonte, pode-se vislumbrar um desdobramento diferente, por exemplo, no caso emblemático de poluição nuclear ocasionado pela explosão química em um dos reatores nuclear de Chernobyl, na atual Rússia, percebido por uma das centrais na Suécia, e somente admitido pelo governo soviético após grande pressão internacional. Embora o governo admitisse a morte de somente duas pessoas, e radiação acima dos níveis permitidos somente em vinte e nove pessoas, a radiação nuclear causou danos a mais de duzentas pessoas, não se abstendo ao território soviético, atingindo, devido aos ventos, países como Áustria, Hungria, Itália, Iugoslávia, Reino Unido, Alemanha, Suécia e Suíça.
Esse caso, embora vastamente debatido doutrinariamente, não teve maiores desdobramentos, pois, apesar de existir a Convenção de Viena sobre Responsabilidade por Danos Nucleares de 1963, o Estado causador do acidente, a atual Rússia, não era parte deste tratado.
Havendo, no entanto, outra convenção, essa tendo como partes todos os Estados envolvidos, a qual era a Convenção de Poluições Atmosféricas Transfronteiriças de Longa Distância, adotada em Genebra, em 1979, esta não pôde ser invocada, pois excluía expressamente, de seu âmbito de incidência, poluições transfronteiriças advindas de acidentes nucleares. A solução possível seria aplicar normas não escritas do Direito Internacional e da Agência Internacional de Energia Atômica, que não regulam temas concernentes à responsabilidade dos Estados.
Se tal tratado à época dos fatos fosse costume internacional, poderia ser aplicado na situação, porém, de acordo com o exposto, hipotética situação seria difícil de ocorrer, dado ao fato da necessidade tempo para que um tratado tão impactante para os interesses econômicos estatais se torne costume internacional.
Na recente catástrofe japonesa, onde um terremoto causou danos às usinas nucleares japonesas, ocasionando vazamento radioativo, pode-se afirmar, conforme Kidd (2011), que havendo danos transfronteiriços, sendo que as Filipinas até o presente momento já foram atingidas pela radiação japonesa, tratados em relação a danos nucleares não poderão ser aplicados ao Japão, que não é signatário deles, mantendo sua própria legislação interna, porém, nesse caso, a Agência Nacional de Energia Atômica, do qual o Japão e a maioria dos Estados fazem parte, em seu estatuto, determina que os Estados devem manter fundos de compensação para eventuais danos que ultrapassem as fronteiras estatais.
Observa-se de tal forma que, apesar da possibilidade de responsabilização internacional por dano ambiental existir, no caso em tela vislumbra-se o empecilho do Estado em questão não ser signatário do tratado que levaria à responsabilização estatal, concluindo-se que os danos causados além das fronteiras japonesas hipoteticamente se reparam sob o crivo da legislação do Estado causador do dano.
4.3 PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO RECONHECIDOS PELAS NAÇÕES CIVILIZADAS
De acordo com Birnie e Boyle (2002), esses princípios seriam os reconhecidos por todos os seres humanos racionais, afirmando que era assim que alguns membros do comitê preparatório do Estatuto da Corte Internacional de Justiça enxergavam essa fonte, enquanto outros membros do mesmo comitê entendiam que tal fonte seriam os princípios resultados da vontade dos Estados.
Conforme observa Pereira (2006, p. 02)
“[…] expressão ‘reconhecidos pelas nações civilizadas causou muita polêmica, pois alega-se que teria caráter discriminatório. Segundo o Comitê de Juristas que elaborou o projeto do Estatuto de Haia, eles seriam os princípios aceitos pelas nações in foro domestico, tais como certos princípios de processo, o princípio da boa-fé e o princípio da res judiciata.”
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Ainda assim, conforme elenca Roessing Neto (2006) pode ser vista como um consentimento para que a Corte Internacional de Justiça utilize tais princípios como fonte secundária, de forma que nenhuma demanda fique sem solução, no caso de lacuna da lei, as preenchendo de forma a proporcionar para todas as demandas a garantia de solução.
No entanto, apesar de não serem utilizados sempre, considerando que são secundárias, interpretam um importante papel no Direito Internacional Ambiental, como Sunkin, Ong e Wight (2001, p. 4-5) analisam:
“De certa forma, tem sido argumentado que a lei internacional inclui princípios que tenham sido reconhecidos pelos próprios Estados como relações governamentais entre eles, seja geral o especificamente. Tais princípios substanciais incluem a proibição contra o uso da força, princípios básicos de direitos humanos, a liberdade dos mares e a prevenção de danos a território de outro Estado. O reconhecimento desses princípios substanciais de direito internacional, em adição aos cada vez mais comumente procedimentos aceitos, reforça a sujeição de aplicabilidade do direito internacional, em especial o direito internacional ambiental. [5] [tradução nossa]”
Exemplos de tais princípios podem ser, dentre outros, o princípio da coexistência pacífica, princípio da boa fé, o pacta sunt servanda, ou seja, os acordos devem ser cumpridos, princípio da solução pacífica de controvérsias, princípio da obrigação de reparar o dano, que, facilmente, podem ser aplicados no instituto da responsabilização internacional por dano ambiental.
O princípio da boa-fé já foi, conforme aponta Reis (2010), objeto de exame pela Corte Internacional de Justiça, em um julgamento relacionado à paralisação de testes nucleares realizados pela França na Polinésia Francesa entre os anos de 1960 e 1970, no qual a Austrália alegava que a França, com a realização de tais testes na atmosfera, acabava lançando material radioativo no território australiano, enquanto a França afirmava que a radiação atômica lançada na atmosfera era infinitesimal, impossibilitando a ocorrência de qualquer dano, levando a questão à Corte Internacional.
A Corte não adentrou no mérito da questão, pois, entendeu que, com o fato da França já haver paralisado os testes, o objeto da disputa em questão não mais existia, porém, na resolução da disputa, considerou que houve, por meio do princípio da boa-fé, com as declarações públicas da cessação da realização dos testes, o nascimento de uma obrigação jurídica unilateral da França para com a Austrália, vinculando o primeiro ente estatal a essas declarações.
4.4 DECISÕES JUDICIAIS
A ocorrência de alguns desastres ecológicos ao longo dos tempos transformou-se em litígios, dando origem a decisões judiciais, tornando-se essas precedentes ou motivo de causa a regulamentações dentro do direito ambiental, conforme bem elencam Roessing Neto (2006) e Reis (2010). No entanto, não existe um sistema, até a presente data, que regule a responsabilidade por danos ambientais ocorridos em decorrência de atividades lícitas, nem mesmo na responsabilidade internacional por dano ambiental, na qual, geralmente, o dano ocorre de condutas lícitas e autênticas, conforme poderá observar-se na explanação de acidentes ambientais ocorridos no mundo inteiro, que contribuíram para a aplicação do direito internacional ambiental.
Além disso, é de suma importância observar que danos ambientais possuem características peculiares que se dão em fatos como a extensão de suas consequências com o tempo ou seu surgimento posteriormente, passado certo lapso temporal, entre outras circunstâncias inerentes e diversas que podem dificultar o estabelecimento de uma conexão entre o ato implicado e o dano realizado, bem como sua reparação.
Cabe ressaltar que são competentes para julgar os litígios entre os entes estatais internacionais, por acordo entre as partes, já que nenhum país é obrigado a comparecer perante um tribunal internacional sem haver consentido para isso, a Corte Permanente de Arbitragem, que é competente em todos os casos que lhe sejam submetidos via acordo entre as partes, independentemente de serem de Direito Internacional Público ou Direito Internacional Privado.
Suas modernas regras de procedimento visam aplicar a arbitragem, conciliação entre outros mecanismos que solucionem conflitos envolvendo Estados, partes do setor privado ou organizações internacionais. Outra corte competente é a Corte Internacional de Justiça, que tem dupla competência, julgando, de acordo com o Direito Internacional, conflitos jurídicos submetidos por Estados, além de prover pareceres jurídicos relacionados a questões jurídicas submetidas por instituições especializadas da ONU.
Essas cortes estão localizadas no Tribunal de Haia, em Haia, na Holanda, sendo considerada a capital judiciária mundial, onde estão situados diversos organismos internacionais além de seis tribunais internacionais, dos quais três são permanentes, os já citados Corte Permanente de Arbitragem e Corte Internacional de Justiça, bem como o Tribunal Penal Internacional, além de outros três temporários, o Tribunal Irã – Estados Unidos, o Tribunal Penal Internacional para a ex- Iugoslávia e o Tribunal Especial para o Líbano.
A seguir, será feita uma breve explanação sobre alguns casos que foram de fundamental importância para a evolução do tema da responsabilidade internacional ambiental, extraídos das obras de Soares (2003) e Reis (2010), os quais esclarecem que tais casos contribuíram para com o progresso do direito internacional ambiental, seja por suas características transfronteiriças ou pelos interesses internacionais envolvidos, tendo alguns deles, no entanto, nem chegado a ser apreciados pelas Cortes, sendo solucionados arbitralmente ou internamente.
Além do caso da Fundição Trail, em relação à poluição atmosférica, é emblemático o caso de duas pessoas jurídicas de direito privado, uma francesa, a Houillères Du Bassin de Lorraine e o proprietário de casas para temporada e de um restaurante na região do Sarre, fronteira da República Federal Alemã com a França, o Sr. Poro. A empresa francesa passou, a partir de 1953, a queimar grandes quantidades de carvão, causando danos à propriedade do Sr. Poro, tornando-a imprópria para o turismo. Tendo sido decidido pela justiça alemã, o Sr. Poro venceu a demanda, como vítima da poluição.
Relativo à poluição do meio marinho, de extrema importância para a evolução do direito ambiental, o caso do Petroleiro Torrey Canyon, ocorreu em 18 de março de 1967, no qual envolveu um acidente entre o citado petroleiro, de propriedade de uma sociedade liberiana com sede nas Bermudas, fretado por uma sociedade californiana, e sub-fretado a uma sociedade britânica, carregado de petróleo advindo do Kuait, cujo destino era o porto galês de Milford Haven.
Ao colidir com um recife, liberou no oceano toneladas de petróleo, que imediatamente atingiram a península de Cornualha, na Grã-Bretanha, e depois, em virtude de um bombardeamento do navio pelo governo inglês, atingiu parte do litoral da França. As soluções encontradas foram alcançadas nas jurisdições internas dos países, pois, nem a Libéria nem os Estados Unidos eram parte das convenções existentes em relação à poluição do mar por petróleo, aplicando-se leis e princípios atinentes ao caso dos respectivos Estados, para fixação da indenização devida aos Estados vítimas do acidente. Esse caso deu origem, em 1969, em Bonn, ao Acordo para Cooperação no Trato com a Poluição do Mar do Norte por Óleo, bem como à Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil sobre Danos Causados por Poluição por Óleo e da Convenção Internacional relativa à Intervenção em Alto-Mar em casos de Baixas por Poluição por Óleo.
Em um caso de 1978, no qual um petroleiro de bandeira liberiana, Amoco Cádiz, derramou óleo, ocasionando uma maré negra na costa da França, prejudicando a atividade de pesca e hoteleira, causando a morte de diversas aves marinhas. Ao decidir sobre os pedidos de indenização, a Corte de Illinois, nos Estados Unidos, rejeitou os pedidos, argumentando ser impraticável a mensuração do dano, pois esta adotara por alicerce especulações além de que, conforme aponta Soares (2003) “as reivindicações diziam respeito a uma res nullius, em favor da qual nenhuma pessoa ou organização tinha direito de apresentar indenização”.
Outro caso que merece ser trazido a lume, é o vazamento de produtos tóxicos ocorrido em Bhopal, na Índia, resultado da atividade lícita de uma indústria química, na qual tal vazamento, que aconteceu em 1984, ocasionou a morte de aproximadamente três mil pessoas e graves lesões em outras centenas, dando origem a diversos litígios.
O governo indiano promulgou lei conferindo ao governo central o direito de sub-rogar-se na representação e direito de propor ação pelos danos ocorridos, ajuizando ação em Nova York, local de domicílio da empresa responsável pela indústria química, todavia, a justiça nova-iorquina, utilizando-se do princípio forum non conveniens (não concordância de foro), que considera, no caso de incompetência, a facilidade para colheita de provas, a possibilidade de visitas a instalações e facilidade de oitiva de testemunhas eventuais, declarou-se incompetente, remetendo o feito para o tribunal de origem.
Apesar de diversas ações serem impetradas nos Estados Unidos, as Cortes Supremas desse país alegaram que as vítimas do desastre não poderiam buscar reparação em cortes norte-americanas. Ao longo dos anos, houve alguns acordos em relação a outros processos envolvendo o caso, no qual um deles a empresa responsável pagou o montante de US$ 470 milhões de dólares ao governo indiano, de uma proposta de US$ 3,3 bilhões de dólares.
O veredicto final ocorreu em junho de 2010, por um tribunal indiano, vinte e cinco anos mais tarde, condenando oito ex-funcionários da empresa responsável a dois anos de prisão e pagamento de multas ínfimas, causando indignação ao redor do mundo, especialmente pelo fato de que os resquícios do desastre ainda contaminam e poluem o lençol freático da região.
Tais casos cumprem a função de trazer à luz as lacunas existentes no Direito Internacional quanto à responsabilização dos Estados em questões ambientais. Seja por questões de soberania ou pelo alcance da vigência dos tratados, assim como a dificuldade em restringir o Estado infrator a cumprir determinações internacionais, representando marcos no fortalecimento do instituto da responsabilidade em Direito Internacional Ambiental.
4.5 ENSINAMENTOS DOS DOUTRINADORES QUALIFICADOS.
De acordo com Roessing Neto (2006), existe uma tendência na Corte Internacional de Justiça de não procurar a doutrina, entendendo que pronunciamentos da Corte Internacional em si seriam mais influentes do que opiniões de autores, por mais qualificados que fossem, observando-se, no entanto que doutrinadores são citados em pareceres e opiniões para casos judiciais, denotando, de acordo com Birnie e Boyle (2003) que julgadores e árbitros internos, menos familiarizados com o Direito Internacional, dão mais importância a esses ensinamentos, aduz Roessing Neto (2006, p.10):
“[…] grande parte do trabalho doutrinário (ao menos daqueles considerados como mais importantes) é realizada por instituições como a Comissão de Direito Internacional da ONU, o Instituto de Direito Internacional, a Associação de Direito Internacional, a Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento […]”
Apesar de alguns doutrinadores serem, ainda que muito dificilmente, reconhecidos como influência nas Cortes Internacionais, dentro do Direito Internacional Ambiental essa influência não foi nem parcialmente sentida, de acordo com Sunkin, Ong e Wight (2001, p. 4):
“No direito internacional geralmente, os trabalhos publicados de alguns escritores acadêmicos e artigos de corpos internacionais, como a Comissão de Direito Internacional, tem sido reconhecidos por corpos nacionais e internacionais como indicativos de lei bem como a forma que a lei é desenvolvida. Seu impacto no desenvolvimento do direito internacional ambiental, no entanto ainda está para ser sentido.”
Observa-se também que os próprios doutrinadores qualificados, conforme observam Birnie e Boyle (2003) corroboram a não utilização da doutrina, destacando a relevância maior dos pronunciamentos da Corte Internacional de Justiça.
4.6 RESOLUÇÕES DA ONU
O Estatuto da Corte Internacional de Justiça não inclui as resoluções da ONU como fontes do Direito Internacional, pois para alguns doutrinadores, os Estados têm obrigação de cumprir as resoluções pelo fato delas terem caráter obrigatório, conforme observa Roessing Neto (2006, p.10):
“[…] ainda que as Resoluções da ONU não possam ser consideradas, formalmente, como fontes de Direito Internacional, tendo em vista que, quando muito, elas representam somente o reconhecimento de uma regra preexistente, elas servem como elementos de pressão política e podem servir como elementos de coerção moral.”
Portanto, apesar do Estatuto não considerar as Resoluções da ONU fontes do Direito Internacional, existe controvérsia, pois, as diversas Resoluções da ONU são importantes como uma forma de compelir os Estados a sentirem-se obrigados a cumprir seus termos, devido ao caráter moral das resoluções, tornando-se base e inspiração de leis internas dos Estados sobre temas ambientais.
4.7 AS SOFT LAWS
A utilização do termo da língua inglesa, soft law, pode ser traduzido como “lei suave”, conforme aponta Roessing Neto (2006), explicando que enquanto a noção clássica do termo lei é a de ser coercitiva, compulsoriamente obrigatória, as soft laws tem um caráter mais brando, não coercitivo, suave.
Considera-se que a soft law tem caráter de natureza moral ou política, não constituindo propriamente, o Direito, mas uma derivação dele, tendo como pilar principalmente o princípio da boa-fé, conforme define o doutrinador Menezes (2003, p.76):
“[…] documentos derivados de foros internacionais, que têm fundamento no princípio da boa-fé, com conteúdo variável e não obrigatórios que não vinculam seus signatários a sua observância, mas que por seu caráter e importância para o ordenamento da sociedade global […] acabam por produzir repercussões no campo do direito internacional e também para o direito interno dos Estados.”
Internacionalmente não há a possibilidade de uma autoridade suprema, que tenha o poder de se impor aos demais Estados, como funciona internamente com os mesmos, elaborando leis e os obrigando a cumpri-las, assim como pontua Reis (2010), dizendo que, apesar dos diversos tratados bilaterais e multilaterais envolvendo diversos temas dentro do meio ambiente, não existe no Direito Internacional, um regime que abranja e proteja o meio ambiente como um todo, enquanto os tratados derivados do Direito Internacional Ambiental não podem ser classificados como reguladores propriamente ditos.
Além disso, esses mesmos tratados precisam em média de dois a doze anos para serem conclusos e tornarem-se efetivos, uma demora que pode ser crucial quando se fala em preservação e contenção de danos ambientais, que se tornam cada dia mais frequentes, bem como a dificuldade de consenso entre os Estados, quando tratados relacionados ao Direito Internacional Ambiental, tendem a produzir impactos econômicos negativos, tais quais os Estados geralmente se recusam a arcar.
Tendenciosamente, surge no campo do Direito Internacional Ambiental, um novo tipo de convenções-quadro, também chamadas Umbrella Conventions, nas quais são constituídas convenções de caráter geral e natureza de soft law nos quais são expressos princípios, resoluções ou códigos de conduta, que, após sua assinatura, conforme o passar dos anos, são firmados protocolos, que regulamentar tópicos da convenção, possuindo natureza coercitiva.
Um exemplo famoso é o Protocolo de Quioto, que é resultado de uma série de eventos iniciados na Conference on the Changing Atmosphere (Conferência das Mudanças Climáticas) realizada no Canadá em outubro de 1988, culminando enfim naConvenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, no Brasil, em junho de 1992.
Apesar de ter sido um sucesso, com 98% de países ratificando o protocolo, os Estados Unidos, talvez o maior poluidor do planeta, se recusou a ratificar, alegando que os compromissos constantes no protocolo interfeririam negativamente na economia norte-americana, além de questionarem a teoria de que os poluentes emitidos pelo homem na atmosfera são os que causam o aquecimento global, enquanto outros quatro países não emitiram nenhuma opinião.
Roessing Neto (2006) explica que apesar de não serem coercitivas, as regras de soft law contribuem para que, a longo prazo, os Estados passem a respeitá-las, transformando-as em costume internacional, inspirando também leis internas que conduzam à consciência ecológica nas relações internacionais, estabelecendo no âmbito do Direito Internacional Ambiental, normas imperativas, entendendo que “as
soft laws são Direito, posto que nem toda norma jurídica deve ser necessariamente,
objetiva a ponto de possuir aplicação imediata”.
A soft law é, em sua definição, uma norma programática, que tem por teor princípios normativos que tem o objetivo de nortear, mas não podem ser considerados regras, pois não geram obrigações específicas, entende Reis (2010, p. 20):
“A soft law é norma jurídica de conteúdo programático. […] implica adequação das leis e políticas internas do Estado ao conteúdo lá constante, e embora não se possa falar, como regra, em responsabilidade internacional pelo descumprimento, […] a desconsideração deliberada do compromisso lá contido pode acarretar responsabilização do Estado no plano internacional quando sua omissão na adequação das políticas internas causar danos a terceiros.”
Sendo norma jurídica de conteúdo programático, ainda assim a soft law é, apesar de conter instrumentos não obrigatórios, um instrumento de extrema importância no comportamento político entre os Estados, sendo reconhecidas, conforme bem pontua Roessing Neto (2006) “por tomadores de decisão como detentores de um importante efeito catalítico”, ou seja, a utilização de elementos normativos como regras legais.
CONCLUSÃO
A presente pesquisa teve como objetivo estudar o instituto da responsabilidade internacional dos Estados, observando em que circunstâncias existe a possibilidade de responsabilização estatal por dano ambiental, além da averiguação da forma mais interessante para o meio ambiente de se aplicar essa responsabilização, subjetiva ou objetivamente.
Adentrando no objeto do estudo que se pretendeu averiguar, ou seja, identificar os elementos caracterizadores da responsabilidade internacional do Estado por dano ambiental, o trabalho se dividiu em quatro capítulos.
O instituto da responsabilidade internacional do Estado se torna ainda mais importante quando acrescenta-se a questão ambiental, pois esta não influencia somente uma parte da sociedade internacional, e sim toda a sociedade em conjunto, diretamente, tendo em vista que por diversas vezes, conforme explanado, as ações, sejam lícitas ou ilícitas de um Estado, tem sido foco cada vez mais comum de efeitos transfronteiriços, atingindo outros Estados, cabendo ao Estado causador a responsabilização do dano, bem como, as ações dos entes estatais também interferem diretamente no planeta como um todo.
Em relação aos problemas apresentados no início dessa pesquisa, cabe aqui respondê-los. É possível responsabilizar internacionalmente o Estado por dano ambiental? Qual tipo de responsabilidade, subjetiva ou objetiva é mais eficaz para assegurar a reparação e recuperação do dano ao meio ambiente?
Quanto ao primeiro problema, conclui-se que, embora seja difícil, a responsabilização é possível, considerando a existência prévia de tratados ou convenções entre os Estados, ofensor ou ofendido, e uma vez configurada a responsabilidade, a reparação do dano ambiental deve ser eficaz e restituir de preferência, integralmente, o meio ambiente degradado, retornando-o à forma que se encontrava antes da ocorrência do dano, sendo que, a reparação somente deverá ser pecuniária em último caso, já que a perda, quando se fala em meio ambiente, é incalculável, e o objetivo máximo da reparação é restituir o que foi destruído.
No entanto, é possível a restituição combinada com indenização pecuniária, quando parte do que foi destruído não seja passível de reconstrução, nesse momento, observa-se a dificuldade doutrinária em avaliar e indenizar justamente o dano, por não haverem critérios definidos em nenhum plano interno ou internacional em relação a esse tipo de reparação.
Em relação ao segundo problema, verificou-se que, apesar da responsabilidade subjetiva imperar como maioria quando se fala em responsabilidade internacional, e ser utilizada também em questões ambientais, ela não é a melhor escolha quando a confrontada com os princípios estudados nas Declarações de Estocolmo e do Rio de Janeiro, pois dificulta a responsabilização estatal ao ser necessária a aferição de culpa para que se configure a responsabilidade, e em se tratando de dano ambiental, o elemento culpa é difícil de aferir, devendo ser utilizado somente em casos excepcionais, e não em regra, como ainda é utilizado, além de que, quando se observa as peculiaridades do dano ambiental, e o fato do meio ambiente ser um direito fundamental da pessoa humana, observa-se que a responsabilidade subjetiva pode ser ineficaz.
Porém, verificou-se uma tendência, extraída do Draft da CDI, de eliminar o elemento culpa ao averiguar a responsabilidade, estabelecendo um nexo de causalidade entre o evento danoso e a ação ou omissão do Estado, ainda que seja um projeto passível de aprovação, e não ser utilizado como regra, torna-se um grande avanço para a questão da responsabilidade internacional por dano ambiental, concluindo que a responsabilidade objetiva seria mais interessante do ponto de vista de regra, não devendo ficar adstrita somente como exceção ou em casos de atos lícitos que ocasionem danos ao meio ambiente.
Analisando a reparação do dano, e qual forma de reparação é mais interessante e benéfica ao meio ambiente, é inconcluso, pois é necessário um estudo mais profundo e abrangente do assunto, que não foi objeto do presente trabalho,
Já dizia Aristóteles, “A natureza não faz nada em vão”, e a fúria da natureza que destrói e estarrece a comunidade internacional é explicada pela resposta natural às intensas e intermináveis ações humanas contra o meio ambiente.
O revide experimentado pela humanidade é gradativo, e, de acordo com os dados científicos, só tende a piorar, portanto, o momento de reparação, precaução e prevenção é agora, quando estar-se na era em que se ultrapassaram os avanços trazidos pela industrialização, tornando-se a geração dos avanços científicos e tecnológicos, que trazem consigo o conhecimento e instrumentos necessários para evitar o desenvolvimento descabido e irresponsável para com o meio ambiente, aprendendo a utilizar o desenvolvimento sustentável, respeitando a natureza para desfrutar dela.
Assim como os avanços tecnológicos trazem consigo a alternativa de um desenvolvimento menos agressivo ao meio ambiente, o conhecimento científico adquirido com a evolução das ciências sejam elas biológicas, exatas ou humanas, também possibilita à humanidade uma nova forma de encarar a sociedade.
Desde João Sem Terra com a Carta Magna, passando por todas as batalhas e revoluções que permearam os séculos passados, atravessando pelo advento do iluminismo que inspirou a Revolução Francesa, culminando na primeira Declaração dos Direitos do Homem, percorreu-se um grande caminho. Nossos antepassados, com muito menos conhecimento do que se tem atualmente, deixaram um legado do qual se orgulha profundamente, pois, por meio da evolução do pensamento humano, alcançam-se os avanços experimentados no mundo atual.
Incumbe-se a esta geração iniciar a reconstrução do ambiente natural que foi sendo deteriorado para a construção do que é chamado de sociedade moderna, pois, tal sociedade tem o conhecimento para um desenvolvimento menos agressivo do que as gerações passadas o tinham.
O legado a ser deixado para as futuras gerações não pode ser o das sombrias previsões científicas, mas sim o de uma sociedade consciente da importância da natureza, amenizando os danos causados a ela, para um futuro menos catastrófico, no qual esta geração seja conhecida como aquela que começou o processo de reversão do dano, sendo lembrada da mesma forma que se lembra das gerações que nos proporcionaram o conhecimento.
Conclui-se assim que, com o avanço da preocupação com o problema ambiental, sofrendo as consequências dos danos ocasionados por nós mesmos, comunidade internacional, observa-se o fortalecimento do instituto da responsabilidade internacional por dano ambiental, visando com esse fortalecimento, o desenvolvimento da responsabilidade objetiva, dentro do direito ambiental, como regra a ser seguida nos casos de danos ao meio ambiente, seja por atos ilícitos ou lícitos, assegurando que a reparação do dano tenha como principal objeto a reparação e recuperação do meio ambiente lesado.
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Markeline Fernandes Ribeiro
Graduada em Direito pela Universidade Vale do Rio Doce
Pós Graduanda em Advocacia Trabalhista pela Universidade Anhanguera
markeline.fernandes@hotmail.com
[1] “ International environmental law is a relatively new branch of international law. It is generally accepted that a truly international environmental movement, in global terms, only began in 1972 on the occasion of the Stockholm Conference on the Human Environment, which yielded the now famous Stockholm Declaration Aside from such global instruments, much of the law is found in the burgeoning number of environmental treaty regimes that either have been, or are being, established to respond to particular environmental problems. Some of these problems have been with us for a while, others are of more recent pedigree. All now require prompt action.Another important aspect of international environmental law is the specific nature of many modern environmental threats. These require both detailed regulation as opposed to broad guidelines to combat them effectively and explicit rules, which are nevertheless susceptible to simple amendment procedures when new scientific information, for example, is available. In many cases there is also need for international co-operation in the identification, monitoring and prevention or control of the environmental problem concerned. These factors mean that negotiation of new treaty regimes is likely to be a more effective technique for legal change than reliance on the usually slower accretion of opinio juris and State practice giving rise to new rules of customary international law. The result is that codified rather than accumulated rules prevail” .
[2] Draft é a denominação da língua inglesa para rascunho, minuta, esboço. A CDI utiliza o termo pelo fato de ainda não ser um projeto completamente pronto, mas que serve de guia enquanto o projeto não é finalizado.
[3] Establishing rules expressly recognised by the States concerned, international conventions or treaties represent the clearest form of legal obligations between States. Accordingly, it has been suggested that the existence of a treaty relating to any particular matter will usually provide a clear and conclusive statement of the rights and duties of the States parties to it in their relations with each other. Treaties often require, in addition to signature at the conclusion of negotiations, ratification by parties. In the case of multilateral treaties, ratification by a minimum number of States parties is often required before they come into force (and then only between those ratifying States). Rules concerning the conclusion, application, interpretation, reservation, amendment, invalidation, suspension, and termination of treaties are set down in the 1969 Vienna Convention on the Law of Treaties, which codified and in certain respects added to the customary international law on the subject.
[4] “ While being a significant source of international legal obligations between States generally, customary international law fulfils a less significant role in international environmental law. This is because customary rules generally take time to evolve and rarely fulfil the specific requirements of international environmental law. It is widely accepted that two main elements are required to be present in the establishment of any particular rule of customary international law. These are, first, the physical element as evidenced by a general and consistent pattern of State practice and secondly, the psychological element of acceptance by these States that such practice is either required or allowed by law, the so-called criterion of opinio juris. The presence of these two elements, of State practice and opinio juris, is sufficient to prove the existence of a binding rule of customary international . “
[5] “ On the other hand, it has been argued that international law includes principles which have been recognized by the States themselves as governing relations between them, either generally or specifically. Such substantive principles include the prohibition against use of force, basic principles of human rights, the freedom of the seas, and the prevention of harm to another State’s territory. The recognition of these substantive principles of international law, in addition to the more commonly accepted procedural ones, enhances the general body of applicable international law, especially international environmental law.”