Matheus Lopes Dezan[1]
Em 1º de abril de 2021, foi sancionada e publicada, com vetos, a Lei n.º 14.133, usualmente denominada de a nova Lei de Licitações e de Contratos Administrativos. A nova Lei de Licitações e de Contratos Administrativos promove um sem-número de alterações sobre as normas jurídicas que concernem a licitações e a contratos públicos, instituindo um novo regime jurídico.
Para o propósito deste artigo, importa saber desde quando a Lei n.º 14.133/2021 está vigente, e quando deixarão de ter vigência e vigor as normas substituídas[2]. Assim prescreve a Lei:
Art. 190. O contrato cujo instrumento tenha sido assinado antes da entrada em vigor desta Lei continuará a ser regido de acordo com as regras previstas na legislação revogada.
Art. 191. Até o decurso do prazo de que trata o inciso II do caput do art. 193, a Administração poderá optar por licitar ou contratar diretamente de acordo com esta Lei ou de acordo com as leis citadas no referido inciso, e a opção escolhida deverá ser indicada expressamente no edital ou no aviso ou instrumento de contratação direta, vedada a aplicação combinada desta Lei com as citadas no referido inciso.
Parágrafo único. Na hipótese do caput deste artigo, se a Administração optar por licitar de acordo com as leis citadas no inciso II do caput do art. 193 desta Lei, o contrato respectivo será regido pelas regras nelas previstas durante toda a sua vigência.
[…]
Art. 193. Revogam-se:
I – os arts. 89 a 108 da Lei nº. 8.666, de 21 de junho de 1993, na data de publicação desta Lei;
II – a Lei nº. 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei nº. 10.520, de 17 de julho de 2002, e os arts. 1º a 47-A da Lei nº. 12.462, de 4 de agosto de 2011, após decorridos 2 (dois) anos da publicação oficial desta Lei.
Art. 194. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Por força do seu artigo 194, a nova Lei de Licitações e de Contratos Públicos vigora desde a data em que for publicada. A Lei, desse modo, vigora desde 1º de abril de 2021, data em que foi sancionada e publicada.
Em atenção à finalidade de substituição de regime jurídico que se depreende da nova Lei de Licitações e de Contratos Administrativos, que ocupará o espaço historicamente ocupado pelas Leis n.º 8.666 (antiga Lei de Licitações e de Contratos Administrativos), n.º 10.520 (Lei do Pregão) e n.º 12.462/2011 (Lei do Regime Diferenciado de Contratações Públicas), o artigo 193 da Lei, com amparo dos artigos 190 e 191 do mesmo diploma, cuida de revogar as leis do regime em processo de substituição de forma expressa por derrogação (revogação parcial) e por ab-rogação (revogação total)[3].
Os artigos 89 a 108 da Lei n.º 8.666/1993, que versam sobre Direito Penal, foram revogados na data em que foi publicada a nova Lei de Licitações e de Contratos Públicos, em razão do seu artigo 193, inciso I.
Diferentemente, os demais artigos da Lei n.º 8.666/1993, a Lei n.º 10.520/2002 e os artigos 1º a 47-A da Lei n.º 12.462/2011 serão revogados após o transcurso de dois anos contados a partir da data de publicação da nova Lei de Licitações e de Contratos Públicos, em razão do seu artigo 193, inciso II.
Como corolário, à exceção dos artigos 89 a 108 da Lei n.º 8.666/1993, revogados em 1º de abril de 2021, os demais artigos da Lei n.º 8.666/1993, a Lei n.º 10.520/2002 e os artigos 1º a 47-A da Lei n.º 12.462/2011 serão revogados em 4 de abril de 2023.
A data correta de revogação é 4 de abril de 2023 porque i) os prazos a que se refere a nova Lei devem ser contados com a exclusão do dia do começo e inclusão do dia do vencimento, ii) os prazos expressos em anos serão computados de data a data e iii) considera-se a data de vencimento do prazo prorrogada até o primeiro dia útil seguinte em caso de não haver expediente, de o expediente ser encerrado antes da hora normal ou de haver indisponibilidade da comunicação eletrônica no dia do vencimento do prazo (artigo 183, II, § 2º, da nova Lei de Licitações e de Contratos Públicos). Assim, a Lei n.º 14.133/2021, publicada em 1º de abril de 2021, vigeria em 2 de abril de 2023, dia de sábado, quando não há expediente, de modo que a lei vigerá no dia 4 de abril de 2023, primeiro dia útil subsequente ao dia 02 de abril de 2023.
Durante esses dois anos, a Lei n.º 14.133/2021 vigorará em conjunto com a Lei n.º 8.666/1993, com a Lei n.º 10.520/2002 e com Lei n.º 12.462/2011, de modo que competirá à Administração Pública optar, discricionariamente, a cada licitação ou contratação direta, por aquela lei ou por estas, de acordo com o artigo 191 da nova Lei de Licitações e de Contratos Públicos. Para tanto, a Administração Pública deve registrar, de forma expressa no instrumento convocatório ou de contratação direta, a opção pela Lei n.º 14.133/2021 ou pelas Leis n.º 8.666/1993, n.º 10.520/2002 e n.º 12.462/2011, sendo vedado combinar a aplicação daquela lei com estas.
De todo modo, os contratos administrativos disciplinados por lei diversa da Lei n.º 14.133/2021 serão regidos por essas leis durante toda a sua vigência, mesmo em caso de prorrogação contratual após 4 de abril de 2023, em acordo com os artigos 190 e 191, parágrafo único, da nova Lei de Licitações e de Contratos Públicos. Manifesta-se, então, o fenômeno da ultratividade da lei revogada, de acordo com o qual a lei revogada produz efeitos, isto é, vigora, ainda que não vija.
Assim, tem-se que: i) a nova Lei de Licitações vige e vigora desde 1º de abril de 2021 (art. 194); ii) revogaram-se em 1º de janeiro de 2021 os artigos 89 a 108 da Lei n.º 8.666/1993 (art. 193, I); iii) as Leis n.º 8.666/1993, n.º 10.520/2002 e n.º 12.462/2011 (artigos 1º a 47-A) serão revogadas em 04 de abril de 2023 (artigos 193, II); iv) de 1º de abril de 2021 a 4 de abril de 2023, compete à Administração Pública optar expressamente, no instrumento convocatório, pela nova Lei de Licitações e de Contratos Públicos ou pelas Leis n.º 8.666/1993, n.º 10.520/2002 e n.º 12.462/2011 (artigo 191); v) após a revogação das Leis n.º 8.666/1993, n.º 10.520/2002 e n.º 12.462/2011, em 4 de abril de 2023, os contratos que tenham sido assinados enquanto elas estavam vigentes permanecerão regidos por elas, em vigor póstumo à sua vigência, por incidência do fenômeno da ultratividade.
Veja-se, por fim, o seguinte quadro comparativo:
Vigência e Vigor da Lei n.º 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e de Contratos Públicos) |
|
Artigo 194 da Lei n.º 14.133/2021 |
A Lei n.º 14.133/2021 vige e vigora desde 01 de abril de 2021, quando foi sancionada pela Presidência da República e publicada no Diário Oficial da União. |
Artigo 193, I, da Lei n.º 14.133/2021 |
Os artigos 89 a 108 da Lei n.º 8.666/1993, que concernem a normas jurídicas de Direito Penal, foram revogados em 1º de abril de 2021. |
Artigo 193, II, da Lei n.º 14.133/2021 |
A Lei n.º 8.666/1993 (exceto artigos 89 a 108), a Lei n.º 10.520/2002 e os artigos 1º a 47-A da Lei n.º 12.462/2011 serão revogados após dois anos contados a partir da data de publicação da Lei n.º 14.133/2021, isto é, em 04 de abril de 2023. |
Artigo 191 da Lei n.º 14.133/2021 |
Enquanto permanecerem vigentes a Lei n.º 8.666/1993, a Lei n.º 10.520/2002 e os artigos 1º a 47-A da Lei n.º 12.462/2011 (até 02 de abril de 2023), faculta-se à Administração Pública a opção expressa por qualquer uma das leis, além da Lei n.º 14.133/2021. A opção da Administração Pública se mantém mesmo em caso de prorrogação contratual após 4 de abril de 2023. |
Artigo 190 da Lei n.º 14.133/2021 |
Os contratos assinados enquanto as leis revogadas pela Lei n.º 14.133/2021 vigiam serão regidos pelas leis revogadas, que produzirão vigor mesmo em caso de prorrogação contratual após 4 de abril de 2023. |
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021. Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 1 abr. 2021. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14133.htm. Acesso em: 1 maio 2021.
FERRAZ JR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. 10. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2018.
Este artigo foi originalmente publicado em: https://schiefler.adv.br/entenda-a-nova-lei-de-licitacoes-lei-no-14-133-2021-quando-passam-a-valer-as-novas-regras/
[1] Bacharelando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (FD|UnB). Estagiário de Direito em Schiefler Advocacia. Membro do Grupo de Estudos em Direito e Economia da Universidade de Brasília e do Instituto de Direito Público (GEDE/UnB/IDP). Membro do Grupo de Pesquisa em Hermenêutica do Direito Administrativo e Políticas Públicas do Centro Universitário de Brasília (HDAPP/UniCeub). Membro do Grupo de Pesquisa certificado pelo CNPq Direito, Racionalidade e Inteligência Artificial da Universidade de Brasília (DRIA/UnB). Editor Executivo Assistente da Revista dos Estudantes de Direito da Universidade de Brasília (RED|UnB). Contato: matheus@schiefler.adv.br.
[2] O fenômeno da ultratividade de normas jurídicas é aquele em acordo com o qual a norma jurídica, ainda que revogada (não vigente, portanto), produz vigor, isto é, é aplicada. Assim, como se verá, se determinado contrato público é regido pela Lei n.º 8.666/1993, mesmo após 4 de abril de 2023, quando a Lei n.º 8.666/1993 será revogada, a esse contrato deve ser aplicada a Lei n.º 8.666/1993, que não mais vigerá, mas vigorará. Cf. FERRAZ JR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. 10. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2018, p. 212.
[3] FERRAZ JR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. 10. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2018, p. 215.