O art. 114, VIII, da Constituição Federal outorga competência à Justiça do Trabalho para processar e julgar “a execução, de ofício, das contribuições
sociais previstas no art. 195, I, “a”, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir”.
Tal artigo, todavia, não permite à seara trabalhista alterar as normas tributárias. Explico: há Tribunais Regionais que entendem que a contribuição
previdenciária devida pelo empregador em função de condenação ou acordo trabalhista deve ser paga observando-se a “data da prestação dos serviços pelo
trabalhador, até porque o tributo é apurado mês a mês” (TRT12, AgPet nº 03564-2007-032-12-00-8). Essa compreensão, todavia, não encontra fundamento
satisfatório.
Diante da natureza tributária da contribuição previdenciária, para verificar sua incidência em um caso concreto, impõe-se utilizar a regra matriz de
incidência. No presente caso, basta examinar o aspecto material (verbo + complemento) e o aspecto temporal.
Dispõe o art. 195, I, a Constituição Federal:
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos
orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo
sem vínculo empregatício;
b) a receita ou o faturamento;
c) o lucro;
Do ditame constitucional, extrai-se que o aspecto material da regra matriz de incidência da contribuição previdenciária é pagar (verbo) salário e
demais rendimentos (complemento). Dessa forma, só há fato gerador se o empregador pagar verbas remuneratórias.
O aspecto temporal, por sua vez, sendo o elemento que indica em que preciso instante se concretiza a hipótese de incidência, guarda relação direta o
critério material. In casu, como critério material é o creditamento salário ou demais rendimentos, o fato gerador só se perfectibiliza na data
do efetivo pagamento.
Nessa linha é o ensinamento de Thiago D’Ávila Fernandes:
Sendo o critério material formado pelos verbos “pagar” ou “creditar”, o critério temporal deve, necessariamente, ser fixado como o instante do pagamento ou creditamento do débito trabalhista ao credor, independentemente de ter ocorrido por força de
decisão condenatória ou acordo homologado. Neste exato momento, ocorre o fato imponível, dando nascimento à relação jurídico-tributária e à obrigação
previdenciária. (In: Regra matriz de incidência da contribuição previdenciária na execução trabalhista. Revista do TST, Brasília, vol. 71, nº 1,
jan/abr 2005, p. 369, grifo nosso)
Aliás, nem poderia ser diferente. O art. 116, I, do Código Tributário Nacional, deixa claro que o fato gerador só ocorre no momento em que “se
verifiquem as circunstâncias materiais necessárias”. No presente caso, a “circunstância material necessária”, é p efetivo pagamento das parcelas
tributárias, motivo por que o a hipótese de incidência se concretiza na data do pagamento.
Dessa forma, somente quando forem efetivamente creditadas ao empregado Recorrido as parcelas remuneratórias devidas pelas Recorrentes é que serão
devidas as contribuições previdenciárias. Esse é, inclusive, o entendimento pacífico do TST:
RECURSO DE REVISTA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. FATO GERADOR.1. A jurisprudência desta Corte pacificou o entendimento de que, no caso de sentença ou
de acordos celebrados em juízo, o fato gerador da contribuição previdenciária é o efetivo pagamento da quantia devida ao empregado, e não
a data da prestação dos serviços. (TST, RR nº 79185-06.2005.5.15.0120, Relator: Delaíde Miranda Arantes, Data de Julgamento: 22/06/2011, 7ª Turma, Data
de Publicação: DEJT 01/07/2011, grifo nosso)
Fica nítido, dessarte, que o entendimento que busca fazer incidir a contribuição previdenciária mês a mês viola a Constituição e a regra-matriz de
tributação. Ao que tudo indica, tal posição trata-se de uma maneira de tentar punir o empregador pelo descumprimento de suas obrigações trabalhistas.
Mas por quê? Será que o empresário já não sofre demais?
* Ricardo de Holanda Janesch
Email: ricardo@investidura.com.br