Sociedade

Abuso sexual em menores: vulnerabilidade na condição de suscetibilidade às situações de riscos.

 

 

 

 

INTRODUÇÃO

 

Em todo o mundo, muito se tem escrito e estudado sobre o tema nos últimos quarenta anos, porém pouco se avançou na prática. Talvez a magnitude do assunto ou a dificuldade que as pessoas têm em controlar o sofrimento O que nos motivou a pesquisar sobre este assunto, foi o aumento exacerbado da violência sexual sobre o adolescente e o quanto esta situação é danosa a vida social, familiar e escolar Aberastury (1992). E é sobre esta égide que buscamos com esta pesquisa, resgatar o adolescente abusado sexualmente ao meio social.

As modificações psicológicas que se produzem no período da adolescência e que são a correlação de mudanças corporais levam os adolescentes a uma nova relação com os pais e o mundo (ABERASTURY, 1992).

A adolescência é o período de transição entre a infância e a vida adulta, sendo caracterizada pelos impulsos do desenvolvimento físico, mental, emocional, sexual e social e pelos esforços do indivíduo em alcançar os objetivos relacionados as expectativas culturais da sociedade em que vive segundo o mesmo autor.

A violência é toda e qualquer forma de opressão, de maus tratos, de agressão; tanto no plano físico como emocional, que contribuem para o sofrimento de uma pessoa. Quando manifestada no período da adolescência pode acarretar dificuldades no desenvolvimento físico e psíquico (AZEVEDO; GUERRA, 1988, COHEN, 1993, SAFFIOTI, 1977).

Pesquisas apontam que, quando se trata de abuso sexual ocorrido no espaço doméstico e familiar, há uma maior predominância do homem como agressor e da mulher como vítima (AZEVEDO; GUERRA, 1988, COHEN, 1993, SAFFIOTI, 1977).

Neste sentido, segundo Azevedo e Guerra (1998), a partir dos anos 90, a prática do psicólogo se diversificou e ampliou o seu campo de ação junto ao sistema judiciário, ressaltando ainda, que ele atuando com outros profissionais em uma equipe multiprofissional, facilita no auxílio da resolução dos conflitos que fazem com que a família recorra ao poder judiciário, nos casos do abuso sexual.

ADOLESCÊNCIA

 

A adolescência é uma fase de transição. Transição de valores, de informações e caracteriza-se por vários rituais de passagens. O corpo começa a mudar devido à revolução hormonal que é instalada. Os adolescentes começam a ter o corpo sexuado do adulto. (AZEVEDO; GUERRA, 1998).

A adolescência compreende a faixa etária entre 10 e 19 anos, segundo definição da Organização Mundial de Saúde (OMS, 1965) e, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei n 8069 de 13/07/90) é considerado adolescente o indivíduo entre 12 e 18 anos de idade (BRASIL, 1990).

Essa fase constitui um período de intensas modificações. O processo de crescimento e desenvolvimento, assim como as características psicológicas peculiares dessa fase da vida e o contexto social em que o adolescente está inserido, determinam maior vulnerabilidade desse grupo aos agravos, colocando-o na condição de maior suscetibilidade às mais diferentes situações de riscos, como gravidez precoce, doenças sexualmente transmissíveis (DST), acidentes, diversos tipos de violência, uso de drogas, evasão escolar, etc. conforme relata a Organização Mundial. Os adolescentes são pessoas com qualidade e características específicas que têm um papel interventivo e responsável a desempenhar, tarefas a realizar e capacidade a desenvolver, num momento particular da vida (SPRINTHALL; COLLINS, 1999).

 

ABUSO SEXUAL

 

Em todo o mundo, muito se tem escrito e estudado sobre o tema nos últimos quarenta anos, porém pouco se avançou na prática. Talvez a magnitude do assunto ou a dificuldade que as pessoas tem em controlar o sofrimento frente a casos de maus tratos explique o fenômeno, uma vez que ocorrem fora da realidade conhecida e vivida por grande parte da sociedade, sendo encarados como “problema dos outros” (KRUGMAN; LEVENTHAL, 2005).

No Brasil, como em muitas outras sociedades americanas e ocidentais, a idade em que crianças e adolescentes podem ter relações sexuais entre eles mesmos e com adultos está regulamentada em lei. A transgressão dessas leis é considerada crime, devendo o transgressor responder judicialmente por seus atos, principalmente se houver emprego de forca física. As primeiras regulações dessa matéria encontram-se registradas no Código Penal do Brasil Imperial de 1830. Infelizmente, não há estudos que avaliem a aplicação das leis relativas à prática sexual com crianças e adolescentes no passado. Não se sabe ainda se eram cumpridas, em que o eram, quais segmentos da sociedade se aplicavam e por que isso não ocorreu. Mas, é possível afirmar que até meados dos anos 80 do século findo, havia pouquíssimas organizações devotadas a exigir o cumprimento dessas leis ou mesmo a prestar serviço especializado a crianças e adolescentes que sofressem violência sexual conforme Santos e Ippolito, 2004.

O abuso sexual de menores é um dos assuntos que durante muitos anos foi tratado como tema “tabu”, resultando numa ocultação a muitos séculos dos comportamentos sexuais entre adultos e menores. Desta forma, a preocupação com os abusos de menores, só atingiu o seu auge na década de 70, não obstante a sua existência e as suas conseqüências terem sido analisadas por profissionais em diferentes momentos do século XX (FÁVERO, 2003).

O conceito de “abuso”, cuja ampliação de sentido passa a ser mais reconhecida a partir dos anos 90, encontra em autores como Silver e Glicker (1990) uma definição de maior alcance, referindo-se a “atos ou palavras negativas, desnecessárias e evitáveis, infligidos por uma pessoa a outra ou outras”.

O abuso sexual tem sido descrito desde a Antiguidade. O Imperador romano Tibério, segundo obra de Suetônio sobre a vida dos Césares, tinha inclinações sexuais que incluíam crianças como objeto de prazer. Há relato de que ele se retirou para a ilha de Capri com várias delas, e que as obrigava a satisfazer sua libido através da prática de diversas formas de atos sexuais (CARTER-LOURENSZ; JONHSON POWELL, 1999).

Abuso sexual vem a ser um ato ou jogo sexual em que o adulto submete a criança ou o adolescente (relação de poder desigual) para se estimular ou satisfazer-se sexualmente, impondo-se pela forca física, pela ameaça ou pela sedução com palavras ou com oferta de presentes. O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, juntamente com outras normas e acordos internacionais, fez com que o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes deixassem de ser apenas um crime contra a liberdade sexual e se transformassem numa violação dos direitos humanos, ou seja, direito ao respeito, à dignidade, à liberdade, à convivência familiar e comunitária e ao desenvolvimento de uma sexualidade saudável (SANTOS; IPPOLITO, 2004).

Questões relacionadas à situação da família nos casos de denúncia e comprovação dos abusos, bem como o desenrolar dos procedimentos jurídicos, se impõem. Faz-se necessário também conhecer as repercussões na vida de crianças e adolescentes: rendimento escolar, adaptação social, alterações da saúde física e mental e a possibilidade de desenvolverem distúrbios comportamentais (SANTOS; IPPOLITO, 2004).

Abusar é precisamente ultrapassar os limites e, portanto, transgredir. Abuso contém ainda noção de poderio, ou seja, o abuso do poder ou de astúcia, abusar na confiança, da lealdade, o que significa que houve uma intenção e que a premeditação está presente (ARAÚJO, 2002). Alguns autores ao definir o abuso sexual consideram um conjunto de variáveis e padrões de comportamentos étnico-culturais que confirmam tal prática abusiva ou não (ARAÚJO, 2002).

O abuso sexual contra crianças e adolescentes não é um fenômeno atual. Referências a atividades sexuais entre adultos e crianças podem ser encontradas nos registros de civilizações antigas e modernas. Tais registros históricos revelam reações sociais extremamente ambivalentes, variando desde a negação da existência de contato sexual entre adultos e crianças ou adolescentes a aceitação desse contato (DEBLINGER; HEFLIN, 1999). No entanto, foi recentemente que o abuso sexual passou a ser foco de pesquisas que têm documentado o impacto psicossocial desta experiência no desenvolvimento de crianças e adolescentes, bem como têm recebido atenção dos meios de comunicação (AMAZARRAY; KOLLER, 1998). A real freqüência dos abusos, possivelmente permanece constante, mas o que parece estar aumentando é a atenção que é dada atualmente ao problema (FLORES; CAMINHA, 1994)

A violência sexual ou abuso sexual, como é comumente chamada, busca aniquilar o outro enquanto sujeito e pressupõe o envolvimento de crianças e adolescentes em práticas sexuais. Seja de forma coercitiva, persuasiva ou até mesmo tolerada ou “consentida”, no caso de adolescentes. O “consentimento”, mesmo que seja utilizado como justificativa para determinados atos e para as práticas exercidas, ainda assim são incluídos em termos de violência, pois a infância e a adolescência são etapas bastante peculiares de desenvolvimento, pressupondo que ainda se em fase de aquisição de conhecimentos e definição de escolhas e efetivação delas. “O abuso sexual supõe uma disfunção em três níveis: o poder exercido pelo grande (forte) sobre o pequeno (fraco); a confiança que o pequeno (dependente) tem no grande (protetor); e o uso delinqüente da sexualidade, ou seja, o atentado ao direito que todo individuo tem de propriedade sobre seu corpo” (GABEL, 1997).

Sua ocorrência é bastante comum em todas as classes sociais e econômicas. Acontece em países pobres ou ricos, com pessoas de boa condição financeira, de boa aparência como também pode acontecer com pessoas de classe social menos favorecida (QUEIROZ, 2006).

Segundo Finkelhor e Hotaling (1984), o trato dados às questões referentes ao abuso sexual deve incluir em sua análise as diferenças de idade entre os envolvidos, as informações sobre as coerções presentes e o comportamento explícito ou implícito neste processo. Segundo os autores, o uso de forca, ameaça e exercício de poder e a autoridade, independentemente das diferenças de idade, sempre deveriam ser considerados condutas abusivas.

O abuso sexual pode ser considerado, devido a suas implicações, como uma questão social, de saúde publica e como um problema psicológico. O abuso sexual contra criança e o adolescente tem sido uma prática comum e constante nas relações familiares em todas as classes sociais e em todo o mundo, além de responsável por fortes traumas, por gravidez indesejada, por doenças sexualmente transmissíveis. Estudos apontam as graves conseqüências dos abusos tanto para a saúde física como para a saúde mental, como as doenças sexualmente transmissíveis, inflamação pélvica, gravidez não desejada, aborto espontâneo, dor pélvica crônica , lesões, dores de cabeça, abuso de drogas/álcool, asma, síndrome de intestino irritável, desordem de estresse pós-traumático, medo, fadiga, depressão, ansiedade, disfunção sexual, desordens da alimentação, desordens múltiplas de personalidade, disfunção do sono e incapacidade permanente ou parcial (FINKELHOR; HOTALING, 1984).

O abuso sexual também pode ser considerado por qualquer ação que objetive a gratificação sexual de um adulto ou um adolescente muito maior com uma criança, antes da idade de seu consentimento legal. Estas ações podem constituir-se por praticas oral-genital, genital-genital, genital-retal, mão-genital, mão-seio, exposição das partes genitais, exibição e produção de pornografia. O desdobramento destas práticas pode se expressar pelo abuso sexual com ou sem contato físico. Os abusos sexuais sem contato físicos são práticas disseminadas e repetitivas a longo tempo, apesar de somente virem a ser discutidas nos últimos anos (FINKELHOR; HOTALING, 1984).

Tipos de abuso sexual

Os tipos de abuso sexual variam em gravidade, desde caricias até sadismo onde o abusador tem prazer de machucar e ou estuprar (QUEIROZ, 2006).

Segundo o mesmo autor, os atos caracterizados do abuso sexual diferem apenas na forma como é praticado pelo agressor podendo agrupá-los da seguinte maneira:

a) Atos que agridem sensorialmente o adolescente, entre outros destacam-se conversas ou telefonemas obscenos;

b) Apresentação forçada de imagens pornográficas;

c) Exibição de órgãos sexuais do adulto;

d) Voyeurismo, que é excitação sexual conseguida mediante a visualização dos órgãos sexuais;

e) Atos que utilizam o corpo como forma de agressão, tais como: contatos sexuais ou masturbação forçada;

f) Pedofilia ato ou fantasia de ter contatos sexuais com crianças em idade pré-pubertária (13 anos ou menos) em que o pedófilo tem de ter mais de 16 anos e ser ao menos cinco anos mais velho que a vítima. Quem recorre a material pornográfico com crianças deve ser também inserido neste conceito. Tal como acontece em desvios da sexualidade, também a pedofilia tem uma evolução crônica, com comportamentos que vão do despir as crianças, a observá-las, ao toque, ao sexo oral, à masturbação, até à penetração;

g) Pornografia. A definição exata de pornografia é controversa, englobando geralmente filmes ou fotografias com cenas de sexo explicito e, ainda, dependendo do caso, algumas formas de nudez com conotação intencionalmente erótica.

Dentre os tipos de pornografia infantil, observa-se o aspecto etário, no qual pode se apresentar de três formas (BALLONE, 2004):

– Pornografia ou cenas de sexo explícito apenas entre crianças, ou apenas entre crianças e adolescentes;

– Pornografia ou cenas de sexo explícito entre adultos, crianças ou adolescentes;

– Pornografia ou cenas resultantes da prática de pedofilia, ou seja, cenas de sexo explícito entre adultos e crianças pré-púberes.

No Brasil, é crime “apresentar, produzir, vender, fornecer, divulgar ou publicar, por qualquer meio de comunicação, inclusive rede mundial de computadores ou internet, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explicito envolvendo criança ou adolescente” (BRASIL, 1990).

 

Fases do Abuso Sexual

 

Uma sucessão de fases que podem didaticamente serem separadas: envolvimento, interação sexual, sigilo, revelação e negação (XAVIER & SANTANA, 2001).

Segundo os autores, a fase do envolvimento pode ser descrita como fase de “sedução” ou “paquera”. O adulto começa a apresentar à criança as atividades sexuais como se fosse jogos ou brincadeiras, como algo “especial” e divertido. A segunda fase é a de interação sexual propriamente dita. Há a evolução do contato sexual, desde brincadeiras que expõe o corpo da criança, passando por toques, carícias e beijos, até a ocorrência de sexo oral, anal ou vaginal. A fase do sigilo ou segredo é de extrema importância. Nesta fase o abusador usa seu poder para manter a criança ou o adolescente em silêncio, utilizando para isto ameaças ou compensações.

A revelação acontece quando alguém ou alguma coisa é descoberta (XAVIER e SANTANA, 2001).

Formas de abuso sexual

Existem duas formas de abuso sexual que os adultos podem praticar contra as crianças e os adolescentes: com contato físico ou sem contato físico. Nos dois casos, o adulto abusa do jovem para conseguir algum tipo de prazer ou satisfação interior (BALLONE, 2004).

a) Com contato físico:

– Violência sexual: forçar relações sexuais, usando violência física ou fazendo ameaças verbais;

– Exploração sexual de menores: pedir ou obrigar a criança ou o jovem a participar de atos sexuais em troca de dinheiro ou outra forma de pagamento.

b) Sem contato físico:

– Assédio: falar sobre sexo de forma exageradamente vulgar;

– Exibicionismo (ato obsceno): mostrar as partes sexuais com intenção erótica;

– Constrangimento: ficar de longe observando jovens ou crianças sem roupa ou ficar olhando de maneira intimidatória;

– Pornografia infantil: tirar fotos ou filmar poses pornográficas ou de sexo explícito.

Perfil dos abusadores

Geralmente, o agressor é uma pessoa em que a criança ou adolescente conhece, gosta e confia. Tal confiabilidade é utilizada como instrumento de sedução, intimidação, ameaças e, sobretudo, com meio de impedir que a criança/adolescente conte a outras pessoas o que se passou/passa (REDE SAÚDE, 2000).

Eles são sutis, raramente deixa lesões físicas, porém a vítima se ressente em sua integridade física, moral e psicológica (REDE SAÚDE, 2000).

Queiroz (2006) caracteriza e relaciona o molestador sexual como aquele que insiste em abraçar, pegar, beijar, fazer cócegas ou segurar a criança mesmo que não queira, conversa sobre atividades sexuais, dá presentes ou dinheiro sem razão.

A maioria dos casos de abuso sexual acontece com autor conhecido pela vítima, podendo ser alguém da família, ou de um conhecido da família (QUEIROZ, 2006).

Ao contrário do que muitas pessoas pensam os agressores não são homens violentos, alcoólatras ou depravados sexuais, estes existem, mas não predominam entre os abusadores. A maior parte dos agressores sexuais de crianças e adolescentes é composta por homens heterossexuais e que se relacionam com outros adultos – são chamados agressores sexuais situacionais (XAVIER, 2001).

INCIDÊNCIA NO BRASIL

 

O fenômeno da violência sexual não é facilmente identificado por meio de dados estatísticos. Assim, partimos do pressuposto de que muitos casos de violência doméstica analisados pelos tribunais não dão visibilidade, ou mencionam, situações de violência sexual entre as partes envolvidas. A violência domestica sofreu um processo significativo de judicialização, derivado da aplicação da Lei 9.099. Se, por um lado, este processo contribuiu para aumentar a sua visibilidade perante o Judiciário (MELLO; ADESSE, 2005).

Os crimes sexuais são poucos denunciados e há falta de instrumentos adequados para registrar estatisticamente o problema, dificultando a produção de um diagnostico nacional exato sobre a violência sexual no Brasil. O numero real de casos é muito superior ao volume notificado à policia e ao judiciário. Estudos do Departamento de Medicina Legal da Unicamp, de 1997, indicam que apenas 10% e 20% das vitimas denunciam o abuso. No entanto, 43% das crianças e adolescentes pesquisadas pela Fundação Perseu Abramo em 2001, em todo o território nacional, relatam que já sofreram alguma forma de violência sexual e domestica, sendo 13% relatam ter sofrido abuso e 11% afirmaram já ter sofrido assedio sexual. (DREZETT, 2000).

Percebe-se que a invisibilidade das questões de violência sexual nos atendimentos também esta relacionada às dificuldades no trato das temáticas da sexualidade. No atendimento a mulheres e crianças, os profissionais de saúde procuram sempre transferir o problema para outros serviços, como o judiciário, o setor de segurança publica ou o serviço social da instituição. Não são capacitados para tratar das questões da violência, havendo grande ausência sobre este tema nos currículos dos cursos superiores dos pais (LERNER, 2000).

Os dados de Drezzet apontam que o agressor é conhecido por grande parte das crianças e desconhecido pela maior parte das adolescentes e mulheres adultas. Entre crianças, o agressor mais comum é seu parente biológico; entre as adolescentes, destaca-se o vizinho como o agressor predominante, seguido do pai biológico, padrasto e do tio. Apesar de responsável por apenas 4,6% das agressões, o irmão aparece apenas como agressor das adolescentes. Com relação ao numero de agressores enquanto participantes efetivos do crime sexual, prevaleceu um único, 12 vezes mais freqüentes os agressores múltiplos. Entre as crianças, o local mais comum da agressão foi na sua residência, seguido do domicilio do agressor e próximo a sua habitação. Entre as adolescentes a abordagem se deu mais quase sempre próximo a sua casa e no percurso da escola ou trabalho (DREZETT, 2000). Em pesquisa realizada sobre casos de incesto em 50 famílias, em São Paulo, houve 52 agressores e 63 vitimas meninas. Destes agressores, 37 eram pais biológicos, seis eram padrastos; 11 meninas ficaram grávidas de seus pais (SAFFIOTI, 1997).

Segundo análise feita em 1.169 casos de violência doméstica atendidos nos SOS Crianças da ABRAPIA, entre janeiro de 1998 e junho de 1999, foram diagnosticados: 65% de violência física, 51% de violência psicológica, 49% de casos de negligencia e 13% de abuso sexual. Em 93,55 dos casos os agressores eram parentes da vitima (52% – mãe, 27% – pai, 8% – padrasto/madrasta, 13% – outros parentes) e em 6,5% os abusadores não são parentes (3% – vizinhos, 2% – babás e outros responsáveis, 1,5% – instituições). Dos 13% de casos envolvendo abuso sexual a pesquisa demonstrou que (ABRAPIA, 2003):

a) A idade da vitima: 2 a 5 anos – 49%, 6 a 10 anos – 33%;

b) 80% das vitimas tinham sexo feminino;

c) 90% dos agressores eram do sexo masculino.

O adulto que comete violência sexual sempre pede para a criança guardar segredo sobre o que aconteceu usando diversas formas de pressão. É muito comum a criança se sentir culpada e até merecedora da violência em si, haja visto ela não tem estrutura mental suficiente para explicar tal ato cometido contra si. Aliado ao sentimento de culpa, a pressão psicológica exercida pelo perpetrador, o próprio laço de afeição entre estes (BALLONE, 2004).

PROCEDIMENTOS PARA A PREVENÇÃO DO ABUSO SEXUAL

 

A prevenção contra este tipo de atos é muito importante e fundamental. Uma boa prevenção pode evitar a consumação de um ato que vai marcar profundamente o desenvolvimento da criança e adolescente e dá origem a danos completamente irreparáveis (ANDREOLI, 1998).

A educação sexual deve ser integrada na educação cujo objetivo é a pessoa, o respeito, e certamente não separada de tudo isto e reduzida apenas a uma educação sobre a anatomia, por um lado, e a funcionalidade do órgão por outro. Os programas de prevenção do abuso sexual de menores a implementar nas escolas devem inserir-se nos programas de educação sexual ou nos programas de promoção para a saúde (ANDREOLI, 1998).

O conteúdo foi estruturado de acordo com as três modalidades de prevenção de maus-tratos sugeridas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) das Nações Unidas: primária, secundária e terciária. A prevenção primária tem por objetivo por eliminar ou reduzir os fatores sociais, culturais e ambientais que propiciam os maus-tratos (SANTOS; IPPOLITO, 2004).

As ações propostas buscam atingir as causas da violência sexual juntamente com a implementação de políticas sociais básicas, destacam-se aqui as ações educativas devem ser dirigidas a toda população, grupos de mães, pais, adolescentes, escolas e igrejas de todos os credos (SANTOS; IPPOLITO, 2004).

Ações voltadas para a prevenção da violência (SÃO PAULO, 2006):

a) Intensificar parcerias intra-institucionais e intergovernamentais e com a sociedade civil organizada, para a implantação e implementação de ações articuladas de promoção da cultura da paz, prevenção da violência, assistência e proteção a adolescentes vitimas de violência.

b) Formentar a organização de Espaços Jovens, estimulando a participação comunitária e juvenil.

c) Estimular a organização de pactos comunitários contra a violência intra-familiar visando a não-legitimação institucional e social da violência, o empoderamento dos setores mais vulneráveis da comunidade, a valorização do papel comunitário na resolução de conflitos sem violência, acordando metas e valores coletivos.

d) Reorganizar serviços de assistência às vitimas de violência, com as respectivas referencias e contra-referencias.

e) Garantir a contracepção de emergência e a profilaxia das DST/AIDS em todos os serviços que atendam adolescentes vítimas de violência sexual.

f) Garantir o apoio psicológico e social e o direito legal à interrupção da gravidez de adolescentes que sofreram violência sexual, caso seja a sua decisão pessoal. Garantir, também, os direitos daquelas que decidirem levar a gravidez adiante, com acompanhamento especificam e apoio psicológico e social, no pré-natal e no puerpério.

g) Capacitar as equipes de saúde da família para orientarem as famílias, com ênfase na realização de ações educativas, sobre os fatores intervenientes na violência, para identificarem fatores de risco e para prevenção da violência contra crianças e adolescentes.

h) Humanizar as práticas terapêuticas no atendimento de adolescentes no pré-natal, parto e nascimento, incentivando a presença dos parceiros nessas ações, para fortalecimento do vinculo da mãe e/ou pai com o bebê, como medida preventiva contra violência intra-familiar.

i) Esclarecer e fortalecer como dever profissional a denuncia da violência, cabendo lembrar que esta é obrigatória por parte do serviço de saúde e que deve ser encaminhada às Varas de Infância e Juventude e/ou Conselhos Tutelares.

A escola, por ser instituição que ocupa lugar privilegiado na rede de atenção à criança e ao adolescente, deve assumir papel de protagonista na prevenção da violência sexual contra crianças e adolescentes (SÃO PAULO, 2006).

Dessa maneira, os educadores deverão ser informados sobre as modalidades de violência contra crianças e adolescentes, serão apresentados alguns dados estatísticos e um quadro sobre mitos e as verdades relacionadas com a violência sexual, com o propósito de desmitificar alguns tabus sobre o tema (SÃO PAULO, 2006).

A prevenção secundária tem vista a identificação precoce de crianças em “situação de risco”, impedindo que atos da violência aconteçam e/ou se repitam. As ações desenvolvidas devem incidir sobre maus-tratos já existentes (SÃO PAULO, 2006).

Os educadores poderão desenvolver sua capacidade de reconhecer indícios de abuso em crianças, preparando-se, assim, para interromper o ciclo de violência sexual. Informações e pistas transmitidas contribuirão para educar o olhar dos educados para identificar sinais de abuso que não deixam marcas, bem como para aperfeiçoar suas habilidades de escuta e sua capacidade de abordar temática tão delicada e penosa para as próprias crianças (SÃO PAULO, 2006).

A notificação das ocorrências de abuso às autoridades competentes pode representar o fim do “pacto do silêncio”, o fim do pesadelo de crianças e adolescentes, assim como o fim da impunidade de agressores (SÃO PAULO, 2006).

A prevenção terciária, que tem como objetivo o acompanhamento integral da vítima e do agressor. Diante do fato consumado, deve-se trabalhar para que o ato não se repita. As ações devem priorizar o imediato encaminhamento da criança/adolescente ao serviço educacional, médico, psicológica, jurídico-social. Isso é fundamental para diminuir as seqüelas do abuso sexual no cotidiano da criança e do adolescente e evitar que se tornem abusadores quando adultos (SÃO PAULO, 2006).

Simultaneamente, devem-se desenvolver ações que visem a responsabilização do abusador e assistência a lhe ser prestada, contribuindo para quebrar o ciclo de impunidade e, conseqüentemente, o ciclo do abuso sexual (SÃO PAULO, 2006).

Para facilitar o trabalho de notificação sugere-se que cada escola entre em contato com o Conselho Municipal da Criança e do Adolescente, elabore catálogo com endereços dos órgãos competentes para encaminhamento das denúncias, e dos serviços de atendimento existentes nos estados e municípios (SANTOS; IPPOLITO, 2004).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As vivências abusivas tomam a mente e o corpo desprovidos de investimentos. A vida pode propiciar ao indivíduo vitimado experiências restauradoras que permitam que ele possa tornar-se sujeito do desejo e do fazer desenvolvendo o potencial criativo do seu ser, de modo que as marcas do passado deixem de pesar e de obstaculizar as vivências do presente e as perspectivas do futuro.

A vitimização pela violência continua sendo um evento de vida negativo, que abala a resiliência de crianças e adolescentes e as expõe a sua fragilidade.

Pôr a violência sexual constituir-se como uma violação de quase todos os direitos fundamentais, não adianta apenas se procurar punir o autor do fato delituoso para que se apaguem todos os traumas de uma situação de abuso.

A violência sexual contra crianças e adolescentes é um fenômeno complexo, envolvendo questões jurídicas, psicológicas, sociais para compreender as múltiplas facetas do abuso.

Necessita-se de mudanças nas estruturas policiais e judiciárias com o objetivo de possibilitar o segmento dos casos a partir do registro policial e do exame médico-legal.

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Fabiana Juvêncio Aguiar Donato

Doutoranda em Educação pela Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias – Lisboa – Portugal. Mestra em Ciências da Educação pela Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias – Lisboa – Portugal. Investigadora e Pesquisadora do CeiEF – Centro de Estudos e Intervenção em Educação e Formação da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias – Lisboa – Portugal. Especialista em Educação, Desenvolvimento e Políticas Educativas (ISED). Especialista em Psicopedagogia Institucional (IESP). Graduada em Letras (CESMAC). Professora Universitária de Graduação e Pós-Graduação em João Pessoa, Paraíba, Brasil.Professora de Métodos e Pesquisa. Coordenadora de Estágio, Coordenadora da Revista Acadêmica ASPER, Coordenadora do Projeto de Extensão: assistencialismo jurídico gratuito a comunidade.

Como citar e referenciar este artigo:
DONATO, Fabiana Juvêncio Aguiar. Abuso sexual em menores: vulnerabilidade na condição de suscetibilidade às situações de riscos.. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2013. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/sociedade/abuso-sexual-em-menores-vulnerabilidade-na-condicao-de-suscetibilidade-as-situacoes-de-riscos/ Acesso em: 23 dez. 2024