Fala-se muito sobre a necessidade de ser a Justiça integrada por juízes competentes e honestos.
Discute-se o Ministério Público, seu relevante papel como fiador e guardião de todo o aparato judiciário.
Não se deixa de trazer à baila a indispensabilidade dos advogados. Sem estes não há Justiça.
Em meio a toda essa discussão, é raro que se veja colocada a imprescindível presença dos serventuários e funcionários da Justiça. Omissão lamentável
porque a Justiça só funciona bem quando conta com bons servidores.
Machado de Assis, num apólogo antológico, criou um diálogo entre a agulha e a linha, a linha querendo depreciar a agulha porque a linha é que aparecia
nas vestes dos salões, enquanto a agulha permanecia obscura no seu canto.
Como em tudo que Machado escreveu, sempre havia uma mensagem universal acima do significado textual.
A página de Machado é uma advertência a todos aqueles que, no topo das instituições, pretendem a homenagem e o reconhecimento, sem compreender que, na
retaguarda de tudo que fazem, há uma agulha tecendo e abrindo caminho.
Como seria alvissareiro que magistrados, membros do Ministério Público e advogados estivessem sempre atentos ao esforço silencioso dos serventuários e
funcionários da Justiça. Como deveria ser exaltado o desempenho das imprescindíveis agulhas. E quantas vezes, infelizmente, essas agulhas são
esquecidas, deixadas de lado e até menosprezadas.
Se a Justiça não é justa com seus servidores, será justa com os cidadãos em geral? Se fecha os olhos diante daqueles que estão diuturnamente fazendo
audiências, movimentando processos, cumprindo mandados, cerficando e dando fé, será capaz de ter ouvidos abertos para ouvir o clamor do povo que pede
Justiça?
Acho que não. Um Poder Judiciário que não valoriza seus agentes, que não reconhece os serviços daqueles que, na mesma nau, fazem o barco andar, esse
Poder Judiciário mostra-se absolutamente incapaz de dar a cada um o que é seu.
Esta reflexão brota de minha alma no momento em que recebo a notícia de que faleceu o Dr. Epaminondas Gomes Moreira, um Serventuário exemplar na
comarca de São José do Calçado.
Epaminondas, no Cartório, foi sempre um servidor, nunca se serviu. Tratou os ricos com cortesia altiva e os pobres com evangélica doçura.
Sua postura sempre humilde escondia um gigante ético, um paradigma de ser humano, como cidadão, serventuário da Justiça, professor do Colégio de
Calçado, esposo, pai.
À sua memória nossa homenagem, a sua família nosso abraço de pêsames.
* João Baptista Herkenhoff, magistrado aposentado, é Professor da Faculdade Estácio de Sá do Espírito Santo e escritor. E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br
Homepage: www.jbherkenhoff.com.br