Discurso de orador na cerimônia de colação de grau em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) em 1º de março de 2012.
Universidade Federal de Santa Catarina
Centro de Ciências Jurídicas – CCJ
Curso de Graduação em Direito
Formatura da turma 2007.1 Diurno
Discurso discente
Orador: Gustavo Henrique Carvalho Schiefler
Magnífico Reitor em exercício da Universidade Federal de Santa Catarina, Prof. Carlos Alberto Justo da Silva;
Honoráveis formandos da primeira turma de Direito do ano de 2007, meus colegas;
Excelentíssimo Chefe do Departamento de Direito desta universidade, Prof. Humberto Pereira Vecchio; demais professores da instituição;
Excelentíssima representante do Centro Acadêmico XI de Fevereiro, em nome de quem estendo os meus cumprimentos aos demais colegas da graduação;
Senhores familiares: pais, irmãos, avós, primos, tios, filhos e amigos.
Falo a vocês de coração aberto, pois esta noite celebramos uma conquista. Hoje celebramos momentos felizes. E mesmo já finado o carnaval, hoje também a tristeza foi interditada.
Eu poderia me valer desta tribuna, que outrora fora reservada a grandes juristas catarinenses, egressos dessa mesma casa, para cultivar alguma mensagem política, acadêmica, mas prefiro não fazer isso.
Eu poderia me valer desta tribuna para tratar de alguma mensagem jus-filosófica ou de esmiuçar uma renovada missão que temos pela frente, de exercitar a justiça, mas também prefiro não fazer isso.
Não o faço por uma razão bastante simples; não por receio de parecer clichê ou de transmitir alguma mensagem inoportuna; mas em razão de que seria inconveniente me sujeitar ao elevado risco de desvirtuar este momento e, em juízo daqueles que represento, desrespeitar peculiaridade tão típica a esta classe, qual seja, a pluralidade de ideias, a diversidade e a oposição de pensamentos.
Não me atrevo, portanto, a desajustar o senso de justiça e respeito à turma. Esta que represento é merecedora de mais. É merecedora da mais cuidadosa coleção de palavras, porque com nenhuma outra se identifica. É merecedora de memória, história e legenda.
Formamos ao longo dos últimos cinco anos uma turma absolutamente ímpar. Ou, como lembraria um colega nosso – com certa razão -, uma turma ímpar e par também.
Houve algum par durante a nossa graduação. Algum par apaixonado, um par de amizades, de grupos de amizade, alguns pares, ou melhor, para ser mais específico, catorze pares em nosso primeiro campeonato sedentário de truco, quando sentamos e jogamos às mesas dessa universidade.
Houve um par de ideologias, bem definidas e defendidas, algum par de debates, algum par de diretorias do CAXIF; enfim, pares de juízos e crenças. Raciocínios acareados, em alguns vários momentos, mas nascidos no mesmo berço, desenvolvidos e fortalecidos em conjunto. Isso porque na diferença percebemos um estímulo à pesquisa e à reflexão.
Daí resulta tamanha injustiça que seria por mim acometida acaso optasse, ao representá-los nesta tribuna, por uma visão monocular da classe. Adianto as minhas escusas para alguém que, por ventura, aguardasse ou desejasse palavras mais licenciosas.
Meus caros, daqui a uma semana, quando a lua cheia brindar os mares da Ilha de Santa Catarina, veremos refletida em suas águas esta enigmática abóbada celeste – ou o que quer que a denomine. Cada estrela, a anos-luz de lonjura, cintilando e expressando, a quem interessar possa, o brilho de seu passado, cada qual em sua individualidade, e, ao mesmo tempo, cada qual pertencendo a complexos sistemas de um universo.
E isso eu posso afirmar como certo, os profissionais de Direito que hoje concluem a sua primeira marcha refletirão, doravante, cada qual em sua íntima individualidade e a despeito de suas diferenças, o brilho comum de seu passado e, quando observados em conjunto, será reluzido o retrato de uma história compartilhada, desta pluralidade distintiva, comum e inerente àqueles que compõem a galáxia jurídica.
Pois bem, naquele primeiro e fatídico dia 19 de março de 2007, quando começamos a caminhada, recebemos de nossos mestres um enorme quadro em tela branca, novo, limpo, acondicionado nas profundezas da nossa biologia, absolutamente livre para registrar cinco anos de arte e ciência jurídicas.
Esse enorme quadro em tela branca foi sendo recoberto de cor por cada um de nós e, pouco a pouco, a cada nova experiência universitária, conforme a verve que inspirava o momento, ganhou forma corrigida e exclusiva.
No mais das vezes, permanecemos animados e eloquentes. Em algumas poucas, aflitos e ansiosos. Tivemos dúvidas sobre como pincelar este quadro do conhecimento; que arte é essa sobre cuja estrutura não há sequer consenso? O conteúdo do Direito merece forma contornada ou não merece forma alguma? Afinal de contas, o que é mais belo: o espontâneo ou o organizado?
Dúvidas como essas, que vem e vão, que foram e voltaram… persistiam… persistem…
É hoje que este quadro recebe a nossa assinatura. Este quadro passa a compor a nossa galeria. Este quadro agora nos permite alçar telas maiores.
E há algo que merece menção: nunca faltamos à humildade em reconhecer o quão pouco ainda conhecemos, não hesitamos recorrer aos mestres, aos amigos e, particularmente, aos pais, nossos heróis responsáveis por suportar as nossas necessidades mais básicas para que pudéssemos nos manter livres e cursar esta graduação, numa verdadeira expressão de amor. Em vocês todos, familiares, mestres e amigos, buscamos inspiração, iluminação ou comparação, ocasiões em que sempre fomos acolhidos em portos seguros. Somos especialmente gratos a isso.
Dentre os confins desta universidade, tivemos a oportunidade de desenvolver três propriedades que preenchem o homem: corpo, mente e arte.
No âmago de cada experiência, vimos a dedução lógica confrontar a intuição, em duelos épicos do convencimento. Vimos a liberdade encontrar a sua expressão e, por vezes, ser questionada; assistimos aos mistérios do mundo físico, com sua peculiar escassez, dificultar interesses igualitários. Foram incontáveis as oportunidades em que os nossos sentidos foram provocados ao longo destes últimos cinco anos.
Somos gratos a isso. Somos gratos aos fundadores e aos mantenedores da, já octogenária, Faculdade de Direito de Santa Catarina. Somos gratos à Universidade Federal de Santa Catarina pelo ambiente que foi a nós disposto, fértil e propício ao desenvolvimento das ideias.
Meus colegas, tenho a mais plena convicção; tal a força que vos impeliu a seguir determinados; tal a força que vos impeliu a não aceitar menos que o adequado; tais os resultados que já despontam dos últimos processos seletivos, profissionais e acadêmicos; que serão vocês, estes mesmos obstinados acadêmicos, hoje formandos, amanhã bacharéis, pugnando diuturnamente por aquilo que acreditam, os que registrarão algumas das próximas páginas – ou no mínimo, algumas linhas das próximas páginas – da história catarinense, quiçá e oxalá, da história brasileira.
Que fique esta mensagem de orgulho, agradecimento e felicidade. Há razões de sobra para comemorar. Há razões de sobra para exercitar o que é justo.
Para os que conhecem a incomensurável gama de experiências que se extrai ao longo da graduação em Direito nesta universidade, ficará manifesto que não poderia, em tão curto espaço, profundar os seus cinco mil memoráveis detalhes; no entanto, para quem ensaia desvendar os corredores do CCJ, ou para aqueles cujas memórias as rugas do tempo já causam rusgas e hesitações, ou ainda, para aqueles cuja curiosidade é hoje aguçada pelo amor que têm aos que aqui estão, ouso crer que esta modesta tentativa, para além desses cincos minutos, certamente já extrapolados, não parecerá inútil.
Por fim, meus colegas, trago a vocês uma coleção simples, mas sofisticada, de palavras, que Churchill exclamou após uma de suas importantes vitórias e que tem semelhança admirável com o que hoje celebramos. E na expectativa de que nos auxilie a melhor compreender este momento, não me acanho em repeti-las:
“Este não é o fim. Não é sequer o começo do fim. Mas é, talvez, o fim do começo.”
Muito obrigado.