Direito do Consumidor

Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de locações de bens imóveis regidos pela Lei Federal 8.245/1991

Há alguns dias, tive contato com um colega advogado e debatendo sobre uma questão jurídica que envolvia um contrato de locação, em especial o locatário, travou-se uma argumentação sobre se há ou não a incidência do Código de Defesa do Consumidor nas relações locatícias.

Antes de adentrar na questão, quero fazer uma ressalva de que sou amplamente favorável ao nosso código consumerista, e sempre advoguei sob esse manto, defendendo veementemente os direitos de clientes enquanto consumidores quando foi preciso.

Mas, no caso em comento, entendo eu que nas questões que envolvam a locação de imóveis não há como aplicar a Lei Federal 8.078/1990, o CDC, igualando o locatário a consumidor e o locador a fornecedor, conforme definido no escopo legal dos artigos 2º e 3º da legislação consumerista. Ou seja, não estamos diante de um fornecimento de produtos ou serviços tipificados pelo Código de Defesa do Consumidor.

Nos contratos de locação de bens imóveis, é de fato necessário observar a aplicação da Lei Federal 8.245/1991, pois observa-se o Princípio da Especialidade, o qual revela que a norma especial afasta a incidência da norma geral. Lex specialis derogat legi generali. A questão é bem clara e está prevista no artigo 1º da citada lei: “Art. 1º A locação de imóvel urbano regula – se pelo disposto nesta lei”.

Inclusive, os tribunais pátrios já se posicionaram neste sentido, sendo interessante destacar um recente julgado do STJ, o qual transcrevo sua ementa:

 AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE LOCAÇÃO. COBRANÇA DE ALUGUÉIS. 1. MULTA CONTRATUAL. INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. SÚMULA 83/STJ. 2. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. MORA EX RE. PRECEDENTES. 3. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. REDIMENSIONAMENTO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 4. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que “não se aplica o Código de Defesa do Consumidor ao contrato de locação regido pela Lei n. 8.245/1991, porquanto, além de fazerem parte de microssistemas distintos do âmbito normativo do direito privado, as relações jurídicas não possuem os traços característicos da relação de consumo, previstos nos arts. 2º e 3º da Lei n. 8.078/1990” (AgRg no AREsp n. 101.712/RS, Relator o Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 3/11/2015, DJe 6/11/2015). 2. A mora ex re independe   de   qualquer ato do credor, decorrendo do próprio inadimplemento   de  obrigação   positiva,   líquida e com termo implementado, nos termos do art. 397 do Código Civil atual. Precedentes. 3. O redimensionamento de verba honorária exige o revolvimento de fatos e provas dos autos, providência esta vedada no especial, em virtude do óbice do enunciado n. 7 da Súmula do STJ, compreensão relativizada apenas quando o valor fixado se mostrar irrisório ou exorbitante, o que não se verifica na hipótese dos autos. 4. Agravo interno desprovido. (STJ, Processo AgInt no AREsp 1147805 / RS AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL, 2017/0193302-3, Relator(a) Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE (1150), Órgão Julgador T3 – TERCEIRA TURMA, Data do Julgamento: 05/12/2017, Data da Publicação/Fonte DJe 19/12/2017, www.stj.jus.br)

 A implicação desse entendimento acaba por afastar as garantias e proteções previstas pela legislação consumerista, como por exemplo, a redução do percentual pactuado no contrato de locação para 2% predito § 1º do artigo 52. No meu ponto de vista, acaba por afastar também a competências dos órgãos e agências de proteção e defesa do consumidor (PROCONs, SEDECONs etc) de intervir nessas relações entre locatários e locadores, justamente por não se tratar de matéria que envolva consumo.

Portanto, consoante ao posicionamento aqui esposado, fica então afastada a incidência do CDC quando se tratar de contatos de locação de bens imóveis, pelo fato de estar diante de um microssistema próprio, regido por lei específica, frisando a Lei Federal 8.245/1991, onde locatário e locador não se enquadram no conceito legal de consumidor e fornecedor. 

Como citar e referenciar este artigo:
LIMA, André Luiz Villela de Souza. Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de locações de bens imóveis regidos pela Lei Federal 8.245/1991. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2018. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-do-consumidor/inaplicabilidade-do-codigo-de-defesa-do-consumidor-aos-contratos-de-locacoes-de-bens-imoveis-regidos-pela-lei-federal-82451991/ Acesso em: 22 nov. 2024