Comissão de Jurisprudência e Súmula
Belo Horizonte | 23 de agosto a 05 de setembro de
2010 | nº 31
Este Informativo, desenvolvido a partir de notas
tomadas nas sessões de julgamento das Câmaras e do Tribunal Pleno, contém
resumos elaborados pela Comissão de Jurisprudência e Súmula, não consistindo em
repositórios oficiais da jurisprudência deste Tribunal.
SUMÁRIO
Tribunal Pleno
1ª Câmara
Decisões Relevantes de Outros Órgãos
? TJRJ – Aplicação do Princípio da Duração Razoável do
Processo
Tribunal Pleno
É legítima a adequação do plano de carreira do
magistério público municipal ao piso salarial dos profissionais da educação
básica, com amparo na Lei Federal 11.738/08 (lei que prevê a instituição e a
atualização do piso salarial nacional para os profissionais da educação
básica), impondo-se ao Poder Público, entretanto, o dever de adotar as medidas
prescritas na LRF e na CR/88. Essa foi a resposta do Tribunal Pleno a consulta.
O Cons. Gilberto Diniz, relator, assinalou que a adequação da remuneração dos
profissionais do magistério público da educação básica ao piso salarial a que
se refere a Lei 11.738/08 constitui uma exceção à vedação do parágrafo único do
art. 22 da LRF, segundo o qual, uma vez atingido o percentual de 95% do limite
dos gastos com pessoal, ficaria vedada a concessão de vantagem, aumento,
reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título. Explicou ser a exceção
em tela fundamentada no inc. I do parágrafo único do art. 22 da LRF e, em
seguida, ponderou que o Poder Público não fica dispensado de observar as demais
proibições insertas nos incs. II a V do parágrafo único do art. 22 da LC
101/00, nem de adotar medidas compensatórias a fim de impedir ou sanear o
desequilíbrio porventura gerado nos gastos com pessoal. Salientou ser
importante, para a efetivação do piso salarial, a norma fixada no art. 4º da
Lei 11.738/08, a qual determina que a União complemente a integralização do
valor do piso nos casos em que o ente federativo, a partir da consideração dos
recursos constitucionalmente vinculados à educação, não tenha disponibilidade
orçamentária para cumprir o valor estabelecido. Por derradeiro, informou que a
constitucionalidade da Lei 11.738/08 foi arguida por meio da ADI 4.167-3 e que
o STF (1) deferiu parcialmente a cautelar para fixar interpretação do art. 2º
da citada Lei conforme à CR/88, no sentido de que, até o julgamento final da
ação, a referência do piso salarial é a remuneração; (2) deferiu a cautelar em
relação ao §4º do art. 2º; e (3) deu interpretação conforme à CR/88 ao art. 3º,
para estabelecer que o cálculo das obrigações relativas ao piso salarial se
dará a partir de 01.01.09. Concluiu que o deferimento parcial da cautelar na
ADI não inibe ou compromete a manifestação do Tribunal de Contas, pois tanto o
objeto da Ação como a decisão proferida pelo STF não alcançam o objeto da
presente consulta. O voto foi aprovado à unanimidade (Consulta nº 812.465, Rel.
Cons. Gilberto Diniz, 25.08.10).
Em resposta a consulta subscrita por Presidente de
Câmara Municipal, o Tribunal Pleno decidiu que (a) é ilegal a aquisição de
combustível, às custas da Câmara Municipal, para abastecimento de veículos de
propriedade de vereadores, mesmo se utilizados no exercício do mandato
parlamentar e (b) é ilícita a compra de coroas de flores por ocasião da morte
de amigos e familiares dos edis com recursos do erário. O relator, Cons. Elmo
Braz, adotou o parecer do Auditor Hamilton Coelho para responder às indagações.
Inicialmente, a Auditoria asseverou que o TCEMG já declarou, em diversas
oportunidades, a ilegalidade do abastecimento de veículos particulares de
vereadores com recursos da Câmara, ainda que para uso no interesse do órgão,
mencionando, nesse sentido, a Consulta nº 810.007 (Rel. Cons. Eduardo Carone
Costa, sessão de 03.02.10) – v. Informativo 17. O Auditor transcreveu parte do
parecer exarado naquela Consulta no sentido de que a utilização de veículo de
propriedade particular de vereador, mediante contraprestação (abastecimento) a
serviço da Administração Pública, configuraria contrato de locação de fato e de
que o uso intercalado do veículo – ora em caráter particular, ora a serviço –
tornaria difícil a mensuração do quantum a ser indenizado, redundando em confusão
patrimonial envolvendo o agente público e o órgão contratante. No referido
parecer, asseverou-se, ainda, não ser cabível o pagamento de combustível por
quota mensal, uma vez que conferiria caráter remuneratório ao valor pago.
Quanto à hipótese de aquisição de coroas de flores, com recursos do erário, por
ocasião da morte de amigos e familiares dos edis, o Auditor afirmou ser essa
insustentável em face dos princípios que regem a Administração Pública insertos
no caput do art. 37 da CR/88, em especial os da impessoalidade e da moralidade.
Ponderou que recursos de natureza pública, auferidos pelo trabalho dos cidadãos
em geral, não podem ser despendidos em homenagens a amigos e familiares de
ocupantes de cargos políticos. O voto foi aprovado, ficando vencido, em parte,
o Cons. Sebastião Helvecio, que entendeu ser possível o uso de veículos
particulares de vereadores mediante indenização pelas despesas dele
decorrentes, desde que comprovadamente utilizados no exercício da atividade
parlamentar e respeitados os preceitos constitucionais e infraconstitucionais
pertinentes (Consulta nº812.510, Rel. Cons. Elmo Braz, 25.08.10).
Em sede de retorno de vista de consulta, o Cons.
Antônio Carlos Andrada proferiu voto no sentido de que tanto o reajuste como a
revisão geral anual integram a despesa total com pessoal porque não estão
expressamente previstos como exclusões dessa despesa, conforme o §1º do art. 19
da LRF. Nesse primeiro ponto, o Conselheiro acompanhou o voto do relator, Cons.
Eduardo Carone Costa, e aproveitou a oportunidade para sublinhar que, ao
contrário do reajuste, a revisão geral anual (art. 37, X, da CR/88) pode ser
realizada mesmo quando ultrapassado o limite prudencial de 95% da despesa total
com pessoal, conforme o inc. I do parágrafo único do art. 22 da LRF e a 3ª
edição do Manual de Demonstrativos Fiscais da Secretaria do Tesouro Nacional –
STN, vol. III, válido para o exercício de 2011, aplicado à União, aos Estados e
aos Municípios. Já em relação ao imposto de renda retido na fonte – IRRF, o
Cons. Antônio Carlos Andrada divergiu do relator e reiterou seu posicionamento,
já explicitado na Consulta nº 676.672, sobre a impossibilidade de se excluir
esse imposto do cálculo da despesa total com pessoal. Assinalou que, na sessão
do Tribunal Pleno de 17.08.10, restou consignada uma mudança de entendimento do
TCEMG acerca da contabilização de valores relativos ao desconto do IRRF, no
sentido de que tais retenções devem, para todos os efeitos, integrar tanto a
base de receita do ente como também compor os gastos totais com pessoal.
Reforçou a importância do princípio do orçamento bruto (consagrado no art. 6º
da Lei Federal 4.320/64), o qual traduz a ideia de que todas as receitas e
despesas devem constar no orçamento em seus valores brutos, vedadas quaisquer
deduções, ponderando que esse princípio obriga o registro de natureza
escritural do IRRF como despesa de pessoal, já que esse imposto integra o
salário bruto pago pela Administração Pública. Entretanto, seria necessário
fazer uma distinção: de fato, o real contribuinte do imposto de renda é o
servidor ou o empregado, de modo que, quando as empresas privadas realizam a
retenção e o recolhimento do IRRF aos cofres públicos, há o efetivo ingresso
financeiro de receita na esfera governamental, mas, quando o ente governamental
ocupa, também, a figura de empregador, não ocorre a movimentação financeira, em
sentido estrito do termo, porque é o próprio Poder Público o devedor e o
destinatário da receita proveniente desse imposto. Assim, concluiu que, para
efeito de escrituração, ao mesmo tempo em que o IRRF é despesa ao compor o
salário bruto do servidor ou empregado, é também registrado como receita do
mesmo ente. Acrescentou que a exclusão do IRRF da despesa total com pessoal
poderia distorcer a finalidade da LRF de limitar o comprometimento dos recursos
públicos com despesas de natureza remuneratória, dado que o IRRF integra o
salário bruto do servidor ou empregado. Aduziu, ainda, que o IRRF não pode ser
excluído do cálculo da despesa total com pessoal, conforme disposição expressa
da 3ª edição do Manual de Demonstrativos Fiscais da Secretaria do Tesouro
Nacional, volume III. Foi aprovado o voto vista, vencido o Cons. Rel. Eduardo
Carone Costa, que considera possível a exclusão do IRRF da despesa total com
pessoal (Consulta nº 812.412, Rel. Cons. Antônio Carlos Andrada, 01.09.10).
1ª Câmara
Trata-se de processo administrativo decorrente de
inspeção extraordinária realizada no Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais
S.A. – BDMG, autuada sob o nº 692.056, determinada pela 2ª Câmara do TCEMG, na
sessão de 05.08.04, na apreciação do processo nº 688.739 – Representação
formulada por Dellape Baptista e Biazzo Simon Advogados Associados, em face do
Edital de Licitação nº 008/2004, na modalidade concorrência, promovida pelo
BDMG, que teve como objeto o credenciamento de 10 sociedades de advogados
sediadas em Belo Horizonte, sendo três para contratação imediata e sete para
cadastro de reserva, para prestação de serviços técnicos profissionais com
vistas à recuperação de créditos e bens de interesse do BDMG, incluindo sua
defesa em juízo, em todas as instâncias, nas demandas em curso ou que
surgissem, relacionadas com os respectivos créditos e bens. A inspeção
extraordinária no BDMG teve como objetivo apurar a necessidade de contratação
de serviço jurídico especial, considerando que o Banco possui órgão jurídico e
que existia concurso com prazo válido para nomeação dos advogados
classificados. A Cons. Rel. Adriene Andrade julgou regular a contratação de
serviços jurídicos especializados por estar motivada no aumento excepcional da
demanda na Instituição e, ainda, por não identificar irregularidade no
preenchimento das vagas do concurso regido pelo Edital nº 01/2003, de
18.12.03, homologado em 29.04.04, considerando que foram convocados todos os
classificados para as vagas ofertadas. Para fundamentar seu voto, a relatora
transcreveu lição de Joel Menezes Niebuhr, que defende a possibilidade de
contratação de advogados estranhos ao quadro da entidade, mesmo para situações
ordinárias, desde que configurada a insuficiência para atendimento da demanda
existente e que, nestes casos, a contratação de terceiros deve ser regida pela
Lei 8.666/93, sendo, em regra, precedida de licitação pública. Por outro lado,
recomendou ao BDMG – que possui departamento jurídico especializado em
contencioso, cuja função, entre outras, é a promoção de ações judiciais – que
avalie a necessidade de adequar seu quadro próprio de advogados à demanda de
ações judiciais, pois o fundamento da demanda excepcional que justificou o
credenciamento, à época, não pode perdurar ao longo do tempo. O voto foi
aprovado à unanimidade (Processo Administrativo nº 704.141, Rel. Cons. Adriene
Andrade, 31.08.10).
Decisões Relevantes de Outros Órgãos
TJRJ –
Aplicação do Princípio da Duração Razoável do Processo
“YYY foi denunciado porque, em tese, no dia 13 de
abril de 1996, (…) ofendeu a integridade física de ZZZ (…). A juíza a quo,
no dia 08 de maio de 2002, pronunciou o recorrente para que responda, perante o
Tribunal do Júri, pela prática do crime definido no artigo 121, § 2.º, incisos
III e IV, do Código Penal (…). É o relatório. VOTO. A Defesa postula a
declaração da nulidade da citação e de todos os atos processuais subsequentes
e, subsidiariamente, a exclusão da qualificadora relativa ao recurso que
impossibilitou a defesa da vítima (…). A hipótese é de provimento deste
recurso, contudo em limites mais extensos do que os propostos nas razões (…)
e por fundamentos distintos. (…)É verdade que XXX sequer foi encontrado para
ser citado. Contudo, ainda que ele seja tido como foragido (…) a sua ausência
no processo é fruto exclusivo da inoperância do Estado. Passaram-se, pois,
quase quatorze anos(…) e nenhuma resposta foi dada, quer à sociedade, quer ao
réu. Da duração razoável do processo e sua positivação como garantia
fundamental do cidadão. De fato, somente em 1950 a Convenção Europeia de
Direitos Humanos veio a positivar o direito à duração razoável do processo
(…). Não obstante, hoje, nossa jurisprudência ainda interpreta o artigo 5.º,
inciso LXXVIII, da Constituição da República de forma restrita: limita-se a
relaxar a prisão cautelar, quando preso o acusado , e a timidamente reconhecer
a responsabilidade civil do Estado pela mora jurisdicional, quando decorre de
dolo ou fraude dos órgãos do Poder Judiciário. Em que pese esta função
garantidora do processo penal, forçoso concluir que a sua simples existência
(…) acarreta prejuízos ao acusado. Assim, o processo penal (…) também pode
representar um prejuízo ao acusado, mesmo porque é evidente que a persecução
penal dá ensejo a vários atos limitadores dos direitos individuais, (…). Por
isso mesmo o direito processual, como ciência normativa, busca o parâmetro
temporal mais seguro possível (…). Além disso, a inegável restrição da
liberdade que o processo acarreta, associada ao sentimento de incerteza a
respeito da futura submissão à medida extrema da privação da liberdade, provoca
sensação de angústia que, mesmo estando solto o acusado, se confunde, ainda que
guardadas as proporções, com as sensações experimentadas dentro do cárcere. Se
“o tempo não pára”, ao menos para quem é processado criminalmente ele
verdadeiramente se arrasta num ambiente de insegurança e ansiedade,
transformando-se na pena propriamente dita. (…) Nesse contexto, (…) a
ausência de “prazo fixo” para a duração do processo, (…), em inúmeras
hipóteses, acaba por colaborar ainda mais para o contexto de incerteza em que
se encontra o acusado. Um processo que perdura por quase quatorze anos, (…)
seja com um pronunciamento contrário ou favorável ao réu, viola manifestamente
o direito fundamental à segurança jurídica (…) e, portanto, a dignidade do
acusado enquanto pessoa humana. E a restrição de um direito fundamental não
pode gerar outra conclusão senão a de que o tempo é um aspecto mesmo do poder
punitivo. (…) E, como no tempo se revela essa faceta do poder estatal, então
o tempo deve ser contido (…). Dos meios de contenção do tempo: o devido
processo legal como processo sem dilações indevidas. A jurisprudência não
tem se ocupado de medidas destinadas a viabilizar uma duração razoável ao
processo senão pelas vias tradicionais da prescrição, da decadência, da
perempção e da detração. Trata-se, porém, de institutos calcados naquela noção
temporal absoluta e objetiva do relógio, que ignoram, portanto, o tempo
subjetivo do acusado, além do tempo da vítima e até mesmo o tempo social (…).
Parte da doutrina tem sugerido a aplicação de outros institutos, como o indulto
e a liberdade condicional, (…). Finalmente, há os que postulam a extinção do
processo em caso de mora injustificada do Judiciário. A solução mais adequada,
entretanto, só será encontrada quando se der efetividade ao brocardo,
amplamente difundido na doutrina, segundo o qual “(…) justiça atrasada não é
justiça, senão injustiça qualificada e manifesta”. (…) Assim, com a dilação
indevida do processo, a primeira garantia que cai por terra é a da
jurisdicionalidade insculpida na máxima latina do nulla poena nulla culpa sine
iudicio. Isso porque o processo se transforma em pena prévia à sentença, (…).
Em casos como o presente, a interrupção da marcha processual em prol de
sentença absolutória configura quebra positiva de direitos fundamentais,
absolutamente aceitável sob o prisma democrático, que sedimenta precisamente a
tutela da liberdade individual. (…) Dessa forma, a demora injustificada em
dar resposta aos casos penais impõe que o Estado, por inoperância própria,
“abra mão” de seu direito de punir porque, na verdade, já o exerceu por meio da
submissão do réu a intenso e prolongado sentimento de incerteza e angústia.
Neste caso, porém, deixo de aderir a esta solução não só porque se trata de
matéria de competência constitucional estranha a este colegiado, mas ainda porque
a própria prescrição traz resposta suficiente a impedir que XXX venha a ser
processado novamente, (…). Pelo exposto, voto no sentido de dar provimento ao
recurso, em limites mais extensos que os delimitados nas razões, a fim de que
seja o acusado despronunciado, declarando-se extinta a punibilidade do fato em
relação a ele.”(TJRJ, Recurso em Sentido Estrito nº 2003.051.00073, Rel. Des.
Geraldo Prado, Julgamento: 24/06/2010 – Quinta Câmara Criminal)
Técnicas responsáveis pelo Informativo:
Luisa Pinho Ribeiro Kaukal
Marina Martins da Costa Brina
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