Seguro-Fiança Locatícia
Maria Berenice Dias*
O nominado seguro-aluguel previsto na atual Lei de Locações já constava do inc. II do art. 31 da Lei nº 6.649/79, mas só agora começou a ser utilizado esse sistema de garantia das relações locatícias.
Das três modalidades existentes, somente a fiança merecia livre trânsito, já que a caução, apesar de regulamentada por mais de uma vez, nunca chegou a ser utilizada, ao menos nunca tive a oportunidade de apreciar qualquer demanda com essa espécie de garantia.
A Lei nº 8.245, de 18/10/91, prevê o seguro de fiança locatícia no seu art. 37, limitando-se o art.
Após o advento desse novo estatuto, a Superintendência de Seguros Privados regulamentou novamente a matéria, por meio da Circular nº 1, de 14/1/92, estabelecendo as condições gerais do seguro.
O seguro contra a insolvabilidade tem por objeto garantir o locador/segurado dos prejuízos decorrentes do inadimplemento do contrato de locação entretido com o locatário/garantido. Porém, não é simplesmente a mora que caracteriza o sinistro, senão que a decretação do despejo, o abandono do imóvel ou a entrega das chaves (cláusula 12 da Circular). Impõe-se ao segurado, em ocorrendo mora, a obrigação de proceder ao ajuizamento da ação despejatória (11.1), sendo que, para a cobrança da indenização, indispensável cópia da sentença de decretação do despejo e comprovação da desocupação efetiva do imóvel (14).
O pressuposto para a exigibilidade do seguro, ou seja, a condição para o pagamento da indenização é a decisão definitiva e já executada na ação de despejo. Evidencia-se, nesses moldes, a indispensabilidade da propositura da ação para ter-se por comprovada a ocorrência do sinistro a dar ensejo ao direito de indenização.
Assim posta dita questão, mister atentar-se na possibilidade de proceder a seguradora a adiantamentos do valor do aluguel, ainda durante a tramitação da ação despejatória (15.1). Tal benefício, decorrente da certeza da obrigação de pagar, se bem que ainda não exigível o crédito, não afeta a higidez do procedimento. Apesar de haver contraprestação correspondente a aluguéis e encargos, tal não configura cobertura do seguro, não se podendo falar em carência da ação a ensejar um juízo de extinção da demanda. É de atentar em que é descontado o percentual correspondente à Participação Obrigatória (15.1), a evidenciar ser incompleto o pagamento feito a esse título. Ainda que se quisesse admitir ter efeito liberatório o adiantamento feito ao credor, a existência de saldo, referente ao percentual da participação obrigatória, ensejaria o prosseguimento da ação.
Nesses termos, o pagamento levado a efeito não pode ser tido como fato superveniente a subtrair o interesse do locador para o prosseguimento da ação, configurando falta de uma das condições da ação a impor um juízo de extinção do processo. Nem perda de objeto ocorre, por desaparecimento de pressuposto para o desenvolvimento eficaz do processo, solução doutrinariamente mais adequada, a levar também a uma solução de término da relação processual.
Expresso no contrato (15.5) que, se não findar a locação, haverá a devolução dos pagamentos feitos a título de adiantamento. Assim, trata-se de pagamento condicional, sem efeito liberatório. Essa quase liberalidade deferida pela seguradora ao beneficiário, por evidente, não pode favorecer o garantido, revelando-se como uma forma de não sacrificar sobremodo o segurado, condicionando o recebimento do aluguel à tramitação, nem sempre célere, da ação despejatória.
É de lembrar que em outras hipóteses faculta a Lei de Locações o prosseguimento da ação ainda que não mais presente seu elemento constitutivo. Nas hipóteses que nomina, cabível a concessão de liminar de desocupação (§ 1º do art. 59), circunstância que, por si só, não leva à extinção da demanda. Mais, na ação de consignação em pagamento o levantamento dos aluguéis consignados não obstaculiza o prosseguimento do feito (parágrafo único do inc. VIII do art. 67), assim como o depósito feito para purgar a mora não impede o levantamento (inc. V do art. 62) ainda que prossigam as ações pelo saldo, o que poderá redundar em despejo.
Assim, de todo indiferentes para o prosseguimento da demanda os adiantamentos porventura feitos ao credor, circunstância não elisiva da mora para o efeito da decretação do despejo. É de lembrar-se, como derradeiro argumento, que impensável a subrogação da seguradora em todos os direitos do locador, entre eles a posse indireta do bem e, conseqüentemente, a possibilidade de promover a desocupação.
* Desembargadora no Rio Grande do Sul
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