Ticiana Dantas Villalva[1]
Resumo
O presente trabalho busca demonstrar a utilização excessiva da Liberdade de Imprensa diante dos casos criminais e o desrespeito à Presunção de Inocência, princípio primordial do Sistema Acusatório e sustento de todas as garantias inerentes ao acusado ou investigado criminal, haja vista, o inegável fato de que os casos criminais cobertos pela imprensa funcionam como uma espécie de espetáculo, onde o principal objetivo é atrair o público e, obter lucro com a informação transmitida. Para solucionar o confronto entre estes princípios, será trazida a teoria da ponderação, com o escopo de demonstrar a necessidade de se impor limites ao exercício excessivo da Liberdade de Imprensa e, assegurar a efetiva garantia da Presunção de Inocência em todo o procedimento criminal.
PALAVRAS CHAVE: Liberdade de Imprensa; Casos Criminais; Presunção de Inocência; Limite; Teoria da Ponderação.
ABSTRACT
The present work seeks to demonstrate the excessive use of the Freedom of Press towards the criminal cases, the disrespect of Presumption of Innocence, primordial principle of the Accusatory System and support of all the guarantees inherent`s to the accused or investigated criminal, due to, the undeniable fact that the criminal cases covered by the press act as a kind of spectacle, where the main objective is to attract the public, and make a profit with the transmitted information. To solve the conflict between these principles, it hahwill be brought the Theory of Weighting, with the scope to demonstrate the need to impose limits on the exercise of excessive Freedom of Press, and ensure the effective guarantee of the Presumption of Innocence in the entire criminal procedure.
KEY WORDS: Freedom of the Press; Criminal Cases; Presumption of Innocence; Limits; Theory of Weighting.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO; 2 A IMPRENSA;2.1 A EVOLUÇÃO DA IMPRENSA NO BRASIL;2.2 O SENSACIONALISMO E A IMPRENSA;2.3 A LIBERDADE DE IMPRENSA; 3. A Imprensa opressiva e o direito penal sob uma análise principiológica;3.1PRINCÍPIO PRIMORDIAL DO PROCESSO PENAL: A PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA;3.2BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE OUTROS PRINCÍPIOS APLICÁVEIS AO PROCESSO PENAL; 3.2.1 A Imparcialidade do Juiz; 3.2.2 A Ampla Defesa e o Contraditório; 3.2.3 O Devido Processo Legal; 4. A Necessidade de se estabelecer limites à Liberdade de Imprensa;4.1 DEFINIÇÃO DE PRINCÍPIO e a hipótese de colisão; 4.2 A TÉCNICA DA PONDERAÇÃO; 4.2.1 O Princípio da Proporcionalidade; 4.2.2 A Ponderação de Princípios Fundamentais; 5. CONCLUSÃO; REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Introdução
A imprensa constitui uma espécie de veículo de comunicação, do qual a mídia é gênero. Atualmente, a mídia é conhecida como “o quarto poder”, expressão trazida pelo filme: Mad City, em alusão aos três poderes típicos de um Estado Democrático: executivo, legislativo e judiciário. Dirigido por Costa Gravas, em 1997, o filme conta a história de um repórter que se aproveita do momento de fraqueza emocional de um civil para transformá-lo em um furo de reportagem, assim, discute o poder da mídia sobre a opinião pública, fazendo uma espécie de jogo com as emoções.
O tema proposto surge a partir da análise de repetidos casos expostos na imprensa, com a idéia de que, além de impor modismos, consumo e hábitos, ela também se apresenta como um dos mais sérios meios de acusação, julgamento, e, consequente condenação ou absolvição do indivíduo, através da forma sensacionalista de exposição dos fatos.
A atração da imprensa por casos de natureza penal possui um motivo histórico. Durante a época inquisitória, quando haviam execuções públicas, elas funcionavam como uma espécie de espetáculo e as pessoas se aglomeravam nas praças para assisti-las. Hoje, a imprensa, tendo em vista a mercantilização da informação e obtenção de lucro, consciente do interesse das pessoas por este tipo de causa, leva os casos de natureza criminal, em forma de espetáculo, até os olhos do seu público, que passa a acompanhar e emitir opiniões sobre estes, estabelecendo até mesmo um juízo de culpabilidade sobre os envolvidos ou suspeitos. É através desta imprensa sensacionalista que se opera a liberdade de imprensa opressiva.
Os efeitos dessa espetacularização da imprensa sobre casos penais podem ser claramente notados na constância de um processo, ou, antes mesmo de existir um processo, quando a imprensa já apresenta um condenado para a sociedade. Nesse sentido, questiona-se: estaria a imprensa utilizando-se de forma abusiva da sua liberdade de imprensa assegurada por meio da liberdade de expressão, na CF/88? Não se pode esquecer que a Constituição também assegura como Princípio Fundamental, que norteia o Direito Penal, o Estado de Inocência, entretanto, a imprensa anulando a inocência dos envolvidos em procedimentos criminais, realiza uma espécie de inversão do ônus da prova, onde é o acusado que necessita provar a sua inocência, quebrando-se a regra geral do processo penal, na qual cabe à acusação o ônus da prova.
Assim, através do confronto entre a Liberdade de Imprensa e a Presunção de Inocência, pretende-se realizar uma reflexão crítica sobre a atuação opressiva da imprensa, diante de casos de natureza criminal e a necessidade de se estabelecer limites a esta prática. Especificamente, pretende-se uma análise acerca dos seguintes pontos: a) A importância da imprensa e a sua atuação sensacionalista, guardada pela Liberdade de Imprensa; b) A violação da Presunção de Inocência, princípio basilar do sistema acusatório penal. Nesse ponto, serão trazidos também outros princípios fundamentais garantidos ao cidadão que também são violados pela atuação opressiva da imprensa, a fim de consubstanciar a necessidade de se coibir essa prática; c) A ponderação de princípios, e a necessidade de que seja estabelecido um limite a atuação opressiva da imprensa.
O interesse pessoal em discorrer sobre esta temática decorre da indignação com a crescente quantidade de casos de natureza penal expostos de forma sensacionalista pela imprensa, violando preceitos fundamentais, principalmente a Presunção de Inocência, princípio basilar do sistema acusatório penal. A relevância acadêmica deste trabalho se opera no sentido de que, desde a graduação, é necessário que se tenha uma visão crítica sobre a forma como o Direito está sendo tratado ou violado na prática, e, se reflita como os novos operadores do Direito podem ser capazes de modificar essa realidade.
Por fim, esta discussão é de relevante interesse social, pois, a sociedade, como um todo, se encontra prejudicada com a má atuação da imprensa em casos criminais. É necessário que esta questão seja vista pela sociedade não como uma forma de censurar a imprensa e restabelecer uma ditadura, mas de estabelecer limites a uma atuação cada vez mais desenfreada do jornalismo, que, acobertado pela Liberdade de Imprensa, entende-se no direito de expor casos de natureza criminal sem a mínima cautela, violando inclusive outros preceitos fundamentais de importância constitucionalmente, equiparada à Liberdade de Imprensa.
2. A IMPRENSA
2.1. Evolução da imprensa no bRasil
No Brasil, a história da imprensa surge em um período que na Europa, os líderes políticos já possuíam consciência do grande papel que os jornais passaram a desempenhar, como instrumentos influenciadores da população, já estando, inclusive, em circulação jornais de facções políticas. Esse atraso jornalístico foi motivado pela censura e a proibição de tipografia na de época colonial. A imprensa deu os seus primeiros passos, oficialmente, no Rio de Janeiro, em 13 de maio de 1808, com a criação da Imprensa Régia, atual Imprensa Nacional, pelo príncipe Dom João.
A imprensa periódica propriamente nasce no século XVII no chamado velho mundo e somente no século seguinte surge nas Américas Inglesas e Espanholas. [..] Nesse sentido, a experiência brasileira não foi destoante na América, embora só tenha surgido de forma sistemática a partir de 1808, com a chegada da corte portuguesa e a instalação da Imprensa Régia. (MOREL, Marco, 2008 apud MARTINS; LUCA, 2008, p. 23)
Nessa época, através dos papéis impressos no Brasil surge a opinião pública, considerada por Ana Luiza Martins e Tânia Regina Luca (2008, p. 33) como “um recurso para legitimar posições políticas e um instrumento simbólico que visava transformar algumas demandas setoriais em vontade global”. A regra era a censura prévia aos impressos, exercida no âmbito dos territórios pertencentes à Nação Portuguesa pelos poderes Cível e Eclesiástico. Os escritos oficiais coexistiam com publicações clandestinas que retratavam manifestações de expressão nativa, dotadas de um olhar crítico e reivindicador de políticas autônomas em um território marcado pela condição colonial.
A segunda fase da imprensa no Brasil é marcada por uma sociedade de corte com identidades cambiantes e estágios culturais diferenciados de uma monarquia cercada de república. A postura tolerante de Dom Pedro II deu margem a uma imprensa incomparável a épocas anteriores, com uma tolerância a críticas escritas e deboches explanados nas caricaturas através da ausência de figuras. Nota-se essa tolerância com a ausência de repressão a jornais vinculantes de uma nova forma de governo.
[..] A simples cobertura da rotina do imperador pelos jornais e revistas já colocava em pauta a questão da civilização. Acentuou-se o projeto de inserção do Brasil na cultura ocidental, reforçado pela desobediência européia do monarca e pela ligação de nossas elites com o mundo das artes e da ciência, conforme disseminados pela França ou Inglaterra, países que inspiravam a pretendida agenda de uma sociedade de corte. (MARTINS, 2008, p. 27)
Já na terceira fase, a chegada do novo século trouxe um cortejo sedutor de novidades, caminhando para uma grande imprensa. Com a industrialização e a imigração registrada no Séc. XX, as publicações operárias cresceram, fazendo com que o surgimento de títulos voltados para esse público se multiplicasse. O fim da 2ª Guerra, por sua vez, representou para a imprensa o início de um ciclo de modernização tecnológica, com a busca pela objetividade e novas técnicas jornalísticas.
No período militar, de logo, não foi verificada uma postura de repressão à imprensa. Entretanto, o jornalismo perdeu força como espaço de discussão dos grandes temas nacionais, isso foi consequência do afastamento da cena pública dos principais membros da oposição. Com essas restrições, os jornais reforçaram os seus editoriais de economia, tática de grande valia para suportar a instabilidade das décadas de 1980 e 1990, quando o Brasil em menos de 10 anos passou por 3 presidentes,11 ministros da fazenda, 9 diferentes políticas econômicas e 6 padrões monetários. Com a instituição do AI5, foi estabelecida a censura, com proibições surreais, surgindo então, a imprensa alternativa composta por veículos independentes em relação às empresas jornalísticas e ao mercado publicitário, cujo conteúdo era caracterizado por criticas relacionadas à situação econômica e política do país.
A grande imprensa sofria censura da ditadura, ou se afinava com o governo, enquanto que os pequenos jornais alternativos denunciavam os abusos de tortura e violação dos direitos humanos no Brasil. A imprensa alternativa era redigida por jornalistas de movimento popular ou de orientação política de esquerda, em boa parte, despedidos dos grandes veículos. (REBOUÇAS, 2008)
A volta à redemocratização teve seu marco principal com a posse do primeiro presidente civel, José Sarney em 1985 e, em 1989, ocorreu a primeira eleição direta para presidente. Entre essas épocas, teve-se o principal marco de democratização da história, a promulgação da Constituição da República Federativa de 1988, que em seu artigo 5º dispõe preceitos fundamentais que serão abordados adiante.Em 1992, as denúncias de corrupção que já vinham sendo vinculadas pela imprensa chegaram ao próprio presidente da República Fernando Collor de Mello. Com o surgimento da TV por assinatura e da internet, os brasileiros foram prestigiados com novas fontes de informações e os jornais partiram em busca de eficiência e novas técnicas.
2.2. O SENSACIONALISMO E A IMPRENSA
No Brasil, a imprensa teve a sua trajetória inicial marcada por altos e baixos, viveu desde momentos de liberdade excessiva a momentos de censura total, mas é inegável o poder que este possui sobre a vida dos brasileiros. Afinal, se não por intermédio da imprensa, como tomar conhecimento dos fatos que acometem a sociedade? A realidade acaba sendo construída pelas notícias que são passadas, ou seja, tudo é elaborado por um grupo de dirigentes que decidem o que deve ser posto e o que deve ser cortado durante a transmissão. Tudo isso realizado de forma rápida e estratégica, não dando sequer tempo do espectador “digerir” o que foi veiculado. Desta forma, é ingênuo negar que as pessoas não serão influenciadas pelo órgão transmissor da notícia.
O grau mais radical de mercantilização da informação: tudo o que se vende é aparência e, na verdade, vende-se aquilo que a informação interna não irá desenvolver melhor do que a manchete. Esta está carregada de apelos às carências psíquicas das pessoas e explora-as de forma Sádica, caluniadora e ridicularizadora. […] No jornalismo sensacionalista as notícias funcionam como pseudo-alimentos às carências do espírito. […] O jornalismo sensacionalista extrai do fato, da notícia, a sua carga emotiva e apelativa e a enaltece. Fabrica uma nova notícia que a partir dai passa a vender por si mesma. (MARCONDES, FILHO, 1991 apud ANGRAMANI, 1994, p. 15)
A mídia, denominação genérica dos órgãos de comunicação, dentre eles a imprensa, chega a ser comparada por Tony Schwartz (2008, p. 5) a um Segundo Deus. Para o autor, Deus é aquele que está em toda parte, assim como em toda parte é possível encontrar pessoas que assistem televisão, escutam rádio e acompanham o jornalismo da imprensa. É através desse poder desenfreado, que surge a imprensa marrom ou imprensa cor de rosa como são chamados os órgãos de imprensa considerados sensacionalistas e que buscam alta audiência e vendagem a todo custo, utilizando-se até mesmo da divulgação exacerbada de fatos e acontecimentos.
A prática de divulgação de informações e notícias, seguindo uma linha editorial de jornalismo não constitui uma violação da ética nesta atividade, desde que seja possibilitado ao leitor entender sobre qual ótica a notícia está sendo transmitida. O jornalismo marrom se manifesta quando esta proposição é propositadamente omitida e, os fatos distorcidos ou propositalmente expostos de forma a induzir o leitor ao erro e através disto obter ibope. Para o professor Marcos Fabrício Lopes da Silva (2008):
A corrente sensacionalista mistura informação e opinião, formando uma espécie de guisado, um “sarapatel de miúdos”. Só que de miúdos humanos. De um lado, a notícia pretende funcionar como um misto de relato fiel e boletim de ocorrência expedido pelo jornal. A opinião vem salpicada, a título de pré-julgamento, e incrementada por uma ordem persuasiva, que lança mão da sobriedade, para acompanhar a efervescência emocional – o calor da hora – provocada por uma narrativa em que o fato ganha contornos dramáticos e o contexto, pertencente à ordem reflexiva, “amarga o banco de reservas”.
A atração da imprensa por casos de natureza penal possui um motivo histórico. Durante a época inquisitória, quando haviam execuções públicas, estas funcionavam como uma espécie de espetáculo e as pessoas se aglomeravam nas praças para assisti-las. É ai, que, levando-se em consideração a mercantilização da informação e consequente necessidade de obtenção de lucro, consciente do interesse das pessoas por este tipo de assunto, a imprensa começa a utilizar-se das causas penais para atrair os olhos do público.
Analisando-se criticamente os casos expostos na imprensa, curioso é o fato de que nas exposições jornalísticas podemos constatar um tipo fixo de criminoso. Trata-se do branco, bem vestido de classe média alta, que, ao ser exposto como protagonista do crime, a imprensa alcança a sua tão cobiçada audiência. Isso é conseqüência do fato de que, no nosso sistema, existe um processo de etiquetamento penal, onde a etiqueta de criminoso, via de regra, não recairá sobre qualquer pessoa que infrinja a norma penal, ao contrário, a seletividade do sistema fará com que recaia sobre aqueles desfavorecidos economicamente, já visados no momento da criação das normas. Assim, o desvio de conduta praticado por aqueles que não fazem parte da “clientela do sistema penal” causa choque e desperta o interesse da sociedade.
(A imprensa) não se presta a informar, muito menos a formar. Presta-se básica e fundamentalmente a satisfazer as necessidades instintivas do público, por meio de formas Sádica, caluniadora e ridicularizadora das pessoas. Por isso, a imprensa sensacionalista, como a televisão, o papo no bar, o jogo de futebol, servem mais para desviar o público de sua realidade imediata do que para voltar-se a ela, mesmo que fosse para fazê-lo adaptar-se a ela. (MARCONDES FILHO, 1991 apud ANGRAMANI, 1994, p. 15)
Trata-se de uma forma de aproveitar-se do espanto já despertado na sociedade, tendo em vista o desvio de conduta praticado, para narrar os fatos de uma forma que o crime constitua um verdadeiro espetáculo teatral e os telespectadores um verdadeiro público que, contagiado pelas exposições, começa a articular em seus pensamentos e emitir opiniões sobre qual seria o melhor fim para aquele espetáculo criminal, geralmente, o desejado the end está vinculado à privação da liberdade do criminoso. Portanto, a cobertura jornalística encontra-se cada vez mais voltada para o choque social e conseqüente alcance de ibope. Através da imprensa sensacionalista o jornalismo atinge altos níveis de comércio no país. Como bem descreve Marcondes Filho (1991) (apud ANGRAMANI, 1994, p. 18), escândalo, sexo e sangue compõem o conteúdo dessa imprensa.
2.3. A LIBERDADE DE IMPRENSA
A Liberdade de Imprensa é trazida como uma modalidade de denominação da Liberdade de Expressão aplicada ao campo específico da imprensa. Trata-se de um preceito pelo qual um Estado Democrático assegura liberdade de expressão aos seus cidadãos e associações, prioritariamente, quanto às publicações que possam por em circulação. Conforme Dirley da Cunha Júnior (2008), a liberdade de expressão de atividade intelectual artística, científica e de comunicação está fundamentada na liberdade de pensamento. Para ele, o direito de opinião também está vinculado a esta manifestação de pensamento, de externar juízos, conceitos, convicções e conclusões sobre alguma coisa, ao passo que o direito de expressão, com seu caráter mais amplo, é direito de manifestação das sensações, sentimentos ou criatividade do indivíduo.
No Brasil, assim como a Presunção de Inocência e os demais princípios que serão abordados mais a frente, a guarida constitucional concedida pela Constituição Federal de 1988 à Liberdade de Imprensa representou uma das conquistas fundamentais para o nosso Estado Democrático, tendo em vista o longo histórico de censura e opressão da história pátria. Este princípio se apresenta como um dos principais direitos e garantias fundamentais do ser humano e está disposto indiretamente em diversos artigos da Carta Magna, sendo a sua disposição primordial posta no inciso IV do art. 5º: “É livre a manifestação de pensamento, sendo vedado o anonimato.”
Desta forma, é inegável que um homem, como um ser inserido em um contexto social, necessita expor a sua opinião, seus anseios, suas críticas, idéias, imaginação, não podendo calar-se diante das suas inquietudes. Nessa linha de pensamento, afirma Albert Callinard (1972) (apud SILVA, 2008, p. 240):
O homem não vive concentrado só em seu espírito, não vive isolado por isso mesmo que por sua natureza é um ente social. Ele tem a viva tendência e necessidade de expressar e trocar suas idéias e opiniões com os outros homens, de cultivar muitas relações, seria mesmo impossível vedar, porque fora para isso necessário dissolver e proibir a sociedade.
A Liberdade de Expressão possui sobretudo um caráter negatório da censura. Por este motivo, não é o estado que deve ditar as opiniões que devem ser consideradas válidas, esta tarefa cabe ao público ao qual estas manifestações são dirigidas. Disto, vem a garantia posta, novamente, na Constituição, em seu art. 220: “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observando o disposto nesta Constituição.” Sobre este dispositivo, comenta Vidal Serrano Nunes (1997, p.28):
A intenção do precitado artigo seria, assim, a de reforçar, do ponto de vista hermenêutico, a idéia de irrestribilidade do direito à opinião, mesmo por meio de comunicação de massa, em relação aos quais a preocupação do estado sempre foi maior em estabelecer meios diretos ou indiretos, de censura prévia à manifestação de pensamentos discordantes daqueles esposados pelos detentores do poder político.
O direito de informar, atribuído à imprensa, possibilita ao cidadão manter-se atualizado acerca daquilo que está ocorrendo no seu país, assegurando a este, inclusive, a possibilidade de formar conceitos e expressar suas opiniões. A liberdade de informação jornalística, disposta no § 1º do art. 220, da CF/88, abriga, além do direito de transmitir a notícia, o direito de tecer comentários ou críticas a respeito da exposição veiculada. Neste contexto, sendo a crítica um juízo de valor posto sobre o objeto, a crítica jornalística apresenta-se como um conceito ou opinião subjetiva do autor a despeito da notícia.
Desta forma, analisando-se a história brasileira, é inegável a importância da imprensa como incentivadora de liberdades, dos direitos do povo, da conscientização política, do fim das injustiças sociais e de grandes mudanças no cenário nacional. Está claro que o legislador constituinte, ciente dos despautérios ocorridos após o golpe de 1964, garantiu a Liberdade de Expressão, porém, face a inexistência no ordenamento jurídico de direitos fundamentais absolutos, a Liberdade de Imprensa deve ser analisada em conjunto com os demais preceitos de igual hierarquia.
3. A Imprensa opressiva e o direito penal sob uma análise principiológica
O Direito Penal Brasileiro adota o sistema acusatório, onde prevalece a democracia, com separação de poderes. Por este sistema, a presunção de inocência do acusado é considerada regra, cabendo à acusação o ônus de provar a sua culpabilidade, sendo assegurado ao réu o direito a ampla defesa, contraditório e a um processo justo e imparcial, com uma decisão fundamentada e provas valoradas com base na razão.
3.1. PRINCÍPIO PRIMORDIAL DO PROCESSO PENAL: A PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
A Presunção de Inocência ou Estado de Inocência é o princípio basilar do Processo Penal. É ele que sustenta todo o sistema acusatório e consubstancia os princípios da ampla defesa, contraditório, imparcialidade do juiz e devido processo legal que serão tratados adiante, sendo, inclusive, considerado por Aury Lopes Jr. (2007, p. 187) um “dever de tratamento”, na medida em que exige que o réu seja tratado como inocente. A origem deste preceito materializou-se nas idéias iluministas de igualdade, liberdade e fraternidade, principalmente do filósofo Montesquieu, em sua clássica obra: O Espírito das Leis, hoje, base do Direito Moderno.
No Brasil, o Estado de Inocência pode ser auferido por via do art. 5º, LVIII da Constituição Federal: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.” A Constituição não prevê, taxativamente, uma presunção de inocência, percebe-se, tão-somente, a não culpabilidade do acusado até que lhe seja proferida uma sentença condenatória. Porém, a relevância deste princípio é tão grande que Amilton B. De Carvalho, citado por Aury Lopes (2007, p. 51) afirma que “o Princípio da Presunção de Inocência não precisa estar positivado em lugar nenhum, é pressuposto – para seguir Eros – neste momento histórico da condição Humana”.
Nesse mesmo sentido, Paulo Rangel (2001) entende que, se o acusado não pode ser considerado culpado, não há o que se falar em presumir uma inocência, o que se tem é uma certeza de inocência. No Direito Penal, a Presunção de Inocência constitui a base do sistema acusatório vigente, e, deste princípio decorrem além de uma série de garantias, outros princípios desta mesma esfera: o direito à ampla defesa, o contraditório, o devido processo legal e a imparcialidade do órgão julgador. Em suma, estes princípios constitucionais exercem função de alicerce em um sistema democrático, que prima pela preservação da Dignidade da Pessoa Humana.
Se é verdade que os cidadãos estão ameaçados pelos delitos, também estão pelas penas arbitrárias, fazendo com que a presunção de inocência não seja apenas uma garantia de liberdade e de verdade, senão também uma garantia de segurança (ou defesa social), enquanto segurança oferecida pelo Estado de Direito. (LOPES, 2007, p. 188)
A Presunção de Inocência, portanto, tem o escopo de, sobretudo, garantir ao cidadão uma certa confiança no Estado, uma garantia de que ao inocente não será imposta qualquer penalidade injusta. Como bem afirma Ferrajolli, citado por Aury Lopes (2007, p. 188), o medo que a justiça inspira nos cidadãos é signo inconfundível de perda da legitimidade política da jurisdição e, ao mesmo tempo de sua involução irracional e autoritária. É nesse contexto, que Aury Lopes aduz que os três aspectos trazidos pela presunção de inocência funcionam como uma tentativa de garantir sobretudo àquele, indivíduo efetivamente inocente, uma confiança na justiça.
O primeiro aspecto consiste no fato de que a restrição da liberdade antes da sentença condenatória é admitida apenas em sede de medida cautelar, obrigando uma análise bastante cuidadosa sobre a efetiva existência do crime e os indícios de autoria e o requisito essencial do pericullum libertatis e o fumus comicci dellicti. Nessa esteira, Torinho Filho (2005, p. 63) afirma: “não havendo perigo de fuga do indiciado ou imputado e, por outro lado, se ele não estiver criando obstáculo a averiguação da verdade buscada pelo Juiz, a prisão provisória torna-se medida inconstitucional”.
o simples fato dele não ser primário ou não ter bons antecedentes não pode afastar aquela presunção de inocência: Não se pode, pois, presumir que o presumidamente inocente vá fugir […] não se pode presumir que o presumidamente inocente seja perigoso. Tais presunções praticamente anulam o princípio constitucional da presunção de inocência. E, assim, sendo presunções odiosas que superam a da inocência, elas afrontam a Lei Maior. (TOURINHO FILHO, 2005, p. 295)
Pelo segundo aspecto, o réu sendo presumidamente inocente, não possui qualquer necessidade de provar a sua condição de inocência, caberá ao órgão acusador, Ministério Público, o ônus de provar a culpabilidade do acusado. Até mesmo, na hipótese de existir confissão, esta não pode ser colocada como única base para uma condenação, devendo ser interpretada de acordo com contexto probatório trazido aos autos e com a ciência do réu do seu direito ao silêncio. Nessa linha, acrescenta Aury Lopes Jr (2007, p. 642), “Somente pode ser valorada a confissão feita com plena liberdade e autonomia do réu; que ele tenha informado e compreendido “substancialmente” seus direitos constitucionais; que tenha sido produzida em juízo; que tenha sido assistido por defensor técnico.”
A bem do rigor, a mens constituiciones foi atribuir ao autor da ação penal [..] o ônus de provar a existência de fato criminoso e a sua autoria. A falta de demonstração probatória desses elementos a Ação penal deve ser julgada improcedente. Logo, em matéria penal é incogitável a adoção de institutos como a inversão do ônus da prova ou outros que forjem pela presunção de culpa e não o contrario. (NUNES; SERRANO 2002, p. 144)
A sentença que condene o réu deve estar devidamente fundamentada. Ao proferir a decisão não deve pairar no juiz qualquer dúvida a despeito da culpabilidade do acusado, em caso de dúvida, este deve ser absolvido, obedecendo-se o In dubio pro réu, sendo esta a terceira garantia deste princípio. Nessa esteira, George Sarmento, citado por Nestor Távora (2010, p. 50 e 51), enfatiza a necessidade de “cristalizar a presunção de inocência como um direito fundamental multifacetário, que se manifesta como regra de julgamento, regra de processo e regra de tratamento”
[..] É um postulado que está diretamente relacionado ao tratamento do imputado durante o processo penal, segundo o qual haveria de partir-se da idéia de que ele é inocente e, portanto, deve reduzir-se ao máximo as medidas que restrinjam seus direitos durante o processo (incluindo-se a fase pré processual). C) Finalmente, a presunção de inocência é uma regra diretamente referida ao juízo do fato que a sentença penal faz [..] (grifou-se) (TORRES, 2006, apud LOPES, 2007, p. 189 e 190)
Como bem dito por Vargas Torres, a Presunção de Inocência deve está garantida em todo o processo, incluindo-se a fase pré-processual. Nesse contexto, não se pode deixar de comentar o Caso da Escola de Base e Aclimação, na capital Paulista, em 1994. Conforme vinculado por vários órgãos da imprensa, em inúmeras reportagens, seis pessoas estariam envolvidas no abuso sexual de crianças, todas estudantes da escola. Dentre os acusados estavam os diretores, funcionários, além de um casal de pais de alunos.
O delegado que presidia a investigação, Edélcio Lemos, visualizava no caso uma chance de promoção. O momento era favorável, uma vez que, Lemos chefiava interinamente o 6º Departamento de Policia, substituindo o delegado titular. Tendo em vista a expectativa de vacância do cargo, era necessário ocupar todos os espaços possíveis para ser notado e a mídia tornou-se sua aliada. Para o repórter Cezar Galvão, da Rede Manchete, o delegado fez o seguinte estudo do caso:
Nós trabalhamos com três linhas de investigação. A primeira de que havia uma investida sexual só por parte do motorista da Kombi que transportava as crianças. A segunda hipótese é de que mais pessoas também se envolviam nessa prática com as crianças. E a terceira hipótese, que talvez seja a mais provável, é a do comércio de fitas e fotos feitas com as crianças. (LEMOS, 1994 apud ribeiro, 2000, p. 68 e 69)
A mídia então, utilizando-se da versão do delegado Edélcio Lemos e ignorando por completo as contradições do inquérito policial, produziu manchetes altamente ofensivas como: “Perua escolar carregava estudantes para orgia” (Folha da Tarde); “Escola de Horrores”(Veja), “Kombi era motel na escolinha do sexo” e “Perua escolar levava crianças para orgia no maternal do sexo” (Notícias populares). – (RIBEIRO, 2000, p.100)
O grau de espetacularização midiática sobre o caso tomou proporções imensuráveis e, como já é de se esperar, os órgãos julgadores, compostos por seres humanos também sofreram os reflexos desta prática. Foi assim, que quebrou-se a regra da liberdade, os diretores da instituição chegaram a ser presos e houve uma depredação e saque da escola. Apesar do fato de que a utilização da prisão como uma forma de aclamar a sociedade e ver atenuado o clamor público, é uma medida um tanto quanto perigosa e arriscada. Na visão de Tourinho Filho (2004, p. 63):
A prisão provisória, qualquer que seja só se justifica se for necessária. E mais: necessária aos fins do processo. […] Do contrario, o réu estaria sofrendo uma pena antecipadamente, e isso violenta o princípio da presunção de inocência. Não havendo perigo de fuga do indiciado ou imputado e, por outro lado, se ele não estiver criando obstáculo à averiguação da verdade, a prisão provisória torna-se medida infraconstitucional. (grifou-se)
Antes da aplicação da pena restritiva de liberdade, uma série de garantias são concedidas ao acusado, tais como a composição cível, a transação penal, o sursis, a suspensão condicional da pena, além da possibilidade em conversão em penas restritivas de direito, que devem ser analisadas caso a caso. Entretanto, em se tratando de notícia vinculada por diversos programas sensacionalistas, é comum a seguinte afirmação: “O lugar desse sujeito é na cadeia”. Esse tipo de afirmação é decorrente do fato de que as pessoas possuem uma espécie de atração por punições severas e, tendo em vista a inadmissibilidade da pena de morte no Brasil, a privação da liberdade se apresenta como a melhor forma de solucionar os casos e se fazer justiça.
O caso Escola de base encontrava-se, apenas, em sede de investigação preliminar, onde o objetivo concentra-se na colheita de provas da materialidade do fato e indícios de autoria. O Inquérito Policial foi arquivado, vez que não havia indícios de provas suficientes para prosseguir com as investigações, quanto mais, cogitar-se a possibilidade de uma denúncia por parte do Ministério Público.
O caso da Escola Base passou a ser referência obrigatória de análise e discussão nos cursos sobre Ética do Jornalismo e de Direito, especialmente quanto tratam dos temas “calúnia”, “difamação”,”injúria”, “danos morais”, etc. Seminários e congressos discutem esse caso alertando para a necessária prudência, serenidade e responsabilidade dos profissionais envolvidos em ondas de denúncia e delação. Também a chamada “histeria coletiva”, “transe coletivo”, e as “falsas lembranças” são assuntos pouco estudados nos cursos de Psicologia, Psicopatologia, Psiquiatria, Estudos Sociais, etc. (LIMA, 2005)
Importante destacar que, o Inquérito Policial é uma fase pré processual e não possui qualquer vínculo com uma posterior condenação do investigado, que pode vir a ser Réu no processo. O inquérito propõe-se, apenas, a colher fundamentações para o oferecimento ou não de uma denúncia. E, é a partir do recebimento dessa denúncia, que terá início a fase processual, ou seja, em sede de Inquérito não foram sequer constituídas as provas que poderão ensejar uma sentença condenatória. Nesse sentido ressalva Aury Lopes (2007, p. 289):
[..] O art. 12 do CPP estabelece que o IP acompanhará a denúncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou outra. Qual o fundamento de tal disposição? […]. Por servir de base para a ação penal, ele deverá acompanhá-la para permitir o juízo de pré admissibilidade da acusação. Nada mais do que isso. Servirá para que o juiz decida pelo processo ou não processo, pois na fase processual, será formada a prova sobre a qual será proferida sentença. (grifou-se)
Nesse caso, os suspeitos, permaneceram durante seis meses sofrendo acusações da imprensa e imputações por parte da sociedade como um todo. Logo após o arquivamento do Inquérito por insuficiência probatória, os jornais publicaram matéria inocentando os suspeitos. Entretanto, um dia de inocente jamais poderá competir com seis meses de culpado. Sobre este aspecto, em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, o casal de suspeitos Ayres e Cida fizeram um balanço da vida do casal após este episódio: “Fomos estampados como monstros. A polícia e a imprensa simplesmente nos condenaram sem nenhuma investigação.” (RIBEIRO, 2000, p.149) Nesse contexto, fica um questionamento: onde está a presunção de inocência dos investigados?
A colisão da atuação da imprensa com a Presunção de Inocência é evidente em todas as fases de um caso criminal. Apontadas algumas interferências da imprensa na presunção de inocência, em uma fase pré processual, parte-se para uma análise desta prática em uma fase processual, consistente na atuação do Tribunal do Júri.
O Tribunal do Júri é composto por 25 cidadãos, previamente alistados, que decidem em sua consciência e sob juramento, sobre a culpabilidade ou não do acusado de crimes dolosos contra a vida, tentados ou consumados. A sua composição se dará em conformidade com o art. 425 do Código de Processo Penal (CPP) e de acordo com o Parágrafo § 2º deste artigo:
O juiz presidente requisitará às autoridades locais, associações de classe e de bairro, entidades associativas e culturais, instituições de ensino em geral, universidades, sindicatos, repartições públicas e outros núcleos comunitários a indicação de pessoas que reúnam as condições para exercer a função de jurado.
A causa é julgada com um “sentimento de justiça” dos jurados. Ocorre que, estes jurados são pessoas do povo, muitas vezes sem qualquer conhecimento sobre a área jurídica, munidos, apenas, da sua convicção interna de o que é “certo” ou “errado” para avaliar as provas trazidas até então. Na formação desta convicção dos jurados, estão presentes, além das suas íntimas convicções, cultura e hábitos, um pré julgamento perigosíssimo, trazido pela imprensa nas suas reportagens. Nesse julgamento prévio trazido, como já foi dito, existe uma tendência para a aplicação da pena privativa de liberdade, exteriorizada através de afirmações como: “o lugar desse sujeito é na cadeia”. A periculosidade desse julgamento se apresenta, sobretudo, pelo fato de que a vinculação das reportagens é geral, ou seja, ao passo que um julgamento baseado em um hábito ou cultura de um jurado ocupa apenas um voto, o pré-julgamento estabelecido pela imprensa atinge todos os votos ali constantes.
Parece inclusive que a imprensa substitui nos dias atuais as execuções em praça pública que ocorriam em passado remoto, ao fazer de um crime, de uma tragédia, um grande espetáculo, transformando-o numa espécie de novela para consumidores sempre ávidos por violência, que é e sempre foi um grande produto midiático. (QUEIROZ, 2009)
O Caso Nardoni é um dos grandes exemplos de atuação da imprensa. A menina Isabella de Oliveira Nardoni, de cinco anos de idade, em 29 de março de 2008, foi jogada do sexto andar do edifício London em São Paulo. Dentre os suspeitos estavam Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, pai e madrasta da menina. Os principais suspeitos, antes mesmos de serem indiciados, já eram taxados como culpados pela imprensa e, consequentemente, pela população.
A cobertura jornalística englobou a exposição de fotos, depoimentos familiares e até depoimentos dos próprios autores. Tudo isso posto de maneira que os acusados fossem considerados culpados e os seus depoimentos colocados de forma que todas as falas fossem passíveis de questionamentos. O objetivo dessa explanação seria uma comoção social, de forma que despertasse na população um anseio em acompanhar os fatos até o final, chegando inclusive a ser publicado na Folha de São Paulo, em abril de 2008: “Caso Isabella faz audiência de telejornais crescer em até 46%”. Desde o início, analisando-se às exposições jornalísticas, pode-se afirmar que o casal Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá sequer precisariam sentar no banco dos réus para serem considerados culpados perante o Brasil.
O caso encerrou-se com o julgamento do casal Nardoni que aconteceu em 22 de Março de 2010, acompanhado pelo público como uma espécie de novela ou reality show, onde a palavra chave era a impunidade. Aqueles que acompanhavam o julgamento tinham uma idéia fixa de que jamais o casal poderia sair impune e, como já era de se esperar, o júri considerou o casal culpado por homicídio triplamente qualificado.
Urge destacar que quando a decisão dos jurados for manifestamente contrária às provas trazidas aos autos, o Réu pode interpor apelação, com base no § 3º do art. 593 do CPP. Porém, o caso será analisado, novamente, por um tribunal composto por novos cidadãos que certamente também tiveram pleno acesso às alusões midiáticas, o que certamente implicará em uma nova condenação. Lembrando-se aqui, que apesar da garantia do desaforamento, este não é suficiente para um caso com repercussão midiática nacional.
Imaginemos um julgamento realizado no tribunal do júri, cuja decisão seja manifestamente contrária à prova dos autos […] Esse novo júri será composto por outros jurados, mas como o espetáculo será realizado pelos mesmos ‘atores’, em cima do mesmo ‘roteiro’ e no mesmo cenário, a chance de o resultado final ser o mesmo é imensa. (LOPES, 2007, p. 147)
Assim, conclui-se que o Princípio da Presunção de Inocência é de suma importância para a humanidade, tendo um caráter mais que especial no Direito Penal, como bem afirma Ana Lúcia Raymundo (2009), é através dele que o acusado assume a sua posição de sujeito de direito na relação processual. Desta forma, o Estado de Inocência jamais pode ser oprimido, principalmente no tocante a julgamentos de natureza criminal, pois o peso de uma acusação penal na vida de um cidadão pode ser muitas vezes imensurável, sendo capaz de destruir sua carreira profissional, sua vida social e emocional como um todo.
3.2 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE OUTROS PRINCÍPIOS APLICÁVEIS AO PROCESSO PENAL
3.2.1 A Imparcialidade do Juiz
É interessante iniciar este tópico fazendo uma alusão ao pensamento de Thornagui (apud GALVÃO, 2004), que sintetizou de forma brilhante a atuação do juiz:
Uma coisa é certa: a missão do juiz é sobre-humana e ultrapassa os limites deste mundo. É, na verdade, uma tarefa religiosa. De todos os encargos cometidos às pobres criaturas, o mais difícil e mais espinhoso, o de maior responsabilidade moral, é o do juiz. Não lhe basta avaliar um fato, o que já não seria pouco; incumbe-lhe penetrar no mais íntimo da alma, revolver os profundos e obscuros escaninhos da mente, por vezes não apenas sombrios, mas tenebrosos; importa-lhe conhecer e ponderar as taras e os defeitos herdados ao acusado pelos ancestrais; o temperamento e o caráter; as emoções, as paixões e tudo que pode influir na inteligência e na vontade; tem de fazer a síntese desses dados para chegar a uma noção sobre a personalidade. E ainda assim não pode estar seguro de haver conhecido o homem, o grau de liberdade interior com que agiu e, consequentemente a medida da responsabilidade.
A imparcialidade é portanto, uma característica essencial ao perfil do juiz, pela qual o julgador não pode possuir quaisquer vínculo com as partes. No processo, o juiz deve estar sempre assumindo uma postura de terceiro desinteressado, voltando-se para as provas trazidas aos autos e para uma busca da verdade dos fatos, não sendo cabível utilizar-se de meras convicções infundadas em seu julgamento. Sobretudo, deve ser levado em conta que, diante daquele julgador, pode estar um inocente.
Sob a perspectiva do julgador, a presunção de inocência deveria ser um princípio da maior relevância, principalmente no tratamento processual que o juiz deve dar ao acusado. Isso obriga o juiz não só a manter uma posição negativa, não o considerando culpado, mas sim ter uma postura positiva, considerando-o efetivamente inocente (LOPES, 2007, p. 188 e 189)
O direito possui um caráter dinâmico, as normas devem ser interpretadas e aplicadas a depender de cada caso concreto. Nessa esteira, não há que se falar em um juiz que esteja restrito a mecanização da norma, como bem ensina Eugênio Pacceli de Oliveira (2009, p. 442): “A regra da imparcialidade ocupa-se diretamente das circunstâncias de fato, e das condições pessoais do próprio julgador, que, segundo juízo prévio do legislador, poderiam afetar a qualidade de determinada, concreta e específica decisão.” O que pretende-se trazer não é uma necessidade de retrocesso, de um julgador privado da capacidade de interpretar, analisar e exprimir conclusões in casu, mas sim, que a imprensa, atualmente, expõe os fatos de forma tão sensacionalista que busca a todo custo convencer o legislador a despeito do desfecho que esta pretende para o caso, prejudicando a sua imparcialidade.
A cobertura jornalística do assassinato da jovem Aida Cury, que morreu em 14 de julho de 1958, em Copacabana é um grande exemplo desta prática. A jovem Aida Cury foi levada a força por três rapazes a um edifício na zona nobre do Rio, onde de acordo com perícia, foi submetida a trinta minutos de tortura e luta intensa contra os agressores que pretendiam abusar sexualmente da jovem. Para encobrir o crime, a jovem foi atirada do terraço do 12º andar do prédio, uma tentativa dos agressores de simular um suicídio, mas, de acordo com Laudo pericial, Aida morreu virgem, não sendo concretizado o crime de abuso sexual e, com a vitima havia indícios de que esta sofreu graves ferimentos, inclusive foi encontrado um lençol que apresentava manchas de sangue, descartando-se a hipótese de suicídio. (FRANCISCHETT, 2004)
Nesse caso, a interferência na imparcialidade do julgador foi buscada a todo custo. Como há de se perceber na seguinte afirmativa: “Tentamos influir sim na decisão do Conselho Nacional de Justiça que deliberou e reformou numa demonstração de equilíbrio a sentença que punha na rua, sem mais nem menos, os acusados de tentativa de estupro e assassinato de uma menina pobre.” (O CRUZEIRO, 1959 apud FRANCISCHETT, 2004, p. 3)
A ânsia em expor os fatos de forma sensacionalista era tanta que David Nasser, repórter da Revista O Cruzeiro, chegou a criar uma briga pessoal com os envolvidos no caso. Em 21 de Março de 1959, a manchete era: “David Nasser enfrenta o padroeiro dos tarados” e matéria tinha como titulo: “Ronaldo, absolvido pelo facilitário”. O texto da reportagem era do jornalista David Nasser, que ironizava a conduta do juiz Souza Netto ao absolver os acusados e assumia agressividade nas matérias, chegando, inclusive, a colocar outros criminalistas para em reportagem, julgarem a postura do magistrado e utilizar-se da pergunta: “O senhor tem filhas ou não?”, para questionar a sentença.
O juiz Souza Netto para mim nunca existiu como homem, como pessoa, mas sim como entidade. Interessava-me o seu erro, a sua sentença, não a sua condição humana. Se algumas vezes tive que sair da raia e trocar o florete pelo cacete, a vara florida pelo tacape, a isso me obrigam os seus companheiros com insultos pessoais. (O CRUZEIRO, 1959 apud FRANCISCHETT, 2004, p. 7)
O artigo de David Nasser, “Resposta ao pequeno canalha” em alusão ao julgador do caso já estava pronto, quando o Conselho de Justiça revogou a sentença do juiz, decretando a prisão dos envolvidos no caso.
Fica claro pois, que a imprensa ao expor os fatos já possui um desfecho prévio pretendido que será buscado a todo custo e, frequentemente, este desfecho será o que melhor atender aos anseios do seu público. Qualquer decisão contrária a este posicionamento será bravamente criticada e o julgador será obrigado a assumir a suportar as conseqüências disto. Vale lembrar, ainda, que o juiz é um cidadão como outro qualquer, inserido em um contexto social e que, diariamente, depara-se com a atuação da imprensa. Desta forma, torna-se evidente a dificuldade do julgador na manutenção da sua postura neutra no julgamento. “Divulga-se Maciçamente o fato a ponto de o juiz que preside o processo se sentir acuado, temendo pela reação da sociedade caso defira algum benefício ao réu, cuja a prisão é pretendida pela mídia.” (LOPES, 2006 apud ANDRADE, 2007, p. 25)
3.2.2 A Ampla Defesa e o Contraditório
A Ampla Defesa é subdividida em auto defesa e defesa técnica. Pela auto defesa é assegurado ao acusado o direito de pronunciar-se diante das acusações a este impostas, sendo ainda facultado ao mesmo, o direito de permanecer em silêncio.
A chamada defesa pessoal ou auto defesa manifesta-se de várias formas, mas encontra no interrogatório policial e judicial, seu momento de maior relevância […] O interrogatório é o momento que o sujeito passivo tem a oportunidade de atuar de forma efetiva -comissão-, expressando os motivos e as justificativas ou negativas de autoria ou de materialidade do fato que lhe imputa. (LOPES, 2007, p. 203)
Já a defesa técnica é aquela prestada por um profissional da advocacia. Nos casos em que o réu não constituir o seu próprio procurador, será nomeado pelo Estado um advogado para efetuar a sua defesa. A ampla defesa é uma das principais garantias do réu para defender-se das acusações impostas no curso da Ação penal.
No que se refere ao contraditório, todos os termos processuais devem primar pela ciência bilateral das partes e pela possibilidade de tais atos serem contraditados por meio de alegações e provas. Segundo Portanova (2002), o contraditório tem duplo fundamento, afigurando-se tanto em seu sentido lógico, quanto político (latu sensu). O fundamento lógico é justamente a natureza bilateral da pretensão que gera a bilateralidade do processo. No campo político, tem-se, simplesmente, o sentido comum de que ninguém poderá ser julgado sem ser ouvido. Destarte, não seria errado apresentar este Princípio em sua sinonímia de Amplo Debate.
O ato de “contradizer” a suposta verdade afirmada na acusação (enquanto declaração petitória) é ato imprescindível para um mínimo de configuração acusatória do processo. O contraditório conduz ao direito de audiência e às alegações mutuas das partes na forma dialética. […] Numa visão moderna, o contraditório engloba o direito das partes de debater frente ao juiz, mas não é suficiente que tenham a faculdade de ampla participação no processo; é necessário também que o juiz participe intensamente […] respondendo adequadamente às petições e requerimentos das partes, fundamentando suas decisões, evitando as atuações de ofício e as surpresas. (grifou-se) (LOPES, 2007, p. 197 e 1998)
No curso do processo penal, logo após o recebimento da denúncia ou queixa, o acusado será citado para responder a acusação que lhe foi imposta por escrito, no prazo de 10 dias. Tudo isso efetivado início da ação penal. Nas exposições midiáticas, a situação funciona de forma diversa, as acusações são oferecidas, o caso é exposto e depois que o espetáculo midiático está pronto, o acusado é que vá a luta para conseguir o mínimo de atenção dos jornalistas.
Nos casos em que ocorre intervenção da imprensa, o réu vai para o juiz exercer a sua defesa, chegando lá, surpreende-se com um juiz munido de vários questionamentos acerca de afirmações postas pela mídia. Com esse conhecimento prévio, é certo que o juiz já tenha estabelecido uma espécie de convencimento anterior que irá se externar em um bombardeio de informações e questionamentos internos sobre o julgado. E, em cima das questões que já haviam sido postas pela acusação, o réu sozinho passará a trazer posicionamentos e provas que dificilmente restarão suficientes para defender-se de toda uma equipe de jornalismo, de uma sociedade e até de convicções íntimas daquele juízo. Valendo acrescentar, ainda, que em alguns casos a ampla defesa deve ser exercida oralmente em um tempo fixo de 20 minutos, prorrogáveis por mais 10, tornando-se ainda mais complexo defender-se contra o todo.
3.2.3 O Devido Processo Legal
A garantia a um devido processo legal é expressão das liberdades públicas, segundo a qual ninguém será privado da sua liberdade ou de seus bens, sem o devido processo legal. O devido processo legal assegura ao réu o direito a um processo como formalidade para a imposição de qualquer pena. Para Dirley da Cunha (2008), o processo é um conjunto de atos empreendidos no sentido de obtenção de uma tutela jurisdicional. Ao processo é assegurado um acompanhamento por um Juiz natural, que deve agir de forma totalmente imparcial, visando-se a obtenção de um provimento final, que consiste em uma decisão clara e devidamente fundamentada, com o indicativo do dispositivo aplicável ao caso.
O devido processo legal evoluiu de um caráter meramente formal, consubstanciado na idéia de respeito a forma do processo para uma concepção material ou substancial, desenvolvida, recentemente, sobretudo na doutrina e jurisprudência norte–americana, primando pelo sentimento de justiça, equilíbrio, adequação e necessidade de proporcionalidade em face do fim que se deseja proteger. Assim, o devido processo legal deve pautar-se em um processo com a obediência de todas as suas fases, garantias e princípios, Ora pois, se nos casos em que ocorre interferência excessiva da imprensa não se pode falar em respeito à presunção de inocência, à ampla defesa, ao contraditório e à imparcialidade do juiz, é certo que, também, há uma evidente desobediência ao Princípio do Devido Processo Legal.
4. A Necessidade de se estabelecer limites à Liberdade de Imprensa
Realizando-se uma análise acerca da Liberdade de Imprensa e dos demais princípios abordados, principalmente a Presunção de Inocência, base do sistema acusatório penal, é fácil observar que, apesar da inegável importância desta garantia constitucional concedida à imprensa, esta, em geral, não vem sendo utilizada de uma maneira equilibrada e, por consequência, vem ocasionando uma notória colisão com garantias constitucionais de igual escala. Assim, serão trazidos mecanismos para solucionar esta questão.
4.1 DEFINIÇÃO DE PRINCÍPIO e a hipótese de colisão
A palavra princípio vem da matriz grega e é originada do latim principium, que significa início, começo e poder. Para a filosofia, princípio seria fonte ou causa de uma ação. Em uma busca pelo Dicionário Aurélio (apud FERREIRA, 1986, p. 1393), encontra-se o seguinte significado para princípio:
1.Momento ou local ou trecho em que algo tem origem; começo […] 2. Causa primária. […] 4. Preceito, regra, lei 5. P. Ext. Base; germe. 6. Filos. Fonte ou causa de uma ação. 7. Filos. Preposição que se põe no início de uma dedução, e que não é deduzida de nenhuma outra dentro do sistema considerado, sendo admitido provisoriamente, como inquestionável. (São princípios os axiomas, os postulados, os teoremas etc.) (grifou-se)
No plano legislativo, os princípios vêm sendo cada vez mais utilizados, muitos deles já são definidos como fundamentais. Da sua definição, nota-se que, à margem do âmbito jurídico, princípio chega a ser confundido com regra. Por esse motivo, a doutrina costuma postar a conceituação de princípio diferenciando-o das regras e dividindo-se em duas correntes.
Para a primeira corrente (BARRETO, 2006), princípios são normas portadoras de alto calão de abstração e generalidade e, por isso, possuem em sua aplicação um alto grau de subjetividade, ao passo que as regras apresentam um grau insignificante ou inexistente de subjetividade.
Nessa corrente, Humberto Ávila (2010), afirma não ser possível determinar o conteúdo de uma norma porque ela é construída pelo intérprete no momento da leitura. Para consubstanciar sua tese traz o pensamento de Esser, (AVILA, 2010, p. 27) pelo qual princípio possui uma função maior, qual seja a de fundamentar a tomada de decisão da aplicação da regra. Seguindo esta visão, Canárias (AVILA, 2010, p. 27 e 28) afirma que o conteúdo axiológico e o modo de interpretação entre as normas são características fundamentais que desvinculam regras de princípios, conceituando princípios como normas que estabelecem fundamento para que determinado mandamento seja encontrado.
Para a segunda corrente (BARRETO, 2006), os princípios são normas que caracterizam-se por serem aplicadas mediante a ponderação com outras e por poderem ser realizadas em vários graus, diferentes das regras que estão ali postas no sentido objetivo do é ou não é. Filiado a esta corrente, Ronald Dworkin (2002) denomina princípio como um padrão que deve ser observado, não porque vá promover ou assegurar uma situação econômica, política ou social, considerada como desejável, mas porque é uma exigência de justiça e equidade ou alguma outra dimensão da moralidade.
Os dois conjuntos de padrões apontam para decisões particulares acerca das obrigações jurídicas em circunstâncias específicas, mas distinguem-se quanto à natureza da obrigação que oferecem. As regras são aplicáveis à maneira de tudo-ou-nada. Dados os fatos que uma regra estipula, então ou a regra é válida, e neste caso a resposta que ela fornece deve ser aceita, ou não é válida, e neste caso em nada contribui para a decisão (DWORKIN, 2002, P. 36)
Nesse contexto, Dworkin (2002) afirma que diante de princípios conflitivos, é preciso se realizar um sopesamento de valores de cada um deles, tendo em vista os princípios possuírem uma dimensão de peso ou valores que as regras não tem e a necessidade de balancear qual seria o mais indicado para a solução da lide. Nas regras, por sua vez, em existindo conflito, apenas, uma delas será válida. O autor acrescenta, ainda, que quando existe uma forte semelhança entre os princípios e regras, a diferença é vislumbrada apenas em uma questão de forma.
Palavras como “razoável”, “negligente”, injusto”e “significativo” desempenham freqüentemente essa função. Quando uma regra inclui um desses termos, isso faz com que sua aplicação dependa até certo ponto de princípios e políticas que extrapolam a [própria] regra. A utilização desses termos faz com que esta regra assemelhe mais a um princípio, pois até mesmo o menos restritivo desses termos restringe o tipo de princípios e políticas dos quais pode depender a regra. (DWORKIN, 2002, p. 45)
Nessa mesma linha de raciocínio, Alexy (1996) no Livro de Afonso Virgílio da Silva, sustenta que princípios são normas que devem ser realizadas na maior medida possível, levando em conta as possibilidades fáticas e jurídicas, sendo, inclusive denominados de mandamento de otimização. Segundo o mesmo autor: “visto que para se chegar a um resultado ótimo é necessário, muitas vezes, limitar a realização de um ou ambos os princípios, fala-se que os princípios expressam direitos e deveres de prima face que poderão revelar-se menos amplo apos o sopesamento com princípios colidentes.” (ALEXY, 1996 apud SILVA, 2003, p. 607)
Em um contexto geral, pode-se afirmar, que aquela aplicação do tudo ou nada seria, apenas, aplicável ao plano de validade das regras. No que se refere aos princípios, estes seriam complementares para a norma jurídica, podendo ser considerados norteadores das regras. Desta forma, em ocorrendo conflito entre princípios, não é possível se falar em exclusão. Como bem ensina Larenz (1997): “no caso de uma contradição entre princípios, tem, portanto, cada princípio de ceder perante o outro, de modo que ambos sejam actuados em termos óptimos.” (grifou-se)
A colisão de princípios se apresenta quando se identifica um conflito decorrente do exercício de direitos individuais por diferentes titulares e isto deve ser resolvido através de uma ponderação. Embora a Constituição de 1988 não tenha fixado taxativamente um direito como cláusula pétrea, está posto em seu preâmbulo que este texto constitucional prima pela proteção da Dignidade da Pessoa Humana. Desta forma é relevante que, em um eventual juízo de ponderação, valores que constituem inequívoca expressão deste princípio.
4.2 A TÉCNICA DA PONDERAÇÃO
Em todas às alusões trazidas até o momento, resta claro que existe um eminente conflito entre a Liberdade de Imprensa e a Presunção de Inocência, visto que é pautado nesta liberdade de imprensa que o jornalismo utiliza-se exacerbadamente dos casos de natureza penal para atrair o seu público, quebrando todos os direitos e garantias concedidos ao acusado pelo seu Estado de Inocência.
Em existindo um choque principiológico é preciso se estabelecer qual dos conflitentes deve prevalecer em detrimento do outro. A técnica da ponderação de interesses, por sua vez, possui um caráter excepcional e vem sendo gradativamente invocada quando na ocorrência de conflito entre princípios constitucionais. Quanto a esta técnica, Sarmento (2003, p. 19), destaca:
No imaginário social, a idéia da ponderação sempre esteve visceralmente ligada à noção de justiça. Basta lembrar que o tradicional símbolo da justiça é uma deusa, com olhos vendados, carregando uma balança, através da qual pode pesar e comparar-ponderar em suma- direitos, argumentos e interesses.
A ponderação de bens ou princípios consiste em uma técnica de atribuir pesos a elementos que colidem. Pode-se afirmar que, inexiste uma interpretação jurídica absolutamente certa ou errada, considerando-se a interpretação mais adequada, aquela pautada em argumentos capazes de convencer o seu destinatário. Para Sarmento (2003, p. 126), “não existe uma resposta certa para o conflito entre princípios, que possa ser mecanicamente deduzida da ordem constitucional. O que há são soluções mais ou menos razoáveis dentro das molduras estabelecidas pela Constituição […]”. Desta forma, é evidente a possibilidade de aplicação desta teoria a técnica de ponderação de princípios, na qual a legitimidade vai debruçar-se sobre a força persuasória da fundamentação perante o público alvo.
4.2.1 O Princípio da Proporcionalidade
A proporcionalidade é de grande importância para o estudo da ponderação, pois ambas se valem do mesmo raciocínio. Como bem afirma Sarmento (2003, p.96): “na verdade, ponderação e proporcionalidade pressupõem o mesmo raciocínio”.
Por criação da doutrina alemã, este princípio está dividido em três subprincípios. O primeiro é a adequação, através da qual o administrador ou julgador deve se utilizar de meios que visem a realização do fim pretendido. O segundo é a necessidade que, se consubstancia na análise de meios alternativos, ao inicialmente escolhido, que possam promover a realização do fim, observando-se se os meios alternativos promovem igualmente a realização do fim e a menor restrição dos direitos fundamentais (ÁVILA, 2010).
Por fim, o subprincípio mais importante, a proporcionalidade em sentido estrito, pelo qual é exigido uma comparação entre a importância na realização do objetivo pretendido e o grau de intensidade da restrição de direitos fundamentais. No dizer de Canotilho (2003, p. 388), este terceiro elemento consiste em uma “questão de medidas ou desmedidas para se alcançar um fim”.
O Princípio da Proporcionalidade e a ponderação de interesses se identificam no sentido de que ambos são utilizados tanto para a contenção do arbítrio e excesso de poder na busca de equilíbrio entre a concessão de poderes privilégios ou benefícios como para auferir a legitimidade das restrições de direitos. Nesse pensamento, Sarmento (2003), nega a possibilidade da ponderação de interesses representar uma discricionariedade disfarçada do julgador, já que seu método está vinculado à proporcionalidade.
4.2.2 A Ponderação de Princípios Fundamentais
Como já foi dito, nas intervenções atuais da imprensa em casos de natureza penal, percebe-se uma clara colisão entre a Liberdade de Imprensa e a Presunção de inocência, todos estes, preceitos fundamentais assegurados no art. 5º da Constituição de 1988. Para solucionar uma colisão entre princípios constitucionais, deve-se atentar para as circunstâncias que cercam o caso, a fim de que pesados os aspectos específicos da situação, sobreponha o preceito mais adequado. Para Humberto Ávila (2010, p. 146), “a ponderação de bens consiste em um método destinado a atribuir pesos a elementos que se entrelaçam, sem referencia a pontos de vista materiais que orientam esse sopesamento.”.
Nessa linha, Ávila (2010, p. 146 e 147), entende relevante separar os elementos que são objetos de ponderação. Dentre estes elementos estão: os bens jurídicos como estados ou propriedades essenciais aos princípios; os interesses, atrelados com algum sujeito que pretende obter o bem jurídico; os valores que constituem o aspecto axiológico das normas e são dignos de ser objeto de sopesamento e os princípios que demonstram que algo vale a pena ser buscado. Ainda para o mesmo autor: “Pode-se, no entanto, sejam quais forem os elementos objetos de ponderação, evoluir para uma ponderação intensamente estruturada, que poderá ser utilizada na aplicação de postulados específicos”. Nesse contexto, a ponderação de princípios divide-se em duas etapas:
A primeira consiste na preparação da ponderação. Nessa fase, analisa-se todos os elementos e argumentos possíveis. O intérprete irá identificar os princípios constitucionais que se encontram em colisão, analisando se realmente existe um confronto entre eles. Quanto a esta etapa, Sarmento (2003, p. 100) destaca que “no campo dos direitos fundamentais, esta demarcação corresponde à identificação dos limites iminentes de cada direto.”
A segunda etapa, por sua vez, seria a realização da ponderação onde, no caso da ponderação de princípios, devem ser indicadas a relação de primazia entre um princípio e outro. Para Sarmento (2003, p. 102), nessa etapa da ponderação o intérprete deverá impor compreensões recíprocas sobre cada princípio, com a finalidade de alcançar um ponto em que a restrição de cada interesse seja a mínima possível.
Importante salientar que, a base da Constituição de 1988 é a proteção da Dignidade da Pessoa Humana, desta forma, a ponderação de princípio deve sempre atentar-se para a prevalência de preceitos fundamentais que consubstanciem esta garantia. Todavia, isso não quer dizer que em qualquer hipótese o Princípio da Liberdade prevalecerá, uma vez que, o grau imposto pelo princípio oposto, pode-se elevar, mediante uma ponderação de interesses.
Assim, deve-se atentar in casu, que com a violação da Presunção de Inocência, resta contaminado todo o sistema penal vigente, tendo em vista o caráter basilar deste princípio. Quanto à Dignidade da Pessoa humana não é possível considerar digno um indivíduo inocente ser obrigado a conviver com um status de culpa e sequer pode ser digno também o destino de um acusado ser definido pela imprensa. Nessa linha de pensamento, é possível afirmar que o fato de um indivíduo pertencente a um Estado Democrático de Direito submeter-se a um julgamento criminal com uma presunção de culpabilidade fere a sua dignidade, fundamentalmente pelo questão de que aquele pode ser um verdadeiro inocente.
Ademais, para falar de aferição à Dignidade Humana, é importante trazer, aqui, que a Liberdade de Imprensa opressiva viola, ainda, o direito à imagem e à vida privada. No Caso Bruno (antes mesmo de ser processado e encontrado os indícios de prova suficientes para tanto, pela forma de exposição dos fatos midiáticos, o goleiro Bruno Fernandes já era taxado como culpado pelo assassinato da sua ex-namorada, Elisa Silva Samúdio), foi possível observar, claramente, a violação da imagem e vida privada de um terceiro que não possuia qualquer envolvimento com o caso. Foi o que ocorreu com a estudante Jeíse Fernandes, que apesar de possuir características totalmente diferentes de Elisa Samudio, foi confundida com a mesma em um shopping no Rio de Janeiro e suas fotos foram divulgadas de forma não autorizada pela imprensa, afirmando ser a amante do goleiro Bruno, que estaria viva e disfarçada.
A estudante teve a sua vida privada totalmente devassada de forma inesperada, e, em face das acusações impostas pela mídia, teve que privar-se da vida em sociedade, do trabalho e, até mesmo do seu direito de ir e vir, vez que, tornou-se praticamente impossível circular nas ruas, sem que fosse apontada como suposta Elisa Samúdio e lhe proferidas ameaças. A questão tomou proporções imensuráveis, afetando, inclusive, a intimidade da garota em sua vida amorosa, já que Jeíse era noiva e o seu companheiro passou a ser taxado como “noivo da amante do goleiro Bruno”.
Aquele que for atacado em seu direito deve resistir; é um dever para consigo mesmo. A conservação da existência é a suprema lei da criação animada, porquanto ela se manifesta instintivamente em todas as criaturas; porém, a vida material não constitui toda a vida do homem; tem ainda que defender sua existência moral, que tem por condição necessária o direito: é, pois, a condição de tal existência que ele possui e defende com o direito. (Von Ihering, 1909 apud CUNHA, 2008, p. 92):
Ora, apesar de notório o fato de que com a violação da Presunção de Inocência pela imprensa opressiva, resta violado todo o sistema penal acusatório, com todas as suas garantias e por conseqüência, é ferida a Dignidade Humana dos envolvidos no caso criminal, com este demonstrativo de violação à intimidade e vida privada, resta inquestionável a possibilidade de limitar essa Liberdade de Imprensa nos casos criminais por violação da Dignidade Humana. “Assim, devem ser levados em conta, em eventual juízo de ponderação, os valores que constituem inequívoca expressão deste princípio (inviolabilidade de pessoa humana, respeito à sua integridade física e moral, inviolabilidade do direito de imagem e da intimidade).” (MENDES, 2008, p. 347)
Faz-se necessário, ainda, uma reflexão sobre o que seria interesse público e interesse do público. No caso do goleiro Bruno, por exemplo, é difícil tirar o goleiro de um time famoso e não dar qualquer satisfação ao público, sendo certo que pode ser considerado interesse público obter informação sobre o paradeiro do jogador. Entretanto, o acompanhamento passo a passo das fases do processo criminal pode ser considerado apenas um mero interesse do público, atendido pela imprensa com o intuito de atingir altos graus de audiência, o que pretende-se com a ponderação é justamente conter essa espetacularização acerca de casos penais.
Nessa esteira, o Princípio da Presunção de Inocência deve prevalecer diante da Liberdade de Imprensa. E, como bem ensina Simmone Scriber, para solucionar este conflito podem ser utilizadas medidas que não impliquem em restrições diretas a liberdade, como por exemplo, o desaforamento, elaboração de questionário para os jurados, e a restrição a publicidade do julgamento. Outras medidas possíveis também seriam, restabelecimento do direito de resposta de forma ampla, o estabelecimento de punições severas para o excesso da imprensa, a limitação da quantidade de matérias a serem publicadas por cada órgão da imprensa e a imposição de publicação de posicionamentos diversificados sobre os fatos na matéria.
a) Desaforamento: O Desaforamento é uma medida prevista pelo ar. 424 do CPP e consiste na possibilidade de mudança do local do processo de competência do Tribunal do Júri. É uma medida interessante, porém, não soluciona todas as questões levantadas, uma vez que, só é aplicável aos casos de júri e, nos casos onde a cobertura midiática dos fatos é nacional, resta insuficiente, pois não há o que se falar em jurados estrangeiros para casos nacionais;
b) Elaboração de questionário para os jurados: Este questionário consiste na elaboração de quesitos prévios para os jurados, com a finalidade de avaliar o seu grau de envolvimento e parcialidade para julgar o caso concreto. É uma medida que não está presente no ordenamento jurídico, mas poderia ser aplicada por intermédio da ponderação e seria uma estratégia inteligente para o combate da publicidade opressiva, pois, de início, já poderiam ser descartados dos julgamentos, aqueles jurados que se mostrassem contaminados pela parcialidade da imprensa;
c) Restrição à publicidade do julgamento: A publicidade dos julgamentos é medida decorrente do Devido Processo Legal e visa assegurar a existência de um processo claro, sem obscuridades. Essa restrição à publicidade pode ser aplicada pela ponderação e por ela devem ser divulgados na mídia, apenas, o essencial para atender ao interesse público de manter-se informado, evitando-se pois, a espetacularização dos julgamentos criminais;
d) Restabelecimento do direito de resposta de forma ampla: O direito de resposta já era garantido pela Lei 5250/67 (Lei de imprensa- Revogada pelo STF), porém este dispositivo não está mais vigente. O direito de resposta amplo seria uma forma de garantir a possibilidade de manifestação sobre tudo aquilo que é publicado e, inúmeras vezes, não é verídico;
e) Estabelecimento de punições severas para a cobertura excessiva: É certo que existe uma extrema necessidade da sociedade estar informada sobre os fatos, mas não existe necessidade de fazer de um processo uma forma de acabar com a vida de um acusado. Como já foi visto, a vítima do espetáculo midiático irá carregar às consequências dessa publicidade durante, toda ou grande parte da sua vida, mesmo que ao final, lhe seja prolatada uma sentença absolvitória. Nessa linha, resta claro a necessidade de punir a imprensa, pois não é justo que, apenas, o acusado ou investigado seja obrigado a sofrer punições em vista de algo que sequer deu causa;
f) Limitação da quantidade de matérias a serem publicadas e imposição de publicação de posicionamentos diversificados: Percebe-se, atualmente, uma publicação de matérias dotada de parcialidade de forma repetitiva, a fim de influenciar a formação da opinião pública. Assim, esta limitação se apresentaria como uma forma de garantir que, seria publicado, apenas o necessário para atender ao interesse da sociedade, não existindo pois, matérias “acusatórias” repetitivas. E a imposição de publicação de posicionamentos diversificados seria uma forma de garantir que a sociedade teria a sua opinião formada de forma imparcial, pois teve acesso a diversos posicionamentos acerca do caso.
Urge destacar aqui que, a presidente da Associação Nacional de Jornalismo- ANJ, Judith Brito, já se comprometeu a criar até o final do ano, um Conselho de Autoregulação para a imprensa. Essa prática é adotada por diversos países na Europa, sendo mais antiga na Suécia e, de certa forma, já seria um meio de coibir a atuação excessiva da mídia minimizando a colisão apresentada.
5. CONCLUSÃO
Na história brasileira, a imprensa desempenhou um papel de suma importância, como incentivadora da liberdade, dos direitos do povo, da conscientização política, do fim das injustiças sociais, da superação de instabilidades econômicas e de grandes mudanças no cenário nacional, passando assim, a ter um grande poder de influenciar opiniões na sociedade, chegando, inclusive a ser considerada um quarto poder. Por esse motivo, de início foi proporcionada uma abordagem acerca da evolução da imprensa no Brasil, buscando-se sobretudo afirmar a sua importância na história pátria.
Ocorre que, com a mercantilização da informação, a imprensa passou a utilizar-se de sensacionalismo em matérias vinculadas com o intuito de atrair o público e obter lucro. E, é nessa linha, que foi realizada uma crítica acerca da atuação da imprensa nos casos de natureza penal. Nessa cobertura jornalística, sabe-se que a inocência jamais traria índices de audiência, a frase “Fulano é inocente” não é capaz de atrair a atenção do público, ao passo que frases como: “Fulano matou”, leva a audiência às alturas. Desta forma, o poder da imprensa passa a ser exercido de forma a convencer a sociedade de que ali existe um pressuposto culpado, para que o expectador prenda os olhos naquelas reportagens e acompanhe até o esperado “the end” afinal, “onde há fumaça, há fogo”. Essa abordagem, teve o escopo de cumprir o objetivo específico consubstanciado em demonstrar a importância da imprensa, bem como a sua atuação sensacionalista, guardiada pela Liberdade de Imprensa.
Nesse contexto, em cumprimento ao objetivo específico de demonstração da violação do princípio da Presunção de Inocência nas atuações jornalísticas, foi realizada uma abordagem principiológica do Direito Penal diante da atuação da imprensa, ressalvando-se a Presunção de Inocência, como um princípio fundamental para o Direito Penal, tendo em vista a vigência do sistema acusatório, caracterizado pela separação de poderes, e pela vigência de princípios como o contraditório, a ampla defesa, a imparcialidade do órgão julgador e o devido processo legal, todos estes princípios que veem a garantir ao acusado a sua presunção de inocência, até que lhe seja prolatada uma sentença condenatória transitada em julgado.
Ao se observar a imprensa tratando um acusado ou até um investigado como culpado, seja de forma direta ou indireta, resta evidente uma espécie de presunção de culpabilidade ocupando o lugar da Presunção de Inocência. Desta maneira, o Réu partindo de uma presunção de culpabilidade, será obrigado a empreender esforços para provar a sua inocência, princípio este que deveria apresentar-se como a sua garantia inicial no processo penal. É inegável que inexiste uma forma concreta de solucionar por completo a publicidade opressiva da imprensa, porém, através de demonstrativos práticos da atuação da imprensa em causas penais, é propiciada uma reflexão sobre a necessidade de se impor limites a esta prática.
Nessa esteira, em atenção ao último objetivo específico da necessidade de se impor limites a atuação da imprensa, a Teoria da Ponderação de Princípios é abordada como um mecanismo de solucionar este conflito entre Presunção de Inocência e Liberdade de Imprensa. É necessário atentar-se para aquilo que é interesse público e o que é interesse do público e, ainda, para necessidade de cumprimento da Dignidade da Pessoa Humana, restando evidente, portanto, que Presunção de Inocência deve prevalecer diante da Liberdade de Imprensa. Nesse raciocínio, é aludido um cardápio de medidas capazes de minimizar a publicidade opressiva e preservar a Presunção de Inocência.
Assim, o presente trabalho não tem qualquer objetivo de tolher por completo o direito à informação ou sugerir uma censura, o objetivo primordial é tão-somente demonstrar que a imprensa está atuando de forma excessiva diante de casos penais e trazer a necessidade de se minimizar a imposição de opiniões publicadas pela imprensa de massa acerca de casos criminais, pois, se restar violada a base de um sistema penal, pode-se afirmar que existirá uma vasta ou talvez total dificuldade em manter a lógica principiológica e a garantias deste sistema.
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[1] Advogada.