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HABEAS CORPUS Nº 87.140 – RJ (2007/0166640-8)
R E L ATO R A : MINISTRA DENISE ARRUDA
IMPETRANTE : SÂNZIO BAIONETA NOGUEIRA E OUTROS
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO
RIO DE JANEIRO
PA C I E N T E : MARIA DO ROSÁRIO DIAS SBAMPATO
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO FISCAL.
PENHORA SOBRE O FATURAMENTO. DESCUMPRIMENTO.
DEPOSITÁRIO INFIEL. NÃO-CARACTERIZAÇÃO.
CONCEITO QUE NÃO PODE SER AMPLIADO POR TÉCNICAS
QUE AUMENTEM O ALCANCE DA TIPIFICAÇÃO
PREVISTA NA LEI.
1. Não obstante a prisão tenha sido decretada pelo juízo da eução,
o Tribunal de origem, em sede de agravo de instrumento,
reconheceu sua legitimidade. Destarte, havendo ameaça à liberdade
individual, não se mostra plausível exigir-se a interposição
de qualquer outro recurso (no caso, especial ou extraordinário) e
suprimir o direito à impetração de habeas corpus, em virtude da
celeridade e urgência no procedimento. Além disso, a Corte de
origem deixou de conhecer do habeas corpus apresentado após o
julgamento do agravo de instrumento, por força do “trânsito em
julgado da decisão relativa ao agravo”. Assim, mostra-se caracterizada
a competência desta Corte para apreciar a presente impetração.
2. Nos termos do art. 5º, LXVII, da CF/88, “não haverá prisão
civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário
e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário
infiel”. Segundo o art. 652 do CC/2002 e o art. 902, § 1º, do CPC,
a restrição à liberdade não pode eder um ano e serve como
“constrição psicológica para o adimplemento da obrigação de
entregar a coisa” (FIUZA, Cesar. “Direito civil: curso completo”,
10ª ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2007, pág. 564). Assim, em
princípio, a prisão do depositário infiel é autorizada pelo ordenamento
jurídico.
3. Por outro lado, há precedentes desta Corte no sentido de admitir
a prisão do responsável pelo depósito mensal de valor decorrente
de penhora sobre o faturamento da empresa. Nesse sentido:
RHC 17.244/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Antônio de Pádua
Ribeiro, DJ de 18.4.2005; RHC 21.039/RS, 4ª Turma, Rel. Min.
Hélio Quaglia Barbosa, DJ de 4.6.2007.
4. Contudo, tratando-se de restrição à liberdade individual, é
necessário o perfeito enquadramento da situação fática ao conceito
previsto na norma. É depositário aquele que recebe um bem
para guardar até que o depositante o reclame (depósito voluntário),
ou é nomeado responsável para a guarda de bens que
foram objeto de penhora (depósito judicial), devendo as contas
serem prestadas na forma do art. 919 do CPC. Não é depositário
aquele que, responsável pelo depósito de percentual incidente sobre
a renda da empresa, descumpre a obrigação, pois são distintos
os casos de penhora sobre o próprio bem e de penhora
realizada sobre os eventuais frutos que o bem possa gerar. Nessa
situação – penhora sobre a renda -, a constrição incide, diretamente,
sobre os frutos e não sobre o bem principal. Desse modo,
apenas no primeiro caso, frise-se, fica caracterizada a situação de
depositário. Malgrado a prisão civil não tenha natureza punitiva,
é inviável a sua decretação por meio de técnicas que ampliem a
tipificação prevista na lei.
Nesse sentido: RHC 19.246/SC, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino
Zavascki, DJ de 29.5.2006; RHC 20.075/SP, 1ª Turma, Rel. Min.
Luiz Fux, DJ de 13.11.2006.
5. Ordem de habeas corpus concedida.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da
Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça: A Turma, por unanimidade,
concedeu a ordem de “habeas corpus”, nos termos do voto
da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros José Delgado, Francisco
Falcão, Luiz Fux e Teori Albino Zavascki votaram com a Sra. Ministra
Relatora.
Brasília (DF), 2 de outubro de 2007(Data do Julgamento).