Lúcio Roberto Falce*[1]
Resumo: A estabilidade gestante e a confirmação da gravidez para o empregador, a aplicação da boa-fé objetiva como dever de informação do empregado, contrapondo a orientação da contida na súmula nº 244 do C.TST, com a função social do contrato, a garantia fundamental a proteção ao trabalho da mulher, e à vida do nascituro.
Palavras-chave: Estabilidade gestante. Súmula nº 244 do C.TST. Função Social. Boa-fé objetiva.
Abstract: Pregnancy stability and confirmation of pregnancy for the employer, application of objective good faith as a duty of information of the employee, contraposing the guidance contained in the summary no. 244 of the C.TST, with the social function of the contract, the fundamental guarantee The protection of the woman’s work, and the life of the unborn child.
Key words: Pregnancy stability. Precedent nº 244 of C.TST. Social role. Objective good faith.
Sumário: 1. Introdução. 2. Os direitos fundamentais, a Constituição brasileira de 1988 e a proteção à empregada gestante. 3. A eficácia dos direitos fundamentais no contrato de trabalho.4. As cláusulas gerais, boa-fé objetiva e função social do contrato. 5. A boa-fé objetiva como norma de conduta, e dever de informação e a estabilidade gestante x a função social
1. Introdução
O Tribunal Superior do Trabalho através da resolução 15/1985, DJ 05, 06 e 09 de 1985 criou a súmula nº 244 com a qual garantia a empregada gestante, os salários e as vantagens correspondentes ao período da estabilidade. A redação original do verbete é anterior a Constituição de 1988.
No momento posterior, a súmula nº 244 do C. TST foi alterada, através da resolução 121/2003, DJ 19, 20, e 21.11.2003, e passou a orientar que a reintegração da empregada somente seria possível no período da estabilidade, do contrário se restringiria aos salários e demais direitos correspondentes ao período da estabilidade.
Em um terceiro momento, a súmula nº 244 do C.TST foi novamente alterada, através da resolução nº 129/2005, DJ 20, 22, 25..04.2005, com a inclusão das orientações jurisprudenciais nº 88 e 196 do SBDI 1 do C.TST, o que resultou na inclusão dos itens I e III, respectivamente, tratando do desconhecimento do empregador sobre o estado gravídico, e da estabilidade gestante no contrato por prazo determinado.
Neste momento consolidou-se na súmula em referência a orientação da OJ SDI 1 nº 88 que garantia o direito ao pagamento da indenização mesmo sem conhecimento do empregador do estado de gravidez, e passou a incorporar a OJ SDI 1 nº 196 do C.TST, garantindo a estabilidade à gestante no contrato por prazo determinado.
O amadurecimento da jurisprudência, quanto a ciência do empregador sobre o estado gravídico é o objeto de estudo deste artigo, frente ao entendimento e a jurisprudência que afasta a aplicação do item I da súmula nº 244 do C.TST, com fundamento na boa-fé objetiva, e no dever anexo de informação, da empregada quando ajuíza a ação após o período da estabilidade.
O estudo no artigo vai além da pura e simples da aplicação da súmula nº 244 do C.TST, especialmente quanto ao item I, quanto a já reconhecida responsabilidade objetiva, com a qual se faz apenas necessário a concepção do feto na constância do contrato, independentemente de ciência do empregador.
O entendimento do atual verbete observa os direitos fundamentais de proteção a maternidade, ao trabalho da mulher, do nascituro, a dignidade da pessoa humana do princípio da solidariedade, e da função social do contrato.
A discussão é necessária a fim de confrontar alguns julgados que não reconheceram à estabilidade gestante, de forma indenizada, quando a empregada não informa o seu empregador a gravidez, na demissão, ou no período coincidente a possibilidade de reintegração, e posteriormente postula a indenização substitutiva quando não há mais a possibilidade de reintegra-se.
2. Os direitos fundamentais, a Constituição brasileira de 1988 e a proteção à empregada gestante
Júlio Ricardo de Paula Amaral, em sua obra, Eficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações Trabalhistas menciona que os direitos da pessoa de forma geral mostram-se como fenômeno histórico recente, e, para tanto cita a evolução histórica dos direitos fundamentais, em referência inicialmente as “considerações” sobre os direitos das pessoas no âmbito da cultura grega e romana, e na concepção cristã com qual o Ser Humano é a imagem e semelhança de Deus, e todos seriam filhos únicos de Deus, fazendo ressalva de que as instituições políticas e jurídicas da antiguidade e da Baixa Idade Média não se basearam nesses ideais.
O autor em referência cita que se costuma considerar o mundo ocidental, principalmente a Inglaterra, onde ocorreu todo o processo de “fundamentalização”, “positivação”, e mais adiante a “constitucionalização” dos direitos e liberdades do cidadão, e ainda que se considerem precursores das modernas declarações que reconhecem direitos do homem: a Magna Carta Libbertatum de 1215 – Constituição João Sem Terra -, o Petition of Rights de 1628, o Habeas Corpus Act de 1679 e o Bill of Rights de 1689. Ressalva o autor que tais documentos tinham apenas a finalidade de estabelecer limitações às prerrogativas do rei, sem reconhecer direitos aos indivíduos.
Posteriormente as independências das colônias inglesas na América do Norte no século XVII, que contribuíram sobremaneira para a evolução dos direitos fundamentais, originaram em declarações de direitos que foram imprescindíveis para evolução e liberdades dos indivíduos.
A Declaração dos Direitos da Virgínia, 12 de junho de 1776 reconheceu direitos ao povo e à sua posterioridade, como a igualdade e liberdade dos homens, como meios de possuir a propriedade e perseguir e obter a felicidade e a segurança.
A Declaração de Independência dos Estados Unidos da América de 4 de julho de 1776, regida por Thomaz Jefferson, que teve como tônica a limitação do poder estatal.
E em momento posterior a este, a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de agosto de 1789, com a qual no seu preâmbulo, menciona que, em decorrência do fato de que “a ignorância, o esquecimento ou a depreciação dos direitos do homem são as únicas causas de desgraças públicas e da corrupção dos Governos”.
O autor Júlio Ricardo de Paula Amaral, em referência a Paulo Bonavides, cita que apesar das manifestações na Inglaterra e na América do Norte, com relação aos direitos e liberdades atribuídas ao indivíduo, na verdade foi em decorrência da declaração francesa que se manifestou a generalização dos direitos da liberdade, e dignidade da pessoa humana, como direito inerente ao homem, já que nesta declaração o destinatário era o gênero humano, enquanto que naquela, apesar de sua abrangência se dirigiam a uma camada social privilegiada (barões feudais).
Posteriormente a este momento, em 1791, adveio a Constituição Francesa que aboliu as instituições agressoras da liberdade e a igualdade de direitos, e no mesmo ano a Bill of Rights norte-americana ou Constituição dos Estados Unidos da América, de 15 de dezembro de 1791, que reconheceu diversos direitos aos cidadãos, como: liberdade religiosa.
No ano de 1793 a França promulgava nova Constituição a qual realizou uma regulamentação aos direitos fundamentais, que nos seus primeiros artigos trata da finalidade da sociedade, como bem comum; os direitos fundamentais: a igualdade; a liberdade; a segurança; e a propriedade; e todos os homens são iguais perante a lei.
Neste movimento de ideais liberais nas Declarações e Constituições, outros países, não somente a Inglaterra, Estados Unidos, e a França, passaram a reconhecer os direitos fundamentais do indivíduo, como a Espanha em 1812, e a Revolução Liberal em Portugal em 1820 que pôs fim ao absolutismo e instalou a monarquia constitucional, que culminou com a Constituição Política da Monarquia Portuguesa de 1822, no sentido de reconhecer direitos fundamentais do cidadão, mas com a ressalva quanto a liberdade religiosa, haja vista que preconiza ser a religião da Nação Portuguesa a Católica Apostólica Romana.
Outros países seguiram esta onda, como a Bélgica em 1831, com sua Constituição Progressista que cumpriu importante papel na evolução histórica dos direitos fundamentais, como, por exemplo, o reconhecimento da “liberdade religiosa”, posteriormente, em sede constitucional, em 1848, a Constituição Alemã, sendo a primeira a utilizar a expressão “direitos fundamentais”.
No ano de 1848, ainda houve a Declaração de Direitos da Constituição Francesa, que trouxe uma ampliação aos direitos humanos fundamentais, que seria posteriormente definitiva a partir dos diplomas constitucionais do século XX, como, a liberdade do trabalho e da indústria.
A Constituição Francesa de 1848 foi o marco da passagem do Estado Liberal, para o Estado Social, haja vista que a partir daí os textos constitucionais passaram a dedicar certa atenção aos direitos sociais.
José João Abrantes, em sua obra Contrato de Trabalho e Direitos Fundamentais, trata da concepção liberal de direitos fundamentais, que como cita o autor, é a concepção jusnaturalista.
“Essa concepção é, antes de mais, uma concepção jusnaturalista, segundo o qual o homem, pelo facto de o ser, possui um conjunto de direitos inerentes à sua natureza, os direitos individuais naturais, competindo ao Direito positivo reconhecer e proteger tais direitos, que lhes são anteriores e existem independentemente dele”.
O autor em referência cita que o Estado não confere esses direitos, mas os reconhece, e a sociedade não os cria os declara.
Os direitos fundamentais, nesta perspectiva tem uma dimensão subjetiva, porque a sociedade é formada por indivíduos tendencialmente iguais, o poder é simbolizado pelo Estado, sendo a única força capaz de ameaçar a liberdade individual.
Ainda a respeito desta dimensão subjetiva dos direitos fundamentais, José Carlos Vieira de Andrade, trata do Estado Liberal, como os direitos de defesa dos indivíduos perante o Estado.
Liberdade, segurança e propriedade, eis a essência do lema da construção liberal da sociedade política.
Neste contexto, os direitos fundamentais eram vistos como liberdade, cujo conteúdo era determinado pela vontade do seu titular (e tendia a incluir a possibilidade de não exercício), ou como garantias, para assegurar em termos institucionais a não intervenção dos poderes públicos – em qualquer caso, enquanto direitos de defesa (Abwehrrechte) dos indivíduos perante do Estado.
A influência da Constituição Francesa de 1848 passa a dedicar atenção aos direitos sociais, e a influenciar as demais constituições, como a Constituição do México de 1917, com a qual o Estado não aparece da mesma maneira mostrando-se como nas concepções liberais, mas sim preocupado com os direitos sociais, como: jornada de trabalho de 8 horas e o direito a greve.
No entanto, somente com a Constituição Alemã de 1919, a Constituição de Weimar, é que teria ocorrido a passagem do “constitucionalismo liberal” para o “constitucionalismo social”.
Posteriormente adveio a Declaração Soviética dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado, e em 1918 adveio a Constituição Soviética.
No ano de 1927, na Itália, por forte influência da Doutrina Fascista, contribuiu para grande avanço aos direitos social dos trabalhadores, como a liberdade sindical.
E, por fim, em 10 de dezembro de 1948 sobreveio a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que é na atualidade o documento mais mencionado sobre os direitos fundamentais.
Por todo esse contexto histórico e por influência da Declaração dos Direitos Humanos, e Constituição de outros países, no Brasil, isto somente ganhou a amplitude e importância necessária na Constituição de 1988 que não despropositadamente, foi apelidada de Constituição Cidadã, cuja República Federativa do Brasil é um Estado Democrático de Direito, que tem como fundamento na: cidadania; dignidade da pessoa humana; e os valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa (artigo 1º, da CF/88).
As Constituições anteriores a de 1988 não trouxeram em seu rol de direitos, qualquer garantia contra a dispensa sem justa causa à empregada grávida, como norma de proteção ao trabalho mulher, e da maternidade e do nascituro.
O artigo 10, II, “b” do Ato de Disposições Transitórias da CF/88 é a norma que garante a estabilidade de 5 meses da confirmação da gravidez após o parto, contra a dispensa arbitrária ou sem justa causa.
A Constituição de 1934 garantia à mulher apenas, salário maternidade e licença maternidade, conforme regra do art. 121, § 1º, “h” da CF de 1934.
A Constituição ditatorial de 1937 de Getúlio Vargas, chamada de “polaca”, se omitiu também sobre a garantia de emprego a gestante.
A Constituição de 1946, feita após a 2ª Grande Guerra seguiu a linha da social democracia de 1934.
A Constituição de 1946 não se estabeleceu nenhuma norma de proteção ou de garantia de emprego à empregada gestante.
No ano de 1964 houve o golpe militar, e a revogação da Constituição de 1946, e surgiu então em 24.01.1967 a Constituição de 1967, que garantia a licença maternidade à gestante, antes e após o parto, sem prejuízo ao salário, mas novamente não há qualquer impedimento à dispensa da gestante, ou uma forma de garantia de emprego.
A Constituição de 1988 prevê no art. 7º, normas de proteção ao trabalho da mulher, como: a proteção ao mercado de trabalho do inciso XX; da licença maternidade do inciso XVIII; da proibição de diferença de salários, do inciso XXX; a estabilidade gestante do art. 10, II, b, da ADCT; e o art. 5º, inciso I da CF/88 que trata do princípio da igualdade entre os homens as mulheres.
Além dessas garantias e direitos fundamentais o artigo 227, caput da Constituição Federal de 1988 trata da proteção ao nascituro, haja vista o dever da família, da sociedade, e do Estado assegurar a criança, ao adolescente, e ao jovem, o direito à vida, à saúde, à educação, à alimentação, à dignidade e etc…,, além de coloca-los a salvo de todas as formas de negligência, discriminação, violência, exploração, crueldade e opressão.
Na legislação infraconstitucional, temos a Consolidação das Leis do Trabalho cujo título III trata das normas especiais da tutela do trabalho, e o capítulo III, da proteção do trabalho da mulher (art. 372 a 401 – B da CLT), que foi dividido: seção I que trata da duração, condições do trabalho e da discriminação contra a mulher (art. 372 a 378); seção II trata do trabalho noturno da mulher (art. 379 a 381); seção III do período de descanso da mulher (art. 382 a 386); na seção IV trata dos métodos e locais de trabalho (art. 387 a 390 – E); na seção V trata da proteção a maternidade (art. 391 a 400); e na seção VI trata das penalidades (art. 401 a 401-B).
Na seção V encontra-se a proteção à maternidade e traz regras que vedam a dispensa imotivada, sem justa causa da mulher grávida, como o art. 391, parágrafo único[2] da CLT, e o artigo 391-A da CLT acrescentado, através da Lei 12.812 de 16 de maio de 2013, publicada no Diário Oficial da União em 17.05.2013, que reafirma do ADCT artigo 10, II, “b” da ADCT.
3. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações de trabalho
O advento da universalização dos direitos humanos em tratados internacionais, tendo o auge a Declaração dos Direitos do Homem de 1948, trouxe como consequência a internalização desses direitos humanos nos textos constitucionais como direitos fundamentais, como exemplo disso, a Constituição alemã de 1949, a portuguesa de 1976, a espanhola de 1978, e a brasileira de 1988.
A questão é definir, diante da força normativa das constituições, a eficácia vertical e horizontal dos direitos fundamentais, sendo a primeira é relacionada às entidades púbicas, o Estado, abrangendo os órgãos do executivo, legislativo e judiciário.
No início apenas havia a dimensão subjetiva dos direitos fundamentais, em relação às entidades públicas, uma vinculação negativa dos poderes públicos que deveriam respeitar os direitos de cidadania, as posteriormente passou a admitir à vinculação positiva em relação aos direitos fundamentais do cidadão, que se trata da promoção dos direitos fundamentais, como, por exemplo, saúde.
A eficácia horizontal por sua vez, como ensina o Professor Doutor Renato Rua de Almeida, nasce em 1954, no Tribunal Federal Alemão quanto à questão que envolve igualdade salarial entre os homens e mulheres, e se consagra, em 1958 com o julgamento do Tribunal Constitucional Alemão, sobre o caso Lüth, que tratava da liberdade de expressão, e aí a dimensão objetiva dos direitos fundamentais.
A questão que envolve a eficácia horizontal é a sua aplicação imediata e direta ou mediata e indireta, como ensina Renato Rua de Almeida.
A eficácia imediata e direta, para alguns se aplica diante da proteção da dignidade da pessoa humana na base dos direitos fundamentais, que não constituem princípios de aplicação absoluta, e que deve ser sopesado com outros valores constitucionais, através do princípio da proporcionalidade, e de seus subprincípios, da necessidade, adequação, e proporcionalidade propriamente dita ou razoabilidade.
A eficácia horizontal é a aplicação dos direitos fundamentais na relação jurídica entre particulares, como nos ensina Ingo Wolgang Sarlet para quem a forma de aplicação desta eficácia, direta ou imediata, e indireta ou mediata, trata-se de questão tortuosa na doutrina e a jurisprudência já que a Constituição de 1988 (art. 5º, § 1º) não previu a forma de vinculação das entidades privadas, ao contrário, por exemplo, da Constituição Portuguesa, no artigo 18/1.
O autor citado faz referência à vinculação dos particulares quanto aos direitos fundamentais, sociais, aqueles prestacionais e não apenas de defesa contra o Estado, e extraí daí a dimensão objetiva aos direitos fundamentais.
É neste contexto que assume relevo a assim denominada (e já analisada) perspectiva (ou dimensão) jurídico-objetiva dos direitos fundamentais, de acordo com a qual estes exprimem valores que o Estado não apenas deve respeitar, mas também promover e zelar pelo seu respeito mediante postura ativa, sendo, portanto, dever de uma proteção global dos direitos fundamentais. A propósito, verifica-se que a doutrina tende a reconduzir o desenvolvimento da noção de uma vinculação também dos particulares aos direitos fundamentais ao reconhecimento da sua dimensão objetiva, deixando de considera-los meros direitos subjetivos perante o Estado.
Ingo Wolfgang Sarlet ensina haver duas correntes a respeito da eficácia mediata e indireta, e imediata e direta, respectivamente, a publicista do alemão Dürig, e de Lipperdey Leisner, com a qual a primeira trata de uma recepção dos direitos fundamentais pelo direito privado através da aplicação, interpretação, e integração das cláusulas gerais, e a segunda trata da aplicação direta dos direitos fundamentais e razão da força normativa da constituição e da unidade do ordenamento jurídico.
O autor em referência, Ingo Wolfganga Sarlet, faz alusão, para efeito de aplicação dos direitos fundamentais entre particulares, diz haver necessidade de avaliar o caso, e cita a aplicação, por via de três hipóteses: de aplicação indireta pelo legislador ordinário; aplicação indireta da Constituição por meio de cláusulas gerais, e conceitos legais indeterminados que devem ser preenchidos com os valores constitucionais, e dos direitos fundamentais; e aplicação direta quando não existir lei ordinária, não houver cláusulas ou conceitos indeterminados, ou quando de aplicação for mais restrito que as normas de direito constitucional.
Quanto ao destinatário da vinculação aos direitos fundamentais, na esfera privada, ainda o autor em referência cita, duas divergências, quanto há relação de desigualdade entre os particulares, quando um detém poder econômico e social, e quando a relação é de igualdade.
Ao se tratar de relações entre indivíduos iguais, para uma corrente deve prevalecer o princípio da liberdade, salvo se houver afronta a dignidade da pessoa humana onde se aplicará de forma direta os direitos fundamentais.
Ingo Wolfgang Sarlet afirma que a doutrina brasileira inclina-se, à luz do direito constitucional positivo brasileiro na vinculação direta dos particulares, prima facie, admitindo-se soluções diferenciadas, de acordo com a proporcionalidade, e cita o mesmo autor que no Supremo Tribunal Federal não se estruturou uma dogmática consistente e conclusiva sobre o tema.
Ingo Wolfgang Sarlet trata que a aplicação dos direitos fundamentais entre particulares, se direta e imediata ou indireta e mediata dever ser feita em uma análise tópico-sistemática calcada na circunstância específica do caso em concreto.
O questionamento que se faz é a aplicação e eficácia dos direitos fundamentais nas relações de trabalho, relação jurídica entre particulares, onde o empregador possui o poder econômico, e social.
José João Abrantes, doutrinador português, diz ser o contrato de trabalho e a obrigação dele decorrente como sendo um “quadro natural para o surgir de uma tal eficácia dos preceitos e valores constitucionais”, em face do caráter desiquilibrado e assimétrico desta relação.
O autor em referência cita o direito alemão com a qual os direitos fundamentais adquiriram uma relevância muito maior no Direito do Trabalho que nos outros ramos do direito.
Júlio Ricardo de Paula Amaral em referência ao doutrinador português, José João Abrantes, cita a constitucionalização do Direito do Trabalho, para proteção não apenas dos direitos específicos do trabalhador, como dos direitos inespecíficos, todos aqueles garantidos ao cidadão, e a pessoa humana, com a qual se passa a denominar o “trabalhador-cidadão”.
Julio Ricardo de Paula Amaral aponta a existência de duas correntes, sobre a aplicação e eficácia dos direitos fundamentais nas relações de trabalho, decorrentes da teoria do direito alemão, Drittwirkung Der Grundechte, sobre a eficácia direta e imediata, e indireta e mediata, ressaltado que a maioria da doutrina reconhece a aplicação da primeira, em razão do desequilíbrio do empregado frente ao empregador, e a subsunção daquele ao poder deste.
E, ainda chama atenção o mesmo autor que mesmo a corrente de aplicação indireta e mediata, quando há uma desiquilíbrio entre as partes, abre-se exceção para aplicação imediata ou direta dos direitos, liberdades e garantias previstas na Constituição.
Julio Ricardo de Paula Amaral é paritário da corrente de aplicação imediata e direta dos direitos fundamentais, nas relações de trabalho.
Percebe-se, portanto, que somente por meio de “aplicação direta” e “imediata” dos direitos fundamentais nas relações trabalhistas será possível a efetiva proteção aos direitos e liberdades públicas dos trabalhadores, em face do dinamismo destas vinculações. Essa conclusão pode ser atribuída à intangibilidade do conteúdo essencial dos direitos fundamentais dos trabalhadores, e, ainda, diante da flagrante desigualdade que ocorre entre os envolvidos – empregados e empregadores, nas relações laborais. Pode-se mencionar, por fim, que o empregador, em decorrência desta relação jurídica, é detentor de direitos e faculdades que, exercidos de maneira inadequada, mostram-se com potenciais fatores de afrontas e violações à liberdade, privacidade e dignidade dos trabalhadores, o que demostra uma necessidade de proteção e efetiva a esfera privada do trabalho.
4. As cláusulas gerais, boa-fé objetiva e função social do contrato
A dimensão objetiva dos direitos fundamentais da Constituição Federal de 1988 se irradiou no ordenamento jurídico, o que gerou o fenômeno da constitucionalização do direito civil (Código Civil de 2002), e os direitos fundamentais foram alcançados pelas cláusulas gerais: boa-fé objetiva e seus deveres anexos (art. 187 e 422 do C.C); a função social do contrato (art. 187 e 421 do C.C); e o equilíbrio econômico dos contratantes.
O olhar sobre o direito civil assim deve ser feito sob a ótica da Constituição Federal e não o contrário.
Ingo Wolfgang Sarlet diz não ser possível enquadrar todos os atores privados, no que diz respeito ao contexto da vinculação aos direitos fundamentais, de maneira que a eficácia imediata e direta deve ser aplicada à luz do caso concreto, dependendo, em princípio de uma norma de direito privado, e faz alusão a três hipóteses, sendo uma delas, quando o legislador ordinário traz cláusulas gerais e conceitos legais indeterminados a ser preenchido pelos valores constitucionais, especialmente os contidos nas normas de direitos fundamentais.
O presente estudo, sem qualquer intenção de aprofundar-se sobre as cláusulas gerais, se interessa pela boa-fé objetiva e seus deveres anexos, especialmente quanto ao dever de informação e colaboração, e a função social do contrato.
A boa-fé objetiva é norma de conduta, vai além de um critério de qualificação do comportamento, já a boa-fé subjetiva se caracteriza por sua situação ou fato psicológico, depende da análise da intenção da pessoa que se pretende qualificar.
A boa-fé objetiva impõe um padrão de conduta, de ambos os contratantes, no sentido de recíproca cooperação, e não o estado psicológico de ignorância de certa situação.
A boa-fé objetiva é um limitador ou óbice ao exercício de direitos subjetivos, e relaciona-se a teoria do abuso de direitos.
Ainda quanto a este princípio, Judith Martins Costa trata dos deveres anexos a boa-fé objetiva: a) deveres de cuidado, previdência, e segurança; b) os deveres e aviso e esclarecimento; c) deveres de informação; d) dever de prestar constas; e) os deveres de colaboração e cooperação; f) dever de proteção e cuidado com a pessoa da outra parte e o patrimônio a contraparte.
Importante ressaltar que a boa-fé objetiva deve ser aplicada caso a caso, e reiterar que o princípio é um padrão de conduta leal correto e honesto, que se materializa em exigências que não podem ser definidas de antemão.
Outra cláusula geral que se revela importante ao estudo, é a função social do contrato do artigo 421 e 187 do Código Civil de 2002, que se extrai da Constituição Federal nos artigos 5º, XXIII (função social da propriedade); princípio da ordem econômica (art. 170, III), e do valor social do trabalho (art. 5º, IV, da CF/88), tendo como fundamento, o princípio da solidariedade, nos termos do artigo 3, I e III da CF/88 de acordo com Paulo Nalin.
A função social do artigo 421 do C.C rompe com os princípios ultrapassados do Código Civil de 1916, como: Autonomia da vontade, no sentido de liberdade absoluta dos contratantes; obrigatoriedade e conservação do contrato (pacta sunt servanda); e relatividade dos efeitos dos contratos, haja vista a limitação que se impõe a estes velhos princípios.
A autonomia privada se coaduna e compatibiliza com a função social, ou seja, este atenua aquele, no entanto, como ensina Judith Martins Costa, trata-se agora de autonomia solidária que está conectada com a dignidade da pessoa humana, e com o desenvolvimento da personalidade das partes, sendo a função social um elemento constitutivo da própria liberdade contratual.
A autonomia privada encontra sua razão de ser na finalidade social, e não no caráter individualista do Código Civil de 1916.
A função social ainda altera, por assim dizer, o foco da obrigatoriedade ou conservação do contrato (pacta sunt servanda) mitigando-o à medida que contrato tem força de lei entre as partes, mas deve observar as regras de equidade, equilíbrio contratual, boa-fé objetiva e a função social, conforme preceitua Nelson Nery.
O contrato passa a ser, como ensina Nelson Nery, a instrumentalização do bem comum, e passa a ser paradigmático para outras situações semelhantes.
O princípio da relatividade do Código Civil de 1916, com a qual os efeitos do contrato somente atingem as partes não prejudicando, nem beneficiando terceiros, também foi alterado pela função social, conforme Paulo Nalin, haja vista que a preocupação é com as repercussões no largo campo das relações sociais, pois o contrato passa a interessar outros que não àqueles imediatamente envolvidos na relação jurídica do crédito.
Importante ressaltar e chamar a atenção ao princípio da função social, não como mero limitador da autonomia da vontade, mas sim como norma jurídica, que traduz a importância do contrato e seus efeitos no âmbito social, cujo interesse ultrapassa a vontade e a esfera particular dos contratantes.
O Professor Doutor Renato Rua de Almeida trata da alteração com o acréscimo do item III da Súmula nº 244 do C.TST, como hipótese de aplicação da cláusula geral da função social, que prevalece no verbete sobre os princípios da liberdade contratual, e do pacta sunt servanda.
A análise da função social e da boa-fé objetiva é de suma importância para a análise de julgados que tratam da estabilidade gestante e a aplicação de tais princípios.
5. A boa-fé objetiva como norma de conduta, e dever de informação e a estabilidade gestante x a função social
Há alguns julgados que contrariando a súmula nº 244 do C.TST não reconhecem a estabilidade gestante, por ofensa a boa-fé objetiva, quanto ao dever de informação da empregada, sobre seu estado gravídico, e quando é ajuizada a ação após o prazo da garantia de emprego.
A sentença prolatada nos autos do processo nº 002611-31.2013.5.03.0043 da 1ª Vara do Trabalho de Uberlândia, confirmado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª região, não reconheceu a obrigação da empresa em indenizar de forma substitutiva à estabilidade provisória gestante sobre a fundamentação, por ofensa ao princípio da boa-fé objetiva e a lealdade contratual, e aos seus deveres anexos da informação e da assistência, nos termos do artigo 113 e 422 do Código Civil, que são normas de ordem pública é cogente, de maneira que a “proteção é a maternidade e ao emprego, e não as indenizações pelo ócio”.
Isso porque a empregada não informa seu estado gravídico no estado demissional, na homologação o sindicato, por recusa a reintegração, quando notificada, e na recusa da reintegração em juízo.
Em suma, de toda a apresentação desta questão, principalmente, em razão do princípio da primazia da realidade sobre formas, compreende-se que a reclamante procurou não possibilitar (1. seja por sua omissão de informação no exame médico demissional. 2. seja por sua omissão de informação na homologação perante a entidade sindical. 3. seja por sua recusa (mediante técnica redacional dirigida) atestada no doc. de f. 125. 4. seja por sua recusa perante este próprio Juízo, termo de f. 72, e principalmente, f. 203) à reclamada em promover sua reintegração.
Diante das considerações ética e moral de que na ordem jurídica todos são sujeitos de direitos e de deveres/obrigações (art. 1º/CC), que se deve respeitar os princípios da boa fé objetiva e da lealdade contratuais (arts. 113 e 422/CC), e seus deveres anexos de informação e mútua assistência, hoje alçados à normas de ordem pública e cogentes (art. 2.035, § único/CC e Enunciados 24 da 1ª Jornada de Direito Civil STJ/CJF, 168 e 170 da 3ª Jornada de Direito Civil SJT/CJF), e que a proteção jurídica da maternidade é ao emprego, e não proteção/fomento às indenizações pelo ócio, tem-se que: 1.Ao se recusar injustificadamente o retorno ao emprego, a própria reclamante opõe resistência à sua garantia constitucional, não ensejando ao empregador obrigação simples e pura de indenizar o período estabilitário, diante desta recusa injustificada da trabalhadora, art. 112/CC, que inviabiliza o cumprimento da obrigação principal pelo empregador por exclusivo arbítrio da reclamante, condição jurídica defesa nos negócios jurídicos, art. 122/CC, porque obsta maliciosa e/ou deliberadamente o cumprimento desta obrigação principal, vedação do art. 129/CC, e, que por consequência lógica e jurídica, não pode ser convertida em indenização substitutiva, já que esta recusa não é do sujeito passivo da obrigação.
Há outros julgados desta seara que entendem também pela ofensa a boa-fé objetiva, quanto à propositura da ação além do período de garantia de emprego, e na ausência de comunicação ao empregador da gravidez.
ESTABILIDADE GESTANTE– CIÊNCIA DO ESTADO GRAVÍDICO E AJUIZAMENTO DA AÇÃO – PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA–O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade prevista noart. 10, II, “b” do ADCT(Súmula 244 do C. TST). Entretanto, com fundamento no princípio daboa-fé objetiva, deve ser considerada para a fixação do termo aquodo período estabilitário a conduta da autora que optou por ajuizar a ação vários meses após a ciência de seu estado gravídico, inviabilizando a reintegração ao emprego. (TRT-15ª R. – RO 001020-64.2011.5.15.0077 – (89123/13) – 1ª C. – Relª Tereza Aparecida Asta Gemignani – DOE 10.10.2013 – p. 1093)
132000060136 – ESTABILIDADE GESTANTE – AJUIZAMENTO DA RECLAMAÇÃO APÓS O TÉRMINO DO PERÍODO ESTABILITÁRIO – Em obediência ao princípio da boa-fé objetiva, bem como para evitar locupletamento ilícito da reclamante, não há que se falar em indenização substitutivaestabilidade gestante quando a empregada somente propõe reclamação trabalhista depois de expirado em muito o período estabilitário, visando não a garantia do emprego, mas pura e simplesmente o recebimento de indenização. Recurso ordinário conhecido e não provido. Adoto o relatório e o exame de admissibilidade consubstanciados no voto do Desembargador Relator, aos quais acrescento os fundamentos quanto ao mérito da demanda, que foram acolhidos pela douta Turma, passando a constituir as razões do voto vendedor. (TRT-21ª R. – ROPS 0000794-77.2015.5.21.0004 – 1ª T. – Relª Isaura Maria Barbalho Simonetti – DJe 10.08.2016 – p. 621).
A análise perpassa sobre a ofensa a boa-fé objetiva e ao dever anexo de informação e assistência da empregada, em dar ciência da gravidez, no período de reintegração, em confronto com a garantia fundamental ao direito de ação,
O artigo 227 da CF/88 quanto à estabilidade gestante garante eficácia direta e imediata ao direito fundamental de proteção à maternidade, como ensina Guilherme Guimarães Feliciano, à luz da eficácia dos direitos fundamentais, e consubstanciado na norma do art 227, caput da Constituição de 1988, que trata da proteção o nascituro.
No caso em testilha (estabilidade gestante), à visa das grandezas constitucionais em jogo – que não se limitam à proteção do empregado e do valor social do trabalho, mas abrangem também os próprios interesses dos nascituro (e incorporam, por isso, a normatividade própria do princípio da absoluta prioridade, ut art. 227, caput, da CF) -, parece fora de dúvida que a interpretação constitucionalmente mais acertada é aquela que pende para a proteção do emprego, da mulher, e da criança.
Por outro lado, o artigo 7º, XVIII da CF/88 trata da proteção à maternidade, com a qual o artigo 10, II, “b” da ADCT se coaduna com este, sem deixar de citar o inciso XX do artigo 7º da CF/88 que trata da proteção ao mercado de trabalho da mulher, na forma da lei.
O artigo 227, caput, da CF/88, e o artigo 7º, XVIII possuem eficácia direta e imediata para aplicação as relações de trabalho, consagrando o reconhecimento da jurisprudência, através da Súmula nº 244 do C.TST que a gestante possui direito à estabilidade, e a indenização quando expirado o prazo de garantia de emprego.
É oportuno ressaltar que a OJ SDI 1 nº 399 do C.TST garante à indenização quando ultrapassado o prazo para reintegração.
Não obstante a essa eficácia direta e imediata dos artigos e valores constitucionais citados, por outro viés, a cláusula geral da função social atinge os direitos fundamentais, a fim de valorizar o contrato no seu contexto social, a ponto de garantir a proteção ao nascituro, e obstar os efeitos nefastos à empregada gestante sem emprego, e sem condições de se sustentar e sua própria família, o que importaria inclusive ao empregador determinar, em exame demissional, teste de gravidez, a fim de dar máxima proteção aos direitos fundamentais citados.
A eficácia assim poderá ser até mediata e indireta, para a proteção a maternidade, ao nascituro e ao trabalho da mulher à luz da função social do contrato, nos termos do artigo 421 c/c 187 do Código Civil.
Por outro lado, citar ou alegar ofensa à boa-fé objetiva, em seu dever anexo de informação e assistência, quando a empregada não comunica sua gravidez no período de garantia de emprego é taxar esta conduta como desleal, desonesta, e não ético o que nem sempre ocorre e não poderá ser presumido, a não ser na análise detalhada do caso concreto.
No entanto, a análise subjetiva da conduta da empregada, e sua intenção quanto a reintegração ou não, deve ser analisada sobre a perspectiva da boa-fé subjetiva e não objetiva, pois aí não se trataria de normas de condutas.
Imagina-se uma trabalhadora que cumpriu mais de 10 anos de contrato de trabalho, e recebe aviso prévio indenizado proporcional de 90 dias, e teve sua concepção no 89º (octogésimo nono dia), o que lhe garantiria a estabilidade por força do artigo 391 – A da CLT, quando já ultrapassado o momento do exame demissional e a homologação no sindicato profissional.
O Tribunal Superior do Trabalho, conforme se extraí da súmula nº 244, reconhece a responsabilidade objetiva, ou a perspectiva objetiva com a qual apenas basta à concepção do feto na constância do contrato de trabalho para garantir-se a reintegração, e ou a indenização substitutiva, independe da comunicação ao empregador, ou do ajuizamento de ação no prazo da garantia de emprego.
Por outro viés, o artigo 7º, XXIX da CF/88 trata da prescrição da ação trabalhista, em consonância com o direito fundamental e princípio da inafastabilidade da jurisdição do artigo 5º, XXXV da CF/88, que garante ao trabalhador o prazo de dois anos para o ajuizamento da ação.
A garantia constitucional bienal para o ajuizamento da ação afasta a ideia de que para se garantir a indenização tenha o trabalhador que propor a ação no período, como norma de conduta, leal e honesta, da garantia de emprego.
Não se pode atribuir uma norma de conduta, como antiética, ou um abuso ao direito material, a empregada que exerce a garantia constitucional de ajuizar ação trabalhista no prazo de 2 anos, mesmo porque se o empregador dispensou a empregada sem justa causa, por óbvio, não quer mais a prestação de serviços daquela empregada, presumindo-se a dispensa de sua mão-de-obra.
Ao contrário deve se garantir a empregada, em razão da função social, a estabilidade provisória de emprego, a reintegração, quando ainda no período da estabilidade ou a indenização substitutiva, aliás, como cita Paulo Nalin, quanto à relativização aos efeitos do contrato, “os efeitos sociais do contrato não são pretendidos pelos contratantes, em que pese, deles não possam isentar”.
Por conta da função social, a jurisprudência, e a sentença da 1ª Vara do Trabalho de Uberlândia são infelizes ao afirma que a proteção é ao emprego e a maternidade e não ”proteção/fomento às indenizações pelo ócio”, pois desta forma estar-se-ia relegando a aplicação dos direitos fundamentais de proteção a maternidade, e ao nascituro, relegando, o direito fundamental do direito de petição, acesso à justiça, e a função social do contrato.
Por outro lado, não se pretende colocar ideia estanque de que a boa-fé objetiva, como norma de conduta, e por seus deveres anexos de lealdade, cooperação, e dever de informação devem ser aplicados à estabilidade gestante, mesmo porque nas cláusulas gerais o caso concreto deve ser analisado e o juiz deve preenchê-lo com os valores constitucionais, mas é necessário olhar a estabilidade sob o enfoque da função social do contrato.
6. Conclusão
O estudo proposto neste artigo possui enfoque na garantia à estabilidade provisória gestante, e na jurisprudência correspondente, súmula nº 244 do C.TST, e a aplicação e eficácia dos direitos fundamentais, longe de arrumar solução pronta para a problemática de ausência de comunicação da gravidez ao tempo ou no prazo a garantia de emprego, haja vista que os direitos fundamentas não são absolutos, e as cláusulas gerais devem ser aplicadas caso a caso, apenas tentou – se afastar a ideia de ofensa a boa-fé objetiva por este comportamento sem presença de outros elementos, como se ausência e comunicação fosse por si só caracterizada como conduta desonesta, desleal e não ética, haja vista que a garantia de emprego à empregada gestante além de ser protegida por norma constitucional, quanto a proteção a maternidade e ao nascituro, deve ser vista sob a perspectiva da função social do contrato.
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[1] Lúcio Roberto Falce Doutor, Especialista em Direito do Trabalho (Direito das Relações Sociais) pela PUC/SP e Mestrando em Direito do Trabalho pela PUC/SP. Advogado Trabalhista sócio da Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo, e dos Advogados de São Paulo.